21 de junho: Dia de Luiz Gama e Machado de Assis, escritores, jornalistas, abolicionistas e negros

Hoje, dia 21 de junho, celebramos o aniversário de duas personalidades negras históricas e de imenso simbolismo para a nossa cultura. Celebramos o nascimento do jornalista, escritor e advogado, Luiz Gama e também do escritor, jornalista, contista, cronista, dramaturgo e poeta, Machado de Assis.

Nascido no ano de 1830, em Salvador, Bahia, Luiz Gonzaga Pinto da Gama era filho de Luiza Mahin. Sua mãe merece um capítulo à parte, nascida na Costa da Mina, na África, Luíza Mahin foi escravizada até o ano de 1812, quando comprou a sua alforria, se mudou para Bahia e se tornou quituteira. Luiza participou do maior levante organizado pelos negros escravizados, a Revolta do Malês, no ano de 1835.

Filho de Luiza Mahin com um fidalgo branco de família portuguesa, aos 10 anos Luiz Gama foi vendido pelo próprio pai, sendo escravizado pelo comprador. Em São Paulo, ele foi colocado à venda, mas foi rejeitado por ser baiano, uma condição que conferia  aos homens a fama de insubordinados, justamente por causa da Revolta dos Malês, ocorrida cinco anos antes. Sendo assim, ele foi levado para casa de um comerciante.

Analfabeto, aos 17 anos Luiz Gama aprendeu a ler e conseguiu a própria alforria. Autodidata, começou a estudar leis e passou a defender escravizados em processos judiciais, conseguindo a liberdade de muitos, iniciando assim, a sua luta abolicionista. Estudos indicam  que Luiz Gama libertou mais de 500 escravizados e chegou a receber o carinhoso apelido de “Apóstolo Negro da Abolição”.

Luiz Gama

Luiz Gama também atuou como jornalista.  Ao lado do caricaturista Angelo Agostini, fundou, em 1864, o primeiro jornal ilustrado humorístico da capital paulista, o Diabo Coxo. Dois anos depois, fundou o Cabrião.

Diabético, Luiz Gama faleceu no dia 24 de agosto de 1882, aos 52 anos. Partiu antes da chamada abolição da escravatura, que aconteceria no dia 13 de maio de 1888, mas sua luta abolicionista, mesmo não encontrando espaço nos livros da história do Brasil, é de suma importância para a comunidade negra.

133 anos após sua morte, em 3 de novembro de 2015, a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), concedeu-lhe o título de “advogado”, uma vez que não era formado e atuava como “provisionado abolicionista”.

 

No mesmo dia, nove anos depois, nascia outro negro que mudaria a história do país

No mesmo 21 de junho, mas com nove anos de diferença (1839), nasceu Joaquim Maria Machado de Assis, no morro do Livramento, no Rio de Janeiro. Filho do pintor de paredes Francisco José de Assis – que por sua vez era filho de escravizados alforriados – e da lavadeira, de origem portuguesa, Maria Leopoldina Machado de Assis.

Em 1849, após a morte da sua mãe, Machado e o pai se mudam para a casa de sua madrinha. Em 1854, Francisco José se casa novamente, dessa vez com a doceira Maria Inês da Silva.  Mesmo após a morte do pai em 1864, Machado de Assis continua morando com a madrasta.

Apesar de não ter sido escravizado na infância, como Luiz Gama, para a doutora, jornalista e historiadora e membro da Rede de Historiadorxs Negrxs, Ana Flávia Magalhães Pinto, “Machado de Assis cresceu em um ambiente em que a sua presença podia ser confundida como a de uma criança ou jovem escravizado”, disse a historiadora em uma live organizada pelo Sindicado dos Jornalistas do Distrito Federal, em 2020, que celebrava o aniversário de Machado e Gama. No mesmo evento, Ana Flávia relembra que assim como Luiz Gama, Machado de Assis também encontrou no jornal “um espaço estratégico para desenvolver os seus projetos individuais e coletivos”. Foi em 1855 que Machado de Assis publicou o seu primeiro poema, Ela, após tornar-se colaborador do jornal Marmota Fluminense. Em 1858, após ter aulas de francês e latim com o professor Padre Antônio José da Silveira Sarmento, ele se torna revisor de provas de tipografia e da livraria do Jornalista Paula Brito, onde conhece membros da sociedade Petalógica e vira colaborador dos jornais O Paraíba e Correio Mercantil.

Para Ana Flávia Magalhães Pinto, em mais um momento a história de Luiz Gama e Machado de Assis se assemelham: “Escrevendo e criando jornais, ambos tiveram a oportunidade de estabelecer relações de amizade, não apenas com medalhões, figurões reais ou pretensamente brancos, mas também com outros homens negros, livres e letrados”. 

O primeiro romance publicado por Machado de Assis foi Ressureição, lançado em 1872. Ao longo de sua trajetória, o escritor lançou 10 romances e 10 peças teatrais, 200 contos, 5 coletâneas de poemas e sonetos, além de mais de 600 crônicas. Entre os livros mais emblemáticos está a chamada “trilogia realista”, formada por Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881), Quincas Borba (1891) e Dom Casmurro (1899).

Machado de Assis

Com uma saúde muito frágil, para além da epilepsia e gagueira, desenvolveu cegueira e depressão ao longo da vida. Machado de Assis morreu com uma úlcera cancerosa na boca no dia 2 de setembro de 1908, aos 69 anos de idade.

Luiz Gama e Machado de Assis, dois escritores e jornalistas negros que nasceram no dia 21 de junho, são retratados no livro Escritos de Liberdade: Literatos Negros, Racismo e Cidadania no Brasil Oitocentista de autoria de Ana Flavia Magalhães Pinto, lançado em 2019, fruto da sua tese de doutorado, que estuda a mídia negra no Brasil e apresenta os resultados da pesquisa sobre a rede de homens negros, livres, letrados e atuantes na imprensa nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro na segunda metade do século XIX.

Livro “Escritos de Liberdade: Literatos Negros, Racismo e Cidadania no Brasil Oitocentista” de autoria de Ana Flavia Magalhães Pinto

Além de Luiz Gama e Machado de Assis, o livro aborda as trajetórias de Ferreira de Menezes, José do Patrocínio, Ignácio de Araújo Lima, Arthur Carlos e Theophilo Dias de Castro, todos homens negros livres e letrados e que colaboraram com a luta abolicionista, muito antes do 13 de maio de 1888: “Luiz Gama e Machado de Assis foram pessoas que cada um ao seu modo, se dedicaram à luta contra a escravidão, problematizando aquilo que estava colocado no sentido de uma conivência com a permanência da escravidão, sejam em textos muito marcantes e também em textos que guardam uma certa discrição, muito comum dessa escrita machadiana”, conclui a autora. 

Para a historiadora Ana Flavia Magalhães Pinto: “Luiz Gama e Machado de Assis foram pessoas que cada um ao seu modo, se dedicaram à luta contra a escravidão”

Fontes:

Portal Geledés

Revista Afirmativa

Live do Sindicato dos Jornalista do Distrito Federal

Podcast Sob Torção – Especial Luiz Gama

Fortes Laços em Linhas Rotas – Literatos negros, racismo e cidadania na segunda metade do século XIX – Ana Flavia Magalhães Pinto