Dia da Trabalhadora Doméstica, celebrar a classe e reinvidicar melhorias

No dia 27 de abril é celebrado o Dia da trabalhadora Doméstica. No Brasil, um grande símbolo histórico da classe é Laudelina de Campos Melo. Nascida no dia 12 de outubro de 1904, na cidade mineira de Poços de Caldas, começou a trabalhar aos sete anos de idade como empregada doméstica. Ao longo de sua trajetória ela combateu a discriminação da sociedade em relação às empregadas domésticas, sempre exigindo melhor remuneração e igualdade de direitos sociais. Com 20 anos de idade, Laudelina chegou na cidade de Santos (SP), entrando para a Frente Negra Brasileira e criando, no ano de 1936, a Associação das Empregadas Domésticas do Brasil, que foi fechada pelo Estado Novo em 1942. Em 1961, ela fundou a Associação das Empregadas Domésticas, na cidade de Campinas (SP), a sua nova morada. A sua luta inspira a criação de associações em apoio às trabalhadoras domésticas no Rio de Janeiro e em São Paulo. A atuação de Laudelina foi fundamental na década de 1970 para a categoria conquistar o direito à carteira de trabalho e à previdência social. Em 1982, ela auxiliou a reestruturação da associação de Campinas, possibilitando a transformação da associação em sindicato, no dia 20 de novembro de 1988, dia da Consciência Negra. Laudelina de Campos Melo faleceu no dia 12 de maio de 1991, aos 86 anos, deixando sua casa para o Sindicato das Trabalhadoras Domésticas de Campinas.

Laudelina de Campos Melo

A data de hoje é um sinal de resistência e luta para todos trabalhadores domésticos no país, considerando as situações nos quais muitos se encontram. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), no Brasil tem 6.158 milhões de trabalhadores domésticos, dos quais 92% são mulheres e 3,9 milhões são negras. No ano de 2015 foi sancionada a lei complementar que regula a PEC das domésticas, que apresentaria benefícios para a categoria, como o recolhimento obrigatório do FGTS por parte do empregador, seguro-desemprego, seguro contra acidentes de trabalho e indenização em caso de dispensa sem justa causa. Além de salário mínimo, jornada de trabalho, horário de almoço, férias e carteira assinada.

Porém, após seis anos da medida ser sancionada, os dados do IBGE mostram pouquíssimos avanços em termos de efetivação de direitos para a categoria. Neste período, apenas 32% das trabalhadoras domésticas possuem carteira de trabalho assinada. No Brasil ainda lidamos com a realidade do trabalho doméstico infantil. Em 2015, foram contabilizadas 156 mil crianças nessas condições, e trazendo esses números para o recorte de gênero e raça, a questão torna-se ainda mais desigual, considerando que 88,7% das trabalhadoras domésticas eram meninas e 71% eram negras.

No contexto da pandemia da covid-19, a categoria das empregadas domésticas foi uma das que não teve direito a um isolamento remunerado, não por acaso o primeiro caso de morte por covid-19 confirmado pelo Ministério da Saúde foi de uma diarista. No início da pandemia, a Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (FENATRAD) promoveu a campanha “Cuida de Quem te Cuida”. A ação consistia em estimular os empregadores a deixarem as domésticas nas casas das famílias delas, com salários. E em casos onde não seria possível, como quando os empregadores trabalham no setor de saúde, por exemplo, a federação estimulou o transporte via aplicativos custeado pelo empregador. No dia 10 de abril, uma reportagem do jornal Correio 24 Horas, revelou que o  Sindicato de Empregadas Domésticas da Bahia recebeu pedido de socorro de 28 trabalhadoras que seguem por um ano em isolamento obrigatório, na casa dos patrões, vistas como ameaça de contaminação. Desses pedidos, 92% são de mulheres negras, moradoras de periferias e chefes de família. Diante desse fato, a presidente da FENATRAD, Luiza Batista, emitiu uma nota em nome da federação, protestando contra a ilegalidade do confinamento obrigatório de trabalhadoras domésticas, afirmando: “Se a trabalhadora não fez um contrato, onde essa assinou aceitando pernoitar no local de trabalho, ela não é obrigada a ficar. O empregador não pode determinar tal conduta”.

Em 2020, o Brasil ficou abalado com a trajetória de Mirtes Souza, a empregada doméstica de Pernambuco, que saiu para levar os cachorros dos patrões para passear e deixou o filho, Miguel, no apartamento sob os cuidados da  patroa e primeira-dama da cidade de Tamandaré (PE), Sari Corte Real. A criança foi direcionada por Sari até o elevador para que, sozinho, fosse ao encontro da mãe. A patroa, que mora no 5o andar, acionou a tecla do elevador que dá acesso à cobertura. Miguel parou no 9º andar, escalou um vão e alcançou uma unidade condensadora de ar, se desequilibrou e caiu do prédio, morrendo instantaneamente, aos olhos da mãe. A chocante história de Mirtes Souza foi contada pelas jornalistas Brenda Gomes e Thaís Vieira na matéria “Mirtes Souza e Danúbia Silva: Mães entre a saudade e a revolta”, que compõe o eBook “Narrativas Afirmativas em Tempos de Pandemia”, organizado pela Revista Afirmativa, em parceria com o Lab Afirmativa de Jornalismo, que narra as histórias e as dificuldades de outras trabalhadoras domésticas negras, e de trabalhadores de outras categorias, durante o período pandêmico.

Hoje, a FENATRAD reivindica prioridade para as trabalhadoras domésticas no Plano Nacional de Vacinação. O PL 1011/2020, tramita na Câmara dos Deputados e incluiu a categoria ao lado de outras 16 profissões consideradas essenciais e que podem ser consideradas no grupo prioritário, como caminhoneiros, trabalhadores de transporte coletivo rodoviário e metroviário, profissionais de limpeza pública, entre outros. 

Que possamos sempre lembrar dos dois pilares que sustaram a luta de Laudelina de Campos Melo: Um projeto voltado para a alfabetização das trabalhadoras domésticas, pois ela considerava que seria o primeiro passo para conscientização e entendimento da legislação trabalhista e consequentemente reivindicação dos direitos da classe; e a realização de atividades que tinham como objetivo estimular a solidariedade entre as trabalhadoras. Que essa data seja de luta, memória, resistência e solidariedade para todas as trabalhadoras domésticas do nosso país.