Conheça as organizações selecionadas e os seus projetos

Por Wagner Prado

Projetos de 8 estados brasileiros e Distrito Federal, representando 12 organizações, grupos e coletivos negros estão selecionados pelo edital Educação e Identidades Negras – Políticas de Equidade Racial. As organizações selecionadas representam os estados do Acre e  Amapá (Norte); Bahia, Ceará e Pernambuco (Nordeste); Goiás (Centro Oeste); Rio de Janeiro (Sudeste); Rio Grande do Sul (Sul) e o Distrito Federal. Todas, ao longo dos próximos 18 meses, vão desenvolver projetos  que têm como ponto comum o combate ao racismo na Educação. O edital Educação e Identidades Negras: Politicas de Equidade Racial é uma iniciativa do Fundo Baobá, que tem como apoiadores na iniciativa a Imaginable Futures e a Fundação Lemann. 

O enfrentamento ao racismo por meio de políticas, ações e programas governamentais e não governamentais; a valorização da cultura das identidades negras, e o aumento de pessoas negras nos espaços de decisão e poder dentro do setor formal e não formal da educação, são as metas do edital. A Imaginable Futures e a Fundação Lemann, parceiros do Fundo Baobá, fizeram, em conjunto, um aporte de R$ 2,5 milhões no edital para que as 12 selecionadas recebam, cada uma, R$ 175 mil.  O recurso restante será utilizado na realização de atividades formativas, assessoria técnica e reuniões de ajustes. para ajustes e trocas de experiências. Todas essas atividades serão promovidas e coordenadas pelo Fundo Baobá. 

Perfil dos Selecionados

Há uma grande diversidade quando são pinçados os dados que fazem a composição das 12 organizações selecionadas pelo edital. Como dito acima, elas fazem parte de 8 estados brasileiros mais o Distrito Federal. Se formos analisar o tempo de atividade de cada uma, vamos encontrar, 2 (duas) delas já têm mais de 16 anos de atuação (Associação Cultural de Tradição Afro-Brasileira Afoxé Omô Nilê Ogunjá e Pesquisadores e Associação Retratores da Memória de Porteiras); 3 (três) atuam entre 11 e 15 anos (Articulação Nacional de Psicólogas(os) Negras(os) e Pesquisadores – Anpsinep, Cineclube Bamako e Coletivo Negro(a) Tia Ciatá; 5 (cinco) atuam de 6 a 10 anos (Associação de Mulheres Negras do Acre e Seus Apoiadores, Centro Comunitário de Audiovisual Luiz Orlando, Coletivo Atinúké, Movimento Nação Marabaixeira e Ponto de Cultura Grupo EX 13) 2, finalizando, 2 (duas) estão constituidas e atuam de 2 a 5 anos (Associação dos Quilombolas e Descendentes do Mundo Novo e Oficina de Inovação e Ancestralidade). 

Olhando o recorte da influência geográfica, 3 (três) desenvolvem suas atividades de forma nacional; uma concentra seu trabalho em uma região do Brasil; cinco trabalham em seus estados de origem e três especificamente nos municípios em que estão localizadas. Com relação ao perfil do corpo diretivo, oito têm pessoas com 30 anos ou mais no seu corpo diretivo; três têm equilíbrio entre jovens (29 anos ou menos) e adultos (30 anos ou mais) e uma tem corpo diretivo composto por jovens (29 anos ou menos). 

No quesito gênero, os grupos diretivos de nove organizações têm em sua composição diretiva pessoas de grupo LGBTQIAPN+. Três não têm.  Pessoas especiais estão presentes na direção de três organizações. Dez dos grupos selecionados possuem parceiros que os auxiliam em termos financeiros e dois deles têm parceiros pontuais, que dão suporte para ações programáticas. 

Para se habilitarem ao edital as organizações que se inscreveram tiveram que fazer uma análise apurada sobre o que pretendiam propor, além das respostas que serão dadas frente aos desafios previamente mapeados. Em termos de desafios, os seguintes tópicos foram apontados pelas organizações: Logística, transporte e alimentação para profissionais, estudantes e membros; impactos emocionais psicológicos na saúde mental de educadores e estudantes; invisibilidade das mulheres negras nas ciências e tecnologias; negação e desvalorização das identidades e culturas negras e quilombolas; pouca aplicação da Lei 10.639/03 nas ciências exatas e da natureza; falta de ferramentas para efetivação de políticas públicas; falta de ações voltadas para a elevação da autoestima de estudantes; baixa formação de novas lideranças femininas negras que atuam na educação; racismo religioso de educadores e das comunidades ao entorno.   

Vencidas as dificuldades previstas, o caminho leva à busca dos resultados esperados ao final do projeto. E as perspectivas vislumbradas pelas organizações, grupos e coletivos participantes do edital são bem animadoras: Escolas sensibilizadas para implantação da Leis 10.639/2003 e 11.645/2008; perspectiva racial introduzida dentro do sistema socioeducativo; mais mulheres negras na pós-graduação; docência universitária e cargos de alto escalão; parcerias e maior articulação com comunidades e grupos locais; aprendizados dos projetos incorporados pelos espaços de educação; jovens, pais, professores e gestores da educação interessados no terma do projeto; lideranças negras juvenis fortalecidas e engajadas com o tema da educação; metodologias que fortaleçam processos de atendimento, escolarização e escuta; uso da tecnologia ampliado na periferia e em comunidades tradicionais para enfrentar o racismo e fortalecer as identidades negras; jovens negros com uma percepção positiva sobre si e sua comunidade. 

Toda essa interação e desenvolvimento ao longo do projeto são vistas como geradoras de transformações pessoais e institucionais marcantes. Entre elas, foram apontadas as seguintes como focos: Habilidades gerenciais potencializadas; capacidade de intervenção ampliada; aumento do interesse por saberes científicos; fortalecimento das relações; ampliação do engajamento político; qualificação na produção e disseminação de conteúdos e na realização de processos formativos;fortalecimento de nossas relações com comunidades e com nossos parceiros. Tudo isso irá fortalecer no corpo diretivo das instituições o desenvolvimento de habilidades de liderança como:  Comunicação estratégica e assertiva; ação em rede e atuação junto a parceiros; visão crítica e tomada de decisões; cursos e treinamentos técnicos específicos; gestão de tempo e priorização; análise de contextos complexos, mapeamento de atores e riscos. 

As associações, grupos e coletivos selecionados consideram o trabalho com educação fundamental para que questões relativas às diferenças sociais sejam corrigidas, assim como a difusão da cultura negra. A fala de Irailda Leandro, da  Associação Dos Quilombolas e Descendentes do Mundo Novo, da cidade de Buíque, em Pernambuco, revela isso: “Só vamos sair desse ciclo de pobreza e desigualdade com Educação”. Carlos Peru, líder do Movimento Nação Marabaixeira, de Macapá, no Amapá, fala sobre uma particularidade do seu estado. “50% da população do Amapá se declara negra. Com a nossa participação nesse edital, vamos chegar ao nosso objetivo de difundir a cultura negra em nosso estado.”

As Organizações e seus Projetos

Para conhecer mais de perto os projetos das organizações selecionadas, acesse este link

Diretor Executivo e Vice-presidente do Conselho Deliberativo do Fundo Baobá falam sobre posicionamento da instituição frente a questões sociais

             Por Wagner Prado

Giovanni Harvey vai completar um ano à frente da Direção Executiva do Fundo Baobá. Antes de assumir o cargo, Harvey foi presidente do Conselho Deliberativo do Fundo e construiu uma carreira com 30 anos de experiência como executivo na iniciativa privada, na administração pública e no terceiro setor. A política sempre esteve presente em sua vida, tendo sido presidente do Diretório Central dos Estudantes da Universidade Federal Fluminense (UFF) entre 1988 e 1989. Giovanni ocupou o cargo de Secretário Nacional de Políticas de Ações Afirmativas entre 2008 e 2009 e foi Secretário Executivo, de 2013 a 2015, da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República (Seppir). Atuando no Fundo Baobá, Giovanni Harvey tem sido uma das vozes mais vibrantes nos eventos relacionados à questão racial no Brasil. Ele faz o seguinte alerta: “O papel da sociedade civil não é concorrer com o Estado. É buscar identificar quais são as demandas que o Estado não está atendendo, por qualquer que seja a razão, e propor soluções inovadoras que possam (no futuro) inspirar a ampliação das políticas públicas.”  

Amalia Fischer é a vice-presidente do Conselho Deliberativo do Fundo Baobá. Profissional com grande experiência de trabalhos em filantropia, investimento social e responsabilidade na diversidade, ela tem doutorado em Comunicação e Cultura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), além de ser Socióloga. Amalia Fischer faz uma análise sobre as origens da filantropia no Brasil. “A filantropia branca tem origem na Santa Inquisição. É uma filantropia em que a Santa Inquisição, que de santa não tinha nada, era aquela que tinha a ideologia e a política daquele momento. E isso foi aplicado a todos os diferentes: judeus, mulheres, negros e indígenas na medida em que o homem branco foi colonizando e se apropriando do mundo.” Em entrevista, Giovanni Harvey e Amalia Fischer falam sobre direcionamentos do Fundo Baobá, realizações e perspectivas. 

Qual a expectativa do Fundo Baobá com relação a políticas públicas a serem implementadas e como a instituição vai atuar frente a elas?

Giovanni Harvey – Essa resposta ela tem dois aspectos. E o primeiro aspecto é exatamente essa expectativa mais genérica, que  passa pela reconstrução, pelo restabelecimento de políticas públicas que não são políticas públicas de governo,  independentemente do que se pensa. São políticas públicas de Estado. O Estado brasileiro  veio aperfeiçoando a sua visão sobre as suas responsabilidades no enfrentamento às varias desigualdades. E, no que diz respeito à desigualdade nas relações étnico-raciais,  o Estado brasileiro, desde a Constituição de 1988, que tornou o racismo crime inafiançável, imprescritível -momento no qual inclusive foi criada, por iniciativa do governo, a Fundação Cultural Palmares-, o Estado brasileiro veio avançando no seu entendimento sobre as suas responsabilidades no enfrentamento das desigualdades geradas pelo racismo estrutural.  Lamentavelmente na última quadra (últimos quatro anos), em termos de visão política, vimos o Estado brasileiro se abstendo de dar continuidade a este processo. Então, a primeira expectativa que eu tenho é de que essas políticas públicas de Estado serão reestabelecidas. A partir daí nós poderemos fazer uma avaliação sobre o posicionamento do Fundo Baobá. 

O segundo aspecto desta resposta é que o papel da sociedade civil não é concorrer com o Estado. É buscar identificar quais são as demandas que o Estado não está atendendo, qualquer que seja a razão, e propor soluções inovadoras que possam (no futuro) inspirar a ampliação das políticas públicas. Quais são as aspirações que não estão sendo atendidas pelas políticas públicas? Porque não estão sendo atendidas por iniciativas que tenham uma certa envergadura. E é a partir dessa análise que nós, o Fundo Baobá, identificamos pontos de melhoria, demandas não atendidas, demandas contra-hegemônicas,  tensões sociais que merecem  adquirir uma maior visibilidade e, a partir daí,  o Baobá se posiciona. Estamos acompanhando com atenção esse redesenho das políticas públicas. Estamos com as nossas operações em curso e certamente vamos fazer um ajuste no nosso posicionamento a partir do desenho e do escopo das políticas públicas que vierem a ser definidas. 

Giovanni Harvey, Diretor Executivo do Fundo Baobá

O Baobá não “apenas” é um mecanismo de captação e repasse de recursos. O Baobá se fez para além disso. Criou uma forma de atuar dentro desse ambiente da filantropia para justiça social. O Baobá virou referência? Ele é inspiração para outros? 

Giovanni HarveyO Baobá não é apenas um captador e distribuidor de recursos, o Fundo Baobá também faz captação para redistribuir recursos para o  campo. Eu entendo a pergunta na dimensão institucional e política, considerando o que pode ser a percepção da sociedade diante da experiência  de construção de uma instituição negra. Depois que eu fui a Salvador e conheci com mais profundidade a história da Sociedade Protetora dos Desvalidos, não posso mais dizer que o Fundo Baobá é a primeira experiência negra pensada com o ponto de  vista da sustentabilidade. Porque nós temos a Sociedade Protetora dos Desvalidos,  fundada em 1832. E a Sociedade foi fundada já numa lógica de buscar a autossustentabilidade e, passados 190 anos,  continua funcionando e continua sendo guiada por uma visão de busca de sustentabilidade. Então, dentro do modelo atual de buscar sustentabilidade a partir de uma gestão financeira mais arrojada, com aplicações, com endowment, o Baobá é a primeira instituição no Brasil que alcança um certo patamar de sustentabilidade em cima da estratégia de um fundo patrimonial. Nesse sentido, o Baobá   é inspiração sim. Ele tem que navegar fora do senso comum. O Fundo Baobá é uma referência por ser uma instituição que opera na fronteira de tensões do enfrentamento do racismo estrutural.

Amalia Fischer Evidentemente que sim. O Baobá é uma referência. Ele é único. Além de referência ele é uma instituição que está consolidada. É uma instituição que é transparente, eficiente, inovadora e tem todas as características de, não sendo uma fundação como a Fundação Ford, ter todos os elementos de uma governança, o que faz com que ela seja forte, capaz de ir às profundezas dos problemas da população negra, buscando soluções junto à população. Então, é a única que vai até as profundezas das necessidades para procurar soluções para a população negra.

O Baobá é referência. Tenho ouvido, por exemplo, a Aline Odara (Fundo Agbara) falando com admiração e falando que quer ser grande quer ser como o Baobá. Isso é maravilhoso, porque pega uma tradição dentro da resistência dos negros no Brasil e das instituições que os negros criaram, como as Irmandades. Isso é uma tradição e é possível ver um histórico. É possível ver que a população negra é capaz de mobilizar recursos e fazer filantropia de um jeito que não o jeito branco. A filantropia branca tem origem na Santa Inquisição. É uma filantropia em que a Santa Inquisição, que de santa não tinha nada,  era aquela que tinha a ideologia e a política daquele momento. E isso foi aplicado a todos os diferentes: judeus, mulheres, negros e indígenas na medida em que o homem branco foi colonizando e se apropriando do mundo. Então, a resistência e a oposição que os negros fizeram a essa filantropia de esmola é uma filantropia que responde promovendo cidadania, alforria e educação de negros. E isso foi feito por muitas mulheres que estavam à frente das irmandades e à frente também de alguns negócios, as ganhadeiras. Então, os negócios sociais foram criados pelos negros. A filantropia de justiça social foi criada pelos negros. E isso você não vê na história da filantropia do Brasil. Você tem que cavoucar para chegar lá e ver coisas que não se falam na história oficial. O conceito da igreja católica para filantropia foi a piedade. E a piedade nunca vê o outro como um igual. Vê o outro como um subalterno e dá a esmola. 

O Baobá e toda filantropia desenvolvida pela comunidade negra é uma filantropia que olha para a cidadania plena, para os direitos, para a equidade racial, para a equidade de gênero. 

Amalia Fischer, vice-presidente do Conselho Deliberativo do Fundo Baobá

Analisando o contexto das relações raciais no Brasil, que tipo de influência o Fundo Baobá pode ter nacionalmente? No terreno internacional, ele pode ser um influenciador? Isso é algo que o Baobá pretende? 

Giovanni HarveySim, o Baobá é um influenciador no campo nacional. As  parcerias que o Baobá tem com instituições da iniciativa privada, do investimento social privado,  da filantropia, do terceiro setor já o colocam como uma instituição importante dentro desse cenário. O Fundo tem interface com instituições internacionais. Ele se  constituiu a partir do apoio de uma organização internacional, que é a Fundação Kellogg, e o Baobá acompanha o cenário internacional. Vamos lembrar que nós estamos na década dos afrodescendentes da ONU, de 2014 a 2024, e que certamente esse tema da década vai voltar à agenda brasileira. Aquela fala do Lula (presidente eleito em 30/10/2022) na COP 27: “O Brasil está de volta”, eu não considero que esta frase se limita apenas à projeção internacional do Brasil no tema do meio ambiente. Existe uma agenda internacional de enfrentamento ao racismo e o Brasil estará de volta a essa agenda, qualquer que seja o ministro ou a ministra da Igualdade Racial. O Brasil vai estar sentado novamente nessa mesa. O Brasil que perdeu o protagonismo, ao longo dos últimos anos,  vai voltar ao debate, vai voltar a incidir nessa área e o Fundo Baobá vai estar inserido dentro desse cenário sim. 

Amalia FischerO Baobá foi criado pelo movimento negro. Então, quem mais sabe das necessidades e sobre abrir oportunidades para a população negra senão o movimento negro? Ter ativistas, pensadores,  filósofos, sociólogos, sociólogas e filósofas  dentro da governança e dos conselhos dá ao Baobá legitimidade para fazer o que está fazendo. Talvez o Baobá não seja a organização que lá no território “X”  esteja transformando a vida das pessoas, mas está impulsionando, fortalecendo essa organização para que ela continue a sua atuação pela equidade racial. 

A existência do Baobá depende das organizações que ele apoia. E essas organizações também dependem do Baobá. Quando falo em dependência não é no contexto negativo, estou falando de apoio mútuo. O fato de o Baobá ser um meio para que as organizações se desenvolvam e possam ter sustentabilidade de todo tipo é uma inter relação saudável para ambos os lados. Mutuamente aprendem e a cada dia é colocado um grão de areia para que o racismo estrutural e o racismo institucional sejam desconstruídos.  

A captação de recursos é o grande gargalo do Baobá?

Giovanni HarveyEu quero detalhar isso um pouco mais. A captação em si não é um problema. A captação para o endowment, dada a falta de cultura de doação para um fundo patrimonial de uma organização negra,  é o problema. Então, captar para realizar projetos não é. O grande desafio que o Fundo Baobá está enfrentando é diminuir a captação carimbada para projeto e migrar para uma captação de confiança, como é o caso da Mackenzie Scott (filantropa norte-americana que em agosto doou US$ 5 milhões para o Fundo Baobá).  É uma doação de confiança. Eu dou o dinheiro e você decide o que vai fazer com ele.  Então, eu diria que é um gargalo,  mas o gargalo está na destinação do montante captado e não necessariamente no ato de captar em si. E o nosso desafio é aumentar a qualidade da nossa relação com o financiador  e o grau de confiança nessa relação, já que o Baobá é a instituição especializada – é um fundo especializado no enfrentamento ao racismo. 

Amalia Fischer – Uma coisa é o começo de qualquer fundo que seja por uma causa. Principalmente uma causa polêmica na sociedade. Porque a sociedade brasileira nega o racismo. Nega que exista desigualdade. Nega que exista opressão às mulheres. Então, cada fundo que é lançado e defende uma causa tem que movimentar recursos e a mobilização de recursos vai além da captação. A mobilização de recursos também tem a ver com a transformação mental das pessoas, com o coração das pessoas, com a paixão das pessoas. Se a pessoa acha que dando esmola na rua ela está fazendo uma transformação, ela nunca vai pensar que doando para uma organização será muito melhor. Porque o menino ou a menina que está na rua pedindo esmola poderia ter outras oportunidades a partir da atuação das organizações da sociedade civil, porque essas organizações da sociedade civil respondem a causas, a movimentos e, se você não as apoia materialmente, você está capenga na democracia. A pessoa não está enxergando que cada vez é mais saudável para a sociedade que ela se envolva. Isso não tira do Estado a sua obrigação. Mas o que se tem que ter bem nítido quando se constitui um fundo é que vai ser difícil. Muito difícil. Sobretudo no campo das causas.     

Saúde, Educação, Empreendedorismo, Recuperação Econômica, Auxílio a Populações em Situação de Vulnerabilidade. Que outros terrenos da ação social o Fundo Baobá ainda precisa semear? 

Giovanni Harvey O Baobá sempre busca a inovação nas suas áreas de atuação.  Tem que refletir sobre quais são as fronteiras da inovação em termos de posicionamento de pessoas negras na sociedade. Nós estamos olhando para as carreiras de liderança. Então, acho que inovação é um caminho, melhoria da performance na gestão. A gente precisa conseguir criar soluções de Comunicação mais amplas, e indicadores.  Então a resposta é olhar para nós mesmos, assim como olhamos para os nossos grantees e inovar.

Amalia FischerA partir dos achados da área programática, a partir dos relatórios das organizações é que podemos saber o que está acontecendo e o que está necessitando a população negra.O Baobá tem investido nisso. Porque se não tivermos uma escuta atenta podemos ter ideias mirabolantes e as pessoas podem não estar precisando de ideias mirabolantes. 

O Baobá acaba de completar 11 anos. Qual a sua projeção para os próximos 5 ou 10 anos de atuação? 

Giovanni HarveyNós estamos comprometidos, estamos trabalhando para nos fortalecer e  alcançar a meta de R$ 250 milhões de  endowment  até 2026. É a nossa meta. 

Amalia Fischer Acho que o Baobá vai viver 50 anos ou mais. Eu espero que não seja mais que isso, porque temos que acabar com o racismo. Acho que o Baobá hoje não é só uma referência, mas uma liderança importante na questão da equidade racial no Brasil. Uma entidade importante que deve ser ouvida e respeitada. Uma liderança. Pessoas  brancas que queiram se engajar profundamente contra o racismo têm que ouvir o Baobá. 

Baobá na imprensa em Outubro

imprensa

Por Ingrid Ferreira

Em outubro o Fundo Baobá para Equidade Racial teve diferentes oportunidades midiáticas. A CNN citou a matéria “Conquistas históricas para pretos, pardos e indígenas”, em que o Diretor Executivo, Giovanni Harvey, comentou o resultado das eleições de 2022, desde a perspectiva da representatividade da população negra. 

Giovanni Harvey também foi mencionado como um dos participantes da 1ª Conferência Empresarial ESG Racial, promovida pelo Pacto Pela Equidade Racial. E em publicação do site Tabôa  sobre o Seminário de 10 anos da Rede de Filantropia para a Justiça Social e, mais especificamente, a mesa “Trajetória e papel da Rede no ecossistema filantrópico nacional e internacional”, que contou com a participação do Diretor.

O membro da Assembléia Geral e ex presidente do Conselho Deliberativo do Fundo Baobá, Hélio Santos, autor de uma coletânea de artigos de autores negros que mapeiam as raízes da desigualdade, foi citado pelos jornais Estado de Minas, Folha e Nexo Jornal.

O Jornal da USP comentou a homenagem realizada a Presidente do Conselho Deliberativo do Baobá, Sueli Carneiro, na publicação “Outubro Negro inicia discussões para “enegrecer” o conhecimento produzido na USP”.

O encontro virtual com associações quilombolas e indígenas, organizado pela Aliança Entre Fundos e que apresentou estratégias de comunicação e ferramentas de aperfeiçoamento para as redes sociais e rotinas de notícias das comunidades, foi notícia nos sites Notícia Preta e Portal Afro. A Aliança entre Fundos é uma iniciativa de filantropia colaborativa para promover justiça racial, ambiental e social, composta pelo Fundo Baobá para Equidade Racial, Fundo Casa SocioAmbiental e Fundo Brasil de Direitos Humanos. 

Apoiadas do Fundo Baobá:

No Instagram o Quilombo Santo, participante do edital Quilombolas em Defesa: Vida, Direito e Justiça fez uma sequência de postagens a respeito do andamento do seu projeto, confira a seguir: “Aprovação do Projeto”, “Encontro para apresentação do projeto”, “Reunião para organizações previstas no projeto” e “Reunião para definição de cronograma de atividades e contratação de serviços”.

O Diário de Pernambuco mencionou o Fundo como apoiador do projeto “Racismo Religioso: Respeita Minha Fé!”, coordenado pela Tenda de Umbanda Caboclo Flecheiro D’Ararobá, no edital Vidas Negras — Dignidade e Justiça, que apresenta resultados de mapeamento sobre racismo religioso em Pernambuco.

E o site Criola citou o Baobá em sua publicação “Lançamento – Racismo, Violência e Estado: Três faces, uma única estrutura de dominação articulada”, que contou com o financiamento do Fundo Baobá para Equidade Racial.

Mudanças e Percepções 3 anos após seleção em edital 

Por Ingrid Ferreira

O Programa de Aceleração do Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco foi lançado em 2019. A implementação dos planos de desenvolvimento individual se deu de 2020 a 2021. Muitas mudanças e conquistas foram vividas desde então e, para saber mais sobre a atualidade de algumas das mulheres negras apoiadas, conversamos com Karen Franquini do projeto “Ganbatte”, que é Gerente de Projetos, Mentora de Carreira, Consultora de Empreendedorismo Periférico, Mestre em Gestão da Inovação e Empreendedorismo, Impacto Social e focada em Diversidade, Equidade e Inclusão; Luciane Reis,  do projeto  “Mercafro”, que é Especialista em Diversidade e Inclusão; e Laiara Amorim Borges, do projeto “Voe como uma garota negra”, que é Headhunter social, Comissária de Bordo na Azul Linhas Aéreas Brasileiras e co-fundadora do coletivo Quilombo Aéreo.
Confira abaixo a entrevista:

Três anos após terem sido selecionadas pelo edital do Fundo Baobá, como você descreve os seus avanços?

Karen Franquini

O Programa de Aceleração do Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco proporcionou o desenvolvimento acelerado de habilidades para minha atuação como Empreendedora, Mentora de Carreira, Gerente de Projetos e Liderança Negra, potencializando os meus talentos e força de trabalho para ajudar outros profissionais a atingirem seus objetivos, gerar impacto positivo na vida das pessoas e contribuir com a mudança de realidades. Como resultado do apoio do projeto, identifiquei novas áreas de atuação, como Mentora de Carreira e Gerente de Projetos, visando ampliar a empregabilidade de mulheres e profissionais negras (os), além disso, fui aprovada no Mestrado. Nos meus avanços atuais, me tornei Mestre em Desenvolvimento Local pela UNISUAM (Centro Universitário Augusto Motta) – RJ, na linha de pesquisa em Gestão da Inovação e Empreendedorismo, com o tema da dissertação  “Desenvolvimento de Negócios de Impacto: Ferramentas e Boas Práticas para Empreendedores Sociais”. Agora eu tenho o objetivo de aprofundar o estudo sobre o ecossistema de negócios de impacto e iniciar o Doutorado em Desenvolvimento Local. A participação no Programa gerou uma mudança de mentalidade, me proporcionou uma descoberta e a valorização da minha visão e potencialidade como mulher e liderança negra, e a minha capacidade de produção intelectual e de planejamento e execução de iniciativas de impacto social.

Karen Franquini – Rio de Janeiro

Luciane Reis

Considero que o principal avanço foi a defesa da minha dissertação no fim do ano passado. Após a defesa, iniciei o processo de operacionalizar o que foi teorizado durante o Programa, que consiste na  elaboração do plano detalhado de identificação e triagem dos estudos existentes sobre o negro na área econômica e de desenvolvimento pessoal. Para isso fiz o mapeamento de uma série de  especialistas junto aos vários campos do ecossistema empreendedor e empresarial que pauta o problema do negro nesses setores, e o mapeamento de monografias sobre temas econômicos, financeiros, de autoconhecimento e desenvolvimento publicados ou ligados à problemática negra. 

Luciane Reis – Bahia

Laiara Amorim Borges

Estamos no terceiro ano, e por mais que o Programa tenha se iniciado de forma individual, ele se desmembrou de diversas formas, e eu pude atuar em diversas frentes por conta desse edital. Uma delas é o coletivo que hoje faço parte,  que é a Primeira Escola Antirracista da Aviação Civil Brasileira. Em 2022, nós conseguimos formar uma turma exclusiva de pessoas negras periféricas e dentre essas pessoas temos quilombolas, empregadas domésticas e mulheres trans. No mesmo ano, já conseguimos empregar 50% delas dentro da área de formação. Ainda que seja um trabalho árduo, é muito gratificante. Por ser uma frente muito nova, temos encontrado muitos desafios, principalmente com as empresas, para haver aceitação e inclusão. Infelizmente, muitas vezes as empresas só querem fazer atividades pontuais com pessoas negras em novembro (Mês da Consciência Negra). Mas estou no 3º ano e celebro a nossa jornada por tudo que conquistamos até aqui, mas ainda não alcançamos a nossa meta.

Laiara Amorim Borges – Minas Gerais

Com a pandemia, alguns planos de desenvolvimento tiveram que ser reformulados. No momento atual, tem algum ponto que você resgatou?

Karen Franquini

O meu Plano foi reformulado devido à pandemia e pela primeira vez na vida tive recursos para investir no meu desenvolvimento pessoal. Consegui visualizar a minha trajetória profissional, independentemente da Ganbatte, negócio de impacto social que fundei e tem como objetivo conectar as empresas a profissionais diversos. Agora me sinto protagonista da minha história, consigo reconhecer minha evolução e potencial para gerar transformações sociais significativas na vida de profissionais periféricos.

Luciane Reis

Sim. Estou organizando a plataforma,  fruto do investimento feito pelo Programa, para ser lançada até o meio do ano que vem. Defender a dissertação foi um momento bastante complicado e, por conta disso, acabei demorando um pouco para conseguir seguir em frente. Somente agora estou retomando. O site ainda continua sendo um projeto. Estou também organizando o primeiro livro das lideranças aceleradas pelo projeto e que tem uma coluna no site do Géledes denominada “Negras que Movem”. 

Laiara Amorim Borges

A pandemia foi o maior desafio a ser enfrentado por todas as lideranças do Programa,  porque houve o aumento do desemprego junto ao isolamento, e nós tivemos que reformular tudo o que estava planejado. Um exemplo disso é que quando começou o edital, um dos meus objetivos era a minha aceleração enquanto mulher pilota na aviação, pois hoje não há nenhuma mulher ocupando esse cargo. Mas quando começou a pandemia, todos os aeroclubes fecharam e eu me deparei com outras questões sociais e psicossociais que atrapalharam muito a minha formação, tanto que eu ainda não concluí. Eu já sabia que não finalizaria no prazo do edital, mas o recurso era para custear parte da minha formação. Eu retomei as minhas horas de voo, mas, por conta da inflação, tudo foi afetado. Ainda assim continuo focada no meu objetivo, ainda que caminhando mais devagar por conta das circunstâncias, e isso faz com que eu compreenda também a importância de ser apoiada por outras mulheres pretas, o poder da militância e as políticas afirmativas, além de que, durante o edital, nós tivemos muitas sessões de mentoria, encontros sensacionais, que é tudo que estou utilizando hoje, e esse caminho tem me mostrado a importância de todo esse processo.

Ao final da primeira edição do Programa, publicamos um e-book, podcast, para contar sobre os esforços e os resultados do Programa, de cada mulher e das organizações de mulheres. Estes materiais tiveram alguma repercussão na sua trajetória?

Karen Franquini

A principal repercussão da publicação do e-book do edital e do podcast foi a valorização da minha trajetória e atuação como empreendedora e liderança negra, e o compartilhamento dos aprendizados para fortalecer a trajetória de outras mulheres e lideranças negras.

Laiara Amorim Borges

O e-book foi muito importante para que eu pudesse mensurar tudo o que tinha acontecido, algo que eu não tinha feito antes. Tanto que teve um momento da entrevista que eu acabei me emocionando, porque nós enquanto mulheres negras sempre estamos nos cobrando muito e não percebemos tudo que fazemos. E precisamos valorizar as nossas pequenas vitórias ao longo da caminhada, e eu espero que ele (E-book) tenha alcançado outras pessoas que possam se inspirar nele e acreditar que ocupar qualquer espaço é possível.

Analisando o seu processo atual, todas as suas metas foram concluídas? Quais são os próximos desafios?

Karen Franquini

Ainda não realizei todos os meus objetivos profissionais, mas aprendi a celebrar e agradecer por cada conquista e principalmente por cada desafio. Aprendi a respeitar e aplicar toda a minha potencialidade, resiliência e determinação para conquistar o que desejo e lutar pelo que acredito. Os meus próximos objetivos profissionais são iniciar o Doutorado Profissional em Desenvolvimento Local na UNISUAM, com o tema da tese de “Diversidade em Programas de Empreendedorismo Social: Mecanismos e Boas Práticas para Inclusão de Empreendedores de Grupos Minorizados”; fortalecimento da minha marca pessoal e da atuação como Líder, Empreendedora Social, Mentora de Carreira e Gerente de Projetos; reposicionamento da Ganbatte e foco em apoiar profissionais periféricos no desenvolvimento de suas carreiras.

Luciane Reis

Nem todas, mas estou agora revisitando meu plano de desenvolvimento individual para ver o que consigo operacionalizar. Durante o processo eu consegui profissionalizar o material existente do Mercafro. O site está pronto e foi defendido enquanto uma tecnologia social na Faculdade de Administração da UFBA (Universidade Federal da Bahia). O repertório/discurso que ele quer pautar foi também defendido em formato de especialização na Faculdade de Educação da UFBA. Defender essa tecnologia e seu repertório junto a duas escolas importantes para legitimação acadêmica foi fundamental para o processo que desejo iniciar a partir de agora.  O próximo passo é transformar a dissertação em um livro.  lançar a plataforma e seu conteúdo a partir do passo a passo sinalizado no primeiro ponto.

Laiara Amorim Borges

Nem todas as metas foram alcançadas, mas por conta da pandemia. Houve metas que foram se apresentando ao longo do processo e eu consegui concluir, ainda que algumas parcialmente: a questão da empregabilidade, principalmente. Com relação ao objetivo principal, essa meta ainda está em vias de ser alcançada, por meio da elaboração de artigos sobre o assunto, pois antes do “Voe como uma garota negra” não existiam artigos dessa área, inclusive a publicação internacional de um capítulo de um livro que fala da situação atual no Brasil das mulheres dentro desse campo tecnológico da aviação. Outra meta que foi concluída também foi o site do projeto. Neste espaço virtual é possível encontrar informações do projeto, editais, abertura de próximas turmas, impactos sociais e parcerias. A única meta que ainda não foi concluída foi a da minha formação pessoal, mas desmembrou pra tantas coisas que eu já me sinto realizada.

Karen Franquini complementa falando que: “O principal aprendizado que gostaria de compartilhar é: Seja gentil com você mesma, não se cobre tanto, respeite seu processo e valorize cada conquista. O grande segredo para atingir objetivos é fazer pequenas ações com frequência, respeitando seus limites e cada dia dando um novo passo. É começar com os recursos que tem, com as habilidades que possui para se desenvolver. Celebrar e valorizar cada passo e conquista que te aproxima do seu objetivo”.

O Programa de Aceleração do Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco é uma iniciativa do Fundo Baobá, com o apoio da Kellogg Foundation,  Ford Foundation, Instituto Ibirapitanga e Open Society Foundations. O Programa, que teve início em 2019,  busca ampliar e consolidar a participação de mulheres negras em posições de poder e influência, através de investimento em seus planos de desenvolvimento individual, formações políticas e técnicas e ainda no fortalecimento das organizações, grupos e coletivos liderados por elas.