Organizações participantes do Vidas Negras: Dignidade e Justiça não se detêm diante de perseguições e desafios

O CEAP, do Rio de Janeiro, e a Associação do Jongo Dito Ribeiro, de Campinas, enfrentam a perseguição religiosa, mas não desistem de seus objetivos de justiça

Por Wagner Prado

Em 2019, levantamento feito pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Especializada) apontou que 222 mil pessoas moravam pelas ruas do Brasil. Em 2021, a população carcerária no Brasil era de 682 mil pessoas, incluindo aí presos provisórios. Ou seja, pessoas presas e não julgadas. Os casos de intolerância religiosa registrados entre janeiro e junho de 2019 pelo disque 100 do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos foi de 354. Dentro desses, as religiões de matriz africana foram as mais atacadas. A insegurança alimentar aumentou de forma mais que significativa no Brasil. A pandemia da Covid-19 agravou esse quadro, mas o processo de crescimento da pobreza alimentar é anterior à pandemia. 

O quadro descrito acima mostra uma sociedade em declínio em vários aspectos sociais. Saúde, Educação e Trabalho que, juntos compõem o tripé da sustentação em qualquer sociedade,  nem foram explorados mas o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), em fevereiro de 2022, divulgou que a taxa de desemprego era de 8,8%  atingindo 12 milhões de pessoas. 

Existe urgência no sentido de fazer com que a igualdade seja alcançada de fato e de direito  e provoque um equilíbrio social entre os detentores do poderio econômico e aqueles que não têm acesso aos benefícios que o dinheiro pode trazer. Há muito se fala em uma distribuição de renda mais equânime e sobre o potencial impacto no exercício dos direitos. Mas o jogo político nunca permite que isso aconteça. 

A sociedade civil vem se movimentando  no sentido de provocar o equilíbrio social. Algo que possa gerar uma melhor distribuição de renda, além de um sem número de melhores oportunidades para todos, nos mais diferentes segmentos, orientadas pelos princípios da justiça. Uma movimentação no sentido de fazer com que o fosso de desigualdade  existente entre ricos e pobres não aumente ainda mais. o que tem contribuído para o crescimento de injustiças nos mais diferentes setores. 

Um dos editais do Fundo Baobá para Equidade Racial, o Vidas Negras: Dignidade e Justiça  foi lançado em maio de 2021 em parceria com o Google.org,  destinou R$ 100 mil para 12 organizações, além de investimentos indiretos de treinamento e assessorias técnicas para o fortalecimento institucional. Os projetos inscritos tiveram que versar sobre um desses quatro temas:   a) Enfrentamento à violência racial sistêmica; b) Proteção comunitária e promoção da equidade racial; c) Enfrentamento ao encarceramento em massa entre adultos e jovens negros e redução da idade penal para adolescentes; d) Reparação para vítimas e sobreviventes de injustiças criminais com viés racial. 

A Associação do Jongo Dito Ribeiro, de Campinas, inscreveu o projeto que leva o mesmo nome da Associação, dentro do eixo da “Proteção Comunitária e Promoção da Equidade Racial. Já o CEAP (Centro de Articulação de Populações Marginalizadas), do Rio de Janeiro, trabalha o eixo “Reparação para vítimas e sobreviventes de injustiças criminais com viés racial”.  O CEAP inscreveu o projeto Observatório da Liberdade Religiosa. 

Líder da Associação do Jongo do Dito Ribeiro,  Alessandra Ribeiro Martins, exalta a luta que eles têm enfrentado no caminho da construção de uma rede comunitária para enfrentamento da discriminação racial, de gênero, religiosa e sexual. A união em torno de objetivos comuns, segundo ela, é que trará força às diferentes comunidades. “Nós vimos a necessidade de consolidar uma rede de segurança, proteção, visibilidade e engajamento coletivo em pautas comuns, de forma que possibilite a proteção de nossos territórios, a proteção dessas lideranças e um combate efetivo frente às discriminações, intolerâncias e perseguições. E para isso é necessário pautas comuns e ações que sejam no âmbito das redes sociais, seja no âmbito das intervenções territoriais comuns. Uma pauta comum”, disse. 

Alessandra Martins – Associação Jongo Dito Ribeiro

Para Marcelo Santos, do CEAP, a questão da preservação da cultura negra dentro do ambiente escolar é uma das pautas comuns citadas por Alessandra Ribeiro Martins.  A aceitação por parte dos estudantes negros, negras e negres é boa. O mesmo não se nota entre os alunos não negros. “São percepções que variam de acordo com os territórios  e níveis de maturidade dos alunos, negros e não negros. Para os alunos negros, em geral, a recepção é boa e quase sempre conecta a atenção ao conteúdo. Mas para os alunos não negros a recepção, em geral, é vista como algo supérfluo  em um primeiro momento, mas quando provocados com a metodologia aplicada aos valores civilizatórios africanos e afrobrasileiros, conseguimos incentivar reflexão crítica sobre o racismo estrutural que vivemos”,  afirma.

Marcelo Santos – CEAP

As duas organizações realizam um forte trabalho em defesa das religiões de matriz africana, que sofrem grande perseguição, mesmo no Rio de Janeiro, onde a presença negra é muito forte. “O CEAP defende a liberdade de crença e culto, garantidos na Constituição Federal, mas ainda há sim muita resistência, fundamentada no preconceito racial e influenciada pelo conservadorismo de algumas lideranças religiosas neopentecostais”, revela Marcelo. “Nós sofremos aqui, diretamente em nossa comunidade, um ataque. Porque a nossa casa de cultura é uma casa de cultura de matriz africana que,  para além da manutenção e salvaguarda do Jongo,  temos um terreiro de umbanda,  temos um espaço de exposição da memória do Jongo, falando das diversas comunidades,  e a gente sabe que a gente demarca essa cultura de matriz africana, essa afrodescendência, e sabemos que isso traz uma exposição. Então,  a gente construiu ao longo do nosso trabalho uma rede que já trava a luta frente às discriminações no âmbito da cultura”, afirma Alessandra. 

O ano eleitoral de 2022 e a polarização política têm açodado disputas.  “A polarização política evidenciou o racismo e, consequentemente, a intolerância religiosa. Não sei se o fato incentivou ainda mais o CEAP, mas certamente fez com que pudéssemos adaptar as formas e ações pedagógicas dos nossos projetos”, disse Marcelo Santos. 

Alessandra Ribeiro Martins, da Associação Jongo Dito Ribeiro, destaca que a cidade de Campinas tem o racismo bem evidenciado. “O racismo em Campinas, para além de físico – a gente não vê preto no centro da cidade, parece que não tem preto aqui -, e aí,  quando você vai para as regiões mais periféricas,  você vê uma grande aglutinação. Ele (o racismo)  também tem a ver com território. Existe um lado da cidade que sempre recebeu investimentos, que sempre foi desenvolvido, que sempre teve bons equipamentos, acesso, mobilidade e um outro lado que ficou esquecido. Então, temos tentado junto com outros atores, como assistência social, como a saúde e a própria Secretaria da Educação, levar cultura, mesmo que pontual, nesses territórios. A gente sabe que não daremos conta de unir a cidade em um projeto antirracista, mas a gente sabe que vai dar conta de semear o antirracismo em vários lugares. E é nesse sentido que a gente tem atuado”, afirmou. 

Ambos finalizam falando da importância de estarem parte do grupo contemplado pelo edital Vidas Negras: Dignidade e Justiça. “Ser acolhido por uma instituição como o Baobá, que mais do que compartilhar um recurso ela nos forma concretamente. Cada relatório que eles mandam a gente revisar, cada pergunta que eles refazem nos ajuda a compreender qual é a lógica desse universo e nos deixa mais fortes também para esse novo momento”, conclui Alessandra Ribeiro Martins. “A importância da nossa seleção se dá na oportunidade de profissionalizarmos alguns serviços de apoio para garantir melhores resultados”, afirma Marcelo Santos.

A costura da sobrevivência

Como comunidades quilombolas estão se movimentando para manter a sua existência por intermédio da manutenção de sua cultura e da sua agricultura

Por Wagner Prado

A cidade de Cristália, em Minas Gerais, e a localidade de Jacarequara, no Pará, estão distantes uma da outra em 2.318 km. Cristália tem 5.760 habitantes, de acordo com o Censo realizado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) de 2010. Por estimativa, não teria chegado a 6.000 pessoas nos últimos 12 anos. Jacarequara, no município de Santa Luzia do Pará, tem  55 famílias em 2022.  Poucas semelhanças. Mas uma delas aproxima muito as duas localidades: a presença de comunidades quilombolas.

O Brasil tem cerca de 6 mil comunidades quilombolas, conforme dados da Conaq (Coordenação Nacional de Articulação de Comunidades Negras Rurais Quilombolas) e do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Mais de 70% delas estão concentradas em quatro estados brasileiros: Maranhão, Minas Gerais, Bahia e Pará. A agricultura e a pecuária são a principal atividade econômica nos quilombos. Além disso, os quilombolas procuram preservar sua cultura por intermédio da oralidade ancestral, ou seja: ouvir os antepassados, aprender com o legado deixado por eles, cultuá-los e disseminar o conhecimento por eles passado. 

Em outubro de 2021, o Fundo Baobá para Equidade Racial lançou, em parceria com a Conaq e tendo apoio da IAF (Inter-american Foundation), o edital Quilombolas em Defesa: Vidas, Direitos e Justiça com o objetivo de apoiar iniciativas de organizações quilombolas na recuperação e sustentabilidade econômica, promoção da soberania e segurança alimentar e defesa dos direitos.   

O edital faz parte das ações da Aliança entre Fundos por Justiça Racial, Social e Ambiental, que reúne o Fundo Baobá, o Fundo Brasil de Direitos Humanos e o Fundo Casa Socioambiental. O Quilombolas em Defesa: Vidas,  Direito e Justiça selecionou 35 organizações para serem apoiadas com R$ 30 mil cada para a realização de atividades e investimentos indiretos por meio de treinamentos, encontros e  assessorias técnicas para o fortalecimento institucional . 

O estado de Minas Gerais, por exemplo, teve cinco projetos selecionados. Um deles, o da Associação da Comunidade Quilombola do Paiol. Os trabalhos ainda estão sendo iniciados, embora o pessoal do Paiol já esteja na estrada de realizações há mais de 10 anos. A ação que será implantada pelas mulheres quilombolas do Paiol é a Costura, atividade que está ligada à história humana desde a era Paleolítica ou era da Pedra Lascada. Isso é muito mais que muito tempo. 

Estabelecer as oficinas de costura vai redundar em movimentação intensa na comunidade. De primeira, terão que ser comprados máquinas de costura, tecidos, agulhas, cadeiras e mesas, entre outros. Os cursos de capacitação em corte e costura serão dados pelas anciãs da comunidade (oralidade ancestral). A elaboração da trajetória produtiva das quilombolas está toda estruturada visando orientação sobre finanças e empreendedorismo para que as costureiras possam ser as gestoras de seus próprios negócios. 

No Pará

O estado do Pará teve um projeto selecionado, o da Associação Quilombola Vida para Sempre Jacarequara, do município de Santa Luzia do Pará. Em mais de 10 anos de existência, a Vida para Sempre vem se dedicando à defesa do patrimônio físico, social e cultural dos quilombolas, em busca da valorização das expressões ancestrais da cultura afro-brasileira e a promoção do uso sustentável e preservação dos recursos naturais, estimulando atividades de manejo e cultivo de práticas agrícolas. 

O projeto inscrito pela Associação Quilombola Vida para Sempre Jacarequara está ligado ao Eixo 2 do edital Quilombolas em Defesa: Vidas, Direitos e Justiça, que versava sobre Promoção da Soberania e Segurança Alimentar nas Comunidades Quilombolas. Ele foi batizado de “Flor da Pedra: práticas agroecológicas e fortalecimento sociocultural”. 

Com a implantação do projeto, que está sendo iniciado e passa a ganhar corpo, a Vida para Sempre pretende implantar tecnologias de sistemas agroflorestais para garantir que a produção agrícola permaneça como fonte de renda para a manutenção econômica e segurança alimentar. 

A forma como isso será alcançado, como bem acontece entre quilombolas, será iniciada pela conversa. Rodas de conversa e cursos formativos relacionados a práticas agrícolas; curso prático sobre plantio; curso sobre identificação e produção de canteiro de mudas de espécies madeireiras e frutíferas; formação de mutirões para a construção de viveiros de mudas, além de capacitação para identificação de áreas que tenham potencial para plantio. 

O Fundo Baobá para Equidade Racial foi buscar as palavras de Anne Karine Pereira Quaresma, líder da Associação da Comunidade Quilombola do Paiol, em Crisália (MG) e de Manoel Venil Barros Nogueira, da Associação Quilombola Vida para Sempre Jacarequara, em Santa Luzia do Pará, para saber como tem sido esse planejamento depois de terem sido selecionados e como isso tem impactado suas comunidades. 

Anne Karine Pereira Quaresma – Associação Quilombola do Paiol
Manoel Barros Nogueira – Associação Vida Para Sempre Jacarequara

Entre os  objetivos de vocês está o desenvolvimento de ações de resgate cultural. Que ações, especificamente, são essas? 

Anne Karine Pereira Quaresma (Comunidade Quilombola do Paiol) – Produção de peças de vestuário que remetam à cultura Quilombola, contendo, por exemplo,  símbolos e frases sobre resistência e resiliência. Promover também momentos de troca de experiência em volta de fogueiras, para que as mulheres engajadas no projeto compartilhem a vivência no processo de corte e costura artesanal. 

A partir do termo “resgate” é possível deduzir que a cultura quilombola está sendo esquecida?

Anne Karine Pereira Quaresma (Comunidade Quilombola do Paiol) – Infelizmente, sim. Muito da nossa cultura tem se perdido com o tempo. 

Vocês falam em “Valorização da identidade dos sujeitos quilombolas”. Essa identidade tem sido desvalorizada de que forma? 

Anne Karine Pereira Quaresma (Comunidade Quilombola do Paiol) – Por um tempo, nós quilombolas da comunidade Paiol fomos vítimas de muito preconceito no município por sermos quilombolas. Por isso,  temos destacado sempre a importância em valorizar nossa identidade. 

O desenvolvimento econômico sustentável vocês vão realizar por intermédio de um programa voltado ao exercício do Corte e Costura.  Quantas pessoas vão trabalhar com isso? Serão apenas mulheres ou homens também estão incluídos? Qual o maquinário e em que quantidade vocês terão que conseguir? 

Anne Karine Pereira Quaresma (Comunidade Quilombola do Paiol) – Nosso projeto foi pensado apenas para mulheres Quilombolas da nossa comunidade. A princípio com a quantidade de 15 mulheres. Para tanto vamos precisar da compra de todo o material necessário para a costura. Como máquina de costura, tecidos, agulhas, tesouras, dentre outros. 

A produção do trabalho de Corte e Costura será comercializada apenas dentro da comunidade ou vocês vão buscar o público externo também?

Anne Karine Pereira Quaresma (Comunidade Quilombola do Paiol) – Vamos buscar um público externo também. Por isso,  parte do recurso será disponibilizado para o marketing e publicações acerca do processo de corte e costura. Para alcançarmos um público maior. 

O aprendizado que vocês estão recebendo dentro da jornada de conhecimento será utilizado como? Já é possível ter uma ideia? 

Anne Karine Pereira Quaresma (Comunidade Quilombola do Paiol) – Todo o aprendizado será utilizado para potencializar as vendas dos produtos. 

Qual a importância de vocês terem sido escolhidos para ser beneficiados pelo edital Quilombolas em Defesa, do Fundo Baobá para Equidade Racial?  

Anne Karine Pereira Quaresma (Comunidade Quilombola do Paiol) – Ter sido escolhido pelo edital foi uma conquista incrível. Este é nosso primeiro projeto aprovado. Sentimos que enquanto Associação estamos no caminho certo na defesa dos direitos do nosso povo e também na busca por melhores condições de vida dos quilombolas a partir do trabalho e da geração de renda.

Há algo que vc gostaria de falar e que não tenha sido perguntado aqui? Se sim, fique à vontade. 

Anne Karine Pereira Quaresma (Comunidade Quilombola do Paiol) – Gostaria apenas de expressar nossa felicidade em poder contar com o apoio de toda a equipe do Baobá. 

A preservação de recursos naturais por meio do manejo e cultivo de práticas agrícolas, florestais, artesanais. Isso está dentro dos conceitos mais modernos sobre preservação ecológica. Por que a natureza é tão importante para os quilombolas? 

Manoel Venil Barros Nogueira (Vida para Sempre): A nossa territorialidade, isto é, a identidade que temos como comunidade quilombola, envolve a relação existente entre nós e com a natureza presente no território da comunidade. Assim, a natureza está envolvida em todo nosso cotidiano e nosso modo de vida, a nossa cultura envolve a natureza. Desse modo, a natureza é essencial para o nosso modo de vida quilombola.

Quando vocês falam em “implantação de tecnologia de sistemas agroflorestais, unindo uma alternativa de fonte rentável para subsistência econômica e segurança alimentar da comunidade”. Em termos práticos, que tecnologia é essa? Qual é alternativa de fonte rentável? 

Manoel Venil Barros Nogueira (Vida para Sempre) –  A Sistema Agroflorestal é uma tecnologia social com grande potencial em aliar conservação ambiental com subsistência e fonte renda para agricultores familiares. É um tecnologia inovadora frente ao modo de produção hegemônico convencional, a exemplo do monocultivo. Esta tecnologia refere-se à transferência de conhecimento e técnicas de cultivos sustentáveis e de base agroecológica, que dialogam com os saberes tradicionais dos agricultores familiares. Esta tecnologia se constitui em um projeto de vida, buscando gerar produção e renda agrícola a partir de cultivos de curto, médio e longo prazos de forma integradas.

O projeto de vocês procura dar mais modernidade aos seus sistemas de produção. É isso? A comunidade está preparada para isso?:  

Manoel Venil Barros Nogueira (Vida para Sempre) – Será um processo de aprendizagem e formação contínua, e no decorrer do desenvolvimento do projeto, os participantes terão oportunidades de unir experiencias anteriores, que tiveram por articulação com o movimento negro estadual e cooperativa de agricultores  do município, com a possibilidade de implementação prática dessa tecnologia social.

O acesso a elementos que fazem parte da chamada vida moderna, como o acesso às mídias digitais, é fundamental hoje para a sobrevivência quilombola?

Manoel Venil Barros Nogueira (Vida para Sempre) –  Sim, as mídias digitais é de fundamental importância, por ser um dos meios que utilizamos em prol de mantermos a comunicação ativa e também de nos oferecer a oportunidade de  participarmos de articulação com outras entidades e movimentos e, também, conseguir financiamentos, como foi o caso deste Edital.

Vocês já conseguiram identificar que tipos de estratégias serão usadas para fortalecer os produtos que são produzidos por vocês. 

Manoel Venil Barros Nogueira (Vida para Sempre) – Esperamos que, com esse projeto, tenhamos a possibilidade que construir estratégias de fortalecimento de nossa produção.

Quão importante é para vocês terem sido beneficiados pelo programa Quilombolas em Defesa, do Fundo Baobá para Equidade Racial? 

Manoel Venil Barros Nogueira (Vida para Sempre) – É de suma importância para o momento atual, pois estamos em processo de fortalecimento de nossa Associação. Assim, o edital possibilita construir estratégias que poderão tornar-se  fonte de renda na  produção agrícola. Mas também no fortalecimento da identidade da comunidade com a importância da Associação como organização coletiva e que luta pela melhoria da comunidade.

Existe algo que não foi perguntado e você gostaria de falar? Se sim, fique à vontade.

Manoel Venil Barros Nogueira (Vida para Sempre) – Uma entidade que fortalece a nossa identidade negra e quilombola possui suma importância para nós. Esperamos que esta parceria com o Fundo Baobá possa render grandes frutos para nossa comunidade.

Tour por São Paulo conecta estudantes do Programa Já É à história negra da cidade

Alunes do Já É participaram de ação que conta a história e contribuição negra na cidade de São Paulo

Por Ingrid Ferreira

O Programa Já É, uma iniciativa do Fundo Baobá para Equidade Racial, está em seu segundo ano de execução e,  no dia 19 de março, um grupo de estudantes participou de uma ação de reconhecimento da história e presença negra em pontos da cidade de São Paulo, aos quais visitou.

A atividade fez parte do encerramento do ano um do Programa. Em sua primeira edição o Já É, contou com o apoio da Citi Foundation,  Demarest Advogados e Amadi Technology; em que o programa foi dirigido a jovens de 17 a 25 anos que já tivessem concluído ou estivessem cursando o 3º ano do ensino médio em escolas públicas e que residissem no município de São Paulo e região metropolitana.

O responsável por guiar o grupo nesse percurso foi Allan da Rosa, que é escritor, poeta, dramaturgo, historiador e angoleiro (capoeirista). Allan também é mestre e doutor em Educação pela USP. 

Autor de Pedagoginga, Autonomia e Mocambagem, sobre culturas negras e educação popular, Allan também coordenou seminários e publicações referentes às obras e trajetórias de Jorge Ben, Muniz Sodré, Itamar Assumpção, entre outros. Ainda, como editor, criou o clássico selo Edições Toró no princípio do Movimento de Literatura Periférica de SP.

Allan da Rosa também apresentou oficinas, conferências, recitais e cenas em todas as regiões do Brasil, universidades, bibliotecas e centros comunitários de Moçambique, Cuba, México, Estados Unidos, Colômbia, Argentina e Bolívia. Recentemente publicou a obra  Águas de Homens Pretos (2021), que é o resultado de sua tese de doutorado.

Allan da Rosa – Responsável pelo tour do Programa Já É

O encontro de todes ocorreu no escritório do Fundo Baobá, localizado no centro histórico de São Paulo,  e de lá deu-se início às descobertas pela cidade. Pontos pelos quais as pessoas  sempre andaram, mas não conheciam a história contida por trás de cada uma das casas de comércio, ruas, monumentos, praças e prédios antigos com que se deparavam.

Durante todo o trajeto, iniciado na Praça da República, as associações entre os locais e seus elementos históricos   foram feitas, enquanto o percurso se desenhava até o Largo do Arouche, onde se  encontra a estátua de Luiz Gama; passando pela Igreja da Irmandade da Nossa Senhora dos Homens Pretos, no Largo do Paissandu e terminando no bairro da Liberdade, onde estão a Igreja Santa Cruz das Almas dos Enforcados e a Capela Nossa Senhora das Almas dos Aflitos.

Luiz Gama foi advogado, escritor e jornalista, ele nasceu em Salvador no dia 21 de junho de 1830, de uma mãe negra liberta e um pai fidalgo português, por quem foi vendido como escravo e levado para São Paulo; Gama, entre outros títulos, detém o de patrono da abolição da escravidão no Brasil.

A Igreja da Irmandade da Nossa Senhora dos Homens Pretos representa um ponto de encontro de resistência, pois as irmandades de homens pretos surgiram no período colonial escravocrata e era uma forma de socialização, resistência e cooperação entre escravizados, libertos e aliados, bem como de mobilização de recursos para compra de cartas de alforria, para realização de funerais dignos, casamentos, ou mesmo batizados.

Já o bairro da Liberdade, apesar de ser conhecido por ser um bairro japonês, carrega muito viva a presença negra em seu território, tanto que Allan explica que o local onde hoje ocorre a feirinha, era chamado de quadrilátero do terror no século XIX, pois a composição do cenário consistia na delegacia, local onde acontecia os espancamentos, a forca e o cemitério; não por acaso a Igreja Santa Cruz das Almas dos Enforcados encontra-se ali presente.

E a  Capela Nossa Senhora das Almas dos Aflitos, era uma capela cemitério destinada às pessoas excluídas da sociedade, tudo que está construído em seu entorno, recobre corpos que ali foram enterrados.  O cemitério é de 1774 e a capela de 1779.

A emoção foi tamanha que o aluno Victor dos Passos Moreira disse em seu relato: “Eu tinha conhecimento sobre a história da Liberdade, mas sobre Luiz Gama me chocou bastante, ao saber que ele foi um dos advogados mais importantes do país e ainda é. Eu não tinha ouvido falar de Luiz Gama no ensino fundamental, no ensino médio e tampouco no cursinho pré vestibular”.

Victor dos Passos Moreira – Aluno do Programa Já É

A fala de Victor evidencia como o apagamento histórico acontece, apesar de as pessoas caminharem sempre pelos mesmos lugares, muitas vezes elas não sabem o que realmente se passou ali.

A  aluna Caroline Cristina Santos ressaltou a importância da atividade para o processo de pertencimento: “Acho que ter esse tipo de informação interfere no ponto de vista que temos da cidade. Por exemplo, eu tinha vontade de ir conhecer a feirinha da Liberdade, um dos pontos mais visitados de São Paulo e eu nunca iria imaginar o que aconteceu lá. Isso me faz ter mais curiosidade e vontade de pesquisar e buscar cada vez mais informações”.

Caroline Cristina Santos – Aluna do Programa Já É

A aluna Karine Lopes dos Santos disse: “O encontro foi muito bom, eu já havia feito um parecido em 2018, mas o Allan citou coisas que passavam despercebidas por mim antes. Agora,  tenho um novo olhar ao sair de casa. Além disso, eu gostaria de ouvir também sobre os bairros mais extremos e periféricos”.

Karine Lopes dos Santos – Aluna do Programa Já É

Além de ser um momento muito especial de reconhecimento da cidade para as e os estudantes, foi a chance de se conhecerem pessoalmente, já que muites só haviam tido contato virtual, por estudarem em horários e unidades diferentes do cursinho pré-vestibular.

Allan da Rosa contou: “Realizo esse trabalho há vários anos, com turmas de contextos e proveniências diferentes. Atuamos pedagogicamente nas ruas, tanto as do Centro quanto das periferias. Trabalho com várias organizações e movimentos sociais profissionalmente, mas também faço “por conta”, ou seja, como militância e prática pedagógica, que ocorre sem recebimento financeiro”. 

Trabalhos como o de Allan são fundamentais para que as pessoas possam construir um olhar crítico sobre suas realidades, conhecendo a história que as cerca a todo  momento.

Vidas Negras, Dignidade e Justiça: as organizações e seus trabalhos de campo

O edital destinou apoio financeiro de R$ 100 mil a 12 organizações. O Instituto Negra do Ceará e a Elas Existem, por exemplo, têm implantado fortes ações junto a seus públicos 

                                              Por Wagner Prado

Em maio de 2021, o Fundo Baobá para Equidade Racial fez o lançamento do edital Vidas Negras: Dignidade e Justiça, em parceria com a Google.org. O edital é parte do programa Equidade Racial e Justiça. O Vidas Negras: Dignidade e Justiça constitui-se em uma oportunidade para que organizações negras fortaleçam estratégias de ativismo, resistência e resiliência diante das injustiças raciais recorrentes. Ele é  destinado ao apoio a organizações  que desenvolvem  ações práticas de enfrentamento ao racismo, à violência e às injustiças criminais de perfil racial. 

Com o apoio da Google.org o Fundo Baobá pode financiar projetos de 12 (doze) organizações, cada uma recebendo R$ 100 mil.  Os projetos dialogam com três grandes temas: a) Enfrentamento à violência racial sistêmica; b) Proteção comunitária e promoção da equidade racial; c) Enfrentamento ao encarceramento em massa entre adultos e jovens negros e redução da idade penal para adolescentes; d) Reparação para vítimas e sobreviventes de injustiças criminais com viés racial. 

O investimento programático do Fundo Baobá, ou seja, a destinação de suas doações está voltada para quatro eixos de atuação: 1) Viver com Dignidade; 2) Educação; 3) Desenvolvimento Econômico e 4) Comunicação e Memória. O edital Vidas Negras: Dignidade e Justiça está sob o eixo Viver com Dignidade, que incentiva ações de promoção da saúde e qualidade de vida; prevenção de doenças e seus agravos; prevenção e atenção às vítimas e pessoas afetadas pela violência racial; enfrentamento ao racismo religioso e proteção de suas vítimas; acesso à terra; acesso à infraestrutura; proteção e defesa dos direitos das comunidades quilombolas em geral.

Aqui, vamos colocar foco em duas organizações que apresentaram projetos dentro do eixo temático c) Enfrentamento ao encarceramento em massa entre adultos e jovens negros e redução da idade penal para adolescentes. As organizações são o INEGRA-CEe a Elas Existem – Mulheres Encarceradas, do Rio de Janeiro, mas que desenvolve seu projeto no estado do Acre.  O INEGRA-CE apresentou o projeto Levante Pretas: Resistências Coletivas. Seu objetivo é promover o desinternamento e o desencarceramento, além de estimular propostas de enfrentamento às violências e violações sofridas por pessoas em situação de encarceramento. O projeto tem foco também nos familiares dessas pessoas. Já o Elas Existem – Mulheres Encarceradas trouxe o projeto O Acre Existe: Mulheres Negras Resistem e Se Fortalecem – Pelo Desencarceramento Feminino, que vai atuar na diminuição das desigualdades de raça e gênero dentro do sistema de Justiça Criminal do estado do Acre. 

A atuação do INEGRA-CE e da Elas Existem leva a uma reflexão sobre a questão da Necropolítica no Brasil. A Necropolítica, conceito definido  pelo filósofo africano nascido em Camarões, Achille Mbembe, no início deste século, evidencia a forma como diferentes governos administram a morte. O conceito é simples e terrível: consiste na promoção de políticas restritivas a determinadas populações no acesso a condições mínimas de sobrevivência; também consiste na criação de áreas, territórios em que a morte é algo autorizado. Isso é como marcar com um símbolo na testa aqueles que devem morrer, quando devem morrer e como devem morrer. A descrição tem alguma similaridade com o que ocorre com as populações em estado de abandono no Brasil? Analise! 

Entrevistamos Cícera Maria da Silva, líder do INEGRA-CE, e Caroline Mendes Bispo, da Elas Existem – Mulheres Encarceradas. 

Cícera Silva – INEGRA-CE

 

Caroline Bispo – Elas Existem – Mulheres Encarceradas

Fundo Baobá – O INEGRA-CE trabalha na busca pela igualdade de gênero e etnicorracial. O que vocês têm desenvolvido para chegar a isso?

Cícera Maria da Silva (INEGRA-CE)Todas as nossas ações, desde nossa fundação, têm como objetivo a construção da igualdade e da equidade de gênero e raça como horizonte. Nesse sentido, temos desenvolvido ações de formação política em gênero, raça, direitos humanos e justiça, bem como apoio a grupos produtivos de mulheres negras, ações educativas em escolas e apoio a comunidades quilombolas. Também participamos de espaços diversos como apoio ao movimento de mulheres negras, associações de mulheres, e lugares que fomentam a criação e monitoramento das políticas públicas, contribuindo com metodologias, instigando e potencializando os debates que impulsionam essas transformações.

Fundo Baobá – Descreva os locais onde vocês têm atuado? 

Cícera Maria da Silva (INEGRA-CE) –  Atuamos na cidade de Fortaleza, especialmente com as comunidades periféricas, bem como junto a associações de moradores/as, grupos produtivos e comunidades quilombolas de municípios mais próximos. 

Temos inserção no Instituto Penal Feminino Auri Moura Costa, na Central de Alternativas Penais, nas Audiências de Custódia, Seminários Acadêmicos e Populares e, atualmente, dentro dos territórios com adolescentes que cumpriram medidas socioeducativas, sobreviventes do sistema prisional, na Frente Estadual pelo Desencarceramento, etc.

Fundo Baobá – O racismo tem sido agente operante quando se fala na condenação e encarceramento do povo negro (homens adultos, mulheres adultas e jovens). Que realidade vocês têm encontrado nesse sentido no Ceará? 

Cícera Maria da Silva (INEGRA-CE) – No Ceará, temos uma realidade perversa, que tem como alvo de suspeição a população negra, empobrecida e periférica. Com 95% da população carcerária feminina sendo composta por mulheres negras, o Ceará é um estado encarcerador, além do agravante de que a grande maioria das prisões são provisórias. Vale ressaltar ainda o contexto pandêmico que reduziu as visitas no sistema prisional, o que piora muito as condições materiais e a saúde psicológica da população encarcerada. Embora lutemos por isso, não podemos esperar com otimismo por políticas de segurança pública que assegurem e respeitem os direitos humanos quando o biopoder e a necropolítica são os parâmetros do próprio Estado.

Fundo Baobá – Entre tantos objetivos de vocês junto às populações encarceradas, vocês também levam a cultura. De que forma?  

Cícera Maria da Silva (INEGRA-CE) –  A cultura para nós é, para além de festividades, uma forma de resistência. É também um meio para levar alegria, entretenimento e conhecimento para nossas irmãs negras encarceradas. Nossas ações com a população encarcerada incluem a presença do Maracatu, batuque, poesias, livros, músicas, cantigas populares, oficina de tranças e turbantes. Ter encerrado um projeto no presídio feminino Auri Moura Costa com a presença do Maracatu Nação Fortaleza, além de inovador, foi muito potente, marcante e emocionante para nós e, sobretudo, para as mulheres encarceradas.

Fundo Baobá – O trabalho não envolve apenas as mulheres apenadas, envolve o entorno delas também (familiares, amigos…). Esse contato é feito como? Parentes e amigos têm abraçado a causa de vocês?

Cícera Maria da Silva (INEGRA-CE) – Para alcançar os familiares realizamos ações/ conversas com eles em dias de visita no sistema prisional e no socioeducativo. Além disso, estabelecemos parceria com o Coletivo Vozes, de mães e familiares do sistema socioeducativo e prisional, o qual  reúne e desenvolve ações com os familiares. Os familiares e sobretudo as mães são os porta-vozes de seus entes presos/as. Trazem as denúncias de violências e violações contra os mesmos no cárcere. Então, diante disso sentem a necessidade de aderir à causa e à luta, embora essa tarefa organizativa não seja fácil, haja vista as demandas mais urgentes com seus entes aprisionados, tais como assessoria jurídica, manutenção da saúde psicológica e preocupações com a integridade física e com a própria vida.

Fundo Baobá – Além do Ceará, vocês pretendem atuar em outros estados?

Cícera Maria da Silva (INEGRA-CE) – Por enquanto não, diante dos desafios apresentados à nossa atuação coletiva, nos deixando vulneráveis frente ao sistema de justiça que ameaça, persegue e criminaliza as defensoras de direitos humanos.

Contudo, reconhecemos ser importante firmar parcerias com outras organizações e coletivos que trabalham no enfrentamento ao desencarceramento e desinternamento, para pensar em estratégias seguras e eficazes de atuação coletiva. 

Fundo Baobá – Para o Instituto Negra do Ceará,  qual a importância de ter sido selecionado pelo edital Vidas Negras: Dignidade e Justiça? 

Cícera Maria da Silva (INEGRA-CE) –  Para o Instituto Negra do Ceará, ser selecionado por alguns financiadores, incluindo o Fundo Baobá, além de honroso, soa para nós como reconhecimento de nossa maturidade e competência, o que nos fortalece e nos traz confiança.

O Edital “Vidas Negras: Dignidade e Justiça”, em especial, nos é importante por várias razões, mas sobretudo por proporcionar aos adolescentes/jovens do sistema socioeducativo assistência jurídica e atendimento psicológico, dois campos de grande carência junto a esse público e que lhes traz o sentimento de proteção, segurança e cuidado. Então,  para nós isso traz uma grande dimensão simbólica. 

Outro aspecto muito relevante desse edital é nos permitir a ampliação do debate com familiares e a sociedade civil sobre o desencarceramento e desinternamento, via realização do seminário estadual e outras ações de caráter mais lúdico. Portanto, algumas coisas não conseguimos mensurar ainda, mas temos a certeza de que o edital é de suma importância para o nosso público e para a construção da dignidade, da justiça e do bem viver que almejamos para o nosso povo preto.

Associação Elas Existem 

Fundo Baobá – A Elas Existem já desenvolvia o trabalho no Rio de Janeiro e no Mato Grosso. Efetivamente, os trabalhos no Acre já estão acontecendo? 

Caroline Mendes Bispo (Elas Existem) – Nosso trabalho teve início em outubro de 2021, com a minha vinda para o Acre, onde comecei a fazer um mapeamento não só dos trabalhos que poderiam ser efetuados, mas também da equipe que seria contratada para me ajudar nessa empreitada aqui. A Elas Existem continua as atividades no Rio de Janeiro, de forma online em Cuiabá (MT) e iniciou os trâmites também para iniciar as atividades em Porto Alegre. Desde janeiro, efetivamente, a gente está dentro das unidades prisionais aqui no Acre. Tanto em Cruzeiro do Sul como em Tarauacá e aqui em Rio Branco, 

Fundo Baobá – Que ações vocês têm desenvolvido lá? 

Caroline Mendes Bispo (Elas Existem) – Nós estamos realizando o plantão de orientação,  onde uma advogada, uma assistente social e uma estagiária realizam a escuta ativa de todas as presas da unidade de Cruzeiro do Sul e Tarauacá, a fim de fazer uma análise que vai para além do crime e das condições que elas vivem naquele lugar. Através dessa análise a gente pode perceber se o acesso aos direitos para essas mulheres  está sendo efetivo e de que maneira nós podemos encaminhar para outros órgãos e instituições. A gente está realizando também as oficinas de empoderamento e fortalecimento para que essas mulheres sejam reintegradas à sociedade após o cumprimento de suas penas. Por fim, estamos fortalecendo as redes que trabalham e discutem a situação das mulheres dentro dos espaços de privação de liberdade, tanto com as mulheres cis e trans nas unidades prisionais quanto com as adolescentes nas unidades socioeducativas, de forma online.  

Fundo Baobá – O racismo tem sido agente operante quando se fala na condenação e encarceramento do povo negro (homens e mulheres). Que realidade vocês encontraram no estado do Acre? 

Caroline Mendes Bispo (Elas Existem) – Em 2014 foi feito o primeiro levantamento sobre as  mulheres presas no Brasil como um todo. Em 2016 foi publicado esse primeiro relatório, que demonstrou que no estado do Acre 100% das mulheres encarceradas eram mulheres negras. Em 2017, no segundo estudo, esse número mostrou que 97% das mulheres encarceradas eram pretas ou pardas. Quando cheguei aqui, o número de  mulheres que se autodeclaravam como pardas era extremamente grande. Inclusive mulheres negras/pretas que tinham vergonha de se reconhecerem como negras, tentando colocar o moreninha ou mesmo o parda. Então, se a gente para para tentar entender um pouco a situação racial aqui no estado do Acre, é muito mais o apagamento e a necessidade de discutir sobre isso, bem como trazer de que forma o racismo vem atacando a vida dessas mulheres a ponto de elas não quererem se reconhecer. Esse foi o que nós acabamos encontrando aqui: um apagamento e uma invisibilidade das discussões, onde a maioria das pessoas no estado do Acre são brancas, onde as mulheres negras não se vêm como mulheres negras e as mulheres encarceradas acabem encontrando esse duplo estigma, de serem encarceradas e de serem, majoritariamente, de mulheres negras. Dessa forma, discutir a racialidade aqui nesse lugar tem sido fundamental. 

Fundo Baobá – Entre tantos objetivos de vocês junto às mulheres encarceradas, quero destacar um objetivo cultural, que é o de elaborar e distribuir material educativo a ser entregue no ambiente carcerário. 

Caroline Mendes Bispo (Elas Existem) – Atualmente, uma das questões mais importantes para a Elas Existem é o acesso a direitos e facilitar o acesso a direitos. Inclusive, facilitar no entendimento das questões. Hoje, nossa comunicação é uma comunicação rápida, é uma comunicação que alcança principalmente o entendimento. Hoje, preparar materiais mostrando que essas mulheres possuem direitos, elas têm deveres também, mas com informações de forma segura, céleres e com linguajar simples faz muita diferença. Ainda não preparamos o material. Fizemos um estudo e faremos outros ao longo do ano. Mas preparar um material com linguagem rápida e acessível faz com que o acesso a direitos fique ainda mais fácil na vida delas.  

Fundo Baobá – Além do Rio, Mato Grosso e Acre, vocês pretendem atuar em outros estados? 

Caroline Mendes Bispo (Elas Existem) – Sim. Atualmente estamos conversando com o estado do Rio Grande do Sul, para realizar algumas atividades em conjunto com uma organização do próprio território. No estado da Bahia, desde 2016, a gente realiza algumas atividades pontuais e estamos com planos de, no próximo ano, ter uma sede também na cidade de Salvador, fazendo assim cinco pontos do Brasil, como uma forma de demonstrar a importância de ter um olhar diverso sobre as mulheres encarceradas. 

Fundo Baobá – Você mudou-se para o Acre. Pessoalmente, como tem sido encarar essa nova realidade? A causa pela qual você trabalha vale a mudança? 

Caroline Mendes Bispo (Elas Existem) – Vale muito a mudança. Não se trata de ter desistido de tudo no Rio, pelo contrário: é ter exposto todas as coisas que fizemos no Rio e conseguimos amadurecer num estado que é tão pioneiro. O Acre durante muito tempo lutou para mostrar sua existência. Então, ele vem se construindo. E as construções que são feitas são muitas construções que nós, da capital, já estamos fazendo há algum tempo. Então, estar aqui dialogando com portas tão abertas… Hoje a Elas Existem faz parte do Comitê de Prevenção e Combate à Tortura, tem parceria com o Instituto de Administração Penitenciária, tem feito diálogos com o Ministério Público e a Defensoria Pública. Então, dessa forma, não só as parceria como os diálogos fizeram com que valesse mais a pena ainda todas as atividades que executamos tanto no Rio de Janeiro quanto aqui no Acre.   

Fundo Baobá – Para a Elas Existem, qual a importância de ter sido selecionada pelo edital Vidas Negra: Dignidade e Justiça?

Caroline Mendes Bispo (Elas Existem) –  Foi muito importante para a gente ter sido selecionada nesse edital, pois ele nos deu a possibilidade de ter vindo para o Acre. A nossa Associação, apesar dos seis anos de existência,  sempre se manteve presencialmente no Rio de Janeiro. Então, estar atuando aqui no Acre também  faz com que a gente consiga colocar nossa experiência, nosso trabalho  de forma prática, para além da teoria, em outros lugares, com outras perspectivas. Então, ter condições financeiras para ter uma equipe no Norte do país, no interior do Norte do país, onde as discussões não são feitas, mas clarear e abrir a visão para o sistema de justiça criminal e das mulheres também no socioeducativo faz  toda uma diferença. Ser uma das organizações contempladas mudou gradativamente nossa existência como um todo. Poder estar discutindo que o Acre Existe e Elas Resistem mudou ainda mais. 

Fundo Baobá e Empresa MetLife em Parceria no Segundo Ano do Programa Já É

Thais Catucci,  Gerente de Comunicação Interna e Responsabilidade Social da MetLife Brasil,  fala sobre colaboração em programa do Fundo Baobá

Por Ingrid Ferreira

A empresa de seguros MetLife é a mais nova parceira do Fundo Baobá para Equidade Racial e responsável por financiar o segundo ano do Programa Já É, que tem como intuito apoiar jovens negros da grande São Paulo e capital a ingressarem na universidade e manterem-se no primeiro ano do curso.

Thais Catucci, Gerente de Comunicação Interna e Responsabilidade Social da MetLife Brasil em entrevista ao Fundo Baobá, fala um pouco sobre o que essa parceria representa e como ela se desenha.

Thais Catucci – Gerente de Comunicação Interna e Responsabilidade Social da MetLife Brasil

Ao ser questionada do porquê do apoio da MetLife ao segundo ano do Programa Já É, do Fundo Baobá, Thais explica que: “A MetLife busca continuamente apoiar iniciativas que façam sentido para a sociedade e que estejam em linha com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU (ODS), com os quais ela se comprometeu. Contribuir com a redução das desigualdades é um deles e este projeto contribui para isso”.

O Programa Já É tem apresentado resultados muito positivos do seu primeiro ano, como é possível visualizar na matéria “Já É: Programa de acesso à educação pública de nível superior começa a dar seus primeiros resultados”, em que alunas contam um pouco sobre o que representa para elas e suas famílias a notícia de suas aprovações para ingressarem nos cursos de suas escolhas.

A empresa MetLife disponibilizou o aporte financeiro de R$ 1 milhão para apoio aos jovens, e Thais fala que: “Este valor é destinado ao Fundo Baobá para que possa custear o financiamento das despesas dos jovens com transporte, alimentação e acesso à internet. Mas, nosso apoio vai além do valor destinado ao Programa, também iremos participar com atividades voltadas para a ampliação das habilidades socioemocionais e vocacionais em esquemas de mentoria com o apoio de nossos colaboradores”.

A Gerente conta que a empresa participa de outros projetos sendo realizados fora do Brasil, inclusive nos EUA, e que a decisão pela parceria com o Fundo Baobá se deu pelo fato de o Baobá ser o primeiro fundo exclusivo para a promoção da equidade racial para a população negra no Brasil, o que é de extrema importância no conceito da empresa.

Fundo Baobá divulga lista final do edital Negros, Negócios e Alimentação com surpresa no número de empreendimentos escolhidos

Edital selecionaria 12 iniciativas gastronômicas. Direção do Fundo decidiu aumentar o número para 14, ampliando ainda mais o apoio aos empreendedores (as) 

                                   Por  Wagner Prado

O dia tão esperado chegou. O Fundo Baobá para Equidade Racial divulga hoje, 31 de março, a lista de 14 empreendimentos agraciados, cada um, com um aporte de R$ 30 mil destinado pelo edital Negros, Negócios e Alimentação. Voltado para empreendedores negres, negros e negras do segmento da gastronomia, o edital foi lançado em novembro de 2021, dirigido especificamente para Recife e Grande Recife. O apoio financeiro irá auxiliar  na recuperação econômica e/ou aceleração desses negócios, nas suas mais diferentes formas: buffets, comida por encomenda, comida delivery, barracas em pontos fixos ou volantes, docerias, restaurantes e outras.  

 

Quando do lançamento do edital, em novembro de 2021, estava previsto que 12 empreendimentos seriam escolhidos. Porém, o Fundo Baobá decidiu ampliar o número para 14. “Estamos bem felizes  com esta possibilidade de agregar recursos próprios ao edital. É o Baobá fazendo o que deve ser feito. Sendo estratégico e consonante com as necessidades e expectativas do campo nos seus investimentos”, afirmou Fernanda Lopes, diretora de Programa do Fundo Baobá.

 

 O Fundo Baobá tem como parceira nesta iniciativa a empresa alimentícia General Mills. O edital Negros, Negócios e Alimentação integra o Programa de Resiliência, Recuperação Econômica e Equidade Racial, lançado no contexto da pandemia da Covid-19. Nano, micro e pequenos negócios das seguintes cidades: Recife, Abreu de Lima, Araçoiaba, Cabo de Santo Agostinho, Camaragibe, Igarassu, Ilha de Itamaracá, Ipojuca, Itapissuma, Jaboatão dos Guararapes, Moreno, Olinda, Paulista e São Lourenço puderam se inscrever.

 

O edital contou com três etapas seletivas. Na última etapa, uma comissão formada pela chef e empreendedora no segmento gastronômico Priscilla Novaes; pelo gestor de projetos sociais da Aliança Empreendedora,  Ariel Pascke; pelo diretor executivo do Instituto C&A, Gustavo Narciso; pelo historiador com pós-graduação em Política e Gestão Cultural, Lindivaldo Leite Júnior e pelo engenheiro, proprietário e diretor de uma empresa de consultoria focada em gestão de investimento verde e sustentável, com e sem alocação de capital, Marco Antonio Fujihara, esteve responsável por fazer a análise das propostas e posterior escolha dos finalistas. Lindivaldo Júnior e Marco Antonio Fujihara representaram os órgãos de governança do Fundo Baobá. 

 

O trabalho da comissão foi gratificante, mas também árduo. Para a chef Priscilla Novaes, que comanda em São Paulo o restaurante Kitanda das Minas, os empreendimentos inscritos tinham um ponto em comum: “Todos os negócios são bons. Mas identifiquei o domínio do empreendedor sobre seu próprio negócio. Esse aspecto de dominar o negócio e saber o que é preciso nele. Também identifiquei aqueles que se interessaram pela formação. Todo aspecto formativo é importante. Os momentos em que meu negócio conseguiu se desenvolver foi quando tive apoio não apenas financeiro, mas apoio na gestão, apoio no maketing”, afirmou.

 

Para o historiador Lindivaldo Leite Junior, de Recife, fazer parte de uma comissão julgadora sempre traz um desafio: “Participar de comissões de avaliação é sempre um desafio, é uma responsabilidade muito grande. Porque você está, de alguma forma, julgando os trabalhos de gente que tem uma batalha cotidiana para organizar. A gente se preocupa em não ser injusto,  já que, em tese, todos que acessaram o edital são merecedores do apoio. Mas nossa tarefa é escolher só alguns. De alguma forma,  tenho sempre satisfação em contribuir com o trabalho do Fundo Baobá e ajudar a manter sua missão, fortalecer seu compromisso com a inclusão racial”, disse. 

 

Ariel Pascke, gestor de projetos sociais, afirmou que a emoção também fez parte do critério de escolha: “Uma grande emoção e responsabilidade, pois chegaram até as minhas mãos iniciativas incríveis. Influenciar na decisão sobre quem seria contemplado pelo edital é se envolver com a história de cada uma das pessoas, negócios, famílias e suas respectivas comunidades. Foi um prazer fazer parte desta seleção. Agora,  estou curioso para saber os próximos passos destes empreendedores e sobre como será o futuro dos seus negócios. Parabéns pela iniciativa, Baobá”, comentou. 

 

Jornada Formativa

Definido o grupo, agora ampliado e composto por 14 empreendimentos, seus responsáveis iniciam uma jornada formativa introdutória, que terá quatro momentos: 1)  Reunião de orientações gerais;  b) Sessões relacionadas à gestão de negócios, com temas diversos; c) Oficina para elaboração do plano orçamentário e cronograma de execução; d) Oficina de orientações sobre como se preparar para prestar contas.  Para a jornada formativa introdutória é necessário que cada empreendedor reserve cerca de 15 (quinze) horas de dedicação. 

 

A lista com os 14 empreendimentos selecionados pode ser conferida AQUI

Fundo Baobá divulga lista de classificados na segunda etapa do edital Negros, Negócios e Alimentação

Lista traz 24 nomes de organizações que empreendem na área da gastronomia na região metropolitana de Recife

                                   Por  Wagner Prado

A tão aguardada lista final do edital Negros, Negócios e Alimentação será divulgada no dia 31 de março. Hoje, 10 de março, porém, o Fundo Baobá para Equidade Racial divulga a lista de 24 empreendimentos da área gastronômica, liderados por negros e negras,  atuantes na região metropolitana de Recife, território para o qual o edital está voltado.  

O edital Negros, Negócios e Alimentação foi criado pelo Fundo Baobá em novembro de 2021.  A proposta dele  é promover apoio financeiro que impulsione a recuperação econômica de negócios dirigidos ao segmento gastronômico em suas formas mais variadas, como bares, buffets, comida delivery, food trucks, docerias,  restaurantes e outras.  A lista final, que sairá em 31 de março, trará os 12 empreendimentos selecionados. Cada um deles receberá R$ 30 mil.   

Impulsionar a recuperação abrange algo ainda maior. Além do apoio financeiro, os proprietários e proprietárias responsáveis vão ser envolvidos em uma jornada de aprendizado para aprimorar os conhecimentos de gestão, planejamento, inovação e busca de parcerias.

O acesso a estes conteúdos vai se dar por meio de atividades formativas, mentorias e compartilhamento de experiências promovidas pelo Fundo Baobá e uma parceria apoiadora. As atividades formativas acontecerão durante a implementação do projeto, de maio a novembro. Nos meses de julho e dezembro vão ocorrer as atividades de compartilhamento de experiências.   

O edital Negros, Negócios e Alimentação é uma parceria entre o Fundo Baobá e a General Mills e integra o Programa de Resiliência, Recuperação Econômica e Equidade Racial lançado no contexto da pandemia da COVID-19. O edital surge para apoiar nano, micro e pequenos negócios de gastronomia da região metropolitana do Recife, que compreende as cidades de Abreu de Lima, Araçoiaba, Cabo de Santo Agostinho, Camaragibe, Igarassu, Ilha de Itamaracá,  Ipojuca, Itapissuma, Jaboatão dos Guararapes,  Moreno, Olinda,  Paulista, Recife e São Lourenço da Mata. 

A pesquisa “O Impacto da Pandemia do Coronavírus nos Pequenos Negócios”, realizada pelo Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas)  e FGV (Fundação Getúlio Vargas) em março/2021,  revelou, entre outros dados, que  79% desses estabelecimentos, em nível nacional, tiveram seu faturamento diminuído; 34% tinham dívidas e/ou empréstimos em atraso; 49% haviam buscado empréstimos em instituições bancárias tradicionais e 19% foram obrigados a promover demissões. Foram ouvidos 6.228 empresários em 26 estados brasileiros mais o Distrito Federal.

Se, para quem atua na formalidade o quadro estava complicado, para quem atua no mercado informal as dificuldades foram ainda mais gritantes. O edital Negros, Negócios e Alimentação dá oportunidade para empresas formalizadas (com CNPJ) e não formalizadas (sem CNPJ), que estejam atuando no mercado há,  no mínimo, três anos. 

Foram recebidas 60 inscrições. A primeira lista de classificados, divulgada em 8 de fevereiro, selecionou 46 empreendimentos. As propostas foram analisadas e entrevistas foram realizadas com todos os e as proponentes. A lista divulgada hoje, 10 de março, elege 24 empreendimentos. O projeto será novamente avaliado, agora por um comitê composto por membros dos órgãos de governança do Baobá e especialistas. A lista final será divulgada  em 31 de março,  com 12 empreendimentos que serão apoiados. 

Acesse aqui a lista de classificados para a terceira fase.

Fundo Baobá cria, no Brasil, o primeiro Círculo de Doação liderado por pessoas negras 

Filantropia negra deve se mobilizar no sentido de exercer a doação, visando promover projetos que trabalhem a equidade racial e a justiça social para a população negra

Por Wagner Prado 

O dia 30 de novembro de 2021 é considerado uma marca histórica para o Fundo Baobá para Equidade Racial. No ano em que completou 10 anos de atividades, o Baobá, único fundo dedicado, exclusivamente, para a promoção da equidade racial para a população negra no Brasil, lançou o seu Círculo de Doação. E por que a marca é histórica? O Fundo Baobá é uma organização comandada por pessoas negras e engajadas nas questões relativas ao povo preto brasileiro. O Círculo de Doação criado pelo Baoba é o primeiro no país e o único que conta com  negros na liderança. 

O Baobá está plantando uma semente para que a filantropia negra se eleve e se fortaleça no Brasil. A missão do Fundo Baobá é prover recursos financeiros, que propiciem apoio para que programas, projetos, iniciativas de organizações, grupos e coletivos negros ou pelo próprio Baobá sejam implementados. De 2014 a 2021, o Baobá investiu cerca de R$ 15 milhões em 833 iniciativas negras, incluindo apoio emergencial no contexto da pandemia da COVID-19. Indiretamente, impactou mais de meio milhão de vidas em todo o território nacional.

Programa de Aceleração do Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco –  objetiva fazer com que coletivas e grupos de mulheres negras sejam fortalecidos em todas as suas capacidades, além de desenvolver as potencialidades para fortalecer a liderança de mulheres negras. Os parceiros apoiadores são Ford Foundation,  Instituto Ibirapitanga, Kellogg Foundation e Open Society Foundation.  

Programa Já É: Educação e Equidade Racial – objetiva fornecer bolsas de estudo em cursinho preparatório para o vestibular. O programa também oferece orientação vocacional e suporte suporte psicossocial, vale transporte, refeição e internet, para jovens negros, com idade entre 17 e 25 anos, residentes no município de São Paulo ou na Grande São Paulo. A trajetória escolar desses estudantes tem que ter sido feita em escola pública. No primeiro ano de apoio, os parceiros foram Citi Foundation, Demarest Advogados e Amadi Technology.

Vidas Negras, Dignidade e Justiça –  destina-se a apoiar iniciativas de organizações, movimentos sociais, coletivos negros que busquem desenvolver ações práticas para o enfrentamento ao racismo, à violência sistêmica e às injustiças criminais no Brasil. 

Os três exemplos de editais, lançados entre 2019 e 2021, dão ideia da importância de realizar o ato da doação para que um número incalculável de pessoas possa ser beneficiada por ações sociais responsáveis. 

Objetivo do Círculo de Doação

O Programa Filantropia para Equidade Racial é uma iniciativa que visa promover os valores da filantropia para equidade racial e será baseado nos seguintes critérios: Consistência, Sustentabilidade,  Coerência e Confiança. Serão convidados a fazer parte lideranças negras nacionais e internacionais, influentes em suas áreas de atuação. Elas serão responsáveis por liderar o primeiro Círculo de Doação para Equidade Racial no Brasil. Além disso, vão desempenhar papel fundamental para elevar o protagonismo de pessoas negras na filantropia brasileira. Caberá também a essas lideranças apoiar o Fundo Baobá na expansão do relacionamento e engajamento de doadores individuais em potenciais doações  entre R$ 5 mil e R$ 50 mil,  de acordo com o nível de engajamento.  O objetivo será fazer crescer o impacto transformador do investimento em organizações negras atuantes em todo território brasileiro e que contribuam para o combate ao racismo. Serão realizados encontros periódicos com os doadores para:
fortalecer a cultura de doação em prol do combate ao racismo,
promover lideranças negras,
inspirar novos doadores,
compartilhar histórias e celebrar os resultados alcançados a partir das doações. 

O Selo Filantropia pela Equidade Racial será disponibilizado para todas as lideranças negras que fizerem parte do Círculo de Doação.

Sinônimo de engajamento e de grande doador

Para a maioria das pessoas, o heptacampeão mundial de Fórmula 1 Lewis Hamilton é um piloto que já colocou seu nome na história. No final de 2021, ele recebeu do governo da Inglaterra o título de Sir, passando oficialmente a ser reconhecido como Cavaleiro da Ordem do Império Britânico, o que confere a ele um status de nobreza. Hamilton foi o oitavo esportista mais bem pago do mundo em 2021, segundo levantamento da revista Forbes, tendo alcançado a casa dos US$ 82 milhões em faturamento (quase R$ 425 milhões). 

O ativismo político de Hamilton e sua condição de esportista milionário se juntam no sentido da co-responsabilidade social. O astro do esporte investe parte do que ganha em Educação. O objetivo de Lewis Hamilton é contribuir para que questões estruturais que impedem o acesso igualitário aos meios educacionais sejam erradicadas, principalmente no que diz respeito a alunos negros. “Qualquer jovem do planeta merece ter o mesmo direito de receber uma ótima educação. As famílias não devem considerar carreiras para seus filhos pensando: Bem, essa carreira não serve, porque não tem como mu filho entrar nesta área. Não tem ninguém que se parece com a gente nesta área. Então, a representatividade é uma conquista importante”, afirmou o heptacampeão em entrevista em novembro, quando disputou e venceu em São Paulo o GP Brasil.

Uma ideia que tem maior sentido se você fizer parte do elo 

O tema continua sendo filantropia. Primeiro, porém, vamos recorrer à etimologia: estudo que define a origem e a evolução das palavras. Então, a origem de filantropia está na junção de duas palavras gregas. Filos, que significa amizade, amor, e  Antropo, humanidade. 

O amor pela humanidade pode ser exercido de várias formas. A reunião de pessoas  visando o bem estar de outras é uma delas. E o privilégio dessa reunião não envolve unicamente gente de melhor poder aquisitivo. Quem não pode contribuir financeiramente pode fazê-lo  de outras formas. A isso se dá o nome de doação. 

A doação pode ser definida como uma das ferramentas de colaboração que aproveita pequenas, médias e grandes quantias oferecidas e são direcionadas para ações de cunho social. Mas não é apenas com dinheiro que se faz doação. Ela pode ocorrer também com horas de trabalho voluntário das mais diferentes formas. 

Filantropia para Justiça Social e Equidade Racial

O modelo de desenvolvimento econômico que acabou se arraigando pelo mundo ao longo da história fez  enfraquecer as pessoas individualmente. Aspectos como justiça, dignidade e igualdade foram esquecidos para que outros, de infinitamente menor  valor, tomassem os seus lugares. A desigualdade em vários setores está fazendo com que as pessoas voltem a se unir buscando um fortalecimento comum. Elas estão, inclusive, procurando fugir do assistencialismo oficial, que dirige e destina uma ajuda, mas não tira as pessoas da vala comum. Isso está mudando. 

As comunidades estão tomando ciência de seu poder de movimentação e articulação. Elas não querem mais receber verbas que são utilizadas para manter o status de quem já detém o poder e vê os vulneráveis, como eternamente beirando a exclusão. As massas também querem o poder. 

O que a filantropia para justiça social e equidade racial pretende é fazer com que o poder volte a essas massas e chegue às massas negras. Por intermédio das doações todo um contingente de excluídos passará a ser valorizado e vai alcançar o bem-estar na educação, o bem-estar no trabalho, o bem-estar na saúde, o bem-estar na moradia. Acima de tudo, vai alcançar o respeito e passará a ser respeitado. 

Histórico dos Círculos de Doação

Uma das formas elaborados por filantropos para juntar quantias que pudessem patrocinar o bem comum são os Círculos de Doação. A partir do início do Século 19 (1800 a 1899), a sociedade dos Estados Unidos passou a se movimentar em torno da formação de associações que visassem o bem social. O pai desse ideário foi o pensador e político francês Alexis Tocqueville (1805-1859). Para ele, a igualdade entre as pessoas era a principal característica da democracia e o desenvolvimento igualitário da sociedade seria um processo que não poderia ser detido.  

O empresário e autor norte-americano Kevin Eikenberry definiu assim os Círculos de Doação: “Os círculos de doação são grupos voluntários que permitem aos indivíduos reunir seu dinheiro (e às vezes seu tempo como voluntários) para apoiar organizações de interesse mútuo. Eles também oferecem oportunidades de educação e engajamento entre os participantes sobre filantropia e mudança social, conectando-os a instituições de caridade, suas comunidades e uns aos outros”. 

Quando Eikenberry fala em oportunidades de educação, isso remete diretamente à formação das Universidade e Instituições Comunitárias Historicamente Negras (Historically Black Colleges and Universities – HBCU), que passaram a ser formadas na segunda metade dos anos 1800 nos Estados Unidos. Elas foram instituídas para levar a população afro-americana ao ensino de nível superior. Hoje, são mais de 100, a maioria delas originárias a partir de Círculos de Doação. 

Um fato que ilustra bem a ação dos Círculos de Doação e de filantropos ligados a eles  ocorreu na Morehouse College (uma HBCU), em Atlanta (Geórgia), em 2020. O bilionário negro norte-americano Robert F. Smith, proprietário da Vista Equit Partnes, qua atua no ramo da tecnologia, militante da causa antirracista e cujo patrimônio pessoal ultrapassa os US$ 7 bilhões, esteve na formatura dos alunos da Morehouse. Lá, ele anunciou a doação de US$ 40 milhões para quitar as dívidas estudantis de todos os formandos.  

Quadro brasileiro

Embora o mundo esteja sofrendo com a pandemia da Covid-19 há dois anos, alguns aspectos positivos devem ser ressaltados. A cultura de doação no Brasil cresceu nos últimos cinco anos, de acordo com pesquisa divulgada pelo Instituto do Desenvolvimento Social (IDIS). O impacto da pandemia, que obrigou, algumas pessoas a se recolher em seus lares acabou prejudicando principalmente aqueles que optam por doar trabalho e não finanças. De qualquer forma, a sociedade brasileira está mais consciente sobre o trabalho das instituições que buscam a filantropia para obter recursos e poder ativar seus projetos.   

O Fundo Baobá para Equidade Racial, atuando há 10 anos buscando ampliar as  oportunidades de desenvolvimento individual e coletivo para a população negra brasileira nas áreas de Educação, Trabalho, Emprego e Renda, Saúde, Acesso à Justiça,  acredita que a sua contribuição é fundamental para que possamos transformar mentalidades e gerar oportunidades justas. Os investimentos feitos por meio de programas e projetos pelo Fundo Baobá, seus resultados  e a forma de doar para que esta transformação social siga sendo realizada estão no site baoba.org.br

Já É: Programa de acesso à educação pública de nível superior começa a dar seus primeiros resultados 

Estudantes negros, negras e negres da periferia de São Paulo foram selecionad@s em 2021. Primeiras aprovações na Unesp, USP e Unicamp já aconteceram 

Por Wagner Prado

Está lá na lista da Unesp (Universidade Estadual Paulista), na da USP (Universidade de São Paulo) e Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) para quem quiser conferir. Os cursos são os de Artes Cênicas (Unesp), Arquitetura e Urbanismo (USP), Letras (USP) e Pedagogia (Unicamp). Os nomes das alunas?: Jakeline Souza Lima, Karina Leal, Larissa Araújo Aniceto e Thais Sousa Silva. Ver nomes em uma lista de aprovação para uma universidade tem um grande significado, principalmente se formos pensar sobre o que está por trás de cada uma dessas aprovações. É possível imaginar algumas coisas como determinação, garra e, acima de tudo, a gana por mudar uma realidade de vida. É sobre isso que vamos falar aqui. A gana pela mudança. 

Larissa Araújo Aniceto, aprovada na FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas) da USP

Para que as populações escolares em diferentes faixas etárias possam ter acesso à Educação, o Fundo Baobá promove apoio a esse ideário: 

➤ Enfrentamento ao racismo institucional no ambiente escolar, tanto na educação infantil, no ensino fundamental e no ensino médio

Projetos de vida e ampliação de capacidades socioemocionais entre adolescentes e jovens 

Entrada e permanência no ensino superior (investimentos em alunos, alunas e alunes do ensino médio, em cursos preparatórios e nos primeiros períodos do curso de graduação)

Formação de lideranças 

➤ Formação de novos quadros técnicos com atuação no poder executivo, legislativo, judiciário, em organizações da sociedade civil organizada, no setor privado, instituições multilaterais.

Em fevereiro de 2021, o Fundo Baobá para Equidade Racial, atuando na base de trabalho Educação, lançou o Programa Já É.  Um número de 84 jovens negros, negras e negres, entre 17 e 25 anos, foi selecionado para estudar em um curso preparatório para o vestibular. Além de não terem que pagar as mensalidades, cobertas pelo programa, também receberam vale transporte e vale alimentação, quando as aulas passaram do sistema remoto para o presencial. O Programa Já é, em seu primeiro ano de funcionamento, contou com o apoio da Citi Foundation, Demarest Advogados e Amadi Technology.  

Aprovações em universidades públicas durante o segundo trimestre de 2021 e/ou as diferentes situações familiares, pautadas por dificuldades de várias ordens,  fez com que alguns desses estudantes tivessem que se afastar do Programa. De 84, 75 continuaram matriculados e 69 permaneceram efetivos em todas as atividades, mesmo com o planejamento tendo sido alterado por conta da pandemia.  Sem poder frequentar as aulas presencialmente, alunos, alunas e alunes receberam computadores portáteis e chip telefônico/internet de dados para que pudessem acompanhar as aulas de forma remota. O objetivo do Programa foi fazer com que os jovens com esses perfis alcançassem instituições públicas de ensino, pela qualidade e nível de excelência que as mesmas possuem. Pessoas negras, pobres e de periferia, normalmente, estão alijadas de frequentar esses ambientes de excelência, embora tenham e possuam os mesmos direitos de qualquer outra pessoa em frequentá-los. 

O acesso à Educação no Brasil é balizado pelo poder aquisitivo das pessoas. Quem goza de boa condição financeira vai ter acesso às melhores escolas e, dentro delas, a todas as ferramentas de última geração que as diferenciam: tecnologia, laboratórios, troca de informações com instituições do exterior, intercâmbios. Alunos negros têm consigo a crernça de que por não terem tido acesso a um ensino básico de qualidade, o nível de excelêna das universidades públicas não é para eles. Um Programa como o Já É, além de outras iniciativas negras, surge para derrubar esses muros de separação. Estigmas têm que ser rompidos. 

Estudo e Pobreza

A OSC (Organização da Sociedade Civil) Todos pela Educação divulgou nota na primeira quinzena de fevereiro/2022 sobre a alfabetização de crianças brasileiras de 6 a 7 anos. Se levarmos em conta que a falta de alfabetização na tenra idade será  prejudicial para tentativas de aprendizado no futuro, isso é estarrecedor e limita o futuro de muitos jovens.

Alfabetizar é o objetivo buscado nos dois primeiros anos do Ensino Fundamental, de acordo com a BNCC (Base Nacional Comum Curricular). Entre 2019 e 2021, o número de crianças brasileiras entre 6 e 7 anos que não sabem ler e escrever aumentou 66,3%. Para que isso seja melhor compreendido, em 2019 era 1,4 milhão de crianças. Em 2021, houve aumento de 1  milhão e o número de crianças brasileiras entre 6 e 7 anos que não sabem ler subiu para 2,4 milhões. Os dados foram colhidos na última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), do IBGE, que  ainda identificou que entre crianças brancas e pretas/pardas há uma grande diferença na alfabetização. O número de crianças pretas e pardas que não sabiam ler em 2019 era de 28,8% e 28,2%, respectivamente.  Em 2021, o número subiu para 47,4 e 44,5. Entre as crianças brancas, no mesmo período, o número subiu de 20,3% para 35,1%.     

Continuidade

Independentemente do número de aprovações obtidas, o Programa Já É terá continuidade em 2022. As aprovações de 2022 têm e devem ser analisadas pela sua qualidade. Serão espelhos para outros alunos que vierem dispostos a encarar o desafio de alcançar uma instituição pública de ensino superior. 

Resiliência

No início do texto perguntamos sobre o que está por trás de uma aprovação no vestibular. As alunas aprovadas na Unesp e na USP falam sobre o nascer de um sonho, a batalha para se alcançar um objetivo e a emoção da recompensa. 

Quando e como se estabeleceu o seu sonho de chegar à faculdade? Que profissão você pensou em seguir e o que motivou isso? 

Jakeline Souza Lima –   Comecei a sonhar em entrar em uma universidade quando entendi a importância da educação em nossas vidas e que a educação pode ser uma ferramenta de libertação e de luta. Meus pais sempre me incentivaram a estudar, sempre me ajudaram nas lições de casa.  Eu decidi que realmente queria entrar na universidade quando percebi que meus pais já não estavam mais conseguindo me ajudar nos deveres, não por falta de tempo ou vontade, mas porque eles não tinham chegado naquele conteúdo e nem naquela série que eu estava. Ali eu entendi que precisava romper o ciclo de falta de acesso à educação, pois eles sempre precisaram trabalhar desde muito cedo. 

O curso que escolhi foi Licenciatura em Teatro. Eu decidi fazer teatro,  pois  comecei a sentir que todas as minhas opções anteriores não eram o que eu realmente queria e todas tinham algo em comum: uma tentativa inconsciente de me esconder. O teatro surgiu na tentativa de me provar que eu podia estar à frente das coisas, que não precisava me esconder. Fiz curso técnico em teatro na etec de artes e essa experiência só me fez ter certeza de que era isso mesmo que eu queria fazer para minha vida. Foi então que decidi o curso da faculdade. Também escolhi a licenciatura por uma questão de me abrir mais possibilidades de trabalho e porque eu amo muito o fato de poder ser professora e ensinar. Acho que ser professor é um ato artístico e político também.

Larissa Araujo Aniceto – O sonho de chegar à faculdade iniciou com o apoio de familiares, amigos e professores, ao identificar que as oportunidades seriam abrangentes para quando eu iniciasse a graduação. A profissão que seguirei é em Letras para, futuramente, ser professora de Português, porque acredito no poder de transformação da educação para o Brasil. 

Larissa Araújo Aniceto, aprovada na FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas) da USP

Karina Leal – Desde pequena fui incentivada aos estudos pelos meus pais, até para diminuir um problema de ansiedade decorrente de uma doença crônica de pele. Então,  a paixão pelo desenho e o esforço me levaram a escolher a  faculdade de Arquitetura e Urbanismo.

Quais as dificuldades para alcançar isso? 

Jakeline – As dificuldades foram ter que lidar com a falta de acesso à educação. Por ter estudado sempre em escola pública, eu  me vi numa defasagem gigante com os conteúdos do vestibular. A questão da pandemia também dificultou muito as aulas on-line, pois na minha casa eu tinha que me dividir em auxiliar meus pais, ajudar nas coisas de casa e estudar. Tinha dias que era bem difícil,  porque eles (meus pais) achavam que por eu estar em casa podia ser solicitada a todo tempo. Então,  foi bem complicado em alguns momentos. E uma das grandes dificuldades foi a persistência. Manter-me confiante durante todo o percurso de estudos,  porque vira e mexe eu sentia que não estava aprendendo nada e que não ia conseguir.  Chorava muito depois das aulas de exatas,  principalmente, porque tenho muita dificuldade e muitas vezes não conseguia entender. 

Larissa – Diversas dificuldades surgiram, tanto no âmbito socioeconômico como na questão de inteligência emocional. Mas todos foram amenizados com a minha rede de apoio.

Karina –  A rotina turbulenta de consultas médicas e os horários de trabalho dos meus pais trouxeram grande empecilho quanto à presença nas aulas. Porém,  essas dificuldades foram superadas pela minha família ter a noção da importância e das consequências positivas da educação.  

Como você chegou ao Já É ou o Já É chegou a você? 

Jakeline –  Uma amiga me indicou o Programa, pois sabia que eu estava querendo muito começar estudar,  mas que não tinha dinheiro para pagar um cursinho. Ela viu no instagram e lembrou de mim. No mesmo instante que ela me enviou a mensagem eu já fui correndo me inscrever.

Larissa – Conheci o Já É por meio de indicação de um colega e o Programa foi essencial para a minha aprovação, pois a equipe do Fundo Baobá é extraordinária e, com diversos incentivos, nos auxiliou a ingressar na universidade pública. 

Karina – O programa Já É chegou até mim por meio de uma prima que estava me ajudando a encontrar uma bolsa em um cursinho, já que procurava uma forma de diminuir o impacto da pandemia no meu ensino.

Karina Leal, aprovada na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP

Conte sobre sua emoção ao ver seu nome na lista de aprovação do vestibular? 

Jakeline – Eu fiquei muito emocionada, muito mesmo, principalmente porque além da aprovação eu fui aprovada em 8º lugar. Apesar de ser só um número, significou muito pra mim essa colocação. Também significou muito a minha nota na prova de habilidades, porque apesar de ter uma certa experiência na área eu ainda sou muito insegura e ter a maior nota em habilidades também significou muito para mim enquanto artista.

Larissa – A emoção de ser aprovada no vestibular foi semelhante à de ser aprovada no Já É: muita felicidade e orgulho de toda a trajetória que está sendo construída. 

Karina– Saber que eu fui aprovada no curso desejado e na primeira tentativa de entrar na USP trouxe muita felicidade para mim e para todas as pessoas que me apoiaram nessa jornada árdua, que teve como agravante a pandemia. Porém, com os diversos auxílios da Baobá esse problema conseguiu ser revertido.

O que você espera para seu futuro?

Jakeline – Eu espero aproveitar todas as oportunidades que a universidade me proporcionar. As aulas nem começaram e eu já tenho sentido como a universidade abre um leque gigante de possibilidades. Eu espero criar e estabelecer relações, fazer contatos, aprender muito. Eu espero conseguir fazer intercâmbio por meio da faculdade  e começar a dar aula. Quero muito trabalhar com crianças e adultos. Nossa, eu espero muita coisa. Está sendo um sonho muito grande. 

Larissa – Para o futuro, desejo uma sociedade mais igualitária e que mais jovens possam ter acesso à universidades de excelência, assim como desejo o meu sucesso profissional e realização pessoal como professora de Português.

Karina – Eu desejo que eu continue perseverante e otimista, conseguindo ultrapassar barreiras e consolidar uma boa carreira como arquiteta.

Trajetória do Edital Quilombolas em Defesa: Vidas, Direitos e Justiça 

Comunidades quilombolas vulnerabilizadas pela pandemia da COVID-19 têm a oportunidade de fortalecer suas estratégias de resistência através de projetos selecionados em edital

Por Ingrid Ferreira

O edital Quilombolas em Defesa: Vidas, Direitos e Justiça lançado no dia 01 (um) de outubro de 2021, foi pensado e realizado pelo Fundo Baobá para Equidade Racial, em parceria com a Conaq (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas). Com objetivo de apoiar organizações quilombolas nas áreas de sustentabilidade econômica e geração de renda, soberania e segurança alimentar e defesa dos direitos quilombolas, o edital integra a Aliança entre Fundos e vai financiar os projetos de 35 organizações. Cada uma receberá o valor de R$ 30.000 (trinta mil reais), perfazendo R$ 1.050.000 (Um milhão e cinquenta mil reais).

No dia 01 de fevereiro aconteceu o primeiro encontro com as organizações selecionadas no edital, o evento contou com a participação dos donatários, do Diretor Executivo do Fundo Baobá, Giovanni Harvey,  e da Diretora de Programa, Fernanda Lopes, membros e membras da equipe de Programa, Administrativo-Financeiro e de Comunicação.

Segundo entrevista com representantes que tiveram seus projetos aprovados nos três diferentes eixos é possível verificar que a iniciativa irá agregar conhecimento e experiências para as organizações quilombolas que estão tendo a oportunidade de participar pela primeira vez de um edital em parceria com o Fundo Baobá, contribuindo no conhecimento em gestão de projetos. Como diz José Gaspar, Sócio da Associação Quilombola de Boa Vista Rosário no estado do Maranhão, inscrito no eixo 1 (Recuperação e sustentabilidade econômica nas comunidades quilombolas) do edital.

José Brandão Costa Gaspar – Sócio da associação quilombola de Boa Vista Rosário – MA

E José ainda ressalta que: “A ideia do edital é de grande relevância pois as comunidades Quilombolas na grande maioria não têm oportunidades de receber nenhum incentivo e  necessitam de reconhecimento pelos trabalhos desenvolvidos que, na grande maioria, são trabalhos hereditários das comunidades remanescentes de quilombo. Além de que as comunidades  integrantes do projeto proposto buscam valorização, igualdade de gênero e independência financeira”.

O projeto que será desenvolvido pela Associação Quilombola de Boa Vista do Rosário (MA), tem como objetivo o desenvolvimento social, cultural, ambiental e econômico do território quilombola de Boa Vista e adjacências, fortalecendo a produção agroextrativista e artesanal das famílias quilombolas. A organização tem mais de 11 anos e destinará as ações a produção culinária de bolos, doces e biscoitos com produtos do agroextrativismo, além da produção de Biojóias tendo como base o Coco babaçu.

No eixo 2 (Promoção da soberania e segurança alimentar nas comunidades quilombolas),  Evânia  Antonia  de Oliveira, artesã  e professora em sua comunidade e representante da Associação Quilombola de Conceição das Crioulas – AQCC, de Salgueiro, no Pernambuco, fala que o edital vai apoiar no fortalecimento do trabalho coletivo, na geração de renda das pessoas que residem do território. Segundo a líder, ao se engajar no projeto as pessoas terão acesso a informações e novos aprendizados.

Evânia Antonia de Oliveira Alencar – Artesã e professora – Associação Quilombola de Conceição das Crioulas – AQCC, de Salgueiro (PE)

O projeto ao qual Evânia responde, tem o intuito de garantir a segurança alimentar e o fortalecimento da perspectiva agroecológica quilombola: sendo baseado na produção agrícola associada a práticas ecológicas, éticas, culturais, econômicas, políticas e sociais. A organização tem cerca de 11 anos de formalização e possui o intuito de fortalecer e qualificar a produção de horticultura em quintais produtivos.

Mais contribuições nos foram dadas por Tatiana Ramalho, vice presidente da Associação dos Remanescentes de Quilombos de Alto Alegre e Adjacências (inscrito no eixo 3 – Resiliência comunitária e defesa dos direitos quilombolas), Para Tatiana “o edital nos trouxe a possibilidade de pensar em uma atividade para fortalecimento da identidade quilombola, pois nesse momento pandêmico e no processo das vacinas percebemos em alguns momentos que algumas pessoas têm dúvidas sobre nossa história, sobre o ser quilombola. E nesse sentido, o projeto apoiado pelo edital vai nos trazer a possibilidade de fortalecer através das narrativas, vivências, saberes e sabores as potencialidades do quilombo”.

Tatiana Ramalho da Silva – Vice presidente da Associação dos Remanescentes de Quilombos de Alto Alegre e Adjacências – Na cidade Horizonte (CE)

O projeto tem o objetivo de promover a igualdade racial em direitos para a população quilombola de Alto Alegre, buscando fortalecer juntamente com as comunidades do estado do Ceará a luta pela titulação dos territórios, elaborar e sugerir políticas inclusive de ações afirmativas, promover trabalhos e estabelecer estratégias para proporcionar desenvolvimento sócio econômico, educacional e cultural, além de proteção ao meio ambiente, aos saberes e fazeres quilombolas da comunidade, combatendo as ações racistas e discriminatórias. 

A organização possui mais de 11 anos e tem como proposta fortalecer a identidade quilombola com memórias, histórias, saberes, fazeres e sabores ancestrais, colocando as práticas que fortalecem as raízes africanas e afro-brasileiras; para além das especificidades que é de utilizar de rodas de conversas que ocorrem na comunidade para alcançar os objetivos citados acima.

O Fundo Baobá, o Fundo Brasil de Direitos Humanos e  o Fundo Casa Socioambiental que, juntos, constituem a Aliança entre Fundos, atuam em prol da justiça racial, justiça social e justiça ambiental. As ações da Aliança são financiadas pela Fundação Interamericana (IAF).  Os três, com editais independentes, têm o intuito de contribuir na redução dos impactos que as crises sanitária e econômica ocasionam nos povos indígenas, comunidades quilombolas e outros povos tradicionais mais vulnerabilizados pela pandemia da COVID-19. 

Primeiro Encontro com Organizações Selecionadas no edital Quilombolas em Defesa: Vidas, Direitos e Justiça

O evento online contou com a participação de lideranças quilombolas de todo o Brasil.

Por Ingrid Ferreira

No dia 01 de fevereiro aconteceu o primeiro encontro com as organizações selecionadas no edital Quilombolas em Defesa: Vidas, Direitos e Justiça, lançado pelo Fundo Baobá para Equidade Racial em parceria com a Conaq (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas) e com apoio da Fundação Interamerica (IAF). O encontro teve inicio com uma apresentação geral das pessoas presentes. Representantes das organizações selecionadas tiveram espaço para falar sobre suas funções e sobre os projetos que serão apoiados pelo Baobá.

O edital foi lançado no dia 01 de outubro de 2021, e tem como objetivo apoiar iniciativas de organizações quilombolas para promover a sustentabilidade econômica nas comunidades, a geração de renda, a soberania e a segurança alimentar, além da defesa  dos direitos quilombolas.

A premissa do edital é apoiar, ao longo de 2022, organizações lideradas e constituídas por quilombolas. Foram selecionadas 35 (trinta e cinco) iniciativas, que vão receber aporte financeiro de R$ 30.000 (trinta mil reais), perfazendo R$ 1.050.000 (Um milhão e cinquenta mil reais). Além disso, as organizações selecionadas contarão com investimentos indiretos por meio de assessoria e apoio técnico visando seu fortalecimento institucional.

Dentre os presentes, além dos donatários do edital, estavam o Diretor Executivo, Giovanni Harvey e a Diretora de Programa do Fundo Baobá, Fernanda Lopes, membros e membras da equipe de Programa, Administrativo-Financeiro e de Comunicação. O encontro teve início com todos os participantes apresentando-se, sendo que os representantes das organizações selecionadas tiveram espaço para falar de suas funções e informações a respeito dos projetos que serão apoiados pelo Baobá.

Das propostas selecionadas 23 encontram-se na região Nordeste do Brasil, 7 no Sudeste, 2 no Centro-Oeste, 2 no Sul e 1 no Norte; sendo que, o eixo 1 de Recuperação e Sustentabilidade Econômica corresponde a 54% dos projetos inscritos. No eixo 2 de Soberania e Segurança Alimentar concentra-se 34% e no eixo 3, que é de Resiliência e Defesa de Direitos 12%. A maioria das organizações tem suas diretorias compostas por mulheres quilombolas cis ou trans, e há um certo equilíbrio de gerações, varias diretorias tem pessoas adultas e jovens.

A Diretora de Programa Fernanda Lopes falou sobre a importância das conexões, parcerias com as organizações e destacou o quão cara para o movimento negro e para o Baobá é a narrativa de resistência, e de apoio à ação, o que coincidiu profundamente com o depoimento dos donatários: muitos declararam que esta é a primeira vez que participam de um edital de apoio financeiro para seus quilombos. 

Em sua finalização, o evento contou com microfones abertos, para que os representantes e integrantes das organizações selecionadas pudessem expor suas dúvidas. Após dúvidas sanadas, Fernanda Lopes relembrou as regras e o passo a passo de como o edital irá transcorrer. Ela destacou que, ainda em fevereiro, terá inicio a jornada formativa e, em seguida, as organizações irão assinar o contrato e receber a primeira parcela.

Edital Negros, Negócios e Alimentação: Confira a lista com os classificados da primeira etapa 

O Fundo Baobá para Equidade Racial divulga hoje (terça, 08) a lista de propostas aprovadas para a 2a fase do processo seletivo do edital Negros, Negócios e Alimentação. O edital é específico para a região metropolitana de Recife e foi lançado na segunda quinzena de novembro de 2021, com apoio da General Mills. 

O objetivo do edital Negros, Negócios e Alimentação é promover a recuperação econômica de negócios voltados para o ramo da gastronomia e, ao mesmo tempo, fortalecer as e os proprietários negros ou negras em sua atuação. A sustentabilidade de um negócio depende de fatores como planejamento, gestão, inovação, parcerias e outros. Porém, para que isso seja atingido, também é necessário promover o saber dentro dessas áreas e não apenas prover o apoio financeiro.

No que tange à promoção do saber, as pessoas negras  responsaveis pelos 12 (doze) negócios selecionados após as 3 (três) etapas classificatórias, irão participar de atividades formativas, além de mentorias e trocas de experiências com outros empreendedores e especialistas do setor da alimentação e do comércio. Cada um dos projetos receberá R$ 30 mil. 

Este edital voltado para o desenvolvimento econômico se mostra necessário frente à crise econômica, agravada durante este período de pandemia da Covid-19 que impactou, de forma negativa e severa, os negócios de alimentação comandados por negros e negras na região metropolitana de Recife,  composta pelas seguintes cidades: Jaboatão dos Guararapes, Olinda Paulista, Cabo de Santo Agostinho, Camaragibe, Abreu de Lima, Ipojuca, São Lourenço da Mata, Igarassu, Moreno, Itapissuma, Ilha de Itamaracá e Araçoiaba.

Para que o edital fosse conhecido e para que houvesse maior adesão por empreendedoras e  empreendedores locais, além das ações de mobilização comunitária que estavam sendo realizadas nos territórios, uma missão do Fundo Baobá foi deslocada até Recife, onde permaneceu por cinco dias promovendo encontros com comerciantes locais que tinham dúvidas sobre a forma de participar do edital. Para mobilizar empreendedores e empreendedoras negros e negras, obter visibilidade na mídia com ampla divulgação do edital Negros, Negócios e Alimentação, o Fundo Baobá contou com apoio da Retruco, agência de jornalismo independente, idealizada por jovens jornalistas, cineastas  e designers de Pernambuco. Dúvidas dirimidas, foram recebidas 60 inscrições. Para a segunda etapa do processo seletivo foram classificadas 46 propostas. A lista pode ser acessada neste link

 

Perfil das Propostas

As propostas selecionadas estão concentradas em 8 dos 14 municípios da Grande Recife e envolvem, prioritariamente, negócios liderados por mulheres ou pessoas de gênero feminino (76,08%), com  escolaridade que varia do fundamental incompleto à pós-graduação. Os negócios estão mais na zona urbana (97,82%) e alguns funcionam desde a década de 1970.

 

Município dos projetos selecionados para a 2ª Fase do Edital:

  • Recife – 29 (63, 04%)
  • Olinda – 8 (17,39 %)
  • Paulista – 2 (4,34%)
  • São Lourenço da Mata – 2 (4,34%)
  • Ipojuca – 2 (4,34%)
  • Cabo de Santo Agostinho – 1 (2,17%)
  • Camaragibe – 1 (2,17%)
  • Jaboatão dos Guararapes – 1 (2,17%)

 

Atuação no ramo alimentício do(a) empreendedor(a)  selecionades para a 2ª Fase do Edital:

  • Bares – 3 (6,52%)
  • Buffet, comida para festas e outros eventos – 7 (15,21%)
  • Comida por encomenda ou para entrega (delivery) – 25 (54, 34%)
  • Food trucks – 1 (2,17%)
  • Restaurantes – 7 (15,21%)
  • Delivery e na feira de orgânicos – 1 (2,17%)
  • Tapiocaria itinerante – 1 (2,17%)
  • Doceria e delicatessen – 1 (2,17%)

 

Próximas listas classificatórias

Seguindo o que determina o cronograma do edital Negros, Negócios e Alimentação, a lista com os classificados na segunda etapa será divulgada no dia 10 de março de 2022 após as 19 horas. A lista final, por sua vez, sairá em 31 de março, também após as 19 horas

Para acompanhar todas as atualizações e novidades do Edital Negros, Negócios e Alimentação, clique aqui.

Banco BV no Projeto de Recuperação Econômica

Tiago Soares, gerente executivo de sustentabilidade e patrocínios no BV  fala sobre a participação da instituição no Programa de Recuperação Econômica.

Por Ingrid Ferreira

O Programa de Recuperação Econômica de Pequenos Negócios de Empreendedores (as) Negros (as), criado em 2020 durante a pandemia, foi uma ferramenta de urgência que teve como objetivo apoiar nano e pequenos empreendedores(as) negros(as) que tiveram os seus negócios afetados pela pandemia da covid-19, em especial pelo lockdown que ocorreu na tentativa de barrar a disseminação do vírus.

Essa iniciativa do Fundo Baobá para Equidade Racial contou com apoio da Coca-Cola Foundation, Instituto Coca-Cola Brasil, Banco BV e Instituto Votorantim. Para além do apoio financeiro de R$30 mil por iniciativa (R$ 10 mil por empreendedor/a), as e os participantes tiveram formações sobre empreendedorismo, gestão e planejamento dos negócios, controle de finanças, marketing, precificação, entre outros temas, para auxiliá-los na administração de seus negócios. Na matéria Fundo Baobá divulga a Avaliação do Programa de Recuperação Econômica  de Pequenos Negócios de Empreendedores(as) Negros(as) é possível ver os resultados alcançados pelo Programa. 

Pensando em compreender um pouco mais a experiência das instituições que fazem o investimento social privado no segundo ano em que o mundo ainda se encontra nesta grave pandemia, o Fundo Baobá entrevistou Tiago Soares, gerente executivo de sustentabilidade e patrocínios no Banco BV, para compreender a visão de impacto adotada pelo BV nesta parceria para apoiar empreendedoras negras e empreendedores negros e estimular pequenos arranjos produtivos locais em todo o país.

Tiago Soares – Gerente Executivo de Sustentabilidade e Patrocínios no Banco BV

Ao ser questionado sobre o motivo do apoio do BV ao edital de Recuperação Econômica de Pequenos Negócios de Empreendedores Negros e Negras do Fundo Baobá, Tiago diz: “O propósito do BV é levar leveza para a vida financeira das pessoas. Por isso, entende que seu papel é ser viabilizador do sucesso de empreendedores que, com a ajuda do Baobá, estão oferecendo informação e subsídio e podem promover um país com menos desigualdade”. 

Tiago Soares também explicou que, recentemente, o BV anunciou publicamente o  projeto que carrega o nome: “Compromissos para um futuro mais leve 2030”. Segundo ele, esse projeto encontra-se alinhado aos pilares ESG (sigla usada para se referir às melhores práticas ambientais, sociais e de governança de um negócio), em que a instituição compromete-se com metas de inclusão social.

De forma muito responsável, o gerente executivo  faz uma ressalva valiosa ao afirmar que “a parceria do BV com a Baobá tem o poder de impactar a vida de muitas pessoas, não apenas dos empreendedores, mas de toda a comunidade de pessoas ao redor. O apoio vai auxiliar os empreendedores a ampliarem seus negócios, e em um futuro próximo geram novos empregos nas comunidades onde atuam”. Tiago acredita que o aporte financeiro oferecido no Programa de Recuperação Econômica tem esse intuito, de apoiar pessoas negras para que elas também possam apoiar as pessoas à sua volta e assim criar  uma corrente em que um possa apoiar o outro.

Além da parceria com o Fundo Baobá, o BV também conta com outro projeto, lançado no ano de 2021,  o Edital Cultural , que tem como objetivo selecionar projetos que fomentem as produções culturais criadas e realizadas por mulheres negras de todo o Brasil: “O edital prioriza iniciativas das regiões norte e nordeste a fim de, não só ampliar as possibilidades de acesso a uma cultura mais representativa e diversa, mas também produzir desenvolvimento social por meio da produção e acesso à cultura de e para populações em situação de vulnerabilidade social e econômica”, afirma. 

Ainda sobre o Programa de Recuperação Econômica, Tiago Soares finaliza falando sobre como o edital do Fundo Baobá se alinha aos  ideais do BV: “Tanto pelo fato de que, cada projeto apoiado, precisava ter pelo menos 3 pessoas empreendedoras envolvidas, reforçando assim alguns dos princípios do BV, como o de ser correto e parceiro. Além de atender à  pauta de dar visibilidade a pessoas negras”, finaliza.

Inscrições para o edital Negros, Negócios e Alimentação serão encerradas nesta quinta-feira, 27 de janeiro

As inscrições do edital Negros, Negócios e Alimentação se encerram hoje, dia 27 de janeiro, às 17 horas. O edital é voltado para empreendedores (as) negros (as) do ramo da alimentação no Recife. Esta será a última oportunidade para que os empreendedores interessados possam se inscrever. O projeto do Fundo Baobá para Equidade Racial tem apoio da General Mills, empresa global de alimentos dona de marcas como Yoki, Kitano e Häagen-Dazs no país.

O edital foi lançado em novembro de 2021, com o intuito de contribuir para a recuperação econômica de negócios do ramo da gastronomia, voltado para os empreendedores e empreendedoras negros(as) e vai contribuir para a ampliação de suas capacidades de planejar, fazer gestão, inovar, ampliar ou estabelecer uma infraestrutura mínima para sustentabilidade de seus negócios.

Os inscritos devem ser empreendedores(as) negros(as) do setor gastronômico, com 18 anos ou mais, que tenham negócio instalado e em funcionamento há 3 anos ou mais, que trabalhem com alimentação de consumo imediato, como almoços, jantares, salgados, bolos, pratos típicos e regionais, dentre todas as opções de cardápio; empresários que trabalhem com  food truck, comida de rua e que sejam ambulantes também podem participar.

Os empreendimentos devem estar localizados no estado de Pernambuco, nas seguintes cidades: Recife, Jaboatão dos Guararapes, Olinda,  Paulista, Cabo de Santo Agostinho, Camaragibe, Abreu de Lima, Ipojuca, São Lourenço da Mata, Igarassu, Moreno, Itapissuma, Ilha de Itamaracá e Araçoiaba. As propostas apresentadas por mulheres negras cis ou trans e de empreendedores(as) negros(as) que nunca foram apoiadas(os) pelo Fundo Baobá para Equidade Racial serão priorizadas.

Os selecionados receberão um aporte financeiro de R$ 30 mil, além de assessoria e suporte técnico, e terão 09 (nove) meses para executar os seus projetos  e apresentar a prestação de contas final.

Os interessados podem se inscrever através do link oficial do edital na página do Fundo Baobá, onde encontram-se os critérios de elegibilidade do programa. Ressaltando que a regra da obrigatoriedade de ter CNPJ foi retirada, como consta na matéria Fundo Baobá altera regras de edital de apoio a empreendedores negros da alimentação na Região Metropolitana do Recife.

Realizadores

Criado em 2011, o Fundo Baobá para Equidade Racial é o primeiro e único fundo dedicado, exclusivamente, para a promoção da equidade racial para a população negra no Brasil. Orientado pelos princípios de ética, transparência e gestão, mobiliza recursos financeiros e humanos, dentro e fora do país, e investe em iniciativas da sociedade civil negra para o enfrentamento ao racismo e promoção da justiça social.

A General Mills é uma empresa líder global em alimentos e trabalha “fazendo os alimentos que o mundo ama”. Com sede em Minneapolis, Minnesota, EUA, a companhia chegou ao Brasil em 1997. Em novembro de 2020, assumiu publicamente o compromisso de ser um instrumento importante de mudança promovendo iniciativas práticas para equidade racial. Ao reconhecer que o racismo deixa marcas todos os dias em diversas sociedades, há séculos, a empresa se mobiliza e busca contribuir para os avanços em políticas de inclusão e, sobretudo, de preservação da vida de pessoas negras.

Fundo Baobá altera regras de edital de apoio a empreendedores negros da alimentação na Região Metropolitana do Recife

Por Eduarda Nunes e Luane Ferraz

O Fundo Baobá, em parceria com a General Mills, comunica a alteração da regra da exigência de CNPJ ativo até 2019 para a validação da inscrição do empreendedor no edital “Negros, Negócios e Alimentação”. A mudança se dá devido aos avanços da Covid-19, influenza e Ômicron em Pernambuco e em todo o país e, por consequência, o agravamento da vulnerabilidade econômica para empreendoras negras  e empreendedores negros.

Com a mudança, qualquer pessoa negra que tenha um empreendimento, instalado e em funcionamento há 3 anos ou mais, na área de alimentação, gastronomia e culinária, no Recife e região metropolitana, seja de maneira formal ou informal,  torna-se apta para a seleção.

Além disso, entre os próximos dias 20 (19h às 21h), 21 (9h às 12h) e 24 (9h às 17h), as pessoas interessadas podem se dirigir ao Hotel Central (Av. Manoel Borba, 209 – Boa Vista) para tirar dúvidas e se inscrever com apoio da equipe executiva do Fundo Baobá.

Em função da pandemia, esta é a primeira atividade presencial da instituição  para divulgação de um edital,  desde setembro de 2019. Na estadia em Recife, a direção do Fundo Baobá se encontrará com lideranças locais e potenciais candidatos ao  edital vigente, além de pessoas e organizações que já foram apoiadas pelo Baobá em editais passados.

A visita marca também o retorno à cidade que foi o local de origem e a primeira sede do Fundo Baobá para Equidade Racial.

A iniciativa

Pensando em contribuir na recuperação econômica desses negócios e promover às empreendedoras e  empreendedores negros uma ampliação de suas capacidades de planejar e fazer gestão, esta iniciativa do Fundo Baobá, em parceria com a General Mills, vai apoiar 12 (doze) empreendimentos negros do ramo de alimentação de consumo imediato, instalados e em funcionamento há 3 anos ou mais na Região Metropolitana de Recife.

As empreendedoras e empreendedores selecionados receberão um aporte financeiro de R$ 30.000 (trinta mil reais), além de assessoria e suporte técnico. Terão 8 (oito) meses para executar os seus projetos  e 30 dias para apresentar a prestação de contas final. Ou seja, o projeto terá duração de 9 meses.

Serão priorizadas propostas que envolvam negócios da gastronomia negra, formalizados (com CNPJ) e aqueles situados em Recife, Jaboatão dos Guararapes, Olinda, Paulista, Cabo de Santo Agostinho e Camaragibe, dado que estas cidades concentram 90% dos negócios deste setor. Além de inscrições feitas por mulheres negras cis ou trans e de empreendedores(as) negros(as) que nunca foram apoiadas(os) pelo Fundo Baobá para Equidade Racial.

Para as pessoas negras que empreendem, o ramo alimentício está entre as 10 áreas de maior presença no mercado. Entretanto, com a crise econômica agravada pela pandemia da Covid-19, muitos pontos de venda fixos foram impactados negativamente, em especial os negócios formalizados (com CNPJ), cujos donos eram mulheres ou pessoas com idade entre 35 e 54 anos.

Inscrições

As inscrições para o edital Negros, Negócios e Alimentação estarão abertas até o próximo dia 27 às 17h. Pessoas interessadas devem preencher o formulário eletrônico disponível exclusivamente neste link.  

Vale lembrar que o processo de seleção contará com três etapas eliminatórias. O resultado final será divulgado no dia 31 de março de 2022, após as 19h, no site oficial do Fundo Baobá (baoba.org.br). 

Para entender melhor os critérios de elegibilidade do programa, basta acessar o edital através deste link

Fundo Baobá divulga a Avaliação do Programa de Recuperação Econômica  de Pequenos Negócios de Empreendedores(as) Negros(as)

Por Jessica Moreira

A população negra sempre empreendeu. Diante de tantos desafios e do próprio racismo estrutural, precisou aprender na prática como criar seus próprios negócios, mesmo sem incentivos ou políticas públicas que dessem conta de tantas necessidades.

Negros e negras são protagonistas quando o assunto é inovação e jeito de empreender. Com modelos de negócios que realmente impactam as comunidades onde estão inseridos, fazem a diferença com formatos mais circulares e comunitários que fogem da lógica capitalista tradicional.

Mas será que, em meio à pandemia, esses empreendedores conseguiram manter seus negócios ativos? Quais foram os maiores desafios? Quais foram as políticas de incentivo criadas ou não para apoiar esses líderes de negócios que atuam nas comunidades que foram as mais impactadas pela pandemia?

Pensando nos mais diversos desafios que se apresentavam e que ainda se estendem em todo o país, o Fundo Baobá para Equidade Racial, em parceria com Coca Cola Foundation, Instituto Coca Cola Brasil, BV e Instituto Votorantim, lançou em novembro de 2020 o Programa de Recuperação Econômica de Pequenos Negócios de Empreendedores(as) Negros(as).

Junto ao Fa.vela — um hub de educação e aprendizagem empreendedora, inovadora, digital e inclusiva — acompanhamos 46 iniciativas e 137 empreendedores de todo o Brasil durante todo o ano de 2021, e as mesmas receberam o apoio financeiro de R$30 mil por iniciativa.

Com consultorias, oficinas e processos de troca e aprendizagem de modo virtual, entendemos a potência de apoiar financeiramente esses empreendimentos, chegando ao fim de 2021 celebrando a permanência desses pequenos negócios, que não só fortalecem o ecossistema do afroempreendedorismo no Brasil, como também de todas as territorialidades onde atuam.

Por que apoiar empreendimentos negros?

Com uma vasta diversidade de negócios, podemos notar mais uma vez as potências criativas que vêm das bordas, tanto das cidades quanto do campo, entendendo que apoiá-las e incentivá-las a crescer também é uma forma de pensar a autonomia financeira da população negra, que ainda sofre com o racismo em nosso país.

Mais da metade da população brasileira é negra, composta por cerca de 56% de pretos e pardos. Desses, o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) estima que, pelo menos, 14 milhões sejam empreendedores. Um mercado que chega a movimentar anualmente até 1,73 trilhão da economia do país.

Com a pandemia, todo o ecossistema de negócios foi abalado. A Pesquisa Global Entrepreneurship Monitor (GEM 2020), realizada no Brasil em parceria com o Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) e o IBPQ (Instituto Brasileiro de Qualidade e Produtividade),  mostrou que, de 2019 para 2020, o número de empreendedores no Brasil caiu de 53,4 milhões para 43,9 milhões.

Mas se tem um nicho que sofreu ainda mais, esse com certeza foi o dos pequenos empreendedores, principalmente negros e periféricos:

A pesquisa “O impacto da pandemia de coronavírus nos pequenos negócios”, desenvolvida pelo Sebrae em parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV) com 7.403 empresários, em junho de 2020, mostra que os negócios liderados pela população negra foram os mais impactados, principalmente por atenderem essencialmente de modo presencial (45%). Entre os brancos, a proporção foi de 36%.

De todos os entrevistados, 70% dos negócios eram conduzidos por negros que moravam em municípios onde ocorreram o fechamento parcial ou total dos estabelecimentos. Neste cenário, a maioria era jovem, mulheres e com baixo nível de escolaridade.

O necessário isolamento para frear o novo coronavírus veio cheio de dificuldades para a manutenção dos próprios negócios. A mesma pesquisa aponta que 46% dos empreendimentos conduzidos por negros tiveram que interromper temporariamente seu funcionamento.

Em meio a um cenário de crise, empreendedores negros ainda tiveram mais recusa na hora de pedir empréstimo (61%) quando comparado aos brancos (55%), mesmo o valor solicitado por negros (R$28 mil) sendo 26% mais baixo do que de brancos (R$37 mil).

Levando todo esse cenário em consideração, nosso objetivo com o Programa de Recuperação Econômica foi apoiar empreendedoras e empreendedores negros das periferias a atravessar esse momento de crise causado pela pandemia da Covid-19.

Ao final do programa, realizamos um processo de avaliação de resultados, com objetivo de contar como essas mulheres e homens, distribuídos por todos os cantos do Brasil, estão fazendo a diferença em seus territórios. Mesmo diante de uma crise também econômica, eles continuam girando a economia local, além de multiplicarem seus saberes e serviços a outros e novos empreendedores.

Caminhos da avaliação

Para chegar aos resultados do programa, contamos com o apoio de uma consultoria externa, a Janela 8, e percorremos alguns caminhos em conjunto com apoiadores, executores e participantes do programa. O primeiro passo foi a análise de informações e documentos coletados durante o programa, como o levantamento das inscrições e demais bases de dados de participantes nos processos produtivos, relatórios narrativos e prestação de contas elaboradas pelos próprios empreendedores e empreendedoras.

Os relatórios elaborados pelo Hub Fa.vela também foram importantes referências para chegarmos ao detalhamento da avaliação, e também para definir os principais pontos de transformação desejados pelo programa por meio de uma Teoria da Mudança.

A Teoria da Mudança permitiu delimitar o impacto desejado do programa: a promoção de uma vida digna a sujeitos e famílias negras por meio da melhoria de suas condições financeiras. Além disso, foram destacados os principais resultados, produtos, intervenções e público-alvo, bem como as premissas da realização do Programa.

A partir daí, foram realizadas entrevistas com stakeholders e grupos de escutas com participantes do programa. Os dados e informações coletados foram analisados e consolidados em um relatório completo e em um resumo executivo (disponível para download aqui).

Perfil dos participantes

“Não existem editais que apoiam o nordeste e a população negra”, foi uma frase recorrente no processo de avaliação do programa.

Entendendo a importância da diversidade geográfica e a realidade das iniciativas localizadas na região norte e nordeste, com apoio aquém do que necessitam, o Programa de Recuperação Econômica priorizou essas regiões na seleção de empreendedores(as).

O Nordeste é o local onde estão concentradas a maioria das iniciativas selecionadas, com destaque para a Bahia (37%). Falar em território neste momento de pandemia é lembrar que a Covid-19 não afetou as populações apenas nos mais altos picos da doença, mas também economicamente, inclusive na pós-primeira onda da doença.

Com o desemprego batendo recordes em 2021, muitas pessoas precisaram recorrer a trabalhos informais ou, então, erguer seus próprios meios de sobrevivência e sustentabilidade. O programa foi importante por apoiar negócios de pessoas que trabalham principalmente sozinhas (44%) ou com suas famílias (31%). Além disso, mais de 60% dos empreendimentos apoiados empregavam pelo menos 1 (uma) pessoa na sua atividade (de maneira informal ou formal) ao longo da execução do Programa.

Mulheres negras: lideranças de negócios

Selecionamos 46 iniciativas compostas por três empreendedores e empreendedoras negras em todo o Brasil, contemplando ao todo 137 empreendedores(as). A principal faixa etária de participação está entre 25 e 35 anos (43%), seguida de pessoas que têm entre 36 e 50 anos (36%). Mais da metade dos empreendimentos (56%) é formado unicamente por mulheres, mostrando como o programa impactou principalmente as mulheres negras.

Já em relação à escolaridade houve uma distribuição importante entre pessoas com diferentes níveis de formação: 25% possui ensino médio completo, 24% superior incompleto e 26% superior completo.

Empreendedorismo a partir das periferias

Dentre os negócios apoiados pelo programa, a maioria se enquadra em quatro segmentos:

alimentação (19%), artesanato (13%), agricultura (12%), costura (12%) e beleza (8%). O Programa também apoiou iniciativas nas áreas de moda e vestuário, turismo, saúde, comunicação, cultura e eventos, educação, pesca e prestação de serviços.

As iniciativas contempladas estão localizadas essencialmente em áreas urbanas (73%) e nas periferias (77%), mostrando a importância, mais uma vez, dos negócios locais.

Estar nas periferias também simbolizou um desafio, diante das longas distâncias, já que algumas iniciativas optaram pelo formato de delivery, exigindo pensar meios de transporte para essas entregas, como podemos ver neste depoimento.

“A gente já tinha dado início ao empreendimento e o projeto deu um incentivo pra gente dar continuidade. Nesse tempo de pandemia tivemos que dar uma pausa no atendimento por conta das aglomerações. A gente teve que pausar 1 ano e meio. Surgiu outra ideia que a gente teve pra não ficar totalmente parada. A gente teve a ideia de entregar bolo, mas a cidade fica a 13 km da nossa comunidade. O projeto surgiu em uma hora de um grande desafio, aprimorou a iniciativa.

O impacto nas comunidades

Os empreendedores se relacionaram com suas comunidades das mais diferentes formas, seja pela disseminação de conteúdo, pelo compartilhamento dos aprendizados adquiridos ao longo do programa ou, então, apoiando a doação de cestas básicas diante da insegurança alimentar que se impôs em todo o território brasileiro em meio à crise sanitária.

Segundo os relatos dos empreendedores, ao menos 16% afirmam que suas comunidades são um importante público consumidor. Além disso, 27% dos negócios geram empregos no território, como podemos notar ao ouvir alguns relatos como este: “Conseguimos dar mais visibilidade, aumentar a mão de obra e aumentar o espaço. Com o espaço maior, deu mais visibilidade e atraiu mais público. Fez muita diferença. Hoje nossa iniciativa tem mais condições de receber o público que a gente tá recebendo hoje. Conseguimos também ajudar mais gente na comunidade”, apontam.

O programa foi um grande fomentador do sentimento de pertencimento em relação à comunidade, uma vez que havia incentivo para olhar ao redor e pensar o negócio por meio da população local, além de fortalecer os próprios territórios, como diz uma das empreendedoras: “Para nós, é importante o impacto das nossas atividades e empreendimentos para a comunidade, pois acreditamos que podemos crescer juntas. Sendo assim, realizamos oficinas, formações, rodas de conversa aprimorando as técnicas de cada empreendedora e dialogando o saber com a comunidade.”

Achados e potências do programa

Da chegada ao programa até o processo de avaliação, os empreendedores negros e negras foram adquirindo diversos aprendizados, capazes de garantir a sobrevida de seus negócios e também ampliar o impacto que já tinham em seus locais.

Segundo as próprias lideranças dos negócios, 3.020 pessoas que vivem nas comunidades próximas aos projetos foram indiretamente beneficiadas, já que o programa fomentou positivamente o espírito de pertencimento às comunidades onde estão inseridos e incentivou a realização de ações locais.

De todo o programa, os processos formativos foram o coração da jornada. No total, foram 447 horas dedicadas a aprender, sendo 282 dessas dedicadas às mentorias customizadas a cada negócio.

Sendo as periferias espaços já conhecidos de partilha de conhecimento – prática herdada pela experiência vivida em comunidade por quilombos e territórios indígenas –, no programa essa experiência de dividir os aprendizados também ficou evidente nos depoimentos colhidos.

Empreendedores narraram a realização de ações de disseminação de conteúdo e recursos para as comunidades onde estão inseridas, o que colaborou nessa ampliação em maior escala do programa, fortalecendo também os laços dos negócios, especialmente entre as mulheres negras.

As mentorias também foram benéficas para ampliar o entendimento sobre os projetos, definir prioridades, tirar dúvidas e também realizar planejamentos de mais longo prazo, já que o programa muniu essas pessoas de ferramentas sobre a prática empreendedora.

De acordo com relatos dos participantes, 69% declaram que superaram os principais desafios que tinham no início do programa. Além disso, houve um aumento de em 22% na formalização de negócios.

Tudo isso se deu a partir da ampliação da consciência sobre a importância de elementos-chave para a manutenção e continuação do negócio, como documentação, prestação de contas e planejamento de comunicação.

Muito além do programa: subjetividades em construção

Se há um elemento que atravessou toda a sociedade brasileira em meio à pandemia, isso com certeza foi o acesso à internet. Seja para estar próximo da família ou dos amigos ou, então, para acessar direitos básicos, como o Auxílio Emergencial, a internet se mostrou fundamental.

O país, no entanto, ainda possui um grande desafio quando falamos em acesso, principalmente em territórios mais afastados das regiões centrais. Esse cenário não foi diferente quando olhamos para a realidade dos empreendedores contemplados no programa.

Pelo menos 82% deles afirmam que, com o programa, conseguiram superar os desafios e inseriram seu negócio no universo virtual, fazendo da inclusão digital um dos grandes ganhos do programa, já que era permitido investir em compra de computadores ou pontos de internet.

É possível entender a importância do programa ao ouvir os próprios empreendedores. “Não tínhamos perspectiva de nada. Tínhamos um negócio que começava aos poucos. Com o edital eu fiquei um tempão sem acreditar no que tinha acontecido. Compramos matéria prima, equipamentos que tínhamos necessidade”.

Os desafios das mulheres negras que empreendem

Quando falamos em empreendedorismo, é importante lembrar que, mesmo cheia de criatividade e ótimas ideias, a população negra ainda enfrenta desafios estruturais para acessar o mercado do empreendedorismo.

Esse fato também pôde ser notado durante a realização do projeto, diante do fato de que muitas pessoas não conseguiam se dedicar integralmente ao seu negócio, pois precisavam complementar a renda das mais diversas formas, não sobrando tempo para focar no seu projeto pessoal. Dos empreendedores e empreendedoras apoiados, 53% tinham no empreendimento uma fonte de renda complementar e para 47% o negócio era a principal fonte de renda. De alguma forma, o programa também conseguiu apoiar essas pessoas, que em alguns casos estavam quase desistindo de investir tempo em suas ideias.

Sobre isso, elas refletem a respeito das dificuldades de viver do próprio negócio. “A gente sabe que mulheres negras empreendendo, muitas vezes a gente tá ali tentando fazer com que nosso negócio se torne nossa fonte de renda principal, mas a gente tem outras relações empregatícias para conseguir complementar a renda”.

Saúde Mental e Autoestima da população negra

A saúde mental e a autoestima das mulheres negras também são impactos não mensurados que valem nota, pois dizem sobre o fortalecimento pessoal dessas lideranças e a possibilidade de darem continuidade aos seus projetos com autonomia.

“Não acreditávamos que um projeto poderia visar pessoas negras e pobres sem querer nada em troca. Não acreditávamos que teríamos visibilidade”, é o que diz uma das empreendedoras ouvidas.

Ao ouvirmos o público apoiado pelo projeto, a questão racial também esteve em evidência. Para eles e elas, o programa foi um modo de, mais uma vez, refletir sobre os preconceitos raciais que vivenciam enquanto pessoas negras inclusive para empreender, tornando-se um limitador do próprio trabalho.

Para uma delas, se existe um jeito de “bater na cara do sistema” é quando mulheres negras conseguem mostrar suas capacidades. “É quando a gente coloca a cara a tapa e prova que é possível, principalmente nós, mulheres, negras, jovens, rurais, quilombolas. Tem toda uma bagagem que está fora do padrão de uma sociedade preconceituosa do jeito que é a nossa”, aponta.

Impacto e processo de aprendizagem contínua

Mais do que recursos financeiros, fica confirmada a importância de munir os empreendedores de ferramentas que os possibilitem continuar seus negócios, mesmo depois do fim de recursos iguais aos do programa.

“O edital não dava só o dinheiro, ensinava também como seguir, mostrava outros caminhos”, apontaram alguns dos empreendedores ouvidos e ouvidas.

Mostrar caminhos de autonomia, principalmente financeira, e formas de empreender que deem continuidade à ideia central é um jeito de continuar impactando tanto os empreendimentos, quanto as próprias comunidades. Dentre os cursos preferidos, estão aqueles ligados a questões financeiras, além de vendas e marketing digital. Pelo menos 68% dos participantes declararam ter aprendido com o programa.

“O dinheiro era uma coisa que nos faltava. Ter um edital que nos possibilitasse  movimentar de alguma forma era muito bom. Quando descobrimos que ainda ia ter os processos formativos, isso casava muito com aquilo que a gente já vinha conversando. O projeto já veio com um pacote completo. Foram os três percursos ideais que a gente nem esperava, mas vinha no pacote.

Reflexões finais

O programa atendeu uma demanda real de aumento de vulnerabilidade do pequeno e nano empreendedor, causada pelo agravamento da pandemia, podendo perceber que, mesmo o objetivo sendo a recuperação econômica, o projeto também teve impactos indiretos e pessoais para cada pessoa selecionada.

Mesmo não sendo possível mensurar como os recursos financeiros irão continuar colaborando para a manutenção dos negócios, com o fim do programa, é possível dizer que as mentorias e consultorias fortaleceram principalmente os empreendedores e empreendedoras com conhecimentos essenciais para continuarem seguindo com seus empreendimentos.

Destacamos que é sempre importante considerar os aspectos de desenvolvimento de capacidades e habilidades pessoais, pois esses se mostram os maiores destaques ao final do projeto, influenciando também na continuidade das atividades empreendedoras pós intervenção.

Destacamos alguns dos maiores resultados:

# 46 iniciativas e 137 empreendedores(as)  impactados diretamente

# 3.020 pessoas ligadas às comunidades dos empreendimentos foram impactadas indiretamente, com 77% das iniciativas concentradas nas periferias.

# 88% dos empreendedores afirmaram utilizar parte do recurso para aquisição de equipamentos eletrônicos para participação nas atividades virtuais do programa

# 40% dos gastos incluídos na categoria outras despesas estão relacionados a cursos e/ou consultorias técnicas para apoio aos negócios, o que demonstra como esses e essas empreendedoras estão pensando em seus negócios também a médio e longo prazo.

# Pelo menos 68% dos participantes declararam ter aprendido com o programa. Foram 447 horas de formação, sendo 282 dessas dedicadas às mentorias customizadas a cada negócio.

# 69% dos(as) empreendedores(as) superaram os principais desafios que tinham no início do programa.

# Houve um aumento de em 22% na formalização de negócios.

# Pelo menos 82% deles contaram que, com o programa, conseguiram superar os desafios e inseriram seus negócios no universo virtual.

# 78% adquiriram matéria-prima e realizaram aquisição ou manutenção de equipamentos.

# 75% compraram de fornecedores(as) da comunidade e 57% declararam  que a clientela aumentou consideravelmente.

# O Edital do Fundo Baobá foi, para muitos, a primeira oportunidade de mobilização de recursos externos, impactando na autoconfiança dos participantes.

# As falas de fortalecimento entre mulheres negras apareceram espontaneamente no processo de avaliação, mostrando a importância de ações de ampliação de autoestima e autoconfiança.

# A criação de redes de networking entre empreendedores de diferentes locais neste momento de crise pode ser encarada como um dos maiores ganhos subjetivos e qualitativos do projeto.

Fundo Baobá prorroga inscrições do edital Negros, Negócios e Alimentação, voltado a empreendedores negros do ramo da gastronomia no Recife

Edital vai apoiar com R$ 30 mil cada uma das 12 iniciativas que forem selecionadas. Inscrições reiniciam dia 06/01 e vão até 27/01

O Fundo Baobá para Equidade Racial, com o apoio da General Mills, anuncia a prorrogação das inscrições do edital Negros, Negócios e Alimentação, uma iniciativa que vai apoiar 12 (doze) empreendimentos negros do ramo da gastronomia de consumo imediato, formalmente instalados há 2 anos ou mais na Região Metropolitana de Recife.

Os interessados poderão se inscrever entre os dias  06 de janeiro e dia 27 do mesmo mês. Para entender melhor os critérios de elegibilidade do programa e se candidatar, basta acessar o edital através deste link.

As(os) empreendedores(as)  selecionadas(os) receberão um aporte financeiro de R$ 30.000 (trinta mil reais), além de assessoria e suporte técnico, e terão 09 (nove) meses para executar os seus projetos  e apresentar a prestação de contas final.

O edital é voltado para empreendedores(as) negros(as) do setor gastronômico, com 18 anos ou mais, que tenham negócio ativo e formalizado há mais de 2 anos (CNPJ aberto em 2019 ou antes), que trabalhem com alimentação de consumo imediato, como almoços, jantares, salgados, bolos, pratos típicos e regionais, dentre todas as opções de cardápio; empresários que trabalhem com  food truck, comida de rua e que sejam ambulantes, também podem participar.

Os negócios devem estar localizados no estado de Pernambuco nas seguintes cidades: Recife, Jaboatão dos Guararapes, Olinda Paulista, Cabo de Santo Agostinho, Camaragibe, Abreu de Lima, Ipojuca, São Lourenço da Mata, Igarassu, Moreno, Itapissuma, Ilha de Itamaracá e Araçoiaba. Sendo que propostas apresentadas por mulheres negras cis ou trans e de empreendedores(as) negros(as) que nunca foram apoiadas(os) pelo Fundo Baobá para Equidade Racial serão priorizadas. 

A iniciativa

Para as pessoas negras que empreendem, o ramo gastronômico está entre as 10 áreas de maior presença no mercado. Entretanto, com a crise econômica agravada pela pandemia do COVID-19, muitos pontos de venda fixos foram impactados negativamente, em especial, os negócios cujos donos eram mulheres.

Pensando em contribuir para a recuperação econômica desses negócios e promover aos empreendedores e empreendedoras negros(as) a ampliação de suas capacidades de planejar, fazer gestão, inovar, ampliar ou estabelecer uma infraestrutura mínima para sustentabilidade de seus  negócios, o Fundo Baobá, com o apoio da General Mills, empresa global de alimentos dona de marcas como Yoki, Kitano e Häagen-Dazs no país, promove o edital Negros, Negócios e Alimentação.

O objetivo do projeto é criar condições para que os empreendedores escolhidos conheçam a fundo os seus negócios e as suas capacidades a fim de gerar um impacto positivo em toda a comunidade, a partir da expansão dos seus empreendimentos e para que sejam, num futuro próximo, geradores de novos empregos por meio da ampliação dos serviços, aumento das vendas e crescimento de antigas e novas relações de negócios. Além disso, a iniciativa tem o intuito de fortalecer e ampliar a sua jornada de diversidade e inclusão étnico-racial no Brasil. 

Realizadores

Criado em 2011, o Fundo Baobá para Equidade Racial é o primeiro e único fundo dedicado, exclusivamente, para a promoção da equidade racial para a população negra no Brasil. Orientado pelos princípios de ética, transparência e gestão, mobiliza recursos financeiros e humanos, dentro e fora do país, e investe em iniciativas da sociedade civil negra para o enfrentamento ao racismo e promoção da justiça social.

A General Mills é uma empresa líder global em alimentos e trabalha “fazendo os alimentos que o mundo ama”. Com sede em Minneapolis, Minnesota, EUA, a companhia chegou ao Brasil em 1997. Em novembro de 2020, assumiu publicamente o compromisso de ser um instrumento importante de mudança promovendo iniciativas práticas para equidade racial. Ao reconhecer que o racismo deixa marcas todos os dias em diversas sociedades, há séculos, a empresa se mobiliza e busca contribuir para os avanços em políticas de inclusão e, sobretudo, de preservação da vida de pessoas negras.

Serviço

O quê? Prorrogação das inscrições do edital Negros, Negócios e Alimentação

Período: 06 de janeiro a 27 de janeiro às 17h

Inscrições: https://baoba.org.br/edital-negros-negocios-e-alimentacao/ 

Público-alvo: empreendedoras(es) negras(os) da área de alimentação de pronto consumo da região metropolitana do Recife com registro formal até 2019.

Confira a lista final das organizações selecionadas do edital Quilombolas em Defesa: Vidas, Direitos e Justiça

O Fundo Baobá para Equidade Racial definiu hoje (21/12) a lista de 35 (trinta e cinco) organizações aprovadas no edital Quilombolas em Defesa: Vidas, Direitos e Justiça. Lançado em setembro de 2021, o edital tem como propósito apoiar iniciativas e organizações quilombolas para promover a sustentabilidade econômica,  geração de renda, soberania e segurança alimentar, proteger e defender direitos quilombolas. O edital é uma iniciativa do Fundo Baobá para Equidade Racial em parceria com a Conaq (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas). O edital integra o conjunto de ações da Aliança entre Fundos por Justiça Racial, Social e Ambiental que reúne Fundo Baobá, Fundo Brasil de Direitos Humanos e Fundo Casa Socioambiental, todos membros da Rede de Filantropia para Justiça Social. As ações da Aliança são financiadas pela IAF (Fundação Interamericana). Este edital também conta com aporte financeiro do próprio Baobá. 

Os projetos selecionados foram avaliados pelo Comitê de Seleção composto por 3 representantes da Conaq,  2 especialistas indicadas pelo Fundo Baobá, e um membro de seu corpo de governança.  A avaliação foi feita com base nos critérios de relevância; coerência; consistência e sustentabilidade. 

Quem participou do comitê avaliador foi a coordenadora executiva da Conaq na Região Centro-Oeste, Sandra Braga, que ressaltou a importância da realização do edital Quilombolas em Defesa, como medida de fortalecimento para as comunidades: “O nosso povo está muito imbuído de melhorias e de fortalecimento. Então quando você vê e lê esses projetos, você compreende melhor a busca deste fortalecimento na base”.

Além da adesão e coerência com os eixos temáticos escolhidos, Braga aproveitou para exaltar a qualidade dos projetos apresentados: “Os projetos eram fantásticos, todos com muita qualidade, com muita propriedade, falando da sua ancestralidade e da sua cultura”.

Outra integrante do comitê selecionador, foi pedagoga e membro da Assembleia Geral do Fundo Baobá, Maria do Socorro Guterres que trouxe pontos importantes para o critério de seleção das projetos enviados: “Usamos a questão de estados com maiores contingentes de comunidades quilombolas, além do fator geracional e de gênero, pensando na paridade de gênero entre homens e mulheres. Outro ponto considerado para a seleção foi dos projetos que não tinham aporte financeiro de nenhum órgão”.

Foram selecionadas iniciativas das seguintes regiões do país:

23 Nordeste (65,73%) – Bahia, Ceará, Maranhão, Pernambuco, Piauí e Rio Grande do Norte

7 Sudeste (20%) – Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo

2 Sul (5,71%) – Rio Grande do Sul

2 Centro-Oeste (5,71%) – Mato Grosso e Mato Grosso do Sul

1 Norte (2,85%) – Pará

Acerca dos eixos temáticos propostos pelo edital, foram selecionados da seguinte forma:

Eixo 1. Recuperação e sustentabilidade econômica nas comunidades quilombolas – 19 propostas

Eixo 2. Promoção da soberania e segurança alimentar nas comunidades quilombolas – 12 propostas

Eixo 3. Resiliência comunitária e defesa dos direitos quilombolas – 4 propostas

“Trata-se de um edital diferenciado, pela primeira vez estamos atuando em parceria com a CONAQ e tem sido um grande aprendizado. O grupo das organizações selecionadas têm muita experiência: 74% têm 11 anos ou mais de atuação e, ainda assim, 66% não conta com outros financiadores neste momento. Vinte e nove por cento das organizações selecionadas têm coordenação composta por maioria feminina, 26% têm equilíbrio intergeracional entre os dirigentes e 3% são organizações cuja maioria da coordenação tem até 29 anos. Há muita potência, temos certeza que serão inúmeras as mudanças vivenciadas pelas pessoas, famílias e comunidades direta e indiretamente envolvidas e outras tantas mudanças nas organizações”, afirma Fernanda Lopes, diretora de programa do Fundo Baobá.  

Para as organizações  selecionadas na etapa final do edital Quilombolas em Defesa: Vidas, Direitos e Justiça, os próximos passos consistem em um encontro de orientação que será realizado em fevereiro de 2022, além de sessões de assessoria técnica para elaboração do plano de ação, orçamento, indicadores e metas para monitoramento e avaliação, previsto para o mês de março, e a assinatura do contrato e pagamento da 1ª parcela, previstos para a primeira quinzena de abril.

Confira agora a lista com as organizações selecionadas do edital Quilombolas em Defesa: Vidas, Direitos e Justiça.

Fundo Baobá divulga lista de propostas aprovadas para a última fase de seleção

O edital Quilombolas em Defesa: Vidas, Direitos e Justiça,  lançado em  setembro de 2021, tem o objetivo de apoiar iniciativas de organizações quilombolas para promover sustentabilidade econômica e geração de renda, soberania e segurança alimentar e proteção dos direitos quilombolas. Ele é uma iniciativa do Fundo Baobá para Equidade Racial em parceria com a Conaq (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas) e é financiado pela IAF (Fundação Interamericana).  O edital contou com 145 organizações inscritas, que participaram da primeira seleção do projeto, que teve 116 iniciativas aprovadas para esta segunda etapa, cuja lista foi divulgada em  5 de novembro. 

As propostas selecionadas foram avaliadas por 11 especialistas: 06 indicados pela CONAQ e 05 indicados pelo Fundo Baobá, vindos de diferentes lugares do país e com experiência em cada um dos eixos temáticos do edital. A avaliação foi feita  com base nos critérios de relevância; coerência; consistência e sustentabilidade. A pontuação máxima que poderia ser atingida nesta etapa foi de 50 pontos. Propostas que atingiram 25 pontos ou menos foram eliminadas. As e os especialistas que fizeram a análise do material recebido recomendaram ao comitê organizador 76 propostas a serem analisadas na terceira e última etapa do processo seletivo. 

Foram selecionadas iniciativas das seguintes regiões do país:

48 Nordeste (63,15%)
17 Sudeste (22,36%)
07 Sul (9,21%)
03 Centro-Oeste (3,94%)
01 Norte (1,31%)

Acerca dos eixos temáticos propostos pelo edital, foram selecionados da seguinte forma:

Eixo 1. Recuperação e sustentabilidade econômica nas comunidades quilombolas – 41 propostas

Eixo 2. Promoção da soberania e segurança alimentar nas comunidades quilombolas – 24 propostas

Eixo 3. Resiliência comunitária e defesa dos direitos quilombolas – 11 propostas

Entre as 76 iniciativas selecionadas para a próxima fase do edital, 48,68% das organizações contam com a maioria da sua coordenação composta por mulheres. 34,21% das organizações têm equilíbrio intergeracional entre os dirigentes, enquanto 6,57% são organizações cuja maioria da coordenação tem até 29 anos.

As organizações selecionadas para a terceira e última fase do Edital Quilombolas em Defesa terão as suas propostas avaliadas por um comitê composto por outro grupo de especialistas e membros da governança do Fundo Baobá. Será de responsabilidade do comitê selecionar as 35 (trinta e cinco) iniciativas que serão apoiadas pelo edital. As organizações selecionadas receberão assessoria técnica para a elaboração do planejamento detalhado do projeto (plano de ação, orçamento, indicadores e metas para o monitoramento e avaliação).

O resultado final do processo seletivo do Edital Quilombolas em Defesa: Vidas, Direitos e Justiça será divulgado no dia 16 de dezembro, após às 19h no site do Fundo Baobá.

Confira agora a lista com as organizações selecionadas para a terceira e última fase do edital Quilombolas em Defesa: Vidas, Direitos e Justiça.

Programa de Recuperação Econômica completa um ano

Duas iniciativas apoiadas pelo edital de Recuperação Econômica mudam a vida de empreendedoras e empreendedores e das pessoas ao redor delas  

Por Wagner Prado

Transformar (verbo transitivo). Significado: alterar, variar, tornar diferente do que era. Uma jornada de transformação depende de alguns fatores. Alguns deles, internos, pois dependem de vontade pessoal. Outros, externos, pois parte da disposição de outro, pessoa física ou jurídica, que propicia ferramentas de apoio ao  desenvolvimento de quem está precisando. 

Vamos abordar aqui exemplos de trajetórias de transformação. Transformação que atingiu não só aquelas e aqueles que querem empreender no Brasil, mas também todos os que são impactados pelas ações desses empreendedores. 

O momento de transformação, para muitos, teve início quando o Fundo Baobá para Equidade Racial lançou o edital Programa de Recuperação Econômica de Pequenos Negócios de  Empreendedores Negros e Negras, em novembro de 2020. A Coca-Cola Foundation, o Instituto Coca-Cola Brasil, o Banco BV e o Instituto Votorantim foram parceiros do Baobá nessa iniciativa, cujo objetivo foi apoiar pequenos empreendimentos liderados por pessoas negras, priorizando aqueles que fossem localizados em comunidades periféricas ou territórios em contexto de vulnerabilidade socioeconômica.

O Programa de Recuperação Econômica de Pequenos Negócios de Empreendedores Negros e Negras beneficiou 46 iniciativas, cada uma delas compostas por três parceiras ou parceiros. Não era necessário possuir o CNPJ (Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica), e cada uma das iniciativas recebeu R$ 30 mil (R$ 10 mil para cada empreendedor/empreendedora). Como premissa, o fato de não ser apenas um edital de transferência de recursos e sim uma oportunidade para promover também uma trajetória de aprendizado para que essas empreendedoras e esses empreendedores pudessem melhorar a gestão de seus negócios. 

Uma das 46 iniciativas beneficiadas pelo edital foi a Pescadoras Artesanais Beneficiárias e lntegradas, do Rio de Janeiro. As parceiras Luciana Oliveira Machado, Dayanna Barros de Souza Oliveira e Erlineia Barros de Souza Oliveira Viana decidiram promover ações que agregassem outras pescadoras como elas e, com isso, batalharem pela valorização do produto que vendem: o peixe. 

A primeira iniciativa do trio, conta Luciana Machado, foi dividir o aprendizado obtido no curso de formação realizado pela ong Fa.Vela e oferecido aos 137 empreendedores e empreendedoras que tiveram seus negócios selecionados  para esse edital. Segundo Luciana, o compartilhamento de informações e de aprendizado chegou a um número de 40 pessoas dos seguintes perfis:  adultos de 30 a 59 anos; idosos (60 ou +); negros (pretos e pardos); homens; mulheres; pessoas transgêneres; travestis e pessoas não binárias (que não se identificam nem como homem nem como mulher). 

A superação de desafios não foi esquecida. Fazer a melhor gestão do tempo e a falta do conhecimento tecnológico tiveram que ser superados. “Ter tempo para estarmos juntas e desenvolver nosso trabalho, além do domínio tecnológico, foi muito difícil para nós três. Superamos isso com as aulas do Fa.Vela e com as teorias passadas pelo Fundo Baobá”, afirmou Luciana. 

Para Dayanna Oliveira, parceira de Luciana Machado, incrementar a potencialidade de seu negócio era primordial. Para isso, um item se fazia muito necessário: um carro. Com ele, a possibilidade de, literalmente, alcançar outros públicos seria real. O recurso de R$ 10 mil recebido por ela tornou isso possível. “Além de ter investido na aquisição de computador, instalação de internet, um novo aparelho celular, mesa de trabalho para investir em atividades de publicidade, comunicação, divulgação, marketing e vendas, investi na compra de um carro para fazer as entregas do quiosque que mantenho. Antes, eu fazia as entregas de bicicleta”, disse. 

A terceira componente do Pescadoras Artesanais Beneficiárias e Integradas é Erlineia Barros de Souza Oliveira Viana. Ela conta que junto com Luciana e Dayana estão pensando em uma virada nos negócios. “Estou pensando em me juntar com as meninas em um só quiosque para trabalhar juntas. Eu aprendi a não ver os outros como concorrentes. A melhorar a união entre a gente para nos ajudar cada vez mais”, afirmou. 

Ao ser perguntada se recomendaria a outras pessoas que fizessem suas inscrições em editais promovidos pelo Fundo Baobá, Erlineia Barros de Souza Oliveira Viana é taxativa: “Sim, porque no Brasil temos muitas pessoas negras e mulheres que estão precisando só de uma oportunidade pra poder mostrar o seu talento e trabalhar”. 

Tijolos sustentáveis para mudar realidades 

A transformação do negócio e seu fortalecimento foram as respostas mais dadas pelos empreendedores quando questionados sobre os motivos que os levaram a participar do  edital Programa de Recuperação Econômica de Pequenos Negócios de Empreendedores Negros e Negras. Essas também foram as motivações de três amigos do estado do Rio, que decidiram investir em algo que possa facilitar o sonho de uma gama infinita de brasileiros: ter a casa própria.  Além disso, eles também não esqueceram de algo importante para o país e para o mundo: as mudanças climáticas. Moradias sustentáveis podem, e muito, contribuir para que o clima não sofra as interferência do Homem. 

Na recente COP 26 (Conferência das Partes para Discussão das Mudanças Climáticas), realizada na primeira quinzena de novembro em Glasgow (Escócia), um dos principais temas foi o das construções sustentáveis. Os edifícios residenciais e comerciais espalhados pelo mundo são responsáveis pela emissão de 40% da emissão de gases estufa no planeta, além de, infelizmente, contribuírem com o consumo de 50% de toda energia produzida no planeta. Soluções sustentáveis têm que ser buscadas. 

Embora dados de 2019 da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua), divulgada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) apontem que a maioria dos brasileiros residam em imóveis próprios (85,6%), dados de pesquisa realizada feita pela Fundação João Pinheiro, de Minas Gerais,  indicam um déficit habitacional de aproximadamente 6 milhões (5,876 milhões) de moradias no país. 

Com o objetivo de construir casas populares sustentáveis e com baixo custo,  três pequenos empresários se juntaram. Gilberto Muniz, Ronaldo Rodrigues e Igor Fernandes de Souza encabeçam o projeto Casas Populares e Sustentáveis. “Nossa Iniciativa visa facilitar o acesso a casas através do método de construção com bloco solo cimento. Pretendemos atuar nas seguintes frentes: treinamento de pessoal para uso do bloco, fabricação e venda do bloco, execução e venda de projetos para uso deste bloco e construção e venda de casas”, afirma Gilberto Muniz.  “Somos uma iniciativa para movimentar a construção civil, atendo as classes de baixa renda”, afirma Igor Fernandes de Souza. 

Igor (à esquerda), Gilberto (no meio) e Ronaldo (à direita)

O principal desafio apontado por Ronaldo Rodrigues para alavancar o projeto do Casas Populares e Sustentáveis estava nas vendas do produto que fabricam: os blocos de tijolos. 

O desafio de incrementá-las está sendo vencido com o aprendizado de itens estudados nos cursos de formação do edital, como planejamento e gestão do negócio; planejamento financeiro; gestão e controle financeiro;  comunicação e marketing; precificação e vendas on line e offline. “O Programa abriu meus olhos para as redes sociais, mostrando que temos que fazer delas uma ferramenta forte para divulgação do nosso projeto”, afirma Ronaldo Rodrigues.