#TBlack 2020 – Os principais acontecimentos da população negra no Brasil e no Mundo

2020: o ano que ficou marcado pela maior pandemia mundial dos últimos anos, também será lembrado pela luta por justiça e equidade racial. O caso George Floyd nos Estados Unidos inflamou uma série de protestos ao redor do mundo, inclusive no Brasil, com os brados de Vidas Negras Importam. A violência contra corpos negros também se fez presente em nosso país ao longo do ano passado, sendo inclusive maior do que nos Estados Unidos. Um relatório produzido pela Rede de Observatórios da Segurança, e apresentado em 2020 mostra que os negros representam 75% dos mortos pela polícia.

Seguindo o conceito do #TBT das redes sociais, de relembrar algum acontecimento importante, em união com a palavra Black, evocada com afinco pelo movimento negro, ao redor do mundo, relembramos nessa matéria, os fatos mais impactantes para a comunidade negra no ano de 2020.

Marielle sempre Presente

No dia 14 de março, completou-se dois anos da morte da vereadora Marielle Franco. Em 2019, o Fundo Baobá para Equidade Racial lançou o edital “Programa de Aceleração e Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco”, em parceria com a Fundação Kellogg, Instituto Ibirapitanga, Fundação Ford e Open Society Foundations. A premissa do programa é fomentar e incentivar a participação feminina negra em espaços de tomadas de decisão. Em virtude dos dois anos sem Marielle, a diretora de programa do Fundo Baobá, participou do programa Bom Para Todos da TVT, falando sobre o projeto e também de como a comunidade negra poderia se reorganizar e atuar para fortalecer a liderança de mulheres negras de todo o país na luta por equidade racial.. A diretora-executiva Selma Moreira escreveu para o jornal O Globo, o artigo Precisamos Proteger Todas as Marielles, e as apoiadas do edital individual do Programa de Aceleração escreveram uma carta aberta pedindo providências para a solução do assassinato de Marielle Franco.

A pandemia tem cor

No dia 11 de março, a OMS (Organização Mundial da Saúde) decretou a pandemia do novo Coronavírus e, a partir do dia 14, os estados brasileiros começaram a decretar isolamento social. Em maio, um estudo do NOIS (Núcleo de Operações e Inteligência em Saúde) da PUC-RJ, revelou que as pessoas negras em condições vulneráveis, estavam mais expostas ao vírus do que uma pessoa não negra. Naquele momento, dos  8.963 pacientes negros internados, 54,8% morreram nos hospitais. Entre os 9.988 brancos, a taxa de letalidade foi de 37,9%. Em São Paulo, um estudo da Rede Nossa São Paulo, também apontou os negros como sendo os mais atingidos pela pandemia. Os três bairros com o maior número de mortes por covid-19 em São Paulo – Capão Redondo, Jardim Ângela e Grajaú – estavam também entre os oito distritos com maior proporção de população preta e parda na cidade.

Foi antevendo esse contexto que, em 05 de abril, o Fundo Baobá para Equidade Racial lançou o edital Doações Emergenciais, voltado para pessoas e organizações que estavam na linha de frente auxiliando populações vulneráveis.

“Não, eles não estão”

A política de extermínio de jovens negros e periféricos, seguiu atuante no país em 2020. No dia 18 de maio, em São Gonçalo, no Rio de Janeiro, João Pedro Matos, 14 anos, foi morto dentro de sua casa e levado pelo helicóptero da polícia, deixando os seus pais em profundo desespero. Dois dias depois, foi a vez de João Victor Rocha, 18 anos, ser baleado durante um tiroteio, no momento em que estava próximo a uma ação solidária de entrega de cestas básicas na Cidade de Deus (RJ). Na ocasião chamamos a atenção para os dois casos , relembramos os dois casos em nossas redes sociais.

Na edição de maio do nosso boletim mensal, a jornalista Maíra de Deus Brito, e também autora do livro, “Não. Ele não está”, que denuncia a mortalidade da juventude negra no Brasil, abordou o tema em uma entrevista ao lado do doutor em direito e sociedade, conflito e movimentos sociais, Felipe Freitas, que também é membro do Conselho Deliberativo do Baobá. Confira as entrevistas aqui

Investimentos em iniciativas que contribuam para promover a dignidade e a justiça, reduzir a violência contra jovens e população negra em geral, apoiar as famílias vitimadas, são prioridades para o Fundo Baobá.

Vidas Negras Importam

No dia 25 de maio morria o homem, mas nascia mais um  símbolo da luta antirracista no ano de 2020. O norte americano George Floyd foi assassinado após uma abordagem policial em Mineápolis, e a sua morte gerou uma série de protestos ao redor do mundo, inclusive no Brasil, como o ocorrido no Largo da Batata (SP) no dia 7 de junho.

Veículos de imprensa aproveitaram a oportunidade para traçar um paralelo com a morte de George Floyd e a importância do enfrentamento ao racismo e da promoção da equidade racial, sendo assim, a diretora-executiva Selma Moreira foi convidada para falar sobre o tema em entrevistas para a Capital Aberto e para o Portal UOL.

Wakanda Forever 

O mundo se despediu precocemente do ator norte americano Chadwick Boseman, aos 43 anos de idade, no dia 28 de agosto. Intérprete no cinema do Pantera Negra, herói das histórias em quadrinhos, encarnando o  rei de Wakanda, uma nação tecnológica fictícia, localizada no continente africano, Chadwick Boseman fez história mostrando a importância da representatividade negra no cinema.

O filme teve uma das maiores arrecadações da história, ocupando a 12ª posição das 100 maiores bilheterias mundiais, com um total de US$1.349 bilhão. A morte do ator foi lembrada em nossas redes sociais.

Beto Freitas, Presente

Na véspera do dia 20 de novembro, o Dia da Consciência Negra, João Alberto Silveira Freitas, foi assassinado por seguranças da Rede Carrefour na cidade de Porto Alegre. O ato covarde e impetrado por um viés racista explícito, foi repudiado com veemência  por inúmeros coletivos e movimentos sociais, algumas autoridades, artistas e outras pessoas defensoras dos direitos para todos os humanos,  fosse nas redes sociais ou nas ruas, em  diversas passeatas e protestos foram realizados ao longo dos dias, por todo país, ressaltando que Vidas Negras Importam.

Diante do fato, o Fundo Baobá se manifestou com uma nota oficial, divulgada para imprensa e também em suas redes sociais e publicada na íntegra no site oficial. No dia 24, o presidente do conselho deliberativo da organização, Giovanni Harvey, também deu uma declaração sobre o tema para o Jornal Folha de São Paulo.

110 Anos da Revolta da Chibata

No dia 22 de novembro celebramos os 110 da Revolta da Chibata, o grande acontecimento histórico que passa completamente despercebido em nosso país, mas que celebra a luta e resistência do povo negro. No dia 22 de novembro de 1910 o marinheiro João Cândido liderou uma revolta dentro do navio Minas Gerais, em protesto pelo castigo que o seu amigo, e também marinheiro Marcelino Rodrigues de Menezes foi condenado: 250 chibatadas, uma quantidade que o levaria à morte. Com 2 mil marinheiros comandando os principais navios de guerra da esquadra e com os canhões apontados para o Rio de Janeiro, a capital do país, eles exigiam o fim dos castigos corporais na Marinha.

O acontecimento foi celebrado em nossas redes sociais.

2020 foi um ano desafiador e que lamentamos e sofremos pelas mortes dos nossos semelhantes, seja pela pandemia do novo coronavírus, como pela operação do racismo institucional. Como sempre, a dor virou luta e incentivo para a promoção da equidade racial como o principal meio para alcançar a justiça social. A movimentação do setor filantrópico mundial e nacional em torno do tema equidade racial após esses trágicos acontecimentos, trouxe um olhar mais atento para esse campo de atuação, justamente o lugar onde o Fundo Baobá opera e continuará operando.

Equidade Racial foi tema do 11º Congresso GIFE

No dia 2 de dezembro, o GIFE (Grupo de Institutos, Fundações e Empresas) promoveu de forma virtual o seu 11o Congresso. Reunindo as associações que promovem ações de investimento social no Brasil, o tema do evento foi “Investimento para a Equidade Racial”.

Entre os palestrantes, estava a diretora executiva do Fundo Baobá para Equidade Racial, Selma Moreira. Além de Selma, participaram da roda expositiva Allyne Andrade, superintendente adjunta do Fundo Brasil de Direitos Humanos; Daniel Teixeira, diretor de projetos do Ceert (Centro de Estudos das Relações do Trabalho e Desigualdades);  Helio Santos, diretor-presidente do IBD (Instituto Brasileiro da Diversidade); Marcia Lima, coordenadora do Afro-Cebrap (Centro Brasileiro de Pesquisa e Planejamento); Marcus Casaes, da Associação de Jovens Empreendedores da Bahia; Raull Santiago, do Coletivo Papo Reto; Sheila de Carvalho, da Uneafro e do Instituto Referência Negra Peregrum e  Thiago Amparo, professor da FGV Direito. A mediação coube a Adriana Barbosa, CEO do Instituto Feira Preta.

11º Congresso GIFE

 O congresso contou com três mesas de exposição e a pergunta era única: “Quais são os desafios colocados para o fim do racismo e pela busca por equidade racial em todas as esferas da sociedade brasileira?” 

A diretora executiva do Fundo Baobá, Selma Moreira, foi ao ponto: “Falta vontade efetiva de transformação da parte de todos os entes da nossa sociedade. Em todas as esferas da sociedade: pública, privada e acadêmica. O Movimento Negro está, há muito tempo, apontando caminhos e soluções; indicando como se deve direcionar os investimentos, processos de gestão e, ainda assim, a gente vive fazendo a mesma pergunta. Será que é por falta de resposta ou é por falta efetiva de ação? Temos uma sociedade formada de múltiplas camadas. Esse é um ponto fundamental para dialogar com essa temática.”

Complementando seu raciocínio, Selma Moreira, fez uma análise sobre o que ocorre no mundo corporativo: “Enquanto não tivermos conselhos de empresas e executivos com esse mandato, o de atuar para a promoção da equidade racial, vamos seguir trabalhando de uma maneira muito singela no que se refere à promoção da equidade racial no País”.

Helio Santos, dialogando com o pensamento de Selma Moreira, colocou o dedo na ferida. “Temos que compreender que a sociedade brasileira é doente. A equidade racial é a terapia regeneradora que nossa sociedade não tem. Temos que pensar políticas que acabem com essa sangria dos jovens negros. Nessas três horas de congresso, seis jovens negros morrerão”, disse o ex-presidente do Conselho Deliberativo do Fundo Baobá e atual presidente do IBD (Instituto Brasileiro da Diversidade). 

A questão da invisibilidade que foi imposta à população negra desde a escravidão e que vem permeando a história da formação da sociedade brasileira foi o foco da fala de Sheila de Carvalho, da Uneafro e do Instituto Referência Negra Peregrum. Para ela, as dificuldades atuais têm que ser vencidas pelo diálogo e pelo posicionamento. “Fomos privados do diálogo e da construção de políticas públicas. Por mais que tenhamos um espaço maior agora, ainda há dificuldade de enxergar, de dialogar e dificuldade de trazer essas organizações e movimentos para a mesa dos debates. O racismo só vai ser combatido com ações práticas”, afirmou. 

Reafirmando que as entidades que já lutam contra o racismo e as que pretendem se engajar nessa luta devem começar promovendo mudanças em suas próprias estruturas, o professor Thiago Amparo, da FGV Direito, denuncia que o básico para a mudança da realidade do racismo no Brasil está sendo mal feito. “Trazer mais pessoas negras para as mesas de discussão é o básico do básico em um país que tem mais de 50% de população negra. Precisamos quebrar as fragilidades da branquitude sobre a questão racial. Muitas vezes os brancos vêm para um diálogo para escutar, escutar e escutar. Mas o momento é de mover estruturas. Mover estruturas que os próprios brancos criaram”, disse. 

Abaixo o link da íntegra do 11o Congresso GIFE, disponível no Youtube:

 

Fundo Baobá na Imprensa em 2020

2020 foi um ano repleto de acontecimentos envolvendo a comunidade negra no Brasil e no mundo e, com isso, o Fundo Baobá para Equidade Racial marcou presença nos principais veículos de imprensa, seja firmando o seu posicionamento referente a promoção da equidade racial, ou na divulgação de ações e dos seis editais lançados ao longo do ano. Ao todo foram 138 participações do Fundo Baobá na imprensa.

Fazendo um recorte mensal, em dezembro de 2020, tivemos um artigo assinado pela nossa diretora-executiva, Selma Moreira, para o portal do Instituto Unibanco, falando da importância de promover a educação para os jovens negros de regiões vulneráveis, além da sua entrevista para a Época Negócios, falando do papel da luta antirracista.

A fase final das inscrições do edital de recuperação econômica para pequenos empreendedores negros, também foi destaque na imprensa. Confira os principais acontecimentos no mês de dezembro: 

05/12 – Época Negócios:
https://epocanegocios.globo.com/Mundo/noticia/2020/12/estamos-longe-de-colocar-equidade-e-luta-antirracista-na-pauta.html 

07/12 – Observatório Rio
https://observatoriog.bol.uol.com.br/noticias/futsal-da-diversidade-amistoso-em-cabedelo-reune-comunidade-lgbt 

07/12 – Observatório do Terceiro Setor:
https://observatorio3setor.org.br/observatorio-em-movimento/pandemia-estabeleceu-mudancas-na-captacao-de-recursos/

10/12 – Instituto Unibanco:
https://www.institutounibanco.org.br/conteudo/dia-internacional-dos-direitos-humanos-por-uma-educacao-com-equidade-racial/ 

17/12 – Henrique Barbosa:
https://henriquebarbosa.com/2020/12/17/edital-do-fundo-baoba-em-apoio-a-empreendedores-negros-tem-inscricoes-ate-20-12-e-verba-de-r%EF%B9%A9-30-mil-para-cada-escolhido/ 

17/12 – Jornal de Arujá:
https://jornaldearuja.com/programa-crianca-feliz-de-aruja-conquista-tres-premiacoes-nacionais/ 

17/12 – Tudo em Arujá:
https://tudoemaruja.com.br/noticia/2020/12/4434/programa-crianca-feliz-de-aruja 

22/12 – São Carlos Agora:
https://www.saocarlosagora.com.br/cidade/mova-sao-carlos-realiza-atividade-no-final-de-ano/132345/ 

Apoiadas do Fundo Baobá, são destaque na mídia em 2020

Lideranças, organizações, grupos e coletivos apoiados por editais pelo Fundo Baobá, também tiveram espaço na mídia, como foi o caso das mulheres negras apoiadas pelo Programa de Aceleração e Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco que conquistaram uma coluna semanal no portal do Geledés – Instituto da Mulher Negra. Ao todo foram 20 textos postados entre julho e dezembro de 2020.

O coletivo Blogueiras Negras, também apoiado pelo Fundo Baobá no Programa Marielle Franco, divulgou em seu site e redes sociais as principais ações da nossa organização, assim como a de outras apoiadas. 

Falando em apoiados, nomes como a psicóloga, gestora pública na Secretaria de Saúde de Suzano, Magna Barboza Damasceno, através do seu projeto “Racismo e as interfaces com a violência doméstica na Saúde”, foi uma das vencedoras do Prêmio Viva, uma iniciativa do Instituto Avon para dar visibilidade a pessoas que trabalham no enfrentamento à violência de gênero no Brasil. O prêmio de Magna foi destaque em muitos veículos de imprensa, incluindo a Marie Claire, que era um dos parceiros da premiação.

Outra apoiada que também ganhou destaque na imprensa foi a jornalista Jaqueline Fraga. Autora do livro “Negra Sou: a ascensão da mulher negra no mercado de trabalho”, ficou entre os dez indicados ao prêmio Jabuti 2020, o mais importante da literatura nacional, na categoria “Biografia, documentário e reportagem”. Isso gerou matéria no O Globo, no Yahoo, entre outros portais de notícias.

Algumas iniciativas de apoiados do edital de Doações Emergenciais no Contexto da Covid-19, lançado em abril, também foi destaque na imprensa.

Confira abaixo um resumo completo dos principais destaques na imprensa de algumas das iniciativas individuais ou coletivas apoiadas pelo Baobá:

Edital – Programa de Aceleração e Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco

06/01/2020 – Guia Negro – “O ano do afroturismo no Brasil: novas empresas, novas viagens, fóruns e redes” – O texto cita Renata Vaz, uma das apoiadas do programa:
https://guianegro.com.br/o-ano-do-afroturismo-no-brasil-novas-empresas-novas-viagens-foruns-e-redes/

14/03/2020 – Ponte Jornalismo – “O espectro de Marielle Franco é a urgência da resistência negra” – Por Diná Alves:
https://ponte.org/artigo-o-espectro-de-marielle-franco-e-a-urgencia-da-resistencia-negra/ 

23/03/2020 – Republica.org – “De um passado enraizado na dor, Eu me levanto” – Por Monalyza Alves:
https://republica.org/mulhereslideresmonalyza

27/03/2020 – Abayomi Juristas Negras – “Trabalho Doméstico e seu histórico escravocrata”:
https://www.abayomijuristasnegras.com.br/post/trabalho-dom%C3%A9stico-e-seu-hist%C3%B3rico-escravocrata

12/05/2020 – Abayomi Juristas Negras – “A Escravizada Anastácia: Santa e heroína”:
https://www.abayomijuristasnegras.com.br/post/a-escravizada-anast%C3%A1cia-santa-e-hero%C3%ADna

29/05/2020 – Justificando – “Não existem normas ou técnicas que salvam as Vidas Negras”:
https://www.justificando.com/2020/05/29/nao-existem-normas-ou-tecnicas-que-salvam-as-vidas-negras/

21/06/2020 – Conversa de Historiadoras – “Estátuas, inadequações e o poder das alternativas” – Por Giovana Xavier:
https://conversadehistoriadoras.com/2020/06/21/estatuas-inadequacoes-e-o-poder-das-alternativas/

24/06/2020 – Escavador – “Giovana Xavier da Conceição Nascimento”:
https://www.escavador.com/sobre/8832405/giovana-xavier-da-conceicao-nascimento 

03/07/2020 – Picosico – Texto por Leandra Silva:
https://picosico.org/m/CCMtzPXnRyB

09/07/2020 – Folha de Pernambuco – “Juristas negras e a luta por espaços no mundo do Direito”:
https://www.folhape.com.br/noticias/juristas-negras-e-a-luta-por-espacos-no-mundo-do-direito/146536/

13/07/2020 – Paraíba Já – “Terceira edição do ‘Uyelê das Pretas’ acontece de 20 à 25 de julho, na PB”:
https://paraibaja.com.br/terceira-edicao-do-uyele-das-pretas-acontece-de-20-a-25-de-julho-na-pb/

16/07/2020 – Correio Braziliense – “Nãnan Matos compartilha conhecimento musical e ancestral com a comunidade”:
https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/diversao-e-arte/2020/07/16/interna_diversao_arte,872830/nanan-matos-compartilha-conhecimento-musical-e-ancestral-com-a-comunid.shtml 

17/07/2020 – Universidade Federal do Rio Grande – “Gutcha Ramil e Dessa Ferreira são as atrações do Janela Musical desta semana”:
https://www.furg.br/en/noticias/noticias-cultura/gutcha-ramil-e-dessa-ferreira-sao-as-atracoes-do-janela-musical-desta-semana

18/07/2020 – Atitude Transversal – “Atitude TRANSversal: Mulher preta transexual tecendo Redes e Ampliando Horizontes”:
https://dandaratitudetransversal.negocio.site/posts/6150661836446010243?hl=pt-BR 

19/07/2020 – Bahia Notícias – “Campanha que divulga profissionais negras de todo o Brasil tem baiana na coordenação”:
https://www.bahianoticias.com.br/noticia/250872-campanha-que-divulga-profissionais-negras-de-todo-o-brasil-tem-baiana-na-coordenacao.html

20/07/2020 – Jornal no Palco – “Dessa Ferreira lança clipe em 25 de julho Dia da Mulher Negra”:
https://www.jornalnopalco.com.br/2020/07/20/dessa-ferreira-lanca-clipe-em-25-de-julho-dia-da-mulher-negra/

21/07/2020 – Revista Afirmativa – “Campanha inspirada em Taís Araújo e Marielle Franco une mulheres negras ao redor do país”:
https://revistaafirmativa.com.br/campanha-inspirada-em-tais-araujo/

22/07/2020 – Matinal Jornalismo – “Dessa Ferreira lança clipe de “Pulso””
https://www.matinaljornalismo.com.br/rogerlerina/agenda/dessa-ferreira-lanca-clipe-de-pulso/

22/07/2020 – Folha de Pernambuco – “Campanha inspirada em Taís Araújo une mulheres negras ao redor do país”:
https://www.folhape.com.br/cultura/campanha-inspirada-em-tais-araujo-une-mulheres-negras-ao-redor-do-pais/148086/ 

30/07/2020 – Instituto Omolara – “O que fazemos?”
https://www.institutoomolara.org.br/#block-33459

31/07/2020 – Unesp Franca – “Mestranda do PPG PAPP foi selecionada pelo Instituto Baobá”:
https://www.franca.unesp.br/#!/noticia/381/mestranda-do-ppg-papp-foi-selecionada-pelo-instituto-baoba/

07/08/2020 – Medium – “Desafio Canções Nossas: Um palco para a música gaúcha independente em meio ao isolamento”:
https://medium.com/@jukebox800/desafio-can%C3%A7%C3%B5es-nossas-um-palco-para-m%C3%BAsica-ga%C3%BAcha-em-meio-ao-isolamento-3820719b14a5

17/08/2020 – RD Notícias – “Projeto Samaúma Literária está reunindo artigos para publicação de um livro digital sobre mulheres negras na Amazônia”:
https://www.escavador.com/sobre/8832405/giovana-xavier-da-conceicao-nascimento

25/08/2020 – Olhar Conceito – “Inscrições para curso para organizações sociais e live sobre racismo e políticas públicas acontecem nesta semana”:
https://www.oestadonet.com.br/noticia/17594/livro-quer-dar-visibilidade-a-producao-literaria-das-mulheres-negras-do-baixo-amazonas/ 

12/09/2020 – Correio do Povo – “Artistas e produtoras gaúchas falam de cadeia produtiva e perspectivas na pandemia”:
https://www.correiodopovo.com.br/arteagenda/artistas-e-produtoras-ga%C3%BAchas-falam-de-cadeia-produtiva-e-perspectivas-na-pandemia-1.479226

21/09/2020 – Universidade de Caxias do Sul – “Seminário on-line aborda heranças indígenas e africanas na música”:
https://www.ucs.br/site/noticias/seminario-aborda-herancas-indigenas-e-africanas-na-musica/

21/09/2020 – G1 – “Workshop sobre Comunicação Estratégica para Organizações Sociais terá nova edição em outubro” – Entrevista Midiã Noelle:
https://g1.globo.com/ba/bahia/noticia/2020/09/21/workshop-sobre-comunicacao-estrategica-para-organizacoes-sociais-tera-nova-edicao-em-outubro.ghtml

29/09/2020 – Correio 24 Horas – “Workshop sobre Comunicação Estratégica terá nova edição em outubro – Entrevista Midiã Noelle:
https://www.correio24horas.com.br/noticia/nid/workshop-sobre-comunicacao-estrategica-tera-nova-edicao-em-outubro/  

30/09/2020 – Karen Franquini – “Quem sou eu”:
https://karenfranquini.com.br/quem-sou-eu/ 

05/10/2020 – Marie Claire – “Magna Damasceno: “Seria insuportável saber de histórias de violência e não fazer nada”
https://marie658.rssing.com/browser.php?indx=11170734&item=122241

29/11/2020 – Bem Blogado – “O espectro de Marielle Franco é a urgência da resistência negra”:
https://bemblogado.com.br/site/o-espectro-de-marielle-franco-e-a-urgencia-da-resistencia-negra%C2%B9/

Negras que Movem – Portal Geledés

25/07/2020 – “Autocuidado e bem viver: Algo muito distante das periferias refém de Salvador- Bahia” – Por Luciane Reis:
https://www.geledes.org.br/autocuidado-e-bem-viver-algo-muito-distante-das-periferias-refe-de-salvador-bahia/

01/08/2020 – “Direito à Ancestralidade” – Por Lorena Borges:
https://www.geledes.org.br/direito-a-ancestralidade/ 

08/08/2020 – “Juventude e Política de Morte no Brasil” – Por Jenair Alves da Silva:
https://www.geledes.org.br/juventude-e-politica-de-morte-no-brasil/ 

15/08/2020 – “Meritocracia: Uma Piada de Mal Gosto” – Por Magna Barboza Damasceno:
https://www.geledes.org.br/meritocracia-uma-piada-de-mal-gosto/

22/08/2020 – “Mindfulness pode ser um aliado para lidar com a dor crônica e aliviar os sintomas da depressão” – Por Evânia Maria Vieira:
https://www.geledes.org.br/mindfulness-pode-ser-um-aliado-para-lidar-com-a-dor-cronica-e-aliviar-os-sintomas-da-depressao/

29/08/2020 – “O que nós temos a receber da política?” – Por Joice Santos:
https://www.geledes.org.br/o-que-nos-temos-a-receber-da-politica/

05/09/2020 – “O que se ganha com o que se perde?” – Por Giovana Xavier:
https://www.geledes.org.br/o-que-se-ganha-com-o-que-se-perde/

12/09/2020 – “Quantas professoras negras você já teve na universidade?” – Por Sulamita Rosa da Silva:
https://www.geledes.org.br/quantas-professoras-negras-voce-ja-teve-na-universidade/

19/09/2020 – “Medidas Socioeducativas: insustentabilidade desse sistema repressivo, que já nasceu abortado” – Por Sibele Gabriela dos Santos e Leandro Bozzola Guitarrara:
https://www.geledes.org.br/medidas-socioeducativas-insustentabilidade-desse-sistema-repressivo-que-ja-nasceu-abortado/

26/09/2020 – “Reparação social da população negra através da arte e cultura” – Por Meduza com Z:
https://www.geledes.org.br/reparacao-social-da-populacao-negra-atraves-da-arte-e-cultura/

03/10/2020 – “Eu, uma mulher negra da Geração Z, inventei a minha profissão” – Por Vitorí Barreiros da Silva:
https://www.geledes.org.br/eu-uma-mulher-negra-da-geracao-z-inventei-a-minha-profissao/

10/10/2020 – “Os aliciamentos para fins de exploração no trabalho continuam mesmo com a pandemia” – Por Brígida Rocha dos Santos:
https://www.geledes.org.br/os-aliciamentos-para-fins-de-exploracao-no-trabalho-continuam-mesmo-com-a-pandemia/

17/10/2020 – “Afro Turismo” – Por Renata Vaz:
https://www.geledes.org.br/afro-turismo/

24/10/2020 – “As tantas porteiras desnecessárias” – Por Marina Ribeiro:
https://www.geledes.org.br/as-tantas-porteiras-desnecessarias/

31/10/2020 – “Um livro independente, escrito por uma mulher negra, sobre o sucesso de mulheres negras, entre os finalistas do principal prêmio literário do país” – Por Jaqueline Fraga:
https://www.geledes.org.br/um-livro-independente-escrito-por-uma-mulher-negra-sobre-o-sucesso-de-mulheres-negras-entre-os-finalistas-do-principal-premio-literario-do-pais/

07/11/2020 – “Uma carta de amor às mulheres negras” – Por Mayara Silva de Souza:
https://www.geledes.org.br/uma-carta-de-amor-as-mulheres-negras/

14/11/2020 – “Notas para uma nova geração de políticas antirracistas” – Por Clara Marinho Pereira:
https://www.geledes.org.br/notas-para-uma-nova-geracao-de-politicas-antirracistas/

21/11/2020 – “Tecnologia ancestral” – Por Leandra Silva:
https://www.geledes.org.br/tecnologia-ancestral/

28/11/2020 – “O espectro de Marielle Franco é a urgência da resistência negra” – Por Dina Alves:
https://www.geledes.org.br/o-espectro-de-marielle-franco-e-a-urgencia-da-resistencia-negra%C2%B9/

05/12/2020 – “O SUS que não se vê” – Por Jéssica Remédios:
https://www.geledes.org.br/o-sus-que-nao-se-ve/

12/12/2020 – “Em caso de despressurização racial, máscaras antirracistas cairão automaticamente!” – Por Laiara Amorim Borges:
https://www.geledes.org.br/em-caso-de-despressurizacao-racial-mascaras-antirracistas-cairao-automaticamente/

Doações Emergenciais no Contexto da Covid-19

06/05/2020 – IFB – “Campus Riacho amplia campanha solidária”:
https://www.ifb.edu.br/riachofundo/23865-campus-riacho-amplia-campanha-solidaria  

12/05/2020 –  Mercadizar – “Famílias da periferia de Belém recebem cesta básica do projeto Telas em Movimento”:
https://mercadizar.com/noticias/familias-da-periferia-de-belem-recebem-cesta-basica-do-projeto-telas-em-movimento/  

18/05/2020 – OBIND – “CIR: Em isolamento, comunidade Canauanim recebe alimentos e orientações para se proteger da Covid-19”:
http://obind.eco.br/2020/05/18/cir-em-isolamento-comunidade-canauanim-recebe-alimentos-e-orientacoes-para-se-proteger-da-covid-19/  

07/07/2020 – Século Diário – “Quilombolas pedem atenção do Estado às comunidades”:
https://www.seculodiario.com.br/saude/quilombolas-pedem-atencao-do-estado-as-comunidades  

15/07/2020 – Yahoo – “Mulheres criam mercado solidário para famílias afetadas pela pandemia”:
https://br.noticias.yahoo.com/mulheres-criam-mercado-solidario-para-familias-afetadas-pela-pandemia-133042887.html  

16/09/2020 – Outras Palavras – “BA: Tecnologias sociais para encarar fome e desemprego”:
https://outraspalavras.net/crise-brasileira/ba-saidas-tecnologicas-para-combater-fome-e-desemprego/  

16/09/2020 – Jornal da USP –  “Como combater os efeitos da covid-19 na periferia?” – Entrevista com o Preta ID – Apoiado do Doações Emergenciais: https://jornal.usp.br/universidade/como-combater-os-efeitos-da-covid-19-na-periferia/ 

21/09/2020 – UOL Ecoa – “Alunos da USP criam projeto para combater Covid na periferia de São Paulo” – Matéria com o Preta ID – Apoiado do Doações Emergenciais:
https://www.uol.com.br/ecoa/ultimas-noticias/2020/09/21/alunos-da-usp-criam-projeto-para-combater-covid-na-periferia-de-sao-paulo.htm  

27/10/2020 – Correio Braziliense – “Covid-19 mostrou importância do funcionalismo público brasileiro”:
https://blogs.correiobraziliense.com.br/servidor/covid-19-mostrou-importancia-do-funcionalismo-publico-brasileiro/

Viver com dignidade está muito além de um conceito. É prática em que priorizamos a nós mesmos sem esquecer a prioridade do outro

Dois homens negros que habitam a maior cidade do país, São Paulo. Ambos professores universitários. Um deles é fisioterapeuta e gerontólogo (alguém que estuda e trabalha com processos do envelhecimento) e o outro é um sociólogo  (alguém que estuda a organização e o funcionamento das sociedades humanas e as relações sociais). 

Procuramos saber deles, a partir do conceito do viver com dignidade, quais são suas opiniões sobre alguns temas que permeiam o nosso cotidiano. Os tópicos vão de relacionamento familiar, passando por ativismo político, saúde, racismo e masculinidade. 

Os entrevistados foram o gerontólogo Alexandre da Silva, professor do departamento de saúde coletiva da Faculdade de Medicina de Jundiaí (SP), e o sociólogo Deivison Nkosi, professor na Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), Campus Baixada Santista, em Santos (SP). Eles não se esconderam de nenhum tema e suas ideias são de grande contribuição para quem deseja pensar uma sociedade progressista, em que o respeito ao outro e a equidade sejam praticados por todes. 

 

PARTICIPAÇÃO POLÍTICA 

Alexandre da Silva Falar de política é não ser partidário. É entender o contexto atual. Quando há discordância política, isso não quer dizer que os discordantes sejam de partidos diferentes. Não quer dizer que sejam opositores. Eu exerço meu direito político todos os dias, pensando em mim e nas outras pessoas. Tento entender quais são as manifestações políticas delas. O exercício político é o exercício da minha cidadania, baseado no fato de que todos nós temos os mesmos direitos. 

Deivison Nkosi –   Minha atuação política se dá por diversos meios. Entendi que a produção intelectual é uma forma de intervenção política importante. É uma forma de ativismo. Então me considero um intelectual orgânico do movimento megro. Mas entendo que a atuação política não pode se limitar à produção intelectual. Então,  procuro  me envolver com os movimentos sociais de combate ao racismo, especialmente aqueles que estão situados no espectro mais à esquerda do universo político. Atuo em contribuição a uma série de organizações de trabalho de base, que fazem tanto trabalhos pedagógicos quanto comunitários. Também tento intervir no debate político sobre temas conjunturais da nossa sociedade, que vão desde as questões sanitárias epidemiológicas (se a gente pensar na Covid-19) até as questões políticas mais gerais, tendo como eixo o movimento negro.

  

RELAÇÃO FAMILIAR

Alexandre da Silva –  Eu estimulo sempre o diálogo. Ele sempre é válido, principalmente quando associado à escuta. Em muitos casos de conflito, com essa receita, a do diálogo e a da importância da escuta,  a gente consegue resolver. E as estratégias de solução nunca passam por qualquer tipo de violência, como falar alto ou coisas assim. 

Alexandre da Silva, gerontólogo, professor do departamento de saúde coletiva da Faculdade de Medicina de Jundiaí (SP)

  

Deivison Nkosi – Entendo sim que a presença familiar é um acontecimento político. Entendo que a minha participação junto à minha família é uma intervenção política. Então, tendo isso em consideração, eu tento conciliar os tempos e os espaços. Isso nem sempre é possível, mas quando a gente percebe a importância política do fortalecimento familiar, a importância das famílias negras para a resistência negra, para a reprodução da nossa existência, mas sobretudo para a criação da possibilidade de existências afetivas e até financeiras, entendemos que esse espaço tem que ser priorizado. Eu venho tentando fazer isso. Sou casado, tenho dois filhos, mas faço parte de uma família ampliada, onde entendo que  influenciar na vida das pessoas da família é contribuir para um mundo melhor e sobretudo contribuir para que mais pretos e mais pretas estejam vivos e estejam bem, além de atentos ao que está acontecendo.

 

ARTICULAÇÕES SOCIAIS

Alexandre da Silva –  Sou apaixonado por gente. Falo com todo mundo: pobres, ricos, velhos, novos, bonitos ou considerados feios. Eu não posso e não se pode agir com preconceito. Trabalho com saúde pública. Trabalho com gente. Eu estudo o envelhecimento, e esse é um fato que acontece na vida das pessoas. O grande problema é que algumas pessoas buscam e legitimam discurso que traduz o que elas pensam e esse movimento de ultradireita do mundo expressa um retrocesso. Já procurei fazer uma análise que não envolvesse o racismo, mas o racismo sempre está presente nesse discurso direitista. 

Deivison Nkosi – As minhas articulações sociais são, sim, permeadas pelo meu engajamento político, mas também pela minha produção intelectual. Eu sou uma pessoa que vem da geração do hip hop; geração que buscava ser,  na prática,  a revolução que procurava ver no mundo. E isso significa trazer para a vida cotidiana determinadas preocupações de gênero, de raça e de classe. Trazer para a experiência cotidiana a preocupação de não reproduzir uma relação coisificada, uma relação reificada com as pessoas. Não tratar as pessoas como propriedade, não tratá-las como coisas que  podem ser descartadas. E estar vigilante com a possibilidade de reproduzir o racismo. Mesmo sendo vítimas do racismo a gente não está isento de reproduzir o racismo. Uma geração  vigilante com a possibilidade de reproduzir as dores e os sofrimentos do racismo e transferir isso para as pessoas com quem a gente convive. Entendo que essas coisas não podem estar separadas e isso significa trazer para o cotidiano aquilo que a gente discute, que a gente teoriza. Trazer para o cotidiano significa  pensar as demandas políticas de gênero, de raça, de classe, de orientação sexual,  tanto no campo pessoal quanto no campo profissional e político como um todo. Senão, podemos defender algo que não vale para nós. Que não vale ser defendido. Então, acredito que seja necessário não perder de vista a necessidade de viver na prática aquilo que a gente defende para o mundo.

Deivison Nkosi, sociólogo, professor na Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e Campus Baixada Santista, em Santos (SP)

RELAÇÃO COM OS TERRITÓRIOS DE VIVÊNCIA

Alexandre da Silva –  Tenho amizades duradouras desde aquele tempo. Até hoje procuro me relacionar com vários territórios, pois defendo o direito das populações negras de envelhecer. E as pessoas envelhecem em todos os espaços. Defendo o envelhecimento com dignidade. Em qualquer território. Procuro conscientizar e fazer a pessoa perceber que ter acesso ao que é digno  faz parte do cotidiano dela. É um direito. 

Deivison Nkosi –  A minha relação com os territórios que passo é bastante ambígua. Eu venho da favela,  cresci na favela, brincava no lixão, e vi o processo acelerado de urbanização das favelas. Tive acesso à universidade e depois a um tipo de possibilidade de visitar e conhecer outros territórios além da favela. Inclusive a universidade é um desses espaços. A favela é o meu lugar de origem, mas também eu pude circular e conhecer o mundo e ver que o mundo é muito maior que a favela. A favela tem construções de resistência, mas também tem carências e dificuldades de acesso a algumas coisas fantásticas,   que são comuns  a algumas pessoas. Então, minha relação é de ambiguidade com esse lugar de origem.

 

RELAÇÃO COM A COMUNIDADE

Alexandre da Silva –  Tenho procurado levar às pessoas meus conceitos sobre saúde, doença e cuidados. Procuro conscientizar. Fazer com que as pessoas percebam o que faz parte do cotidiano delas. Procuro expandir os conhecimentos sobre a população negra dentro da minha área, que é a saúde. Tento incutir nelas o valor do lazer, o exercício da intelectualidade e procuro aflorar nelas tudo o que nos desperta como cidadãos. 

Deivison Nkosi Contribuo de diversas formas. Se minha comunidade não é esse lugar onde eu durmo, minha comunidade é muito maior. Minha comunidade é a comunidade negra brasileira, afrodiaspórica do mundo. Minha  comunidade é a classe trabalhadora. Minha contribuição política vai na direção de defesa desses grupos.

Num âmbito mais estreito,  tento participar das atividades do movimento negro na minha cidade, das atividades de bairro da minha cidade, das atividades do meu bairro de origem.  As pessoas como eu, que são intelectuais e que vivem para atuar na pesquisa e difusão  de conhecimento, têm uma responsabilidade para com a sociedade. Aí eu procuro devolver o que acumulo,  participando de atividades que  possam fomentar um trabalho de base, uma conscientização, fomentar o avanço de alguns debates e algumas pautas.

 

SAÚDE E BEM ESTAR

Alexandre da Silva –  Valorizo muito minha prática física e a leitura. Mas isso não é fácil. Se deixarmos, o trabalho acaba nos engolindo. O fato de eu estudar o envelhecimento faz com que eu analise o meu próprio. A maioria da população negra não teve lazer porque trabalhou muito, sempre trabalhou. A população negra morre trabalhando, sem contemplar. O trabalho é importante, mas saber dosar, parar e desfrutar é importante também. 

Deivison Nkosi –  Saúde e bem estar: Isso é uma questão bem importante, porque saúde não é a ausência de doença. Saúde é bem estar psíquico, físico, emocional, mas é também a possibilidade de intervir nas políticas públicas. É a possibilidade de se ver representado nos espaços de poder. É a possibilidade de concretizar projetos de vida. E vivemos em uma sociedade que impede isso a todo tempo. Seja pela classe, pela raça ou pelo gênero. E isso coloca um desafio logo de cara. A saúde da população negra é completamente atravessada pelo racismo no Brasil. O racismo representa uma barreira enorme para uma vivência plena para a qualidade de vida e para o acesso à saúde. Vários dados mostram que a população negra tem menor acesso à saúde e,  ao mesmo tempo,  é mais acometida por uma série de doenças. Então, o racismo representa uma barreira para a saúde da população negra.

 

COMBATE AO RACISMO

Alexandre da Silva –  Tenho feito um trabalho trazendo a discussão do envelhecimento para dentro da perspectiva racial. A questão é sobre como o racismo tem impedido o envelhecimento da população negra. Por exemplo, quando se joga para a frente o tempo exigido para aposentadoria, essa é uma forma de dizer “o negro não”. O Brasil falhou no compromisso com o envelhecimento dessa parcela da população. 

Deivison Nkosi –  Sou um militante do movimento negro,  intelectual orgânico do movimento negro.  90% da minha produção teórica é voltada para o combate ao racismo. Mas também, quase 100% da minha atuação política é voltada ao combate ao racismo.  Estou engajado aos movimentos sociais como um todo. Sou uma das pessoas que dedicam a vida ao combate ao racismo. Isso é pesado em alguns momentos, porque a vida não é só combater. A gente precisa amar, desejar, sonhar, brincar, descansar e muitas vezes a atuação no movimento não dá descanso.

 

IDENTIDADE E MASCULINIDADE NEGRA

Alexandre da Silva – Eu acho que o desafio maior seja a desconstrução do macho, do forte,  que acaba sendo algo que gera muito sofrimento para o homem negro.  Porque as violências acontecem de diversas formas.  Isso limita também as outras expressões de masculinidades. Então, é importante pensarmos que masculinidade negra fala também de diversos gêneros, de diversas possibilidades, trocas de afeto, novas construções. Passa por pensarmos uma paternidade mais presente,  que muitas vezes é confrontada com o imaginário da população de que o homem se relaciona com várias mulheres e não consegue ter uma. Não estou pregando para que voltemos a um modelo judaico cristão. Não. Cada um pode escolher a forma que lhe convém para viver. Mas que a gente possa expandir essa identidade e masculinidades negras. E hoje a gente percebe um movimento grande, forte,  responsável e afetivo de diversos sujeitos, pessoas negras que estão trazendo essas identidades e discutindo essas masculinidades. E isso tem sido um abraço coletivo. Uma forma de todos  nós nos sentirmos pertencentes a esse mundo que sempre foi nosso. 

Deivison Nkosi –  Sobre Identidade e masculinidade é bom separar, porque são duas questões diferentes e que se relacionam. Antes de existir uma Identidade negra havia uma Identidade branca.  O que obriga o negro a afirmar a sua negritude é o fato de ele sofrer racismo. E o racismo se baseia em um identitarismo branco, identitarismo que vê o branco como única expressão de humanidade, beleza, bondade e verdade. O negro, quando aparece, aparece como animal, selvagem, violento, agressivo. Então, é o próprio racismo que cria a necessidade da afirmação da identidade negra. Também  é verdade que uma pessoa negra não é só negra. Ela é um monte de outras coisas. É o racismo que reduz o negro ao negro. Mas o negro é homem, é mulher, é hétero,  é gay,  é bi, é trans, é cis, é trabalhador. Existem várias identidades que perpassam a nossa existência. E mesmo assim a gente não se reduz a elas. Há momentos em que somos pai, somos filhos, somos profissionais de tal profissão, tem momentos que somos moradores de tal bairro.  As identidades não são fixas. Elas estão em diálogo a depender do contexto. O desafio é pensar estas dinâmicas complexas da identidade. Pensar inclusive que um negro não é só um negro. Acima de tudo ele é um ser humano. E nem tudo que um negro vive está ligado à negritude. O negro sofre, o negro ama, o negro tem sonhos, desejos, dores que estão na dimensão humana e ele partilha com outros humanos a expressão dessa experiência. E ainda que haja o racismo e que ele atravesse a vida do negro, o negro não se reduz ao negro. Cada pessoa tem seu próprio jeito de viver a vida. 

Quando pensamos as masculinidades negras, temos que pensar que o machismo privilegia os homens em detrimento das mulheres. Também o racismo  privilegia o branco em detrimento do negro. E isso coloca uma questão para homens e mulheres negras.  A Grada Kilomba (escritora portuguesa)  fala que a mulher negra é o outro do outro. Porque embora ela seja mulher, no feminismo ela deixa de ter a sua experiência considerada. Ela vira um outro em relação à mulher branca. Mas também nos espaços do movimento negro muitas vezes as mulheres negras têm suas pautas invisibilizadas. Então, se a mulher negra é o outro do outro, o que dizer do homem negro?

Promover a equidade racial através da potencialização da educação do jovem negro

No dia 10 de dezembro, quando é celebrado o Dia Internacional dos Direitos Humanos, o Fundo Baobá para Equidade Racial divulgou em seu site oficial a lista das 100 pessoas selecionadas para o Programa Já É – Educação para a Equidade Racial

O programa foi lançado exatos cinco meses antes, em 10 de julho de 2020, com o objetivo de apoiar 100 jovens negros residentes em bairros periféricos de São Paulo e outros municípios da região metropolitana a acessarem o ensino de nível superior. A iniciativa do Fundo Baobá, em parceria com a Citi Foundation, inclui não só os custos dos estudos em cursinho preparatório para o vestibular e as despesas com transporte e alimentação ao longo do programa. Ele prevê também atividades voltadas para o enfrentamento dos efeitos psicossociais do racismo e para a ampliação das habilidades socioemocionais e vocacionais. Ainda prevê mentoria com profissionais de diferentes formações acadêmicas, experiências profissionais e de vida.

Educação é um dos quatro eixos nos quais a missão estratégica do Fundo Baobá para Equidade Racial está focada. E não podia ser diferente: o ambiente escolar é um dos mais severos gargalos à equidade racial do Brasil. Dados mostram que o ensino fundamental tem quase o mesmo percentual entre crianças brancas e negras de 6 a 10 anos (96,5% e 95,8%, respectivamente). Mas, na faculdade, a matemática é outra: na média, só 25,2% dos jovens entre 18 e 24 anos cursam ou concluem o ensino superior, segundo o IBGE. Só que o percentual de jovens brancos que frequentam ou concluem o ensino superior (36,1%) é praticamente o dobro do percentual de jovens pretos ou pardos (18,3%) na faixa de 18 a 24 anos.

Não podemos negar que nos últimos anos houve um aumento significativo de pessoas negras nas universidades. Uma pesquisa do IBGE,  de 2018, mostrava que 50,3% dos estudantes do ensino superior da rede pública eram negros, sendo a primeira vez na história que o número de matrículas negras ultrapasava o de pessoas brancas. O Censo da Educação Superior, também em 2018, apresentou uma pesquisa na qual o número de negros no ensino superior saltou 78% entre 2014 e 2018. 

Para a gerente sênior de riscos e continuidade de negócios, Viviane Elias Moreira, o aumento de pessoas negras no ensino superior está atrelado à aplicação de políticas afirmativas e de reparação histórica e social, como as cotas raciais e o Programa Universidade Para Todos (ProUni), instituído pelo o governo federal no ano de 2005: “As medidas afirmativas são a base para que a população negra tenha acesso ao ensino de qualidade e a uma correção histórica educacional voltada à evolução da população negra, e que tenha também acesso a todo suporte pressuposto para que você tenha ensino de qualidade de primeira linha”. 

Viviane Elias Moreira, administradora com ênfase em comércio exterior e gerente sênior de riscos e continuidade de negócios

Para o economista, membro da assembleia geral e um dos fundadores do Fundo Baobá, também fundador do Instituto Cultural Steve Biko e vereador reeleito em Salvador, Silvio Humberto, é evidente que o aumento de negros nas universidades veio de políticas afirmativas, mas que isso não é apenas mérito do governo: “Essas políticas não chegam porque governo decidiu fazer. Você tem um movimento antes e tem sempre que se fazer referência ao movimento negro, ao trabalho pioneiro”. Silvio, inclusive,  menciona o trabalho do Instituto Cultural Steve Biko, que no dia 31 de julho deste ano completou 28 anos de atividades, e foi um dos pioneiros no cursinho pré-vestibular para pessoas negras na Bahia: “Nós falamos que são 28 anos promovendo ações afirmativas, então o que eu diria é que isso, tanto as as cotas raciais, quanto o ProUni, de garantir em escala o acesso de pessoas negras às universidades, tem um nome, tem um movimento anterior, que vem sendo puxado desde os anos 1990, com os movimentos dos cursinhos pré-vestibulares negros, populares e comunitários”.

Viviane Elias, que se formou na universidade antes do surgimento das políticas de inclusão, também é fruto do cursinho pré-vestibular social: “Eu sempre falo que o meu divisor de águas na vida foi o meu curso pré-vestibular, que eu fiz no Núcleo da Consciência Negra na USP, no ano de 1997. Porque lá eu tive acesso a uma possibilidade de ensino pré-vestibular com qualidade, com apostilas de qualidade, que eram elaboradas por um cursinho pré-vestibular muito caro e famoso, na época. Mas principalmente com relação à representatividade, foi ali que eu vi biólogos negros, químicos negros, historiadores negros,  professor de inglês negro e tínhamos também professores brancos que contribuíam e eram aliados ali naquela causa”.

O ingresso do negro na universidade também fica atrelado a uma educação básica de qualidade. Mas uma pesquisa do IBGE, de 2018,  mostra que um terço dos brasileiros entre 19 e 24 anos não havia conseguido concluir o ensino médio naquele ano. Entre os que não conluíram esta etapa, 44,2% são homens jovens negros. Muitos dos motivos que mostram a evasão escolar corresponde ao fato de o jovem negro ingressar mais cedo no mercado de trabalho. Para Silvio Humberto, isso é parte do círculo vicioso da pobreza e ele necessita ser rompido: “A evasão é consequência da vulnerabilidade social em que se encontra a maioria dessa juventude. Então, se você tem uma escola que não oferece os meios e as condições, começam as distorções de idade-série. Jovens  e adolescentes na faixa dos 13 anos começam a migrar para a noite, obrigados a entrar muito mais cedo no mercado de trabalho”. O que também revela outra problemática que afasta  jovens da escola: a gravidez na adolescência: “Muitas meninas, por engravidarem,  têm que ficar em casa pra cuidar não só da sua cria, mas também da família, dos seus irmãos, e tudo isso vai interferindo na sua educação, nas condições para garantir uma educação de qualidade,  de eles terem acesso”.

Silvio Humberto, economista, membro da assembleia geral e um dos fundadores do Fundo Baobá, também fundador do Instituto Cultural Steve Biko e vereador reeleito em Salvador (BA)

Viviane Elias também atribui o ingresso do negro na universidade a uma boa educação de base,  de qualidade, mas também reconhece as problemáticas no ensino básico. Portanto,  ela acredita que o trabalho que precisa ser feito é o empoderador: “Precisamos empoderar jovens negros, mostrando que eles podem ser o que eles quiserem e que existe um mundo de possibilidades para eles”. Muito da fala de Viviane é baseada em sua experiência em trabalho com  jovens de comunidades vulneráveis: “Muitos deles acham que a faculdade ainda é um sonho distante, porque é uma coisa elitista, ou não é para eles. Então,  empoderar esses jovens negros que, sim,  podem entrar em uma universidade e a partir do momento que eles entrarem, o esforço de alguma maneira vai ser considerado dentro do processo dele. Precisam levar em consideração o fato de um jovem negro de periferia levar quatro horas dentro de um ônibus, se ele trabalha o dia inteiro. Para poder entregar um trabalho do dia pra noite, os professores precisam, ao menos, ter sensibilidade de entender que essa pessoa tem algumas restrições para executar o trabalho”.

Silvio também reforça a importância do acompanhamento para esses jovens: “É preciso ter uma visão sistêmica, não vai se combater a evasão escolar somente com esse acompanhamento. Daí a importância do serviço social na educação para poder ir nas causas. Mas precisa também, fundamentalmente, não se perder de vista que é necessário combater a vulnerabilidade social das famílias das quais  esses jovens são oriundos”.

As trajetórias de Silvio Humberto e Viviane Elias incluem instituições particulares de básico. “Eu sou a prova cabal de que a exceção só serve para confirmar a regra”, brinca o economista. O fato de Silvio ter estudado em uma escola particular veio de uma recomendação que a sua mãe recebeu: “Deixe de dar uma boa roupa para o seu filho e dê educação”, sendo assim, os seus pais se esforçaram bastante para que Silvio e os irmãos pudessem ingressar numa boa escola: “Fiz o ensino médio em uma escola de classe média aqui de Salvador, onde a minha realidade era uma e a dos meus colegas era outra, completamente diferente, porque onde eu morava tinha problemas de saneamento, de falta de água, às vezes de energia elétrica, a rua não era asfaltada, era uma área pobre e tinha pessoas também extremamente pobres, embora fosse um bairro extremamente musical, cultural que é a Fazenda Garcia”. Conhecido hoje como reduto musical, o bairro Garcia é um dos mais antigos e tradicionais da cidade de Salvador. Durante muito tempo, recebeu o nome de Fazenda Garcia, por abrigar no espaço a fazenda do Conde Garcia D’Avila. Silvio afirma que ser um aluno negro em uma escola particular, majoritariamente branca, construiu a sua consciência de classe e raça, e que a boa contribuição disso veio de seu pai que, na época, trabalhava como mecanógrafo, consertando máquinas de escrever e de calcular: “Eu era um dos poucos negros dentro dessa escola, mas um conselho que recebi de meu pai quando eu tinha 14 anos foi:  ‘Não se esqueça, você é filho de operário, você não é igual a esses burgueses que estudam nessa escola’. E isso eu nunca esqueci, isso foi a forma dele me falar, do jeito dele, o que era consciência negra e de classe, da minha origem social, para demarcar bem quem eu era e o que eu estava fazendo ali”.

Viviane estudou boa parte do ensino fundamental também em uma escola particular, mas em São Paulo: “Eu fui bolsista no colégio particular até a oitava série e depois, por questões financeiras de não conseguir nem pagar a bolsa, eu tive que ir para um colégio público”. Na época, havia sorteios e uma grande concorrência para ingressar, inclusive, nas escolas públicas: “Eu dormi na fila de um colégio na Vila Formosa, e consegui ser sorteada para estudar no período da tarde, que era o menos disputado, para conseguir ter acesso ao ensino médio de qualidade. E aí foi meu primeiro grande choque com a defasagem de um ensino que eu tive até a oitava série como bolsista em uma escola particular até a  chegada no terceiro colegial,  que era uma escola pública e, mesmo de ponta, era normal por exemplo, na metade do primeiro colegial,  eles estavam ensinando pela primeira vez uma coisa que eu aprendi na sexta série. Então,  eu sempre fui vista como se fosse uma nerd do colégio, mas eu não era. A questão é que eu já tinha tido um ensino diferente dentro do colégio particular”. 

O primeiro vestibular prestado por Silvio foi aos 16 anos: “Entrei na universidade com 17 anos. Dentro da trajetória escolar eu não perdi ano nenhum, entrei na universidade muito cedo, mas era uma exceção, um ponto fora da curva, você se formar, como eu me formei em economia, com 20 anos de idade”. Após prestar um concurso público e não ser chamado, Silvio prestou concurso para auditor fiscal da Secretaria Municipal da Fazenda: “O meu primeiro concurso foi feito no ano de 1984 e eles chamaram em 1985, e de lá são 35 anos como auditor fiscal da Secretaria da Fazenda e depois, em 1993, eu me tornei professor da Universidade Estadual de Feira de Santana, no curso de Economia”.

Viviane prestou vestibular em duas oportunidades. Na primeira tentativa, foi para o jornalismo: “Não passei para segunda fase por dois pontos, mas passei em uma faculdade particular  e não tive dinheiro para pagar. Então, voltei a cursar meio ano de cursinho em 1998”. Na segunda oportunidade, ela passou em três faculdades: Estudando de manhã e trabalhando como operadora de telemarketing à tarde, o primeiro estágio veio apenas no último ano de curso e foi uma experiência frustrante: “Consegui um estágio no Banco Alfa. Fui contratada para ser estagiária da mesa de câmbio, mas me colocaram como operadora de telemarketing para o processo de concessão de leasing e, quando eu fui ver, eu estava limpando as mesas dos operadores da época. Foi uma das minhas maiores frustrações”, relembra.

Mentoria e carreira

Além de custear o cursinho pré-vestibular para jovens negros e as despesas com ônibus e transporte, o Programa Já É- Educação para Equidade Racial terá programa de mentoria e acompanhamento acadêmico, para que o jovem tenha a possibilidade de se descobrir profissionalmente e escolher a sua carreira, uma coisa que a juventude negra de antigamente nem ao menos sonhava, como relembra Viviane: “Hoje a gente fala de carreira para um menino de 18 anos. Na minha época, as pessoas negras nem sabiam o que era carreira. Ela sabia que era o trabalho. Eu precisava trabalhar para pagar minhas contas, para pagar o aluguel da minha casa, então nem pensava em fazer carreira, eu pensava em ter um emprego e evoluir no emprego para ter mais dinheiro,  para ter uma ascensão social e conseguir o meu grande sonho, que sempre foi comprar a casa dos meus pais e ter os meus objetivos de viajar e conseguir estudar, porque eu sempre gostei muito de estudar”.

Quando surgiu a oportunidade de cursar o seu primeiro vestibular, a voz familiar se fez presente, mais uma vez, na vida de Silvio: “A minha mãe, no alto da sua sapiência, me disse: ‘Meu filho, pobre sabe escolher: ou é medicina, ou é direito, ou é engenheiro, é isso que eu sei. Como eu não posso te orientar, peça a Deus’. Então eu posso dizer que a minha entrada na economia tem a ver com essa força da espiritualidade, que eu acredito muito, que escolheu esse caminho para eu trilhar”. 

Após a experiência traumática com o primeiro estágio, Viviane pensou em uma solução drástica: “Eu decidi que iria hackear o sistema”, frisa. “Enquanto o sistema achar que eu estou seguindo os passos dele, eu estou tentando viabilizar estratégias para que eu consiga hackeá-lo e estar sempre à frente”. Após terminar o curso de Administração com Ênfase em Comércio Exterior, Viviane foi cursar outra faculdade, dessa vez de Processos Gerenciais: “Era uma faculdade de dois anos, que era o que dava para pagar. Mas  depois disso, acabei investindo muito em certificação, principalmente certificações internacionais e estudo de idioma. Posso te falar que todas essas conexões, além dos meus últimos estudos que foram dois MBAs diferenciais para o que eu faço, realmente foram que me possibilitaram hackear o sistema e ter mais chances no mercado de trabalho”. 

 

Silvio, por sua vez, não tinha muita ideia do que era o curso de economia: “Eu não sabia muito o que era, então a forma que o curso foi se desenhando, que a academia de cursos me preparou para ingressar no mercado de trabalho, estava focado em fazer concurso”. E foi na faculdade que Silvio teve o primeiro contato com o movimento negro: “Foi em 1980, eu participei do MNU (Movimento Negro Unificado), fui um dos fundadores do Grupo Negro da UCSAL (Universidade Católica de Salvador) inspirado no grupo negro da PUC-SP”.

 

Promover a equidade racial, potencializando a educação dos jovens negros de regiões vulneráveis,  é a principal premissa do Fundo Baobá, através do Programa Já É: “O Fundo Baobá é formado por líderes visionários. Afinal de contas, quando você vê que jovens de 17 a 25 anos têm acesso a iniciativas como essa. Que essas iniciativas  cobrem todos os pontos de defasagem e ainda disponibilizam um plus, o Fundo Baobá vai proporcionar que essas pessoas tenham acesso à representatividade tangível, que é uma bandeira que eu levanto muito. Representatividade é muito importante, mas quantas pessoas de nós terão acesso a Michelle Obama, por exemplo? Mas quantas dessas pessoas vão ter acesso a uma Fernanda Lopes, a uma Viviane Elias, a uma Selma Moreira? E isso é transformar vidas através de ações afirmativas”. 

 

Silvio também acredita na força e no potencial do Já É, mas também alerta para a importância de estendê-lo  para outros estados do Brasil: “A proposta é excelente, mas só acho que não deveria ficar restrito ao município de São Paulo, apesar de ser lá onde você tem as maiores desigualdades. A gente precisa que esse programa se estenda para o Brasil, e sobretudo para a região Nordeste, é preciso encontrar parceiros, é preciso apoiar as organizações que já existem”, finaliza.

 

Fazendo um retrospecto em sua trajetória profissional, Viviane Elias reforça ainda mais o surgimento de medidas como o Programa Já É: “Eu sou uma profissional de gestão de riscos e gestão de crises, hoje eu componho o pequeno percentual de 2.6% de mulheres executivas nesse país, estou participando do primeiro curso de formação de conselheiras negras deste país, tenho dois MBAs e passagens profissionais por multinacionais e nacionais nos mais diversos segmentos, única e exclusivamente por ações afirmativas como essa do Fundo Baobá. Eu sou o resultado do que ações afirmativas, alinhadas com educação de qualidade e com suporte psicossocial de blindagem contra ações do racismo estrutural, podem fazer. Hoje eu gero receita, procuro praticar o ‘ninguém larga a mão de ninguém’, participo de outros grupos de empoderamento de mulheres e meninas negras da periferia, porque eu sei que uma ação social como essa pode movimentar e mudar vidas”, completa.

Recuperação econômica e fortalecimento de territórios negros é um dos caminhos para a justiça social

No dia 20 de dezembro, encerram-se as inscrições do Programa de Recuperação Econômica de Pequenos Negócios de Empreendedores(as) Negros(as), iniciativa do Fundo Baobá para Equidade Racial, que tem apoio do Instituto Coca-Cola Brasil, Instituto Votorantim e Banco BV, com a premissa de dar suporte financeiro a pequenos empreendimentos, liderados por pessoas negras, em comunidades periféricas ou territórios em contexto de vulnerabilidade socieconômica no país. 

A pandemia do novo coronavírus acentuou as desigualdades em nosso país, o que gera discussões sobre o que significa desenvolvimento econômico. Para o mestre em sociologia e professor na FGV (Faculdade Getúlio Vargas), Márcio Macedo, há controvérsias nas definições e formas de se medir o desenvolvimento econômico: “Para os economistas mais ortodoxos, o desenvolvimento econômico pode ser medido a partir de parâmetros como PIB (Produto Interno Bruto), renda per capita e níveis de consumo da população. O que é considerado nessa forma de se medir desenvolvimento econômico é o tamanho da economia e do mercado consumidor. Hoje somos a nona economia mundial, nosso PIB gira em torno de US$ 1,8 trilhão. Com essa definição, o Brasil se encontra à frente de países como o Canadá. Contudo, se olharmos os índices de competitividade da nossa economia, o Brasil vai para uma posição 34º na lista das economias mundiais. Além disso, se levarmos em consideração o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano – unidade de medida utilizada para aferir o grau de desenvolvimento de uma determinada sociedade nos quesitos de educação, saúde e renda), o Brasil, atualmente, encontra-se na 79º posição no ranking do IDH mundial (uma lista com mais de 180 países), como divulgado pelo PNUD, em 2018”, afirma Márcio. 

Márcio Macedo, mestre em sociologia, professor e coordenador de diversidade da FGV EAESP

Curiosamente, o Brasil encontra-se há três anos nessa posição, o que pode ser considerado uma estagnação. “De forma geral, podemos dizer que o Brasil é um país com grandes desigualdades e paradoxos. Assim, eu diria que não podemos nos considerar desenvolvidos economicamente porque temos uma desigualdade social e econômica enorme”, finaliza.

Para a empreendedora na Ceilândia (DF), formada em serviço social e pós-graduanda em Gestão, Empreendedorismo e Inovação Empresarial, Wemmia Santos, o que dificulta o desenvolvimento econômico e a redução das desigualdades é a manutenção de privilégios das classes favorecidas: “Vale dizer que somos cada vez mais afetados para perder as dimensões que desvinculam o consumo do exercício da cidadania, haja vista que o modelo de inclusão adotado para o desenvolvimento econômico se deu via políticas públicas de estímulo ao consumo de bens e serviços. Ao olhar com mais cuidado para essa estrutura, fica exposta a não opção pela dissolução/diminuição das desigualdades, e também fica evidente que quanto menor seu poder de renda,  menor seu exercício de acesso ao direito de ter direitos. A face dessa realidade desafia a temática de desenvolvimento econômico, bem como denuncia outras restrições no que se refere a questões ambientais e socioespaciais”.

É aprendizado básico de economia que os recursos são escassos e que não é possível dividir com todos, mas para Wemmia Santos é preciso romper com esse mito: “As ‘crises’ e a suposta escassez de recursos são os pretextos utilizados pelo Estado para justificar sua retirada da responsabilidade social, especialmente no campo das políticas sociais. Desse modo, o desenvolvimento econômico que deveria beneficiar toda população, fomentando o acesso à cultura, esporte e lazer com garantia de mobilidade que atenda a todos, é desfavorecido em favor do capital que tenciona a construção de instrumentos baseados unicamente no planejamento público tecnicista que limita a equidade e distribuição justa de bens e serviços, favorecendo apenas os estratos privilegiados”.

Wemmia Santos, pós-graduanda em Gestão, Empreendedorismo e Inovação Empresarial e empreendedora na empresa RAIX

Para muitos, a principal forma de se emergir economicamente é empreendendo, ou,  como dizem, se tornando o seu próprio patrão e dono do próprio negócio. Muito tem se discutido sobre o empreendedorismo, muito se tem estudado sobre os melhores formatos de se investir, empreender e obter lucro, mas, considerando a deficiência no desenvolvimento economico do nosso país, pouco se dialoga sobre a formalização do empreendedorismo negro. Wemmia recorre à história para demonstrar que o debate sobre empreendedorismo, mesmo com a proliferação da internet, está longe de ser algo recente. Ela cita inclusive, a Irmandade da Boa Morte, que teve a sua fundação no século XIX, em Salvador, vindo posteriormente a se estabelecer na cidade de Cachoeira, na Bahia: “As mulheres da Irmandade vendiam quitutes e com o lucro das vendas ajudavam seus afiliados e outros negros, fugidos da escravidão, pagando suas alforrias. Ainda hoje, elas preservam essa motivação inicial, em memória ao sofrimento dos escravizados pela busca da liberdade e, dessa forma, se mantêm um exemplo notório de luta e resistência contra a escravidão. São, portanto, revolucionárias desde aquela época. Transformaram a falha de mercado do sistema escravocrata em oportunidade de viabilizar a liberdade de seu povo. Encontraram e encontram meios para solucionar questões relacionadas à redução da pobreza e desigualdade, em um cenário nada propício à participação ativa da mulher, com ênfase nas mulheres negras”.

Para Wemmia, é importante conhecer a história, justamente para compreender os territórios negros: “Quando resgatamos a história do Brasil, antes mesmo do sistema capitalista, fica evidente a manutenção do racismo estrutural nos territórios que a população negra se concentra e nas faixas de rendimento entre negros e não negros. Para nós é necessário conhecer e preservar a história para, só assim, consolidar ações mais igualitárias”.

É dentro deste contexto histórico que Marcio Macedo acredita que, quando falamos em empreendedorismo negro ou afro empreendedorismo, há uma perspectiva política envolvida.  Ou seja, são negócios de pessoas negras, que podem envolver algum tipo de relação com elementos das culturas negras e ainda ser voltados, de forma prioritária, para o consumo de pessoas negras: “Apesar de isso não ser algo novo, ele tomou um novo significado em um contexto que o mercado consumidor e a economia como um todo passam a ser vistos como  espaços de questionamento da desigualdade racial. Falar que a invisibilidade do empreendedorismo negro é efeito do racismo estrutural e empresarial é simplificar o problema. Entender o fenômeno do empreendedorismo é olhar para as relações entre raça, classes, desigualdades das mais variadas entre negros e brancos,  além da reconfiguração do mercado de trabalho dentro de uma economia neoliberal”.

Pesquisa realizada pelo Sebrae em 2018, a Global Entrepreneurship Monitor (GEM) revela que 40,2% das micro e pequenas empresas no Brasil são comandadas por negros. A mesma pesquisa, também nos mostra que apesar dos empreendedores negros liderarem o número de micro e pequenas empresas no Brasil, quando olhamos para o faturamento é maior a proporção de empreendedores negros que possuem renda familiar mais baixa do que empreendedores brancos e – ao contrário – é maior a proporção de empreendedores brancos que possuem rendas maiores: “Esses números discrepantes seguem a mesma linha ou dimensão da desigualdade vista entre negros e brancos no Brasil. Há diferenças nas formas, modos e tipos de negócios ou empreendimentos de negros e brancos. É preciso abrir os números para verificar com mais acuidade essas diferenças e desigualdades, mas diria que estamos comparando universos bastante distintos”, afirma Márcio.

Outra grande dificuldade da pessoa negra que empreende diz respeito à obtenção de créditos. Um estudo realizado pela PretaHub, em parceria com o instituto de pesquisas Plano CDE e o banco JP Morgan, mostrou que 32% dos empreendedores negros tiveram crédito negado, sem explicação. Márcio Macedo diz que ter acesso a crédito no Brasil é, em geral,  algo bastante difícil e caro e mais ainda para quem é pobre: “Há uma mistura de desinformação, desconfiança e seleção prévia realizada por bancos. O ponto central é: não há linhas de crédito com taxas de juros que não sejam exorbitantes para serem oferecidas para empreendedores e microempreendedores negros, porque a maior parte deles está alocada nas faixas de classe menos abastadas, que sofrem com problemas de formalização ou com questões às vezes bastante simples de serem resolvidas, mas que impedem o acesso ao crédito”.

A Pandemia de Covid-19 acentuou ainda mais as desigualdades sociais e raciais. E, no caso do empreendedorismo negro, um estudo do Sebrae mostrou que durante esse período 46% dos empreendedores estavam com dívidas em atraso. Sessenta e um por cento dos que buscaram empréstimo não conseguiram, mesmo tendo pedido valores mais baixos do que os brancos: “A pandemia afetou todos os negócios, tanto de brancos como os de negros. Contudo, a pandemia também se orientou pelas desigualdades na maneira como afetou de forma desproporcional a população. Ou seja, houve uma socialização desigual dos impactos negativos da pandemia, com um número maior de mortes e perdas de pobres e negros”, ressalta Márcio Macedo. “No caso dos empreendimentos negros, a forma de resiliência tem se dado através de apoio de redes familiares e de amigos. Muitas vezes não necessariamente na manutenção do negócio, mas na tentativa de dar conta das despesas de manutenção pessoal e familiar. Muitos empreendedores negros dependem dos seus negócios para pagar suas contas mensais, ou seja, sua subsistência está vinculada ao negócio. Na impossibilidade do negócio/empreendimento funcionar, algo que ocorreu no período mais crítico da quarentena, boa parte deles ficou sem renda e teve que recorrer à ajuda do Estado, dinheiro vindo do auxílio emergencial liberado pelo governo federal, ou buscou ajuda, como já disse, com familiares ou redes de amigos”, completa.

Com as dificuldades, no contexto da Covid-19, o empreendedorismo negro precisou pautar estrategias de resiliência negra para se manter vivo. Sendo empreendedora desde 2017 à frente da marca RAIX, atuando no ramo do vestuário com a valorização da cultura periférica,  e atuando também na Feira da Quebrada em Brasília e na Loja Colaborativa, Wemmia acredita que uma rede de parcerias com outros empreendedores negros pode ser eficaz na forma de aceleração e apoio de pequenos negócios. Márcio Macedo também vê de forma positiva a rede de parceria entre empreendedores negros: “Essa é uma estratégia que já vem sendo colocada por organizações como a Coalizão Éditodos, que visa captar recursos e apoiar negócios de empreendedores/as negros/as. A aceleração é algo que deve ser feita, contudo, é necessário experiência no universo do empreendedorismo. O processo de aceleração deve ser capitaneado por alguma organização que tem um papel importante e “know-how” no ecossistema empreendedor”.

Pensando nessa experiência no universo do empreendedorismo, Márcio Macedo está à frente do projeto “Raça & Mercado”, uma iniciativa conjunta da FGV EAESP – via FGVCenn e Coordenadoria de Diversidade – Feira Preta, AfroBusiness e Diaspora.Black. O projeto tem como premissa estimular a reflexão sobre o empreendedorismo negro e o fortalecimento do ecossistema: “Entre maio de 2019 e dezembro de 2020 realizamos onze fóruns de discussão nos quais foram convidados pesquisadores, empreendedores/as, empresas, organizações da sociedade civil e setores do Estado para discutir o tema do empreendedorismo negro a partir de diversas perspectivas. Publicaremos um relatório de atividades no início de 2021 com as principais conclusões”.

Atuando em seu território, Wemmia Santos é coordenadora do Programa LECria, (Laboratório de Empreendimentos Criativos) um edital de fomentos para empreendedores periféricos que, a cada ano, doa R $10 mil para 10 empreendimentos. Essa iniciativa surgiu após um estudo territorial: “Estudo realizado pela Codeplan (Companhia de Planejamento do Distrito Federal) aponta que Ceilândia, Águas Claras e Taguatinga são as três Regiões Administrativas com o maior número de microempreendedores individuais (MEI) no setor da cultura, nas atividades artísticas como espetáculos, fotografia e música”, segundo a empreendedora, são empresas criativas que estimulam o mercado e são responsáveis pelo aumento da qualidade de vida na região. “O LECria, tem como objetivo instigar ainda mais o empreendedorismo criativo na construção e ampliação da economia solidária entre a juventude, oportunizando a inclusão de novas formas de empreender nas artes, danças, música, comunicação entre outros nichos”. Completa.

Dessa forma, além de fomentar a criação a Feira da Quebrada, Wemmia traz o conceito de loja colaborativa, como forma de ligar o empreendedor com o cliente: “A loja colaborativa RAIX, na Praça do Cidadão, em Ceilândia, foi criada com o objetivo de fomentar o empreendedorismo entre jovens periféricos trazendo um formato colaborativo, que já é tendência validada, segundo o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). A ideia é sermos um veículo que conecta o vendedor ao cliente, cedendo o espaço por um valor justo e acessível, espaços compartilhados tem sido uma ótima solução para empreendedores iniciais e de pequena escala que buscam otimização de custos e escoamento de estoque, tendo em vista a impossibilidade de arcar sozinhos valores fixos, como aluguel, manutenção, funcionários, divulgação, dentre outros, fazendo assim que permaneçam por mais tempo na informalidade”, completa.

Márcio acredita que programas de recuperação econômica, como proposto pelo Fundo Baobá, são iniciativas louváveis e importantes para o desenvolvimento e fortalecimento do empreendedorismo negro no Brasil: “É necessário que outras organizações, públicas e privadas, sigam o exemplo do Fundo Baobá com vistas a possibilitar que inovações econômicas e sociais sejam conquistadas através do empreendedorismo de pessoas negras, que beneficia a todos/as, negros/as e não negros/as”. 

Wemmia Santos, que é uma das mulheres apoiadas pelo Fundo Baobá no Programa de Aceleração de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco, também reforça o coro: “Se eu não tivesse participado de um edital de fomento, com certeza boa parte das ações que executamos hoje não seriam possíveis. Fico feliz em ver cada vez mais iniciativas que incentivam pessoas negras a buscarem seus sonhos de forma ampliada”.

Representatividade negra nos espaços de tomadas de decisão e educação como ferramenta de equidade racial foram temas de lives com participação do Fundo Baobá

No mês dedicado à consciência negra, a direção do Fundo Baobá para Equidade Racial participou de lives e webinarios falando sobre equidade racial, representatividade negra nos espaços públicos e de tomadas de decisões, a importância da educação como instrumento na redução das desigualdades sociais e raciais e o papel da mídia na cobertura da pandemia do novo coronavírus, doença que escancarou o racismo e acentuou ainda mais as desigualdades em nosso país.

A primeira live de novembro aconteceu no dia 5, dentro do projeto “Redes&Raízes” do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) no Brasil, em parceria com o Observatório da Juventude do UNFPA, e contou com a participação da diretora-executiva do Fundo Baobá, Selma Moreira, no treinamento “Captação de Recursos para Organizações”. Selma exemplificou para os jovens presentes o conceito de captação e como deve ser realizado: “Captação é igual negócio, você precisa investir para ter retorno. Tem que pensar quais são os recursos disponíveis para trazer o investimento. Isso não acontece magicamente”.

Durante o evento virtual, o participante do Observatório da Juventude da UNFPA, Hugo Sabino dos Santos, fez o seguinte comentário: “A apresentação da Selma me trouxe muitas reflexões sobre entender o lugar de quem está nessa posição de captador. Entendi o quão necessária é a minha formação sobre o conhecimento da instituição em que trabalho, porque, possivelmente, também eu esteja dentro dessas reuniões, desse discurso e dessa troca de captação”.

Diante dessa reflexão, Selma respondeu: “A gente tem uma equipe bem pequena no Fundo Baobá, mas todo mundo tem que ser captador, isso não significa que vai estar sempre à frente [da captação]. Se, às vezes, você vê uma oportunidade ou lê um edital, mas se não está conectado com a alma da organização, pode deixar passar”.

No dia 26, Selma Moreira retornou para outra formação do “Rede&Raízes” sobre captação de recursos, que teve a participação de 19 jovens representantes de coletivos, organizações e iniciativas para as juventudes negras. Selma apresentou passo a passo para que as entidades possam se afirmar, citando por exemplo, a criação de alinhamentos institucionais estratégicos. Além de construir um planejamento orçamentário, um plano de mobilização de recursos buscando pessoas e parceiros para dialogar e criar estratégias de captação. “O trabalho de captação pelos coletivos possuiu uma camada a mais, que é a camada da barreira jurídica. Existe o desafio do tempo presente, as organizações não estão preparadas para lidar com coletivos (grupos que não sejam formalmente constituídos como organizações da sociedade civil). É uma questão do nosso modelo jurídico, muitas vezes o projeto tem conexão, mas não tem institucionalidade – dado que o coletivo não tem CNPJ.” 

Segundo a diretora-executiva do Fundo Baobá, o ambiente e a visão de empresas estão em transformação e as organizações da sociedade civil podem auxiliar neste processo: “Parte do nosso trabalho é construir caminhos e deixar nítido para as instituições que esses pontos não devem ser encarados de maneira superficial”.

A cobertura completa do evento, você pode acompanhar na matéria completa no site oficial da UNFPA

O curso virtual “Raça, Gênero, Democracia e Participação Política no Brasil”, uma iniciativa do Instituto Geledés da Mulher Negra, em parceria com a Escola do Parlamento da Câmara Municipal de São Paulo, contou com nove aulas semanais, dos dias 22 de setembro a 17 de novembro. E no dia 10 de novembro, aconteceu a aula de número oito, com o tema Promoção da Equidade de Raça e Gênero, e teve a participação da diretora-executiva do Fundo Baobá, pós-graduada em Gestão Estratégica em Comunicação Organizacional e Relações Públicas, pela Escola de Comunicação e Artes da USP e MBA em Gestão e Empreendedorismo Social, pela FIA,  Selma Moreira, ao lado do doutor em sociologia e pós doutor no departamento de estudos africanos e da diáspora africana pela universidade de Wisconsin, Sales Augusto dos Santos, com a mediação da professora e mestre Suelaine Carneiro.

Em sua fala, Selma apresentou o trabalho do Fundo Baobá e destacou: “Um dos desafios que nós temos é como conseguir constituir a pauta da equidade racial em uma conversa para todo o mundo. Hoje o movimento negro tem feito um esforço hercúleo para entrar em mentes e corações, e eu acho que a gente consegue sonhar quando a gente alcança esse espaço, nessa perspectiva do quanto é fundamental para o desenvolvimento de uma sociedade mais justa, mais equânime e mais inclusiva, conseguir entender as diferanças e, a partir delas, dar um passo para o nosso próximo momento como sociedade.” 

Selma aproveitou para frisar a importância de se trabalhar com investimentos focados na promoção da equidade racial no país: “A gente vive um momento, em todo o mundo e,  principalmente no Brasil, onde negar a existência do racismo, fazendo um discurso só com uma perspectiva de classe, não é mais suficiente, em função de todos os movimentos realizados, promovidos historicamente pelo movimento negro. A gente chegou em um momento que não se permite mais negar a necessidade de investimentos focados. As organizações como o Fundo Baobá, que fazem parte da Rede de Fundos para Justiça Social, tem promovido esse diálogo, na perspectiva de repensar os seus investimentos, mas também de pensar os seus times; trabalhar na perspectiva de inclusão; trabalhar as relações raciais, tanto no escopo programático, da forma como se investe e qual o diálogo é feito com o campo, mas também em um olhar interno. Eu diria que esse discurso, ele tem aberto espaço para dialogar com as empresas onde ainda há resistência e uma certa timidez”.   

Confira a aula completa aqui

Selma Moreira, também participou no dia 17 do evento internacional “Moving Forward: Rebuilding a More Just and Equitable Educational Future” (Seguindo em frente: reconstruindo um futuro educacional mais justo e equitativo), organizado pela WISE, que é uma plataforma internacional multissetorial para pensamento criativo, debate e ação proposital, promovendo a inovação e construindo o futuro da educação por meio da colaboração. Selma contextualizou o cenário educacional em nosso país, enfatizando as desigualdades raciais existentes no processo, apresentando dados alarmantes: “Um rápido olhar sobre a questão do racismo no Brasil e seu impacto na educação de jovens negros apresenta números que chocam, pois os negros correspondem a 56% da população brasileira, mas quase 10 a cada 100 negros com idade acima de 15 anos não sabem ler e escrever. A taxa de analfabetismo é 3 vezes maior em negros que em brancos. 76% dos jovens brancos entre 15 e 17 anos estão matriculados no ensino médio, entre negros, este número cai para 62%. 55,8% de brancos concluem o ciclo básico de educação, entre negros o número cai para 40,3%”. Selma também usou o espaço para falar sobre a atuação do Fundo Baobá na promoção da equidade racial no país: “Junto com Desenvolvimento Econômico, Viver com Dignidade, Comunicação e Memória, Educação é um dos eixos que definimos para a atuação do Baobá – que atualmente é o único fundo brasileiro que se dedica, exclusivamente, à promoção da equidade racial para a população negra. Tanto que este ano, mesmo em meio à pandemia do coronavírus, o Fundo Baobá lançou um edital, em parceria com a Fundação Citibank, para preparar jovens da periferia de São Paulo, a maior cidade do país, a alcançar o ensino superior”. O Programa Já É – Educação para Equidade Racial, citado por Selma, inclui o custeio dos estudos em cursinho preparatório para o vestibular e as despesas com transporte e alimentação ao longo do programa, que deve ter duração de 12 meses, além de atividades voltadas para o enfrentamento dos efeitos psicossociais do racismo e para a ampliação das habilidades socioemocionais e vocacionais, incluindo programa de mentoria.

Confira abaixo

No dia 25 de novembro, o presidente do Conselho Deliberativo do Fundo Baobá, Giovanni Harvey, mediou uma importante discussão: Onde estão os negros no Serviço Público. Segundo dados do IPEA (Instituto Nacional de Pesquisa Econômica Aplicada),  divulgados este ano, o número de funcionários públicos no Brasil é de 11,4 milhões nas esferas federal, estadual e municipal. 

Embora o governo não torne público dados do número de funcionários por recorte de cor ou raça,  estima-se que apenas 35% dos postos do serviço federal são ocupados por negros. A Prefeitura de São Paulo é a única no País a ter um recorte por raça e cor dos seus funcionários: 28,6% deles, ativos da Prefeitura de São Paulo são negros. E eles têm participação maior nos quadros de nível básico, em que representam 48%. 

Foi para discutir caminhos para um maior acesso dessa população que o Instituto República chamou, Matilde Ribeiro, ex-ministra da Seppir (Secretaria de Políticas para Promoção da Igualdade Racial), Eloi Araujo, ex-ministro da Seppir (Secretaria de Políticas Públicas para Promoção da Igualdade Racial) e Paulo Paim, atual senador da República pelo estado do Rio Grande do Sul. 

Giovanni Harvey que também já atuou em diferentes instâncias de governo, iniciou o debate com uma indagação sobre como é possível contribuir para uma diversidade de pessoas no serviço público. 

Para Matilde Ribeiro “a gestão, no sentido do desenvolvimento, tem que ser democrática, participativa, visando o bem comum. Pessoas em diferentes posições no jogo, mas o jogo deve ser jogado por todos. Já as ações afirmativas, como forma de construção de Justiça diante de situações de desigualdade, passa pela  ação por construção de diversidade, construção de inclusão, construção democrática de participação e construção do desenvolvimento igualitário. As duas coisas, portanto, têm total conexão”, afirmou.  

O senador Paulo Paim, corroborando com o pensamento de Matilde Ribeiro, enalteceu em sua fala as importantes contribuições que as várias vertentes do movimento negro deram para a construção de políticas inclusivas dentro do funcionalismo público e em outros segmentos do trabalho. “A criação do Estatuto da Igualdade Racial é uma das grandes vitórias do movimento negro brasileiro. Foi por intermédio dele que, em 2014, foi estabelecida a Lei de Cotas no Serviço Federal, a Lei 12.990/14. Um benefício para muitos que estavam à margem desse processo de sequer poder aspirar a um cargo na esfera pública federal”, afirmou. 

Embora exista uma Lei de Cotas, para o ex-ministro Eloi Araujo isso ainda não é o suficiente. A reivindicação tem que ser maior. “Quero pensar sobre como somos minoria na administração pública. Os números divulgados pelo IPEA dão conta da minoria absurda que é a comunidade negra na administração pública. Na diplomacia não somos 6% de negras e negros. Entre embaixadores não contamos 10 negros. e negras. Na auditoria da Receita Federal,  não chegamos a 15% de negros e negras”, disse. 

Para Araujo, é preciso maior avanço na presença negra no serviço público de uma forma geral. Para isso, ele pede uma mobilização. “Temos que avançar em algumas políticas públicas. Criar protocolos rigorosos no sentido de proteger a saúde, proteger a vida de negros e negras que são ofendidos nas favelas. Que são ofendidos pelo Estado brasileiro. Criar protocolos rigorosos  para avançar nas políticas de ação afirmativas, notadamente nas políticas de cotas. Essa é a forma mais intensa de avançar com a perspectiva educacional, uma perspectiva de ingressar a juventude negra na universidade. Agora que o Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação) ganhou esse conceito constitucional, temos que estimular a juventude negra a ir para as universidades e prestar concursos públicos para todos os cargos da administração pública superior”, afirmou.

Acompanhe a live completa abaixo

No mesmo dia, a diretora de programa do Fundo Baobá, Fernanda Lopes, foi uma das convidadas da live “Um olhar para a mídia negra no ‘novo normal’: Potencialidades e desafios”, organizada pela Revista Afirmativa, em parceria com o Lab Afirmativa de Jornalismo, que marcou o lançamento do Ebook “Narrativas Afirmativas em Tempos de Pandemia”. O evento mediado pela jornalista Alane Reis contou também com Thales Vieira (Instituto Ibirapitanga), Lígia Batista (Open Society Foundation), Atila Roque (Fundação Ford), Rosana Fernandes (Cese), Taciana Gouveia (Fase), além da estudante de jornalismo, Andressa Franco, e da jornalista recém formada, Brenda Gomes, ambas contribuíram na produção do Ebook.

As estudantes de jornalismo, Andressa Franco e Luana Gama, escreveram a matéria “Emprego, renda e Covid-19: O impacto da pandemia na vida dos trabalhadores negros”, que narrou histórias de pessoas como o jovem Matheus Cardoso, que mora no bairro de Pernambués em Salvador (BA), e durante a pandemia passou a trabalhar como entregador de comidas por aplicativo, após ser dispensado do estágio em uma academia. Assim como também nos apresentou a vida de Darcilene de Jesus, moradora do bairro Engomadeira em Salvador (BA), que trabalha como diarista. Antes da pandemia, ela fazia faxina três vezes por semana na casa de uma senhora que morava com a filha. Após as medidas de isolamento social foi dispensada pela patroa, que faz parte do grupo de risco. Sem carteira assinada, sem benefício algum e com um filho de três anos, Darcilene passou a receber o auxílio emergencial.

Para Andressa Franco, escrever essa matéria e acompanhar esses relatos “foi muito mais do que contar histórias, foi a oportunidade de ter empatia com todas elas. Nós conseguimos construir novas perspectivas para o futuro”.

Brenda Gomes, por sua vez, ao lado da estudante de jornalismo, Thaís Vieira, assinou a matéria “Mirtes Souza e Danúbia Silva: Mães entre a saudade e a revolta”. O texto conta a história de “Duas maternidades que foram interrompidas durante a pandemia”, alerta Brenda. A história de Mirtes ficou conhecida no Brasil todo. A empregada doméstica de Pernambuco, que saiu para levar os cachorros dos patrões para passear e deixou o filho, Miguel, no apartamento junto com a patroa e primeira-dama da cidade de Tamandaré (PE), Sari Corte Real. A criança saiu do apartamento de Sari, no 5º andar, para procurar a mãe e foi até os elevadores do condomínio. A patroa acionou a tecla do elevador que dá acesso à cobertura. Miguel parou no 9º andar, escalou um vão e alcançou uma unidade condensadora de ar, se desequilibrou e caiu do prédio.

Brenda Gomes também contou a história da baiana Danúbia Santos,  que perdeu o seu filho Marcus Vinícius, de 21 anos. Ele saiu de casa para comprar bolo para celebrar o aniversário de 1 mês do seu filho e foi atingido por tiros e chutes na costela, durante uma operação da polícia militar.

Mediando o bate-papo, Alane Reis ressaltou que histórias como as de Danúbia, Mirtes, Darcilene, Matheus e muitas outras registradas no Ebook só foram contadas porque a mídia negra cumpre essa função de contar a sua própria história: “Somos nós falando de nós para todo o mundo”. Alane ainda citou que há 65 mídias negras no Brasil e que esse trabalho pode se intensificar ainda mais se houver uma unidade: “Apesar da mídia negra ser tão forte, existe uma necessidade que a gente dialogue mais”.

Lígia Batista, da Open Foundation Society, também ressaltou a importância histórica da atuação das mídias negras em nosso país, principalmente em tempos de pandemia, onde se acentuaram ainda mais as desigualdades: “A mídia negra tem o papel de ressignificar a nossa história, acabando de uma vez por todas com o mito da democracia racial”.

“São as mídias negras que movem a estrutura narrativa, elas são as placas tectônicas narrativas”, diz Thales Vieira do Instituto Ibirapitanga: “Afinal de contas, as histórias estão sendo contadas o tempo todo, mas quem está contando as nossas histórias e como estão contando?” questiona.   

O diretor-executivo da Fundação Ford para Brasil e América Latina, Atila Roque, fez questão de ressaltar a importância da produção do Ebook ter sido feita por 11 jovens negros, além de as equipes de editoração e diagramação também serem negras: “É impossível não olhar para essas carinhas e não ter uma explosão de esperança e um sopro de visão de futuro, Nós precisamos redimensionar as nossas possibilidades de reimaginar o Brasil.”

Fernanda Lopes, ressaltou que o direito à informação é um direito humano e que a mídia negra cumpre o papel de informar e fazer valer esse direito, ao construir novas narrativas: “É importante reiterar esse lugar do jornalismo de escrevivência, que retrata a sociedade brasileira nessas diferentes dinâmicas, sendo a forma de oferecer para a sociedade a oportunidade de mudar paradigmas, desnaturalizar estigmas, construir novas representações sociais e um novo imaginário coletivo sobre a população negra brasileira”. Por fim, a diretora de programa do Fundo Baobá afirmou: “O futuro é a transformação e o novo normal é a mudança”.

Para Taciana Gouveia, da Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase), e grande parceira do Lab Afirmativa de Jornalismo desde 2016, não há nada de novo para as populações mais vulneráveis, no contexto da pandemia do novo coronavírus: “Não há nada de novo na forma como vivem as favelas, as populações vulneráveis e LGBT+, quem é privilegiado, continua sendo privilegiado. Não existe novo normal”.

Rosana Fernandes, da Coordenadoria Ecumênica de Serviço (Cese), também traz a sua visão crítica para o chamado “Novo Normal”: “O normal pra gente é isso que a gente vê todos os dias, é isso que está no Ebook, essa tragédia cotidiana, que nós mulheres, homens negros, particularmente, vivenciamos todos os dias, a juventude que é exterminada e a mulher que tem o seu filho morto por uma bala perdida, que na verdade é uma bala acertada”. 

 Leia gratuitamente o Ebook Narrativas Afirmativas em Tempos de Pandemia aqui. E acompanhe a live completa abaixo.

Fundo Baobá terá financiamento do Google.Org para apoiar Projetos De Justiça Racial

O Fundo Baobá para Equidade Racial – primeiro e único fundo dedicado exclusivamente à promoção da equidade racial no Brasil – contará com financiamento do braço filantrópico do Google para apoiar projetos focados no avanço da justiça racial e no combate à violência contra a população negra no Brasil. O anúncio foi feito nesta sexta-feira, 20, Dia da Consciência Negra e envolve doações que totalizam US$ 400 mil (cerca de R$ 2,1 milhões). 

Esses recursos viabilizarão edital a ser lançado em 2021 com vistas a apoiar 10 organizações negras para execução de projetos locais focados em temas como acesso à justiça e combate à violência contra população negra, em especial a juventude negra, dentro das prioridades de investimento do Fundo Baobá  ligadas ao eixo viver com dignidade.

Além do apoio financeiro, as organizações negras de base comunitária selecionadas irão participar de jornadas de fortalecimento institucional, a fim de que, no futuro, possam ter mais autonomia para buscar novos financiamentos,  disseminar resultados e boas práticas.   Parte dos recursos doados pelo Google também irá financiar a operação do Fundo Baobá. 

“Segundo o último censo da filantropia realizado por institutos e fundações empresariais, promoção da equidade racial responde por apenas 14% dos projetos e programas apoiados”, destaca Selma Moreira, diretora do Fundo Baobá. “O apoio do Google.org tem um potencial que vai além das organizações que serão apoiadas com os recursos financeiros destinados à justiça racial. Trata-se de um importante exemplo para que outras instituições abracem o desafio e  promovam a equidade racial no Brasil”, analisa.

“O Google continuará a apoiar a luta por justiça racial. Acreditamos em um sistema de justiça baseado na equidade para todos, orientado por dados e apoiado por soluções baseadas na comunidade. Temos orgulho de apoiar as organizações que estão enfrentando esse desafio complexo”, diz Justin Steele, diretor de Google.org nas Américas.

Diretoras do Fundo Baobá participam de lives sobre justiça social e fortalecimento de redes territoriais

A diretora-executiva do Fundo Baobá para Equidade Racial, Selma Moreira, participou de uma live organizada pelo Citi Brasil e mediada por Andréia Abreu, analista sênior de Projetos e Processos e líder da frente de comunidades – um grupo de afinidade do Citi Brasil voltado para comunidade negra e que tem como objetivo trabalhar as pautas sobre racismo estrutural, concientização da população não negra, além de apoiar a equipe de gestão do Citi nos esforços de recrutamento, bem como o desenvolvimento e retenção dos colaboradores negros. Gabriela Graci e Patrícia Salles, responsáveis por Operações e Comercial Card do Citi, além de madrinhas do Programa Já É – Educação Para Equidade Racial, edital lançado pelo Fundo Baobá e financiado pela Citi Foundation, também integraram a conversa, realizada em 9 de outubro.

Gabriela Graci perguntou sobre a ausência de negros em cargos de chefia. “A educação é apontada como um caminho para construção de uma sociedade melhor e mais inclusiva. Mesmo assim, muitas pesquisas apontam que mesmo negros com qualificação profissional ainda possuem salários menores no mercado formal, como podemos evoluir neste cenário?”, indagou. Para Selma,  esse cenário é reflexo do racismo estrutural. “Há muito o que se fazer, estamos dando ‘passinhos curtos’, mas têm passinhos sendo dados. Não há como pensar o desenvolvimento de uma sociedade e da inclusão sem dialogar a educação, sendo ela de qualidade e inclusiva para todos. O Fundo Baobá promove a equidade racial, e quando falamos sobre equidade, estamos falando de justiça, e não sobre como encontrar novos caminhos mágicos”. 

Segundo a diretora-executiva, promover a equidade racial é uma missão de todos. “O racismo estrutural afeta a nossa constituição e a sociedade, mas, mesmo assim, tem muita gente que diz que não fez parte disso, você pode não ter feito parte objetiva do problema, mas você pode fazer parte da solução, isso que é mais importante. Esse diálogo que estamos fazendo aqui se trata de mover essa forma de pensar, para que a gente construa pontes fortes e conectadas, para pensar em caminhos para o Brasil que permita o desenvolvimento de todas as pessoas de forma igual”. Finaliza.

https://www.youtube.com/watch?v=N5_wfpjbk_0&feature=youtu.be 

Vinte dias depois, foi a vez da diretora de programa do Fundo Baobá, Fernanda Lopes, participar da live Semear Ação da Juventudes, uma iniciativa do Centro de Promoção da Saúde (CEDAPS Brasil), em parceria com o programa Jovens Construtores. O bate-papo abordou ações de promoção de saúde, equidade e fortalecimento de redes territoriais no combate à Covid-19. Quem mediou a conversa foi o assessor de projetos do Jovens Construtores, Hugo Sabino. Além da Fernanda Lopes, participaram membros do programa Jovens Construtores que tiveram as suas iniciativas apoiadas pelo Fundo Baobá no edital de Doações Emergenciais no combate à Covid-19, entre eles: Thalyta Cunha, Juliano Pereira, Pâmella Santos, além de Diego Nóbrega que não pode participar do evento ao vivo, mas enviou um vídeo.

Com a mesa virtual aberta para o bate-papo, Thalyta Cunha, da região de Del Castilho (RJ),  falou da sua iniciativa apoiada, que consistiu na impressão do material pedagógico para as crianças que estavam sem aula, devido à pandemia: “Pensou-se em deixar as crianças em casa, em desenvolver atividades pedagógicas e aulas online, sendo que a gente mora em um país no qual uma entre cada quatro pessoas não têm acesso à internet, isso são 46 milhões de brasileiros, em um país de 209 milhões de habitantes, é muita gente que não tem acesso a informação, e foi pensando em tudo isso que eu tive a ideia de fazer a impressão do material pedagógico, enviado pela Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro, juntamente com a distribuição de kit lanche para essas crianças”. Com o fechamento das escolas, outro problema foi identificado por Thalyta: “As crianças continuaram na rua, sem camisa, descalço e soltando pipa, eu vi crianças brincando na lixeira, foi um trabalho de formiguinha ter que explicar tudo isso, que além da Covid-19 tinha a leptospirose, dengue e muitas outras doenças”. Para Thalyta, o engajamento de uma mãe da comunidade, foi primordial para a divulgação da sua atividade: “Eu não fiz flyer e nem panfletos, a divulgação foi boca a boca, chamei uma das mães, que conhece todo mundo da comunidade, sendo super ativa e engajada, e eu contei do projeto pra ela e pedi segredo, por ser poucas vagas, no dia seguinte tinha mais de 20 pessoas batendo na minha porta”.

Para a jovem, foi gratificante a realização dessa ação: “Eu ouvi relatos de pessoas que estavam gastando cerca de cinquenta reais, imprimindo material da prefeitura e eles disponibilizavam material semanalmente, uma família com cinco crianças não consegue dar conta desse gasto. Eu me senti extremamente abençoada em ver as crianças estudando e ver os agradecimentos dos responsáveis.”

Thalyta reforça a importância de projetos como estes, na construção de uma sociedade melhor: “Eu sou fruto de um projeto assim, e hoje eu me vejo como uma ferramenta, para que essas pessoas passem pela mesma evolução que eu passei”.

Diego Nóbrega, da Cidade de Deus (RJ), trabalhou a comunicação como ferramenta no combate ao coronavírus e principalmente na conscientização dos moradores da comunidade. “O que me incentivou a realizar esse projeto é que o pessoal continuou com aglomerações, barzinhos e festas, colocando a vida de muita gente em risco. Diante disso, coloquei um carro de som para rodar na comunidade durante cinco dias, pedindo para o pessoal se conscientizar e sair de casa somente se fosse necessário. Fiz banners e coloquei nos pontos mais vistos da nossa comunidade. Além disso, foram distribuídas 20 cestas básicas e kits de higiene para 20 famílias mais vulneráveis da nossa comunidade.” Afirma Diego, que realizou um trabalho de pesquisa para saber quais áreas do território necessitavam de mais atenção: “Fui para o lugar mais caótico da comunidade, onde o pessoal mais necessitava, fiz uma pesquisa e dali eu tirei as 20 famílias e fiz a distribuição das cestas básicas e kit higiene”. Para a realização da ação, o jovem estabeleceu parcerias, como, por exemplo, com o CEDAPS, que auxiliou na compra das cestas básicas. “Me senti completamente realizado por estar fazendo algo pela minha comunidade, realmente as pessoas precisavam muito de ajuda”, finaliza Diego 

Trabalhar a comunicação na comunidade também foi o projeto da Pâmella Santos, da região da Pavuna (RJ). Ela e o irmão colocaram uma caixa de perguntas em frente ao portão de casa. “Sob a caixa tinha um cartaz que questionava qual era dúvida deles sobre a doença, e em pouco tempo nós recebemos muitas perguntas. Foram feitos panfletos, com as perguntas que os moradores fizeram e hoje em dia eles ainda estão circulando”. Assim como Diego, Pamella também realizou um trabalho de pesquisa, mapeamento e monitoramento de uma comunidade carente, para realizar entrega de kits de higiene para os moradores: “Eu e mais quatro jovens mapeamos uma comunidade muito vulnerável, dentro do Complexo da Pedreira, que tinha esgoto a céu aberto, e levamos kits de higiene. Mesmo usando máscara, era nítida a felicidade no olhar em receber algo que eles não tinham condições de comprar.”

Para Pamella, havia uma mistura de sentimentos, ao mesmo tempo que existia a alegria de fazer o bem a quem necessita, havia a insatisfação com o poder público diante daquela situação: “A nossa ação coletiva foi muito importante, considerando que político nenhum tinha entrado naquela favelinha, nós fomos os únicos a entrar para levar um pouco de esperança e dignidade para aquelas pessoas”, diz a jovem que relembra que foi alertada por uma moradora, que a atitude dela, e dos jovens que a acompanhava, era de muita coragem, considerando o ambiente vulnerável que eles se encontravam, principalmente em meio à uma pandemia. 

Ainda em sua fala, Pamella ressaltou a importância da ação realizada em rede e de estabelecer parcerias e trabalhar em comunidade: “Somos um fruto daquilo que despertamos em nós mesmos e sabemos que não estamos sozinhos, e não é preciso ser super herói para fazer algo, é preciso buscar ativamente ser uma luz em um mundo cheio de sombras. Aquilo que a gente faz, é aquilo que a gente é, seres de enorme valor, basta apenas a gente escolher a nossa causa pessoal, aquilo que ressoa em nosso coração e na nossa cabeça, para agir. Nós somos a rede, nós somos a referência”.

Fernanda Lopes, explicou sobre a missão e as prioridades do Fundo Baobá para Equidade Racial,  sobre o que foi o edital, teceu comentários sobre cada uma das exposições, e reiterou que são iniciativas como essas que movem o trabalho do Fundo Baobá. “No ano que vem, o Fundo Baobá completa dez anos e eu espero que essa iniciativa que mobilizou cinco participantes do Jovens Construtores possa mobilizar muitos outros jovens para estar conosco”, finalizou.  

Veja a live completa aqui: 

https://www.youtube.com/watch?v=hSD5BvCB7V0&feature=youtu.be 

Fundo Baobá na imprensa em outubro

O principal destaque do Fundo Baobá para Equidade Racial na imprensa no mês de outubro foi o edital de Chamada para Artigos que subsidiem a filantropia para justiça social, com foco na promoção da equidade racial, considerando os impactos da pandemia da Covid-19 para a população negra.

Com as inscrições encerradas no dia 30 de outubro, para figurar como primeiro(a) autor(a) do artigo era necessário ser especialista, mestre ou doutor com produção acadêmica concernente às áreas priorizadas pelo Fundo Baobá, como educação, saúde; população quilombola; juventude negra; racismo religioso; violência de gênero, além de ciência e tecnologia; desenvolvimento econômico; comunicação, arte e memória, violência contra a população LGBTQI+ e violência racial

O Canal Futura, assim como em outros dois editais anteriores, produziu o quadro Minuto Futura dedicado ao novo edital do Fundo Baobá, sendo exibido na TV e nas redes sociais da emissora, na última semana das inscrições.

Os portais negros, como o Alma Preta e Aliança Pró-saúde da População Negra, além de sites de filantropia para justiça social,  como Desabafo Social, Prosas e Fundo Brasil, também divulgaram o edital de Chamada para Artigos.

Tratando-se de um edital voltado para produção acadêmica, o mesmo foi destaque na página oficial do Núcleo de Estudos de Gênero Pagu da Unicamp e também na página da Associação Brasileira de Pesquisadores Negros, que já havia falado do edital em setembro no seu site oficial.

E portais de notícias do Brasil inteiro, como o Metropolis, O Semanário, Climatempo, Gazeta Brasília, Portal Notícias MG, Capital em Foco, Estado do Paraná, entre outros, falaram do novo edital do Fundo Baobá.

Confira todas as reportagens de outubro sobre o Fundo Baobá:

Metropolis – 01/10     

Jornal O Semanário – 01/10

Climatempo – 01/10

Gazeta Brasília – 01/10

Portal Notícias MG – 01/10

Estado do Paraná – 01/10

Diário do Porto – 01/10

Revista Sampa – 01/10

Capital em Foco – 01/10

Rio das Ostras – 01/10

Alma Preta – 08/10 

Desabafo Social – 08/10 

Aliança Pró-saúde da População Negra – 16/10

Pagu – 17/10

Futura – 29/10

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Prosas 

Fundo Brasil

Estado participativo. Só que não

Apesar do assunto política se manter em evidência durante o período eleitoral, a ciência política é vivenciada a todo momento. É notório que determinados territórios, considerados negros, empobrecidos, periféricos e quilombolas, carecem de atenção e atuação do poder público. Para discutir sobre participação política, resiliência comunitária e recuperação econômica, conversamos com Lúcia Xavier, assistente social e coordenadora da ONG Criola, organização com mais de 25 anos de trajetória na defesa da sociedade civil e parceira do Fundo Baobá para Equidade Racial no Programa de Aceleração e Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco.

 

Quando falamos em territórios, principalmente territórios negros, empobrecidos, periféricos, quilombolas, como fazer que as suas demandas e necessidades sejam ouvidas e atendidas pelo poder público?

Há uma ideia de incapacidade da população de arregimentar e correr atrás dos seus direitos parece que elas não fizeram as perguntas certas na hora certa para a população garantir os seus direitos. Na verdade, faz parte da dinâmica do racismo institucional garantir que o que você faz e o que pensa não faça sentido. Então, por mais que as pessoas tenham uma experiência na solução dos problemas, elas vão enfrentar um racismo institucionalizado que vai fazer com que essa entrega seja entendida como ainda não acabada, ainda impossível de ser executada. Daí uma necessidade de uma mobilização da sociedade, de que você consiga trazer para um contexto social essa demanda e fazer com que ela seja compreendida, quer seja no ponto de vista da solidariedade ou do compromisso político, como uma demanda legítima. Você pode não conseguir o efeito 100%, mas você pode ter uma resposta à altura desses acontecimentos. Um exemplo: morte materna –  a sociedade se corrói com essa questão da morte materna, mas ela não é capaz de se movimentar a ponto de pedir o fim da morte materna. Então fica-se sempre achando que você ainda não alcançou essa fala porque você ainda não soube traduzir esse conhecimento, essa necessidade, mas na verdade nos falta ainda uma possibilidade de sensibilizar, tanto o próprio setor da população negra quanto fora dele, sensibilizar a sociedade de modo geral, para que sejam dadas respostas à altura do que a gente necessita.

 

No que se diz respeito à Resiliência Comunitária: o quanto as comunidades, os  territórios negros, para sobreviver, precisam se organizar para ocupar o espaço que o Estado não ocupa?

É importante frisar que o Estado não deixa nada vago. Não tem espaço vago na política. Ele que faz você acreditar que falta algo em você para alcançar aquilo, para dar o retorno necessário para o desenvolvimento da sua atuação, porque, afinal de contas o Estado é um espaço da disputa entre grupos. Fica parecendo falta de competência dos grupos no acesso à representação política, que os grupos não foram capazes de construir representação suficiente. E você acredita nisso, você acredita que não tinha candidatos preparados, que não tinha candidatos adaptados para este processo. Então você fica imaginando que tem uma vaga que nunca vai ser preenchida, e aí você olha e acha que isso tem a ver com o racismo, mas na verdade tem a ver também com modo que se estruturam essas relações para fazer você imaginar que falta ainda capacidade para essa população acessar esse mecanismo. Então a ideia é que parece que tem uma vaga, mas na verdade há uma estrutura para você não participar. É como se eu te oferecesse um emprego para você varrer a minha rua, mas em seguida, quando você se coloca à disposição, eu digo que a qualificação para essa vaga é saber pular amarelinha; aí você se prepara para pular amarelinha, mas no mesmo momento eu falo que é uma amarelinha que não usa somente os pés, mas as mãos também. Ou seja, eu vou dando dificuldades que parecem parte do jogo, mas que no fundo têm a ver com as estratégias do racismo institucional.

Lúcia Xavier, assistente social e coordenadora da ONG Criola

Como podemos classificar a participação dos habitantes de territórios negros, territórios empobrecidos, periféricos, quilombolas no espaço político? E se são candidatos, conseguem se eleger?

Eu imagino que a população tem um modo de operar os processos políticos, analisando os seus problemas e a capacidade de diferentes sujeitos a dar conta desses problemas. Por exemplo, se eu tenho problemas de transporte na região onde eu vivo, no meu território, essa questão se apresenta pra mim como uma questão importante, que precisa ser tratada. Então eu vou olhar na constelação de candidatos aqueles que também olham para os mesmos problemas que eu. Se você é igual a mim, esteve nas mesmas condições, qual é a sua chance de alcançar essa disputa e trabalhar esse direito? Então o que eu acho que tem acontecido é que a população faz uma boa análise e, inclusive, até vota nos candidatos do seu próprio território. Mas ela também aspira outras questões relacionadas ao seu direito, à força política para fazer mudanças naquele território e que se relacionam com o conjunto da cidade, com estado e com o país. É claro que tem fisiologismo, tem a compra dos votos que, nesse sentido, ultrapassa as dinâmicas da política. Muitos acham que a população vende o seu voto: claro que não! Às vezes ela está presa a armadilhas que estão nas mãos de políticos, como vaga em escola ou o acesso a serviços de saúde. Então, de certa maneira, fica parecendo que ela vendeu o voto, mas não: é o sistema que opera de maneira que ela não tenha oportunidade de apresentar novas candidaturas, novos representantes e novas possibilidades de mudanças. Eu acho que a população arrisca sempre nessa análise, escolhe candidaturas que vão dar conta dos problemas que ela está elegendo nesse processo: saúde, trabalho, educação, segurança… e a partir daí planeja essa candidatura, mesmo que às vezes pareça conservadora e violenta. Por que nos parlamentos tem tantos policiais e pessoas do mundo militar? Porque a sociedade está achando que esse grupo pode vir a enfrentar um problema que ela não consegue, que é a violência armada, o crime organizado, a violência policial. A população quer alguém que venha dar conta de dinâmicas que ela mesma não dá conta. A Marielle Franco foi uma liderança política que quando foi eleita, os dois grupos a estavam analisando corretamente, o grupo interno e o grupo externo. O grupo interno, no caso a Favela da Maré, que ela teve votos lá também, analisava que ela seria uma boa representante para remover essas barreiras e garantir direitos. E, o grupo externo a enxergava com mais força ainda, porque vinha daquele lugar e, para além do seu próprio discurso, ela seria capaz de  projetar a sua voz para a sociedade, à favor daquele grupo. Por isso eu entendo que quem votou na Marielle não foi a elite, eu entendo que quem votou na Marielle tinha o mesmo projeto, tanto os que moravam na favela,quanto aqueles que moravam fora. Votaram pensando nas mudanças e nas melhorias para aquele local, para aquela cidade, para aquele grupo. Votaram por estas razões, e você vê que até hoje que ela segue sendo  referência. A  partir dela se ampliaram mais representações políticas que vinham desse mesmo campo.

 

O Programa de Aceleração e Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco, do Fundo Baobá, surgiu para fomentar lideranças femininas em espaços de poder. Para você, o que falta para que as mulheres, principalmente mulheres negras, vindas de territórios negros, ocupem esses espaços políticos?

Eu vou olhar isso de dois modos: ser uma liderança na sociedade, promovendo processos de fortalecimento das mulheres e da população negra, ampliando os horizontes da democracia brasileira, melhorando a qualidade de vida dessa população. Acho que já é uma possibilidade das mais importantes você ter gente em vários setores debatendo e discutindo a questão racial e, ao mesmo tempo, pontuando a partir daí direitos, liberdade, democracia. E o outro ponto tem a ver com as dinâmicas institucionais, aquelas que também vão estabelecer direitos que podem melhorar a democracia e ampliar liberdades. Quando eu vejo alguém se candidatando a algum cargo público em um parlamento, eu também penso que essa pessoa possa dirigir uma unidade de saúde e uma unidade escolar, pode gerenciar programaticamente secretarias, ministérios, direção de instituições, o que é claro, uma disputa complexa, mas necessária. Mas não é possível olhar  só um lado, é preciso ter vozes fortes na sociedade. Porque parte das mudanças produzidas na sociedade têm a ver com a capacidade dos setores envolvidos nessa discussão de sensibilizar e convencer outros setores. Pegando como exemplo a eleição da Marielle e o lugar de onde ela veio: ela convenceu outros setores a apoiar as suas causas, e essa experiência política de participação da sociedade é de muita importância. A Marielle, que estava se candidatando a um cargo público no parlamento, foi capaz de expressar na sociedade a necessidade de fazer valer essa ideia, esse propósito. Ela também moveu a estrutura da sociedade a pensar na população negra, para enfrentar a violência contra essa população, para pensar nos territórios que essa população vive. Então um projeto como o Programa de Aceleração e Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco deve ter a capacidade de construir lideranças na sociedade que estejam em outros setores além do público, para fazer valer o direito da população.

 

Hoje, como tem sido a atuação da ONG Criola dentro desse contexto de resiliência comunitária, recuperação econômica e participação política?

Nós temos uma experiência muito importante. Agora, durante a pandemia da covid-19, nós consultamos algumas lideranças sobre o que elas estavam fazendo diante desse processo. Era importante compreender como elas estavam enfrentando as violações de direitos, se elas estavam se solidarizando com o seu território e com a população deste território. E a gente descobriu que elas estavam buscando soluções de todos os níveis: soluções em torno da prevenção, dos impactos econômicos, da fome, da falta de renda. E nós perguntamos se elas queriam atuar nessa mesma direção,  promovendo direitos humanos, e elas aceitaram, até porque elas já estavam atuando nesse campo. Nós queríamos remover barreiras contra esses direitos, para que, só alguém vivendo nessa realidade poderia nos ajudar. Perguntamos se essa ação de ajuda humanitária não poderia ser conjugada também com uma ação de direitos, e elas toparam. Então, as lideranças que fecharam esta parceria com Criola promoveram distribuição de alimentos e também ajudaram no cadastramento para o auxílio emergencial, identificaram e foram ajudando as mulheres a removerem algumas das barreiras que as impediam de terem acesso ao auxílio. O auxílio era essencial pois se tratava de algo de mais longo prazo, em comparação à  ajuda solidária, que teria um fim em algum momento, tendo em vista que a pandemia atingiu todo mundo. Acabou ocorrendo que essas mulheres, com apoio das lideranças,  resolveram problemas da documentação, acionaram serviços públicos que estavam paralisados, reivindicaram direito à saúde, à assistência, trabalharam junto com órgãos de Justiça, como a Defensoria Pública, para poder alcançar esses direitos, promoveram a prevenção – não só a distribuição do material, mas também garantiram o acesso à informação correta. Também puderam reunir outras forças comunitárias para enfrentar o problema, atuaram junto com jovens, igrejas, terreiros, coletivos e grupos comunitários, todos trabalhando nas lógica e na dinâmica de direitos.

Para quem quiser mais informações sobre essa iniciativa, é só acessar o agoraehora.org

 

  

Pandemia impõe desafios de ações mais efetivas para proteção infantil

Pesquisa feita pela Unicef, intitulada Impactos Primários e Secundários da Covid-19 em Crianças e Adolescentes, revelou que famílias com crianças e adolescentes até 18 anos foram as mais impactadas pela pandemia no Brasil. Realizado pelo Ibope, o estudo, que foi divulgado em agosto de 2020, mostra que esses grupos foram os que tiveram maior redução de rendimentos com, por exemplo, a perda de emprego e, consequentemente, maior exposição à fome e à violência. 

O que o levantamento expôs em números, a pedagoga Viviana Santiago, 40 anos, conhece na prática. Gerente de Gênero e Incidência Política da Plan International Brasil, ONG voltada à promoção dos direitos das crianças e igualdade para meninas, ela convive diretamente com as famílias e comunidades em contexto de vulnerabilidade agravada pela crise sanitária. 

Viviana Santiago é Gerente de Gênero e Incidência Política da Plan International Brasil

Segundo Viviana, que atua no terceiro setor há 14 anos, seis dos quais na organização internacional, a pandemia alimentou a violência, o estresse e a fome nessas famílias. “Com a desmobilização das redes de cuidado das crianças e da educação infantil, essas pessoas perderam muito. Centenas ficaram sem rendimento ou emprego. Outras precisaram continuar trabalhando para sustentar as famílias”, afirma.

Os responsáveis pela renda tiveram que trabalhar, deixaram muitas vezes os filhos menores sob a supervisão e cuidado dos mais velhos (e não tão mais velhos assim!). Os que ficaram sem renda foram ainda mais expostos, pois não tinham o que oferecer à família para garantir o básico. “Ou seja: a pandemia acrescentou mais estresse ou mais trabalho para esses núcleos”, completa Viviana.

Com a falta de espaços de alimentação e acolhimento para essas mulheres e seus filhos, aconteceu o aumento da violência intrafamiliar – física ou sexual -, com abuso e exploração, o que reverberou especialmente na vida das crianças pequenas. Foi nesse contexto que o Fundo Baobá lançou em julho o edital de doações emergenciais com foco em famílias com crianças de 0 a 6 anos. O objetivo era selecionar profissionais dos setores saúde, educação e assistência social capazes de formular e implementar iniciativas de apoio, no contexto da pandemia Covid-19, a famílias com mulheres e adolescentes grávidas, mulheres que deram à luz, homens responsáveis e corresponsáveis pelo cuidado de crianças nessa faixa etária em seus núcleos. A iniciativa, realizada em parceria com a Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, a Porticus América Latina e a Imaginable Futures, atraiu mais de 200 pleiteantes de todas as regiões do Brasil. Foram selecionadas 56 propostas que estão recebendo apoio no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Por regiões, o número de projetos contemplados é o seguinte: 24 do Nordeste, 23 do Sudeste, 4 do Norte, 4 do Centro Oeste e 1 do Sul. A lista de selecionados foi divulgada no final de setembro e pode ser conferida aqui.

Parte da solução para interromper esse ciclo, segundo Viviana, é fortalecer as redes de proteção para que continuem sendo capazes de cuidar, não apenas das crianças e adolescentes, mas também dos provedores da família para recompor a renda e impactar o menos possível o desenvolvimento infantil. “Quando acontece a retomada do trabalho, sem o suporte para essas crianças e adolescentes, aumentam as chances do trabalho infantil e de que eles fiquem em risco”, explica. “Por isso, é tão importante criar ações coordenadas de proteção para essas famílias.”

Renata Santos, 43 anos, ou simplesmente “Meduza com Z” (seu nome artístico), concorda. Diz que a pandemia evidenciou as vulnerabilidades dos territórios, por exemplo, como Sapopemba, na zona leste de São Paulo, que lidera os rankings de pessoas infectadas e de vítimas fatais. “Muitos residem com suas  famílias em ocupações, favelas, vielas, casas pequenas,  não tendo como manter o isolamento social”, afirma, com a certeza de quem lida com essa realidade todos os dias.

Perda de empregos e escolas fechadas – que, embora oferecessem aulas on-line deixaram milhares de estudantes sem acesso porque ou não tinham equipamentos ou não dispunham de internet – pressionaram ainda mais as famílias, aumentando os casos de maus-tratos, a negligência, a violência doméstica e sexual.

Meduza com Z do projeto CapoELAndo

“Aqui, foi uma tragédia declarada”, completa. “A expectativa é de que, quando a pandemia acabar, os governantes percebam o quanto continuamos sendo prejudicados. Dessa forma, implantem políticas públicas com ofertas regulares de serviços que possam, de fato, suprir as necessidades básicas da população da periferia.”

Também uma das contempladas pelo Fundo Baobá para Equidade Racial no Programa de Aceleração do Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco, Renata tem uma longa trajetória de atuação social. Recentemente, dedica-se ao projeto CapoELAndo, que reúne professoras e alunas, desenvolve iniciativas socioculturais para mulheres negras e periféricas de Sapopemba.  Afinal, Renata sabe que ali convivem, lado a lado, criminalidade, drogadição, violência doméstica e todo tipo de violação de direitos. Por isso, capitaneou uma campanha junto ao Enfrente/Benfeitoria com o CapoELAndo – Luta por Direitos Fundamentais. 

“Conseguimos arrecadar bom recurso financeiro que permitiu auxiliar as nossas atendidas, seus familiares e outras centenas de famílias necessitadas com doação de cestas básicas e produtos de higiene. Além disso, realizamos visitas para orientá-las sobre a importância de prevenção do coronavírus”. Os projetos não param por aí. Se depender do fôlego da Meduza com Z, tem ainda muita arte, esporte e lazer na mira dela para fortalecer sua comunidade.

Ir aonde a necessidade está

Danúbia Santos, 34 anos, líder negra apoiada pelo Programa de Aceleração do Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco (relembre  o programa aqui), executiva social da Central Única das Favelas (CUFA-Bahia) e coordenadora do Coletivo Negritude Sussuarana, é incansável. Desde a adolescência, participa de atividades ligadas ao teatro e à dança, dedicando parte do seu tempo a projetos culturais. Nesse processo, não esquece da necessidade de conscientizar os jovens das comunidades para as questões de etnia, cidadania, educação, identidade, sexualidades, drogas e diversidade religiosa, realizando, por meio da arte, seu trabalho de desenvolvimento político e social. Confira sua experiência nas comunidades em tempos de Covid-19: 

Danúbia Santos é executiva social da Central Única das Favelas (CUFA-Bahia) e coordenadora do Coletivo Negritude Sussuarana

Boletim – Em que consiste o seu trabalho na CUFA/BA? Como começou a sua trajetória nessa área? 

Danúbia Santos – A CUFA (Central Única das Favelas) é uma rede com foco em empreendedorismo social que atua em 27 estados e mais 22 países. Na CUFA Bahia eu sou executiva social e coordenadora do núcleo Sussuarana. Comecei  no movimento social há uns 20 anos, em uma ONG, a CRIA (Centro de Referência Integral de Adolescentes). Aos 14 anos, já era uma jovem dinamizadora e movimentava diversas ações em minha favela (Sussuarana) e em Salvador por meio de atividades artísticas e culturais que liderava, do Movimento HIP HOP e ações voltadas para equidade racial. Não parei mais. Conheci a CUFA em 2010 e fiquei encantada, pois tive a oportunidade de conhecer meu ídolo MV Bill e o visionário Celso Athayde. Já lia muito sobre eles nas revistas de RAP e, apesar de não haver uma formação forte da CUFA na Bahia, fazíamos sempre parcerias para promover várias ações na minha comunidade.  

Boletim – Para você, que convive diariamente com a realidade dessas famílias, quais os principais desafios, no contexto da pandemia, do isolamento e do distanciamento social? 

Danúbia – Acho que o principal desafio neste momento são as pessoas que moram em favelas se manterem em casa. A favela não parou, pois muitos precisaram permanecer trabalhando para garantir o sustento de suas famílias. São padeiros, trabalhadores de supermercados, ambulantes, garis… Sem essas pessoas, a sociedade, de modo geral, não poderia inclusive garantir seu próprio sustento mesmo tendo recursos. O distanciamento é praticamente impossível, pois muitas vezes estamos falando de famílias numerosas, que moram em pequenos cômodos. Por isso,nas ações de apoio emergencial,  além da alimentação, focamos também na distribuição de álcool 70%, máscaras e produtos de higiene para, ao menos, reduzir os impactos da Covid na vida dessas pessoas. Além disso, a CUFA criou o programa “criança da favela”, por meio do qual recebemos doação de brinquedos para distribuir para crianças que neste momento ficam em casa ociosas e também têm direito de brincar. 

Boletim – Você que está em contato direto com a realidade dessas famílias e de seus filhos, o que destaca como essencial nesse momento?

Danúbia –  A situação é muito complexa. Vejo que muitas mães precisam retornar ao trabalho, mas as aulas não voltaram. Então, elas ficam sem opção. Também por isso os auxílios não podem parar ainda porque muitas famílias necessitam, já que perderam seus trabalhos ou não podem sair de casa por conviverem com moradores de grupos de risco ou crianças que não podem ficar sozinhas. Neste momento, é essencial também ter a sensibilidade de perceber as necessidades de cada público. Em Sussuarana, por exemplo, além de ações específicas com ambulantes e recicladores, fizemos a distribuição de cestas para o publico LGBTQIA+.

CUFA-BA em ação

Boletim – De que forma a pandemia realmente impactou essas famílias? Que perspectivas enxergam?

Danúbia – Muitas famílias de fato tiveram seus recursos reduzidos neste momento de pandemia  – seja por não poderem sair para trabalhar ou por terem perdido seus empregos. O que percebo hoje é que muitas pessoas estão meio que ‘jogando pra cima’. Aqui em Salvador já houve a abertura de diversos espaços. Querem limitar os locais de lazer, mas o transporte público permanece reduzido, obrigando as pessoas a pegarem ônibus lotados e ficarem muito próximas. É um problema estrutural, pois, por mais que as pessoas queiram se prevenir, são obrigadas a ficar coladas. 

Boletim – O que é mais gratificante no seu trabalho e o que é mais desafiador?

Danúbia – É muito gratificante poder contribuir com as pessoas de alguma forma, principalmente mulheres negras que ficaram sem perspectiva neste momento e viram uma pequena contribuição chegar em suas casas para, pelo menos, amenizar a situação. Temos consciência que as pessoas querem mesmo é trabalhar e ter seu poder aquisitivo. Desejam pegar seu dinheiro e comprar o que quiserem. É isso que traz dignidade. Porém, neste momento de pandemia, está sendo mais do que necessário fazer as doações para levar o alimento à mesa das famílias. Isso nos faz acreditar em um futuro mais humano. O maior desafio é fazer com que as pessoas compreendam a importância da prevenção. Na verdade, nossa morte é banalizada há muito tempo. Então, é difícil fazer as pessoas acreditarem que vale a pena proteger a sua vida e a dos outros. 

Boletim – Em que consiste o seu projeto de desenvolvimento individual apoiado pelo Programa Marielle Franco? E de que forma complementa sua atuação? 

Danúbia – Meu projeto visa ao meu desenvolvimento pessoal, social e profissional. Passar no edital foi e vem sendo de extrema importância, primeiro porque eu tenho a oportunidade de fazer investimentos em minha formação acadêmica e também por transmitir os conhecimentos adquiridos para outras pessoas. Desde que ingressei no Programa, me sinto muito fortalecida e capaz de realizar coisas antes inimagináveis. Consigo  desenvolver habilidades e sair da minha zona de conforto, trazendo bons resultados também na CUFA. Fico muito feliz e lisonjeada em ver minha favela ser pautada em âmbito nacional e internacional. 

Fundo Baobá encerra em 12 de outubro a Chamada para Artigos Sobre Ações de Filantropia para Equidade Racial Pós-Pandemia

O prazo está acabando: vão até 12 de outubro as inscrições no edital de artigos sobre ações de filantropia para equidade racial no contexto pós-pandemia.  Serão selecionados até 20 artigos e seus autores vão receber verba de apoio no valor de R$ 2,5 mil cada. Para 2021, ano em que o Fundo Baobá para Equidade Racial completa 10 anos de fundação, uma edição eletrônica bilíngue (português-inglês) de um livro com os artigos será publicada. 

O edital é aberto a toda a comunidade acadêmica. Para figurar como primeiro(a) autor(a) do artigo esperamos contar com especialistas, mestres ou doutores com produção acadêmica concernentes às áreas priorizadas pelo Fundo Baobá para os seus investimentos programáticos: educação para equidade racial, do ciclo básico à pós-graduação; população quilombola; juventude negra; racismo religioso; saúde da população negra e ciclo de vida; masculinidades negras; violência de gênero contra mulheres negras; violência de gênero contra lésbicas, gays, travestis, transsexuais, queers, intersex negrxs; violência racial: segurança cidadã; racismo ambiental;   população negra, ciência e tecnologia; população negra e desenvolvimento econômico; população negra, comunicação e arte; população negra e memória.

 

O objetivo do edital, que é parte do projeto Consolidando Capacidades e Ampliando Fronteiras e integra uma parceria com a Fundação Ford, é a produção de conhecimento que possa fortalecer a atuação do Fundo Baobá no apoio a organizações e lideranças negras. Por isso, a participação da comunidade acadêmica é muito importante. 

A primeira etapa da seleção será de 26 de outubro a 10 de dezembro de 2020 e contará com o apoio de um grupo de pesquisadores com experiência comprovada na área e com título de doutor há pelo menos cinco anos para realizar análise crítica dos artigos.  A lista final dos textos que irão compor a publicação será divulgada no site do Fundo Baobá até o dia 22 de fevereiro de 2021. 

Clique aqui e inscreva seu artigo. 

Open Society Foundation: a força da filantropia na luta antirracista

Fundada na década de 1980, a fundação atua mundialmente com foco em combater desigualdades e o preconceito. Atualmente, os países que mais recebem investimentos são o Brasil e a Colômbia, fortalecendo as lideranças e organizações negras. Conheça parte dessa história que é contada por Lígia Batista, assessora especial do Programa para América Latina. 

Boletim –  Quando a Open Society Foundations trouxe para o centro a questão da equidade racial nos  Estados Unidos e no Brasil?

Lígia Batista – O trabalho da Open Society nos Estados Unidos começou na década de 1980, com foco em melhorar a qualidade dos cuidados paliativos e reformar a política de drogas, dotada de práticas severamente punitivas que recaíam especialmente sobre os negros. Na década de 1990, o trabalho foi ampliado para combater o preconceito nas escolas, no policiamento, nos processos eleitorais e no sistema judiciário, bem como foi intensificado o apoio àqueles que defendiam mais  níveis de prestação de contas pelos governos e a proteção dos direitos civis e políticos. Em 2020, a fundação investiu $220 milhões de dólares para fortalecer o poder de atuação e disputa política das comunidades negras norte-americanas, em resposta às ondas de protestos que ainda tomam as ruas do país em reação aos assassinatos de afro-americanos pela polícia. No Brasil, a fundação tem aumentado sua atuação no fortalecimento de lideranças e organizações negras. Apoiamos cada vez mais grupos que se posicionam na vanguarda das disputas políticas e no enfrentamento ao racismo, seja no campo da inovação democrática, da construção de contranarrativas ou do reposicionamento do debate sobre direitos humanos neste país, no qual raça e etnia devem ser entendidas como eixos centrais. Além disso, buscamos contribuir para alavancar o debate sobre o papel que a filantropia deve ter na luta antirracista.

Boletim –  E a atuação com o Fundo Baobá?

Lígia Batista – Um dos maiores apoios já realizados pela fundação no Brasil foi para a consolidação do Programa de Aceleração do Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco. A parceria com o Fundo Baobá, iniciada em 2018, visou a consolidação desse projeto que é fundamental. O assassinato de Marielle diz muito a respeito do medo que as elites brancas cisheteronormativas carregam diante do levante de mulheres negras que desafiam as estruturas de poder. E nada é mais vigoroso do que responder a essa tentativa de silenciamento com o fortalecimento de outras vozes negras femininas em todo o país que dedicam sua energia à luta por equidade racial no Brasil sem perder de vista as dimensões de gênero, classe, sexualidades e território, dentre outras. A existência desse Programa, feito por e para mulheres negras, só reforça o senso de que não avançamos sozinhas, mas de forma coletiva.

Boletim – Por que a Open Society Foundations considera relevante apoiar iniciativas, programas e projetos que promovam a equidade racial?

Lígia Batista – Mais da metade da população brasileira é autodeclarada negra. Essa é uma dinâmica única que nos torna o país com a maior população negra fora do continente africano. Apesar disso, ainda que sejamos maioria, há uma clara distorção nas relações de poder. Negros e negras ainda são minoria em direitos, representação e participação política, além de alvos preferenciais da violência armada, da desigualdade econômica, do encarceramento, da intolerância religiosa e da violência de gênero. Assim, em um país majoritariamente negro, no qual uma minoria branca sempre controlou os sistemas de poder, apoiar ações que promovam a equidade racial deve ser uma prioridade. Lutar contra o racismo é lutar por uma sociedade que busque reparar o legado de dor e violência deixado pelo colonialismo e pela escravidão, combatendo as expressões contemporâneas de exclusão que até hoje ainda derivam desses processos históricos.

Lígia Batista é assessora especial do Programa para América Latina da Open Society Foundations

Boletim – Qual é o papel das fundações na busca por um mundo mais justo e igualitário?

Lígia Batista – O papel da filantropia no Brasil pode ser decisivo para a consolidação de um projeto diferente de presente e de futuro. Ainda que sem dominar os poderes econômicos e políticos que sustentam essa sociedade desigual, os movimentos negros têm dado conta de tocar múltiplas estratégias de ação, já tendo alcançado vitórias históricas. Grandes lideranças do setor filantrópico devem tomar partido nessa discussão, se posicionar do lado certo da história e promover ações concretas, para dentro e para fora de suas instituições. O setor precisa compreender que a neutralidade não existe e que todas as escolhas estratégicas de ação adotadas pelo investimento social privado partem de alguma perspectiva – e elas nunca foram racialmente ‘neutras’. Dessa forma, destaco que o compromisso com a equidade racial no setor deve se refletir na missão, visão e valores das instituições. É preciso incorporar a equidade racial ‘portas para dentro’, a partir, por exemplo, da definição de critérios objetivos e políticas internas para fortalecer a diversidade e equidade nos processos de contratação das equipes, com a garantia de que as vozes negras tenham espaço real de escuta e participação ativa na tomada de decisão. Essa diversidade deve se aplicar também aos conselhos. E pensando em ‘portas para fora’, é urgente investir e fortalecer cada vez mais lideranças e organizações negras da sociedade civil, incorporando o enfrentamento ao racismo de forma clara nos planos de ação.

Boletim – Além do apoio que oferece ao Fundo Baobá, no Brasil, que outros países têm iniciativas apoiadas?

Lígia Batista – A Open Society tem atuação em mais de 120 países ao redor do mundo. A fundação apoia o fortalecimento de sociedades abertas e vibrantes em todos os continentes e tem presença já consolidada e crescente na América Latina. Considerando especificamente o trabalho para equidade racial e as relações raciais na região, os países que hoje concentram a maior parte dos investimentos são Brasil e Colômbia, visando o fortalecimento de grupos afro-latinos e indígenas.

Boletim – Gostaria de fazer algum comentário adicional ou deixar um recado para as pessoas?

Lígia Batista – O recado que eu gostaria de deixar é que é preciso agir agora. Que não tenhamos que esperar por mais casos como os de Ágatha Felix, João Pedro, Rafael Braga, Preta Ferreira, Valéria Santos e tantos outros que escancaram o racismo cotidiano para nos lembrarmos que essa causa é real e urgente. Além disso, destaco que a luta por equidade racial não deve ser travada apenas por pessoas negras: o enfrentamento ao racismo deve ser uma agenda de todos e todas. Cada um de nós tem um papel fundamental para tornar realidade  a utopia de justiça, dignidade e direitos para todos e todas.

Direção do Fundo Baobá e apoiadas do Programa Marielle Franco participam de live sobre diversidade e liderança

A diretora-executiva do Fundo Baobá para Equidade Racial, Selma Moreira, participou do evento Road Show 2020 – Conexão, Diálogos e Transformação, organizado pela Eight Diálogos Transformadores, uma rede colaborativa de coaches e facilitadores de diálogos, em 17 de setembro. Além da Selma Moreira, participaram também três apoiadas do Programa de Desenvolvimento e Aceleração de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco, iniciativa do Fundo Baobá em parceria com a Fundação Kellogg, Instituto Ibirapitanga, Fundação Ford e Open Society Foundations. Entre elas estavam a diretora-executiva do Instituto Migra, Monalyza Alves; a cineasta e coordenadora de licenciamento e filmes originais da Netflix, Aline Lourena; e a educadora social e estudante de filosofia Lídia Rodrigues.

Com o tema “Diversidade na Prática – Coaching como Acelerador de Lideranças”, o evento virtual foi mediado por Christine Napoli e Roberto Rotenberg, ambos da Eight. Em sua fala inicial, Selma apresentou o Fundo Baobá, a forma como a organização funciona e o seu trabalho de promoção da equidade racial no país, por meio do apoio financeiro e técnico que alcança organizações, grupos e coletivos negros via editais. A diretora-executiva também explicou a forma como o Baobá capta recursos, dialogando com empresas e instituições, e também com indivíduos, que podem doar para a instituição funcionar no dia a dia, para os programas e projetos ou para o fundo patrimonial. Sobre isso, Selma frisou a importância de dialogar com as pessoas e mostrar a necessidade de se empenhar na luta antirracista: “Captar é um grande desafio, mas tem um diálogo para ser dirigido aos indivíduos, que cada cidadão precisa também pensar qual é o seu lugar, nessa construção de uma sociedade mais justa, o que te toca o que você pode contribuir para isso, além de fazer um post bacana nas redes sociais”.

Selma Moreira e as apoiadas do Programa de Aceleração e Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco no Road Show 2020 – Conexão, Diálogos e Transformação

Entre as lideranças apoiadas, Monalyza Alves fez questão de destacar a importância do seu projeto desenvolvido com apoio do Programa Marielle Franco: “Eu trabalhei por dez anos no governo do Estado do Rio de Janeiro, atuando com políticas de promoção da igualdade racial e também com direitos humanos. E havia uma dificudade por parte de gestores, principalmente negros, em entender como a estrutura do governo funciona. Então quando eu fiquei sabendo do Fundo Baobá, eu inscrevi esse projeto que é uma espécie de formação inicial para quem vai assumir cargos públicos. Porque eu entendo que se você conhece a máquina, você consegue transformá-la”.

Para a cineasta Aline Lourena, a raiz do seu trabalho é empoderar mulheres negras e torná-las protagonistas da sua própria história: “A minha missão é ampliar o número de mulheres negras em cargos de liderança. Eu sou cineasta, mas eu passei boa parte da minha vida empreendendo em uma agência de comunicação e publicidade, sendo pioneira no Brasil em ter todo um processo de admissão de um corpo de profissionais negros e LGBTQI+, sendo essa uma das únicas estratégias possíveis de atuar no mercado de trabalho, na área da comunicação e do entretenimento, em um espaço de protagonismo, onde eu pudesse trazer as nossas histórias para o grande público”.

Sendo uma grande militante em defesa das crianças e adolescentes vitimas de violência sexual, Lígia Rodrigues falou sobre o seu projeto que busca trabalhar autoproteção, principalmente com a perspectiva racial: “Desde os 15 anos eu sou ativista do enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes e, ao longo dos anos, eu fiz educação social de rua, educação em saúde e planejamento de políticas públicas. Em 2019 eu estava em Brasília, e eu estava muito angustiada porque eu não conseguia ver o link das ações que aconteciam no campo, de enfrentamento direto a violência sexual, e o que repercutia lá no planalto, considerando que eles queriam aumentar a pena para autores de crimes sexuais, mas lutavam pra acabar com a educação sexual, que é o principal mecanimo de enfrentamento a violência sexual. E foi à partir dessa indignação que formulei o meu projeto que é de educação e autoproteção para crianças e adolescentes.”, completa.

Christine Napoli, relembrou o papel da Eight no Programa Marielle Franco, considerando que ele é fomentado por dois blocos: “Um dedicado à formação das líderes individuais e o outro é o apoio aos coletivos liderados por mulheres negras. Nessa parte da formação individual, o Programa tem três pilares, um que irá subsidiar as líderes em sua atuação política e de lugar de fala, outro que cuida da parte psicológica, resiliência e de enfrentamento ao racismo, e a outra parte de coaching individual, que foi justamente onde nós da Eight entramos”. Para Selma, o trabalho da Eight com as apoiadas do Programa é essencial: “O racismo é algo tão perverso, tão absurdo, que muitas vezes faz com que a gente tenha dúvidas da nossa capacidade, tenha dúvidas da nossa luz, então a perspectiva é que nós tenhamos o coach como uma ferramenta que nos auxilia a entender todo o nosso potencial, brilho, capacidade e força. O que a gente está sonhando e como é que a gente faz acontecer, e esse é o papel da Eight, de apoio nessa transição do sonho para a realidade”, destacou.

Confira a live completa aqui

Fundo Baobá na imprensa em setembro

Confira os principais destaques do Fundo Baobá para Equidade Racial na imprensa no mês de setembro:

 

06/09 – Rede Brasil Atual:
https://www.redebrasilatual.com.br/blogs/blog-na-rede/2020/09/afroempreendedorismo-covid-19-tensao-historica/ 

12/09 – Correio do Povo (Entrevista Dessa Ferreira – Apoiada PMF):
https://www.correiodopovo.com.br/arteagenda/artistas-e-produtoras-ga%C3%BAchas-falam-de-cadeia-produtiva-e-perspectivas-na-pandemia-1.479226 

15/09 – Associação Brasileira de Pesquisadores Negros:
https://www.abpn.org.br/post/chamada-para-artigos 

15/09 – Núcleo de Estudos de Gênero Pagu:
https://www.pagu.unicamp.br/pt-br/oportunidades-na-area-genero-setembro2020  

16/09 – Outras Palavras (Entrevista Azeviche – Apoiado Doações Emergenciais):
https://outraspalavras.net/crise-brasileira/ba-saidas-tecnologicas-para-combater-fome-e-desemprego/ 

16/09 – Jornal da USP (Preta ID – Apoiado do Doações Emergenciais):
https://jornal.usp.br/universidade/como-combater-os-efeitos-da-covid-19-na-periferia/ 

16/09 – Portal Geledés:
https://www.geledes.org.br/fundo-baoba-contrata-assistente-administrativo-financeiro-l/ 

21/09 – G1 (Workshop Comunicação Estratégica):
https://g1.globo.com/ba/bahia/noticia/2020/09/21/workshop-sobre-comunicacao-estrategica-para-organizacoes-sociais-tera-nova-edicao-em-outubro.ghtml 

21/09 – UOL Ecoa (Preta ID – Apoiado do Doações Emergenciais):
https://www.uol.com.br/ecoa/ultimas-noticias/2020/09/21/alunos-da-usp-criam-projeto-para-combater-covid-na-periferia-de-sao-paulo.htm 

21/09 – Casa Firjan:
https://casafirjan.com.br/pensamento/ambientes-de-inovacao/10-principais-tendencias-apontadas-pelo-mapeamento-de-iniciativas 

21/09 – Universidade de Caxias do Sul:
https://www.ucs.br/site/noticias/seminario-aborda-herancas-indigenas-e-africanas-na-musica/ 

23/09 – Estudar Fora (Chevening):
https://www.estudarfora.org.br/brasileiros-selecionados-pelo-chevening-dao-dicas-para-conseguir-bolsas-para-o-programa/ 

25/09 – IDIS – Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social (Entrevista Giovanni Harvey):
https://www.idis.org.br/forumidis-fundos-filantropicos-da-emergencia-a-perenidade/ 

28/09 – GIFE (Entrevista Giovanni Harvey):
https://gife.org.br/filantropia-colaborativa-abordagem-busca-qualificar-impacto-do-setor/ 

29/09 – Correio 24 Horas (Workshop Comunicação Estratégica):
https://www.correio24horas.com.br/noticia/nid/workshop-sobre-comunicacao-estrategica-tera-nova-edicao-em-outubro/

28/09 – Rádio Nova Vida:
https://www.facebook.com/139555189712323/videos/997945620617475/  – A partir dos 5min23seg

30/09 – Portal Geledés:
https://www.geledes.org.br/chamada-para-artigos-lancada-pelo-fundo-baoba-tem-como-foco-acoes-de-filantropia-pos-pandemia/ 

 

Coluna Negras que Movem – Portal Geledés

05/09/2020 – “O que se ganha com o que se perde?” – Por Giovana Xavier:
https://www.geledes.org.br/o-que-se-ganha-com-o-que-se-perde/

12/09/2020 – “Quantas professoras negras você já teve na universidade?” – Por Sulamita Rosa da Silva:
https://www.geledes.org.br/quantas-professoras-negras-voce-ja-teve-na-universidade/

19/09/2020 – “Medidas Socioeducativas: insustentabilidade desse sistema repressivo, que já nasceu abortado” – Por Sibele Gabriela dos Santos e Leandro Bozzola Guitarrara:
https://www.geledes.org.br/medidas-socioeducativas-insustentabilidade-desse-sistema-repressivo-que-ja-nasceu-abortado/

26/09/2020 – “Reparação social da população negra através da arte e cultura” – Por Meduza com Z:
https://www.geledes.org.br/reparacao-social-da-populacao-negra-atraves-da-arte-e-cultura/

Vozes que transformam

Fazer ecoar as falas das mulheres negras e dar representatividade para elas no ambiente político e em toda a sociedade. Esse é o foco  destas duas iniciativas empreendidas por organizações apoiadas pelo Programa de Aceleração do Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco, que é apoiado pelo Instituto Ibirapitanga, Fundação Ford, Open Society Foundations e Fundação Kellogg.

Por meio do Programa, o Fundo Baobá oferecerá apoio financeiro, técnico e institucional a organizações da sociedade civil, grupos e coletivos liderados por mulheres negras. Acompanhe essas trajetórias cheias de emoção.

Romper as fronteiras impostas 

O coletivo Mulheres Negras Decidem nasceu há quase dois anos, a partir do engajamento de cinco mulheres (Juliana Marques, Ana Carolina Lourenço, Diana Mendes, Lorena Pereira e Gabrieli Roza). A ideia era organizar um espaço em que pudessem expor suas ideias e construir um ambiente político menos hostil para a mulher negra. O passo inicial foi a participação no Programa Minas de Dados, realizado em 2018. A partir dessa experiência, perceberam qual deveria ser o real propósito do coletivo dali em diante: dar voz e representatividade política à mulher negra. 

O assassinato da vereadora Marielle Franco, em março do mesmo ano, reforçou esse objetivo. “Nossa missão é qualificar e promover a agenda política liderada por mulheres negras na política institucional”, afirma Juliana Marques. Com o seu trabalho, elas querem não apenas dar visibilidade, mas impulsionar a atuação no meio político – em que homens brancos ainda são a maioria esmagadora.

Mulheres Negras Decidem – Foto: Wendy Andrade

Foi a partir do amadurecimento do grupo e do desejo de expandir, que o coletivo se inscreveu no Programa Marielle Franco com a iniciativa: “Um novo projeto de democracia”. Quando começou, as articuladoras estavam concentradas no Rio de Janeiro e em São Paulo. Agora, estão em mais 14 estados (AL, AM, BA, DF, ES, MA, MG, PB, PE, PI, PR, RO, SC e TO). 

Nestes 18 meses de existência, o coletivo já realizou ciclos de formação política, em 2018, nos quais foram discutidas regras do jogo eleitoral, e reconstruiu a participação de diversas mulheres negras na política, bem como os sistemas políticos que serviram de pano de fundo para as candidaturas. No ano passado, realizaram o Fórum Mulheres Negras Decidem para discutir a política brasileira sob um olhar antirracista e feminista.

“No contexto da pandemia, inspiradas pela intensa mobilização de mulheres negras para mitigar os impactos negativos em suas comunidades, realizamos também a pesquisa Para Onde Vamos?. Em parceria com o Instituto Marielle Franco, acessamos 245 mulheres negras de todo o território brasileiro e apresentamos um panorama do ativismo no Brasil”.  O apoio do Fundo Baobá permitiu ter condições materiais para fortalecer a capacidade de liderança com foco na governança e na sustentabilidade do coletivo. “Além disso, colaborou para nossa visibilidade dentro do movimento de mulheres negras e para a ampliação do alcance da nossa pauta.”

Espaços de troca, acolhimento e denúncia

O coletivo Marcha das Mulheres Negras de São Paulo foi criado a partir do processo de construção da Marcha Nacional das Mulheres Negras, que aconteceu em Brasília, em 18 de novembro de 2015. Desse processo, o núcleo que construiu a Marcha Nacional deu continuidade às ações e, em 2016, iniciou a Marcha em São Paulo. “Nosso objetivo é promover discussões sobre  a opressão e violência presentes nas estruturas políticas, sociais e econômicas do país  e, partir daí, traçar estratégias que, além de cobrar ações efetivas por parte do Estado, permitissem que a Marcha de Mulheres se consolidasse como canal de apoio a denúncias”, explica Andréia Alves.

A ideia é que, além de acolhidas, elas tenham formação política a partir de uma perspectiva negra, periférica e de mulheres. O coletivo faz questão de afirmar que o grupo é um espaço plural e diversificado, multirreligioso, não governamental e multipartidário, que articula, de forma descentralizada, e trabalha para o fortalecimento da democracia. “Buscamos, de forma permanente, estabelecer alianças e engajamento nas lutas sociais, fortalecendo a luta contra o racismo, o patriarcalismo, a lesbofobia, a bifobia, a transfobia, o classismo e todas as formas de preconceito e discriminação”, diz. O grupo é formado por mulheres negras  idosas, jovens, lésbicas, bissexuais, transexuais, com deficiência, das cidades e das periferias. “Mulheres múltiplas na existência e na resistência”, diz Andréia.

Marcha das Mulheres Negras de São Paulo

O coletivo viu no edital do Programa Marielle Franco a chance de capacitar essas militantes comunitárias, acadêmicas, independentes, estudantes e trabalhadoras de diversas áreas. “São mulheres brilhantes que, raramente, se enxergam como lideranças, embora sejam mais do que ninguém”, revela. A capacitação é o meio de romper com o racismo e o sexismo estruturais, que impedem a entrada e a permanência dessas mulheres em espaços de poder. “Quando detectamos a possibilidade de proporcionar formação política e técnica para mulheres negras, não perdemos tempo”, confirma.

O projeto inscrito –Aquilombar e Ampliar Universos – formação política para mulheres negras” – foi selecionado. Nestes seis meses iniciais de apoio, o grupo conseguiu não apenas a capacitar essas mulheres, mas estruturar a área de comunicação. Andréia destaca que o apoio do Fundo Baobá – da assessoria técnica qualificada ao suporte financeiro – permitiu colocar em prática ações planejadas, conhecer e criar redes com outros grupos, organizações e coletivos de mulheres negras em todo Brasil. Além disso, vai possibilitar colocar o site no ar e também criar conteúdos para  um canal no YouTube para divulgar, por exemplo, a primeira atividade de formação política.

Todos os anos, no dia 25 de Julho – Dia Internacional da Mulher Afro-latinoamericana e Caribenha e Dia Nacional de Teresa de Benguela – o grupo reúne milhares de pessoas nas ruas da capital paulista, em marcha contra o racismo, o machismo e a lesbotransfobia, entre outras formas de opressão. Este ano, por conta da pandemia, as atividades foram on-line, com ajuda das tecnologias digitais e da internet. “Nossa marcha on-line contou com uma programação ao vivo, além de transmissões de intervenções de rua, como faixas e videomap (projeção em edifícios). Os conteúdos gerados foram transmitidos em nossas redes sociais (youtube, facebook e instagram), em perfis de artistas e digital influencers que são parceiros”, relembra. Além de mais reportagens na mídia, aumentaram de 1700 para 4000 os seguidores no instagram.

Por ser on-line, a marcha teve a participação também de mulheres com deficiência. Segundo Andréia, elas contribuíram para melhorar a comunicação, incluindo as hashtags de acessibilidade  #paratodoslerem e #paracegoler e também a tradução em libras na maioria das lives. “Foi um processo ainda inicial, mas temos vontade e disposição para fazer e, mais do que isso, tomamos para nós a responsabilidade política de tornar a MNSP um espaço para todas as mulheres negras e suas especificidades”, afirma.

 

Vozes que transformam

Resgate da memória e o direito de ser quem você quiser: esse é o foco  destas duas iniciativas empreendidas por organizações apoiadas pelo Programa de Aceleração do Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco,  que é apoiado pelo Instituto Ibirapitanga, Fundação Ford, Open Society Foundations e Fundação Kellogg.

Por meio do Programa, o Fundo Baobá oferecerá apoio financeiro, técnico e institucional a organizações da sociedade civil, grupos e coletivos liderados por mulheres negras e lideranças femininas negras. 

Igualdade e respeito como princípios de vida

Grupo de Mulheres Lésbicas e Bissexuais Maria Quitéria (Paraíba) começou seu trabalho em novembro de 2002, com o objetivo de combater a violência e o preconceito contra essas mulheres. Ancoradas no movimento gay, sentiam que suas pautas eram silenciadas e, para agravar a situação, sofriam violência por conta do machismo e da lesbofobia praticados ali. “Precisávamos de iniciativas que nos representassem além do HIV/Aids, resgatassem nossa cidadania e promovessem a autoestima dessas mulheres”, explica Cryss Pereira. O resultado foi a formação do coletivo.

Em 2019, quando foi aberto o edital para o Programa Marielle Franco, do Fundo Baobá,  o coletivo percebeu que era uma ótima oportunidade para se organizar e começar a expandir discussões e formações. O projeto inscrito –  “Equidade sim! Racismo não!” – foi um dos selecionados e permitiu dar mais visibilidade a elas, além de impulsionar e fortalecer as lideranças internas, especialmente nestes meses de pandemia, em que as atividades se concentraram no mundo virtual.

Antes da Covid-19, entre as ações que já desenvolveram, as que citam como mais relevantes são “Goleando contra LGBTfobia”, um torneio de futsal feminino no qual fortalecem as jovens para enfrentar a violência e o preconceito, e “Eu também sou cidadã”, projeto voltado para o empoderamento das mulheres privadas de liberdade.

Grupo de Mulheres Lésbicas e Bissexuais Maria Quitéria (Paraíba)

Olhar para a questão da violência contra a mulher, aliás, é um tema urgente e sempre presente para elas – sobretudo em tempos de pandemia, com o aumento dos casos. “Mas visualizamos também um avanço na disseminação de informações on-line, um maior envolvimento quanto às denúncias e quanto à propagação de postagens encorajadoras e empoderadoras para as mulheres”, confirma Cryss Pereira.

Segundo ela, o apoio do Fundo Baobá permitiu aprofundar o conhecimento quanto à própria história dessas mulheres, além de dar condições de ocupar as mídias sociais de forma qualificada, garantindo espaços de discussão. “Ter a oportunidade de fortalecer ativistas financeiramente trouxe para o grupo duas designers gráficas, que estão encarregadas da produção das peças virtuais. Além disso, elas também são ativistas. Portanto, é um sonho ter pessoas qualificadas na nossa comunicação”, afirma. Foi justamente no meio virtual, com a profissionalização da comunicação institucional, que conseguiram seguir com as atividades. 

Uma das mais recentes foi a live-show da cantora Bia Ferreira, em comemoração ao 29 de agosto, Dia Nacional da Visibilidade Lésbica. A artista possui forte atuação por meio da sua música contra o racismo e a favor dos direitos LGBT. O show,  uma construção coletiva, em parceria com a Secretaria da Mulher e Diversidade Humana e a Fundação Espaço Cultural (Funesc), ambas da Paraíba, foi ao ar no instagram do Maria Quitéria. 

Da moda para o jornalismo pela causa

O portal Blogueiras Negras se materializa a partir da Blogagem Coletiva Mulher Negra, em 2013. Na época, um grupo de mulheres negras organizadas em diferentes espaços on-line resolveu se reunir para escrever sobre a intersecção racismo e feminismo. “Compreendemos que era um território que esse grupo poderia explorar coletivamente”, relembra Larissa Santiago. A pergunta que deu início a esse processo foi: “onde estão as blogueiras negras de moda?”, publicada no blog Tempo Fashion. Provocadas, resolveram reunir demandas, temas e denúncias no endereço blogueirasnegras.wordpress.com e, mais tarde, no blogueirasnegras.org.  

O início foi difícil e elas quase desistiram, depois de ficar três meses fora do ar, em 2019. Mas foi aí que surgiu a possibilidade de fazer a inscrição no Programa Marielle Franco. “Foi um momento crucial. Resolvemos planejar como manter a memória. Assim, nos inscrevemos no edital na esperança de consolidar o sonho de gerir e manter a comunicação como o legado das mulheres negras”, revela Larissa Santiago.

O projeto inscrito – “Autonomia e Memória, consolidando o legado da comunicação no movimento de mulheres negras no Brasil” – foi selecionado e ajudou a fortalecer a capacidade interna de organização e sua gestão, consolidando o protagonismo do coletivo na comunicação do movimento de mulheres negras. Parte desse trabalho consiste na manutenção de uma plataforma com mais de 1300 textos, a maioria inédita e assinada por 400 autores. 

Da esquerda para a direita: Larissa Santiago, Charô Nunes (ao centro) e Viviane Gomes, na primeira vez em que se encontraram para dar início ao projeto Blogueiras Negras

Nesse processo e respondendo às demandas que surgiram, criaram um podcast para dar mais visibilidade aos efeitos da Covid-19 nas periferias. “Nossos posts sobre a infeliz morte de crianças negras aumentou significativamente nossa visibilidade.  Temos feito lives, inclusive internacionais, sobre cuidados digitais e outras áreas programáticas. Vale  acrescentar que reforçamos a comunicação com as profissionais de redes sociais com objetivo de  ampliar nossa presença e levar nossa experiência a um número maior de pessoas”, completa Charô Nunes, também do coletivo. 

Nestes anos de existência, o Blogueiras Negras desenvolveu várias trocas e aprendizados. Por conta disso, reconhecem que houve avanços para a mulher negra, mas ainda falta muito para equiparar condições de vida, empregos, saúde. “É notório perceber alguns avanços, apesar do contexto atual, mas esses números ainda são insuficientes. Precisamos de moradia, comida e estarmos nos espaços em que poderemos de fato tomar decisões para garantir, minimamente, o que está na constituição”, finaliza Viviane Gomes.

O apoio do Fundo Baobá permitiu dedicar tempo não apenas para pensar expansão, mas perceber potencialidades e desafios, além de incrementar áreas, como a comunicação nas redes sociais, o podcast e novas parcerias – especialmente em tempos de pandemia, em que, respeitando o distanciamento, elas tiveram que suspender as atividades presenciais. E, ainda assim, “propagar vozes das diferentes mulheres negras militantes”, como diz Charô Nunes.

Agosto negro e o cuidado com a saúde mental

No mês passado, foi celebrado o “Agosto Negro”. Sua origem foi a luta do movimento negro nos Estados Unidos, na década de 1970, após a prisão e morte de George Lester Jackson, em 21 de agosto de 1971, na prisão de San Quentin, na Califórnia.  Ele foi preso e condenado à prisão perpétua depois de ter roubado 70 dólares em um posto de gasolina. 

Durante o tempo em que permaneceu preso, estudou economia política e, ao mesmo tempo, se destacou como líder da resistência negra – o que levou ao seu assassinato por um agente penitenciário. Sua morte fez com que milhares de pessoas fossem às ruas, clamando pelo fim do racismo e do extermínio da população negra. Quatro décadas depois, o povo negro continua nas ruas, mesmo diante de uma pandemia mundial,  afirmando que vidas negras importam, sim!

A luta antirracista requer resistência, é verdade, mas também demanda da sociedade uma análise aprofundada dos impactos do racismo em todas as fases da vida de suas vítimas,  que sofrem com o preconceito, a discriminação e desenvolvem uma série de traumas. Discutir o racismo e as suas consequências, além de frisar a importância dos cuidados com a saúde mental, é de extrema importância para a promoção da equidade racial. Iniciativas como a da Articulação de Psicólogos Negros, que dedica um mês à saúde mental e à luta antirracista, são fundamentais.

Apoiado pelo Fundo Baobá para Equidade Racial no edital de doações emergenciais no combate ao Coronavírus, o psicanalista, doutorando da PUC-SP e membro do Coletivo Margens Clínicas, Kwame Yonatan Poli dos Santos, organizou a cartilha “Saúde mental, relações raciais e Covid-19”, em parceria com a psicanalista Laura Lanari. A cartilha contém cinco textos que pretende dialogar com a população negra sobre os problemas relacionados à vivência do racismo. Confira sua entrevista: 

De qual forma o racismo impacta a saúde mental das pessoas negras?
Os efeitos das práticas do racismo na subjetividade devem sempre ser escutados na sua singularidade ou podemos incorrer no erro de universalizar que toda população negra se afeta, e responde da mesma maneira, com as práticas de racismo. Nossa aposta deve ser a construção de saídas singulares, coletivas ou individuais. No entanto,  se entendermos que o racismo é um dado estruturante das relações,  compreenderemos que é um sistema que estrutura o laço social, assim sendo,  temos que pensar como esse sistema atua em nós e como respondemos a ele. Isso significa que algumas pessoas e grupos construirão saídas mais ou menos a reexistir, ou seja,  afirmar a sua existência na sua diferença diante dessa ferida colonial que sangra. É importante mencionar que o racismo estrutura o campo das relações. E subjetiva tanto as pessoas negras quanto as brancas, pois não é possível silenciar, discriminar, humilhar, violentar, matar sem se tornar monstruoso, isto é,  desumanizar-se também nesse processo. Por fim,  possuímos indicadores no âmbito da saúde mental de que o racismo produz um sofrimento psíquico intenso em uma grande parcela da população negra, produzindo efeitos no horizonte do desejo. Cito o exemplo  dos dados de 2016 do Ministério da Saúde que mostram uma prevalência do aumento do suicídio em jovens negros, isso nos mostra uma face do genocídio .

Kwame Yonatan Poli dos Santos

O racismo sofrido durante a infância e adolescência interfere na vida adulta e nas relações pessoais do negro?
Como disse anteriormente,  o racismo é um dado estruturante das relações e pode deixar marcas no campo do desejo de modo a violentar, desde muito, a infância a população negra. Portanto, escuto muitas mulheres negras  e homens negros na clínica relatarem vivências violentíssimas na escola  e até mesmo na família, que deixaram sequelas profundas na forma de se posicionar diante do mundo até a vida adulta, chegando a internalizar como mecanismo de sobrevivência,  por exemplo:  adaptar-se o tempo todo para  ser aceito e/ou reconhecido por pessoas brancas. Como diz a psicanalista Neusa Santos Sousa, autora da obra Tornar-se Negro (1983), ser negro é estar submetido a uma dupla injunção: de odiar sua negritude (cabelo, história etc) e almejar os ideais da branquitude. Logo, é  preciso ressignificar constantemente a vivência da negritude de maneira a produzir linhas de singularização, da experiência de enegre-ser produzindo outros sentidos para além da captura binária resistência/sofrimento.

Como é falar da importância da saúde mental, sem demagogia, considerando as desigualdades sociais, o genocídio dos jovens negros, o encarceramento em massa da população negra, entre outros problemas?
É preciso compreender o genocídio de maneira ampla, isto é, para além daquele policial que atira ou do que enfia a faca. Existem os amoladores de faca (ideia do professor da UFRJ Luís Antônio Baptista) – ‘antes do punhal ser cravado nas costas do mestre Moa do Katende (capoeirista, compositor, percussionista, artesão e educador, assassinado em outubro de 2018)  existiram aqueles que amolaram o punhal, prepararam o terreno, autorizando a morte, enfraquecendo a vítima antes do golpe mortal. Nessa perspectiva, antes de o jovem negro ser preso, assassinado ou morrer de frio na rua, existe uma série de pessoas e instituições que amolaram o punhal. Logo, o genocídio é uma trama de poder que mata aos poucos. O genocídio também se refere aquilo que nos mata aos poucos  ao sequestrar o futuro daqueles que ainda nem viraram adultos. Quando apontamos os dados sobre prevalência do suicídio dos jovens negros,  essa é a ponta do iceberg, a parte imersa conta processos de subjetivação coloniais que sequestram a potência,  aniquilam as perspectivas de sonhar um futuro. Uma das piores formas de miséria humana é a de não poder sonhar mais. O cuidado em saúde mental deve produzir sonhos, isto é, por meio dele deve-se investir em estratégias de produção de energia vital,  revitalizando esse sujeito para que possa protagonizar sua vida.

Em junho de 2020, com o apoio do edital de doações emergenciais do Fundo Baobá para Equidade Racial, e em parceria com o coletivo Margens Clínicas, você, ao lado da Laura Lanari, organizou a cartilha “Saúde Mental, Relações Raciais e Covid-19”, fale sobre esse trabalho.
A cartilha é fruto de muitas mãos. Ela nasce em 2016 com um convite para realizar oficinas de relações raciais e saúde mental em um Centro de Atenção Psicossocial (Caps) da zona sul de São Paulo. À medida que ia passando por outros Caps ia percebendo a dimensão racial como uma chave de análise da instituição. Então, por exemplo, lembro de uma equipe, majoritariamente branca, que não se sentia à vontade em fazer roda com os usuários e, consequentemente,  tinha várias dificuldades de se enxergar racializada. Com a pandemia temos a descaracterização dos serviços, mas também um ‘relançar dos dados’, a oportunidade dos Caps se reinventarem e fazerem a rede a partir da transversalização da temática racial. A cartilha traz a proposta do Aquilombamento da Rede Sul, em São Paulo (SP), que se reformulou com a pandemia para o formato on-line. Nessa perspectiva, o quilombo é um mundo sem os muros da colonialidade. Aquilombamento é a construção do comum que toca o plano singular, uma reorientação vital,  a partir da perspectiva  interseccional de uma analítica das relações de poder e seus efeitos no corpo. A cartilha tem cinco textos que versam sobre saúde mental, Covid-19, relações raciais,  psicanálise e saúde pública.

Cartilha Saúde Mental, Relações Raciais e Covid-19

Leia a cartilha “Saúde Mental, Relações Raciais e Covid-19” aqui