Presença de mulheres negras em cursos majoritariamente masculinos têm pouco avanço nas universidades

Raquel e Giovanna querem conquistar espaço nos cursos vistos como masculinos

Por Kátia Flora, do Perifaconnection, em parceria com o Fundo Baobá para Equidade Racial

 A proporção de pretos e pardos no ensino superior teve um aumento na última década. Um levantamento feito pela Quero Bolsa, plataforma de inclusão no ensino superior, a partir de dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), informa que entre os anos 2010-2019, cresceu quase 400% o número de estudantes negros nas instituições de ensino. Mas, em alguns cursos como engenharia, administração, nutrição, entre outros, o percentual é bem menor.

Há também a ausência de mulheres negras nos cursos ocupados majoritariamente por homens, por exemplo engenharia civil e administração de empresas. Por outro lado, a Lei de Cotas, criada em 2012 como forma de políticas públicas, têm ajudado muitos jovens a realizar o sonho de entrar numa universidade. Para chegar nesse patamar, o Programa Já É, curso preparatório para o vestibular do Fundo Baobá de equidade racial, têm atividades voltadas à ampliação de habilidades socioemocionais e vocacionais, incluindo programa de mentoria.

É o caso da Raquel Pinheiro de Carvalho, 18 anos, que está feliz pela oportunidade de fazer o curso do Fundo Baobá e ter um auxílio dos profissionais, para alcançar seu objetivo. Ela quer cursar engenharia civil, profissão que conheceu quando tinha apenas 10 anos, através da prima, que estava terminando a faculdade e mostrava os seus trabalhos e projetos. Na época, ficou fascinada com aqueles desenhos, apesar de não entender muito os significados. “Gosto da área de exatas me identifico desde o ensino fundamental”, afirma.

Raquel Pinheiro de Carvalho, 18 anos

Na fase adulta trabalhou como jovem aprendiz em uma empresa de engenharia na Avenida Luiz Carlos Berrini, Zona Sul de São Paulo, na área dos Recursos Humanos, Raquel conta  que a maioria dos funcionários era composta por homens. Havia  apenas uma mulher negra, na época, estagiária de engenharia civil. “Eram quarenta e dois homens brancos e uma mulher negra na mesma área.

Raquel quer ser engenheira civil e seu foco é entrar na Universidade de São Paulo. Sabe das barreiras que irá enfrentar, e que a situação que relatou sobre o antigo emprego pode se repetir, mas segue firme o seu lema: “nunca desista de estudar”.

Já a estudante Giovanna Vitória dos Santos Xavier, 18 anos, quer estudar em universidade pública na área de nutrição. Ela descobriu a profissão no curso técnico da ETEC Uirapuru, que está atualmente no último semestre. Ela conta que, na sua sala de aula, a maioria das estudantes são mulheres e que negros são a minoria, mas ela se inspira no professor e coordenador do curso, homem negro, que motiva os alunos a continuar nos estudos e fazer a diferença na sociedade. Giovanna conta também com o apoio da mãe, que terminou o ensino médio há pouco tempo e trabalha como Líder de limpeza. “Na minha família, nunca fiquei sabendo de ninguém que tenha chegado cursar uma instituição de ensino. Minha mãe se sente orgulhosa e estimulada pelo meu esforço”, ressalta.

Giovanna Vitória dos Santos Xavier, 18 anos

Giovana está radiante com o Programa Já É, e a oportunidade de ter auxílio dos professores no aprendizado. “É a primeira vez que vou fazer cursinho e ter mais chances de passar na Universidade pública”, afirma.

10 anos do Baobá: filantropia não é evento, é processo que deve ser estimulado

O olhar de economistas sempre é muito importante para uma análise sobre como vai a saúde financeira do país e o que poderá advir dela. Evidentemente, a economia determina hábitos e costumes. Por outro lado, ela os restringe também. Dois economistas que fazem parte da governança do Fundo Baobá para Equidade Racial falam como o trabalho da instituição vem sendo realizado e quais são as diretrizes que o Brasil deve seguir para alcançar a tão almejada equidade racial, algo que passa por questões políticas, educacionais, culturais, sociais e até religiosas. 

Ana Toni tem graduação em Economia e Estudos Sociais pela Swansea University, no Reino Unido, é mestra em Política Econômica pela London School of Economics and Political Sciences, além de doutorado em Ciências Políticas pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). Atualmente,  atua como diretora executiva do Instituto Clima e Sociedade (iCS). Silvio Humberto é graduado em Economia pela Universidade Católica de Salvador, mestre em Economia pela Universidade Federal da Bahia e doutor em Economia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), É professor na Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS) e, atualmente, cumpre seu terceiro mandato como vereador. Silvio Humberto é fundador do Instituto Cultural Steve Biko. 

A primeira questão comentada por ela e ele é o fato de a economia brasileira ter crescido em 1,2% no primeiro trimestre de 2021 e se isso seria benéfico para o trabalho de filantropia no país. Para Ana Toni, o mar da economia, revolto ou calmo, tem pouca relação com o desenvolvimento da filantropia. “Vejo pouca relação entre crescimento econômico e crescimento ou não crescimento da filantropia brasileira. Filantropia é muito mais uma questão de cultura e política pública. É uma questão de experiência: quanto mais a gente a exercita, melhor e mais ampla ela fica. Então, mesmo que o crescimento econômico brasileiro esteja para cima ou para baixo, penso que o dilema aqui é como a gente nutre essa cultura filantrópica, que eu vejo que está se fortalecendo no Brasil”, conclui. 

Ana Toni, economista, doutora em Ciências Políticas e diretora-executiva do Instituto Clima e Sociedade (iCS)

Para Silvio Humberto, a questão da doação filantrópica perpassa a questão dos índices econômicos. “Diria que o principal desafio para a filantropia no Brasil é fazer com que os brasileiros que detém recursos, os que são ricos, os que concentram a riqueza, doem. Porque nós sabemos que o Brasil não perde uma copa do mundo das desigualdades.  Então, é preciso um esforço conjunto. Sobretudo da sociedade brasileira. Daqueles que de fato podem doar e são capazes de doar para fora. Mas aqui dentro eu acho que falta empatia. As elites brasileiras sempre encararam o país como um grande negócio.”, comenta o professor de Economia na  Universidade Estadual de Feira de Santana (BA). 

Mas para promover a filantropia, principalmente quando ela busca promover a equidade racial, é necessário quebrar alguns paradigmas. “É preciso entender a filantropia. A filantropia não como um evento, mas sim como um processo. Processo que precisa ser estimulado. A sociedade como um todo tem que entender que, se nós queremos que o Brasil avance, temos que combater e enfrentar as desigualdades. Não as desigualdades vistas de forma monocromática, mas entender também a desigualdade de gênero, racial, geracional. Então, entender o caráter multidimensional  da pobreza é muito importante nesse processo”, afirma Silvio Humberto. 

Ana Toni destaca a necessidade de mudanças na legislação. Isso daria incentivo para que pessoas físicas e jurídicas fossem levadas a doar. O caminho dos incentivos fiscais não pode ser esquecido. “Acho que a gente está dando, nesses últimos anos, alguns passos mais largos do que, pelo menos historicamente, já  foi feito. Mas tenho certeza que se não mudar alguma coisa de legislação, para incentivar doadores a fazer essa doação, a gente não vai jamais conseguir. As igrejas têm incentivos, as entidades privadas não têm. Isso já faz um diferencial imenso para os doadores. Então, sem mudar uma legislação vai ser também muito difícil mudar essa cultura”, afirma. 

Fatos lamentáveis ocorridos no mundo e no Brasil, como os assassinatos de George Floyd e Breonna Taylor, além do assassinato do brasileiro João Alberto, em Porto Alegre, contribuíram para uma retomada de consciência das pessoas e também das empresas. Inclusive o mercado financeiro balançou. Grandes instituições bancárias dos Estados Unidos aconselharam seus investidores a não apostar na estabilidade do dólar no momento em que o país estava convulsionado por manifestações populares. “Esses fatos mais que motivam as pessoas a se engajar como doadores para a filantropia de equidade racial. Acho que é um dever, hoje em dia, de qualquer organização lidar com o tema do racismo. Não dá mais para essas organizações, que estão vendo essa brutalidade há séculos e séculos, considerarem que isso não está mexendo com elas. Esses fatos mostram a necessidade de todos agirem como doadores: os brancos de bem, os brancos progressistas, todos”, diz. 

Silvio Humberto segue a mesma fala de Ana Toni e acrescenta: “Esses casos motivam mais as pessoas a se envolverem nas questões raciais. Sobretudo o que o caso George Floyd fez foi envolver as pessoas brancas. Elas não saíam às ruas. A questão racial era vista como uma questão negra  e dos grupos minorizados.  Com relação ao caso do Carrefour, temos que ter cuidado para que isso não vire monetização da questão racial. Tudo se resume com a empresa pagando uma indenização. Não podemos cair na armadilha do ouro de tolo. As vidas não têm preço”, conclui.

Silvio Humberto, economista, doutor em Economia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), professor na Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), fundador do Instituto Cultural Steve Biko e atualmente cumpre seu terceiro mandato como vereador

Os dois economistas analisam como muito importante o trabalho que o Fundo Baobá vem fazendo para que a filantropia para a equidade racial tenha apoio e visibilidade no Brasil. “O Baobá simboliza a modernidade da filantropia para equidade racial. Os negros e o movimento negro já tinham organizações filantrópicas na sua história. Mas o Baobá tem feito isso com a  governança que o mundo moderno exige e quer. O tema da filantropia para equidade racial é difícil. As pessoas não sabem como lidar. O Baobá tem influenciado muito o setor filantrópico e mostrado não só como fazer mas também a vantagem de se fazer filantropia para a equidade racial”, afirma Ana Toni. Silvio Humberto compara o trabalho do Baobá à missão de um orixá guerreiro. “O Baobá tem uma missão oguniana (de Ogum, orixá descrito como forte perseguidor de seus objetivos), que é abrir caminhos nunca d´antes navegados. Ele é um divisor de águas nessa relação com essa filantropia que, antes, pouquissimas organizações do movimento negro tinham acesso. Os projetos sociais que são apoiados têm que estar cada vez mais vinculados ao fortalecimento das organizações negras, das nossas organizações”, define.

O papel de pais e responsáveis na escolha do curso superior

A escolha pela profissão também passa pelo que é vivido no seio familiar

Por Eduarda Nunes, do Perifaconnection, em parceria com o Fundo Baobá para Equidade Racial

Fazer faculdade não é uma escolha simples e para muitos não é nem uma possibilidade. Um país que foi construído sobre o alicerce do racismo e de outras mazelas sociais renega pessoas negras, mulheres e pessoas com deficiência ao Ensino Superior. Desfazer essa condição exige que sejam elaboradas e postas em práticas políticas públicas de reparação como a Lei de Cotas (2012) e os programas de auxílio estudantil .

Um levantamento feito pelo site Quero Bolsa, a partir de dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) verificou que entre 2010 e 2019 houve um aumento de 400% de estudantes negros nas graduações (de 38,15% a 56%). Entretanto, esses alunos não chegam a 30% em cursos como Medicina, Publicidade, Relações Internacionais e outros de prestígio social. Isso exemplifica que, embora o acesso da população negra à universidade tenha melhorado, ainda não deixou de ser uma questão que precisa ser amplamente debatida. Iniciativas como a do Fundo Baobá servem tanto para prover oportunidades, como para dar suporte às políticas públicas conquistadas pelo Movimento Negro.

No meio desses desafios há outro que persegue muitos estudantes: escolher o curso da faculdade. Afinal, como saber o que vai fazer, possivelmente, pelo resto da vida aos 17 anos? Esse é um momento importante e exige bastante não só do vestibulando, como também de quem está ao redor dele.

Na maioria das famílias negras brasileiras, as profissões estão sempre ligadas à servidão: trabalho doméstico, vigilância, serviços terceirizados. O programa Já É propõe uma transformação desse quadro, oferecendo suporte para muitos jovens se tornarem os primeiros da família a entrar na faculdade.

É esse o caso de Ângela Ferreira da Silva, jovem de 18 anos que pretende cursar Direito na Universidade de São Paulo (USP). Estudante esforçada, ela está sempre motivada a aprender. Na pandemia, com a instabilidade que foi estabelecida, ela começou a fazer curso de Inglês, Francês e História da Arte para não ficar parada. Segundo ela, essa vontade de conhecimento também faz parte da personalidade de seu pai, seu José Carlos, com quem mora. Embora nem ele nem sua mãe, dona Janaína, tenham cursado ensino superior, eles são essenciais na escolha de Ângela. “Eu sempre busquei as coisas de forma muito individual, quem sempre correu atrás de algum cursinho ou alguma vaga em alguma escola, ou tentar bolsa em escola particular foi sempre eu. Só que os meus familiares sempre me apoiaram nisso. Então eu chegava e mostrava uma oportunidade boa e eles me apoiavam e iam nos processos seletivos”, conta. A jovem mostra que ter apoio e estrutura é tão importante quanto o próprio ato de estudar.

Ângela Ferreira da Silva, 18 anos

O caso de Thauany Christina Gabriel Aniceto de Souza (25)  é um pouco diferente. Sua irmã, Ana Lúcia, foi a primeira a fazer faculdade e na família gerou-se uma expectativa de que ela seguiria os mesmos passos. Mas enquanto a mais velha foi para área de Recursos Humanos, Thauany quer mesmo é ser enfermeira. Os familiares, por um bom tempo, foram contra essa decisão. “Eles sempre disseram que a questão da enfermagem é ser um profissional que não tem vida”, conta ela, que também afirma não se importar de abdicar de seu tempo pessoal para poder ajudar nos cuidados de quem precisa. No início, ela nem queria faculdade mesmo. Aos 16 anos ela pensava em fazer curso técnico ou auxiliar porque queria mesmo era “pôr a mão na massa”, como ela mesma diz. Com o passar do tempo ela conheceu e se encantou pela área de obstetrícia. “Não tem como eu ser técnica e obstetra, eu teria que ser enfermeira obstetra e eu decidi fazer a faculdade de enfermagem para depois fazer a pós-graduação em obstetrícia”, relata. Todo esse processo interno aconteceu em paralelo ao convencimento da família de que essa era uma boa escolha.

Thauany Christina Gabriel Aniceto de Souza, 25 anos

Já com Vanessa da Silva Souza (24), a história é outra. Filha de trabalhadora doméstica, ela, que sempre teve uma relação muito afetiva com a comida, deu muitas voltas para decidir com o que iria trabalhar e acabou parando na área da cozinha. Ela cresceu vendo sua mãe, dona Maria José, cozinhando e fazendo disso uma forma de sustento para a família. Quando terminou o Ensino Médio, participou do projeto Chef Aprendiz e, através dele, conseguiu trabalhar num restaurante de comida saudável no centro de São Paulo. Ela passou de auxiliar de cozinha a cozinheira em pouco mais de dois anos. Foi tanto orgulho e realização pessoal que, juntas, Vanessa e dona Maria José passaram a nutrir o sonho de abrir um restaurante – que agora precisa ser tocado sem uma das partes, por conta de um câncer que acometeu dona Maria José e lhe tirou a vida em 2020.

Vanessa da Silva Souza, 24 anos

Os incentivos vêm de muitos lugares, principalmente do ambiente familiar. As memórias afetivas tem impacto em quem as pessoas são ou querem ser. Nem sempre é preciso ter cursado uma universidade para encorajar alguém a fazer uma. A contribuição para esse desejo acontece de muitas formas, como Ângela, Thauany e Vanessa acabaram de demonstrar.

 

Fundo Baobá na imprensa em Junho

A participação  do Fundo Baobá em eventos virtuais sobre filantropia, captação de recursos e sustentabilidade ganhou destaque na imprensa no mês de junho em diversos veículos.

No dia 16 de junho, o presidente do conselho deliberativo do Fundo Baobá, Giovanni Harvey, participou do “1º Fórum da Cadeia Nacional de Abastecimento”, organizado pela Associação Brasileira de Supermercados (Abras). Em sua fala no painel “Impacto social e ambiental”, Harvey deu seu recado aos dirigentes empresariais:

“Precisamos aperfeiçoar o modelo capitalista no Brasil. Temos uma sociedade de classes estratificada. Temos, em algum sentido, uma certa punição à possibilidade de consumo de  determinados segmentos sociais. Nós vemos com preconceito a possibilidade de certos segmentos sociais adquirirem determinados bens, determinados produtos. De certa forma, até punimos empresas que são mais ousadas e buscam ampliar  sua participação no mercado buscando esses segmentos”

A divulgação do evento foi destaque no portal Metrópoles.

No dia 22 de junho, foi a vez de a diretora-executiva da organização, Selma Moreira, participar da plenária de abertura do 10º Fórum Brasileiro de Filantropos e Investidores Sociais, organizado pelo Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social (Idis). Com o tema “O Capital e a Humanidade”, o painel discutiu a superexposição das desigualdades sociais no contexto da pandemia e a responsabilidade do setor privado na mudança deste cenário. Selma reconheceu que a pandemia motivou a filantropia em muitos âmbitos e destacou a necessidade de uma ação filantrópica contínua, considerando que a desigualdade não é algo momentâneo:

“A gente precisa de um processo de desenvolvimento da sociedade para além de uma perspectiva humanitária, que é necessária agora. Precisamos construir um novo cenário para os próximos anos. Infelizmente a gente não vai mudar esta perspectiva de extrema miséria e fome, mas precisamos trabalhar em uma perspectiva que contribua para que as organizações sociais tenham possibilidades de desenvolver as suas capacidades, cada vez mais fortalecidas. A partir disso, desenvolvendo suas capacidades, também haverá uma possibilidade de desenvolver o campo, as pessoas e os micronúcleos.”

Selma Moreira citou a importância da existência de fundos de filantropia para justiça social, que olham diretamente para determinadas regiões, assim como também ressaltou que é o momento de as organizações lucrativas irem além daquilo que, historicamente, realizam,  “Tendo esse olhar de que nós podemos construir uma sociedade que, de fato seja mais inclusiva, mais humana e mais equânime”.

O evento completo foi divulgado na Folha de São Paulo e o painel “O Capital e a Humanidade”, com participação da Selma Moreira, pode ser assistido na íntegra abaixo

Conforme também noticiado na Folha de São Paulo, nos dias 28, 29 e 30 aconteceu o Festival ABCR – Conexões para mudar o mundo, organizado pela Associação Brasileira de Captadores de Recursos. Selma Moreira participou no segundo dia de evento virtual com a palestra “Investindo nas capacidades de gestão como estratégia de sustentabilidade”. A diretora-executiva do Fundo Baobá apresentou a organização em sua fala:

“A gente é um fundo para a justiça social, como outros fundos irmãos que fazem parte da Rede de Filantropia para a Justiça Social. Somos uma organização que está muito próxima do campo. Ali, no dia a dia. Esse é um dos maiores ativos de ser um fundo para a justiça social. Ter essa capacidade de escuta muito conectada com o dia a dia. Fazer uma escuta muito ativa e permitir que ela direcione a forma de doar.” 

Além das participações em webinários, um grande destaque na mídia, envolvendo o Fundo Baobá, foi a parceria com o MOVER (Movimento pela Equidade Racial). A iniciativa envolve  45 empresas nacionais e multinacionais que divulgaram um manifesto contra o racismo e se comprometeram a gerar 10 mil cargos de liderança para pessoas negras, promover a empregabilidade de 3 milhões de pessoas negras, além de outras ações. O Fundo Baobá é um dos parceiros especializados na promoção da equidade racial a atuar em conjunto com este grupo de empresas. 

A criação do Projeto MOVER foi destaque na CNN Brasil e no portal da EPBR.

Apoiadas do Fundo Baobá

No campo das apoiadas do Fundo Baobá, o portal Eu Rio divulgou o Workshop Empoderamento Talentos Black, que ocorreu no dia 13 de junho, em Nilópolis, no Rio de Janeiro. Com a premissa de levar experiências e conhecimentos para empreendedores, o workshop foi ministrado pela jornalista Angélica Zago, a maquiadora Danny Soares e a empresária Emanuele Sanuto, as três apoiadas no Programa de Recuperação Econômica de Pequenos Negócios de Empreendedores(as) Negros(as), iniciativa do Fundo Baobá com o apoio do Instituto Coca-Cola Brasil, Banco BV e Instituto Votorantim. 

Emanuele Sanuto, Angélica Zago e Danny Soares, apoiadas no Programa de Recuperação Econômica, com o Workshop Empoderamento Talentos Black – Foto: Thiago Lara

Outro projeto viabilizado com apoio do Programa de Recuperação Econômica, teve destaque na imprensa, desta vez no jornal A Tarde (BA). O Akuaba, formado pelas doulas e terapeutas em ginecologia natural, Júlia Morais e Laura Daltro e pela relações públicas, Alana Santana. O trabalho realizado pelo Akuaba consiste em promover encontros, em Itapuã (BA), para falar sobre autocuidado feminino.

Laura Daltro, Júlia Morais e Alana Santana, do projeto Akuaba – Foto: Jefferson Dias

No dia 18 de junho foi celebrado o Dia Nacional do Tambor de Crioula, riquíssima expressão da cultura afro. O portal O Imparcial fez uma matéria especial com o grupo MaraCrioula, do Maranhão, que foi um dos apoiados no edital Doações Emergenciais no Contexto da Covid-19. O grupo se inscreveu no edital e, na ocasião, o apoio recebido viabilizou 120 kits de higiene básica, máscaras, álcool em gel e cestas básicas para a comunidade. 

Tambor MaraCrioula (MA), apoiado no Edital Doações Emergenciais no Combate a Covid-19

Coluna Negras que Movem – Portal Geledés

Dando continuidade às ações do Negras Que Movem, a coluna do portal do Geledés – Instituto da Mulher Negra, assinada pelas apoiadas do Programa de Aceleração e Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco, no mês de junho teve  quatro textos publicados:

Políticas públicas e a necropolítica brasileira, de autoria da graduada em Serviço Social,  pós-graduada em Política de Assistência Social e MBA em Administração Pública e Gerência de Cidades, Sibele Gabriela dos Santos.

O futuro é uma mulher preta, escrito pela servidora da carreira de planejamento e orçamento federal, Clara Marinho.

Pandemia ladeira abaixo: A gente sempre tem que morrer?, assinado pela publicitária e bombeira militar, Marina Ribeiro Lopes.

Preta, pretinha, não liga para o que dizem essas pessoas e só abaixe a sua cabeça quando for para colocar a coroa, escrito pela advogada Mayara Silva de Souza, em parceria com a coordenadora da Clínica de Direitos da Criança e do Adolescente, Letícia Carvalho Silva.

Mês da Filantropia Negra (Black Philanthropy Month) é aberto oficialmente no Brasil pela primeira vez

Diretora-executiva do Fundo Baobá, Selma Moreira chamou as pessoas a fazerem doações pela causa negra

Um marco para a filantropia pela equidade racial foi estabelecido neste 4 de agosto no Brasil com a abertura do Black Philanthropy Month (Mês da Filantropia Negra), que já acontece há 10 anos nos Estados Unidos e, pela primeira vez, se realiza no Brasil em parceria com o Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (GIFE). Participou do evento, Selma Moreira, diretora-executiva do Fundo Baobá para Equidade Racial, primeiro e único fundo voltado, exclusivamente, para apoiar iniciativas negras para  promoção da equidade racial. 

O BPM Brasil teve as palavras de abertura proferidas pela afro-americana Jackie Copeland, fundadora do BPM nos Estados Unidos: “A justiça econômica é a última fronteira do movimento pelos Direitos Civis e Humanos. Esperamos que todo o mundo nos acompanhe na celebração do mês de agosto, pressionando por tornar a equidade uma realidade”, ressaltou Jackie. 

Jackie Copeland, fundadora do BPM nos Estados Unidos

Em sua fala, Selma Moreira, lembrou das raízes de ajuda mútua que sempre acompanharam a história dos negros no Brasil. “Não vou me estender nos dados que comprovam o resultado de séculos de opressão e preconceito. São verdades que carregamos em nossas veias, no nosso DNA. Mas carregamos também uma história de lutas.  Atualmente, é comum ouvir, especialmente entre mulheres negras, a expressão que ganhou visibilidade em um dos livros organizados por Jurema Werneck: ‘Nossos passos vêm de longe’. Trata-se da mais absoluta verdade: entre nós, ninguém soltou a mão de ninguém. E talvez o exemplo mais emblemático seja a criação das irmandades negras. O agrupamento em irmandades foi uma estratégia encontrada pela população negra para a construção da solidariedade diante de uma sociedade hostil em pleno escravismo colonial.” 

Selma Moreira, diretora-executiva do Fundo Baobá para Equidade Racial

Segundo dados do Censo GIFE 2018, apenas 10% das organizações afirmam focar a população negra em seus programas e projetos de doação. Este percentual cai para 2% quando se trata de definir organizações que tenham a população negra, a equidade racial ou o combate ao racismo contra a população negra como foco prioritário. O investimento social privado e a filantropia podem ter um papel estratégico em diferentes frentes, seja no âmbito do investimento ou, de modo transversal,  em todas as ações e políticas implementadas pelas organizações.

Em sua fala de encerramento, Selma Moreira disse:

“Nós temos todos os saberes e capacidade para construir os próximos passos da nossa história. Durante essa pandemia nós vimos as pessoas mais simples doando para suas comunidades. Temos que pensar nas estratégias que envolvem o capital, porque a gente também doa. Somos a maior parte da população e é fundamental que encontremos essas saídas. Mas acho que temos que fazer isso juntos. E vamos fazer isso com a absoluta certeza de que isso se faz a partir de um conjunto de pessoas. Que a gente tenha capacidade de pensar na doação da  forma mais ampla. Que a gente possa doar vida. As irmandades se juntavam para comprar as cartas de alforria para comprar a liberdade. O que é mais necessário que poder viver em liberdade e de forma digna? Que a gente tenha a possibilidade de seguir juntos, de construir nossa história potente e de múltiplos atores. Que tenhamos condição de ver a justiça social, a equidade racial  para todos e não apenas para alguns. Espero que você doe, que se engaje e permita que seu melhor aflore na perspectiva de uma sociedade mais conectada, onde as pessoas negras sigam vivendo e vivendo com dignidade.”

Além de Selma Moreira, outras importantes vozes brasileiras no tema da filantropia para equidade racial participaram como palestrantes desta primeira edição do BPM Brasil: Adriana Barbosa (Fundadora e CEO da Feira Preta); Atila Roque (Diretor da Fundação Ford Brasil); Gilberto Costa (Diretor executivo do JP Morgan Brasil); Ines Lafer (Presidente do  Conselho do GIFE e Diretora da Fundação Betty e Jacob Lafer) e Neca Setubal (Ex-presidente do Conselho do GIFE e Presidente da Fundação Tide Setubal).

Palestrantes do BPM Brasil 2021 em sentido horário: Márcio Black, Gilberto Costa (JP Morgan Brasil), Ines Lafer (GIFE, Fundação Betty e Jacob Lafer) Adriana Barbosa (Feira Preta e Pretahub), Atila Roque (Fundação Ford Brasil) e Neca Setubal (Fundação Tide Setubal)

Para assistir o painel na íntegra basta fazer a inscrição gratuitamente neste link e depois acessar esta sala.

 

Sobre o Black Philanthropy Month

Ao longo do mês de agosto, o Black Philanthropy Month vai promover atividades para disseminação da cultura de doação no Brasil e no mundo. Estão programadas as seguintes ações: 

  • Lançamento do mapa de iniciativas da filantropia pela Equidade Racial no Brasil;
  • Lançamento da plataforma ISP pela equidade racial;
  • Encontro de formação e sensibilização das governanças do ISP para a Equidade Racial;
  • Produção de vídeos pílulas que respondam a pergunta: “Quais contribuições aprofundadas podem e precisam ser dadas pela filantropia e o investimento social privado para responder ao desafio de uma maior equidade racial?” para ser divulgado durante o mês de agosto;
  • Disseminação, divulgação das ações (rede GIFE, imprensa etc).

Educar como forma de resistir

Diferentes histórias, um sentimento em comum: o amor pela educação. Em um momento frágil para a educação brasileira, jovens selecionados pelo Programa Já É mostram que o amor pelo ensino resiste

Segundo uma pesquisa realizada em 35 países pela organização educacional Varkey Foundation, o Brasil é o país com menor índice de  valorização dos professores. Além disso, o sistema de ensino público do país convive com a baixa remuneração, a falta de incentivo e de planos de carreira bem definidos – fatores que muitas vezes minam a motivação.

Estes são apenas alguns dos diversos problemas que atingem os profissionais de educação brasileiros. Ainda sim, em meio a um cenário profissional turbulento e uma classe desprestigiada, alguns jovens estudam com afinco para se tornarem professores.

Quando questionada sobre qual o seu maior sonho, Laysa Stefani, 18 anos, responde instintivamente: “tentar marcar vidas. Assim como a minha professora marcou a minha vida. Eu quero fazer isso com outras crianças, marcar a vida delas.”

O profissional da pedagogia, por estar em uma área direcionada à atuação com crianças, participa de fases importantes do desenvolvimento. Esses profissionais acabam se tornando grandes referências na vida de seus alunos.

Laysa Stefani, 18 anos

Foi a  observação da relação entre aluno e professor que fez Laysa optar pelo curso. “Quando as minhas irmãzinhas iam para escolinha, porque o pai delas tinha que trabalhar, eu via o jeito que elas chegavam felizes para estudar. Eu via a admiração que elas tinham pela professora da escolinha e eu percebi que era aquilo que eu queria pra mim quando tivesse que pensar numa profissão, uma coisa que eu queria fazer pra minha vida”, conta.

Apesar da beleza da profissão, o desprestígio dos professores é cada vez maior, assim como os artistas. É nesse cenário adverso que João Gabriel Ribeiro, um cearense de 20 anos, que partiu do seu estado natal para São Paulo em busca do seu objetivo de viver da música, estuda para cursar licenciatura na área.

Ele, que vivia com a sua mãe em uma cidade há cerca de 300 km de Fortaleza, chamada Milhã,  não tinha muitas oportunidades para explorar seu dom e realizar seus sonhos no município onde vivia. É quando ele decide buscar sua felicidade na Grande São Paulo onde, segundo ele, é mais fácil encontrar projetos sociais que o levem a realizar seus sonhos, como o Fundo Baobá.

Quando questionado sobre as motivações para se tornar professor de música, o artista diz querer “levar o ensino da música a mais pessoas que não tiveram, ou que não têm, as mesmas oportunidades que eu tive.”

João Gabriel Ribeiro, 20 anos
João Gabriel Ribeiro, 20 anos

Além disso, o jovem reconhece que, como professor, ele pode ajudar outras pessoas a explorar os seus talentos. “Muitas pessoas não têm a oportunidade de conhecer novos horizontes, alguns têm muito talento e não conseguem desenvolvê-lo e acabam se perdendo e indo para outros caminhos.”

Percebe-se que os jovens que estudam para atuar na área da educação estão buscando repetir padrões positivos da vida deles. Seja um professor exemplar, ou a experiência em si de ser aluno, eles querem reproduzir o que um dia a educação os causou. “O papel da educação na minha vida foi me ensinar a ver o mundo”, afirma João.

Os caminhos que levam os estudantes até a universidade

Da zona leste à Região Metropolitana de São Paulo, o sonho de ingressar no Ensino Superior.

A pluralidade  brasileira, com diversas realidades distintas coexistindo em um mesmo espaço, permite que os caminhos que levam até à universidade sejam incontáveis. Se a entrada no ensino superior fosse um destino pré-definido em um itinerário, a viagem passaria desde a inspiração herdada pelos familiares e amigos à superação de quem nunca se viu representado no universo acadêmico. Nos contrastes destes horizontes, sonhos e metas de estudantes são formados.

É nestes bastidores da vida que os objetivos de Gustavo Jesus Soares, de 17 anos, morador da Vila Yolanda II, na zona leste de São Paulo, foram moldados. Apresentando um olhar calmo e atencioso enquanto arruma o cabelo no formato Black Power, o jovem destaca que uma das suas principais características está na forma como enxerga o mundo: de uma maneira simples onde a sua força de vontade te leva longe.

Com a determinação de quem acredita que somente com os estudos as suas metas serão alcançadas, Gustavo atravessa a zona leste de São Paulo a caminho do trabalho com livros, cadernos e canetas, porém esses objetos não são suas ferramentas de trabalhos — já que atua no ramo de pinturas de bonecos –, mas sim, companheiras diárias da sua busca por conhecimento.

Gustavo Jesus Soares, 17 anos

“Para chegar até onde trabalho, preciso sair de casa muito cedo por causa do trânsito e demora para realizar o trajeto. É mais ou menos uma hora e trinta minutos de deslocamento [de acordo com o Ibope, um paulistano passa cerca de um mês e meio parado no trânsito]. Porém, mesmo com essa demanda, eu encontrei um jeito de estudar e não perder o foco dos meus objetivos. Durante o trajeto do ônibus, eu coloco a leitura de temas importantes em dia”, afirma.

Dividindo o ambiente familiar com os seus pais, o jovem destaca que o incentivo diário de ambos é o que auxilia na concentração dos seus objetivos. O pai do estudante atua no ramo de almoxarifado enquanto a mãe, formada em pedagogia, é professora de educação infantil.

É com esse apoio incondicional que a jornada até a universidade ganhou propósito. Segundo Gustavo, o sonho de viver bem, com a mente tranquila, em paz com o mundo e sem se “matar” por dinheiro é o que dá sentido ao esforço diário que encara no transporte público. Para transformar esses e outros sonhos em realidade, ele pretende cursar administração com foco em Finanças Pessoais.

“Eu busco liberdade de expressão e financeira. Para isso, preciso compreender como administrar os meus gastos e administrar a minha vida como se fosse uma empresa real. Onde eu sou o dono, o funcionário e tudo”, define.

Do outro lado de São Paulo, mais especificamente em Franco Rocha, na Região Metropolitana da cidade, os caminhos até a universidade passam pela inquietação de quem pretende conhecer e conquistar cada detalhe possível de ser desbravado neste mundo. É com curiosidade presente nas personalidades das pessoas jovens, que possuem uma sede natural por descobertas pessoais, que Giovanna Oliveira Correia da Silva expõe em metas os seus desejos: estudar de tudo um pouco.

Convivendo em um ambiente tranquilo, como ela mesmo define, a jovem divide o lar com os seus pais. Ao lado deles, a estudante possui a oportunidade de realizar uma agenda de estudos saudável, com cerca de três horas de dedicação diária. Através das suas lentes de óculos, os olhos castanhos escuros de Giovanna demonstram a vontade de explorar o novo.

“Eu sei que sou muito nova, mas pretendo estudar muitas áreas ainda! Eu quero cursar Publicidade e Propaganda, depois Letras e me aperfeiçoar em inglês. Acredito que são cursos e profissões que exploram o que tem de melhor no mundo”, exalta.

A estudante revela que suas expectativas com o Programa Já É, do Fundo Baobá. Para ela, a iniciativa representa a possibilidade de tornar os seus objetivos em realidade, já que será a primeira vez que fará a prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) – contará com acompanhamento profissional. Além deste passo importante, Giovanna acredita que é uma oportunidade incrível de conhecer e conectar-se com outros jovens que possuem a mesma determinação de ingressar no ensino superior.

10 Anos do Baobá: a importância da Assembleia Geral e do Conselho Deliberativo

O texto começa com um agradecimento. Mas não é pieguice. É que ele tem muito significado para o que estará escrito posteriormente. Sim, o agradecimento é sentimental, mas também tem posicionamento político contundente. “Tenho prazer enorme em fazer parte desse time. Prazer enorme em estar desde o início dessa construção de ações, de projetos, de propostas de promoção de equidade racial no Brasil.  O Fundo Baobá tem um valor enorme para milhares de famílias brasileiras, de famílias nordestinas sobretudo. Porque aqui no nordeste está a expressão  maior de negação de direitos de todas as ordens. Quero agradecer imensamente por estar nessa organização, por fazer parte da Assembleia Geral do Baobá e poder contribuir de forma efetiva para que tenhamos uma sociedade mais justa, mais igualitária, que respeite de fato a sua diversidade.” 

A fala acima é da pedagoga Maria do Socorro Guterres, que faz parte da Assembleia Geral do Fundo Baobá para Equidade Racial. Mas qual é o papel da Assembleia Geral e de seus membros dentro do Fundo Baobá? A própria Socorro Guterres explica: “A assembleia tem papel fundamental para a condução dos trabalhos da missão do Baobá. Os membros da assembleia têm um papel não só burocrático de aprovar e assinar atas, além da prestação de contas. O papel é de fortalecer o processo organizativo do Baobá. De construir alternativas que possibilitem a alteração dos propósitos de vida das pessoas para as quais o Baobá executa as suas ações. A Assembleia Geral não só decide, mas constrói, coordena e articula, ela decide os processos organizativos. Os processos de fortalecimento do Baobá.”

Maria do Socorro Guterres, pedagoga

Outra esfera de governança do Fundo Baobá é o Conselho Deliberativo, do qual faz parte o economista Elias Sampaio. Falando diretamente de Salvador, na Bahia, Sampaio disse: “O Conselho Deliberativo faz parte do que chamamos de Governança do Baobá. O Conselho é o elo entre a execução e os guardiões dos princípios do Baobá, que são os associados, os membros da Assembleia. O Conselho toma decisões estratégicas. É quem aponta os caminhos para onde o Baobá deve seguir e aponta correções, quando necessárias.  O papel do conselheiro é contribuir com esse debate”, afirma Elias Sampaio.  

Socorro Guterres e Elias Sampaio fazem parte da trajetória de criação do Fundo Baobá para Equidade Racial, lá na metade da primeira década dos anos 2000.  Como profissional da Educação e profissional da Economia, eles falam sobre esses dois eixos programáticos do Baobá. “O eixo educação é fundamental. A importância de ter o eixo educação desde a fundação do Fundo Baobá é pensar que ainda existe um fosso extremamente grande entre a população negra (adolescentes, jovens e crianças) e a população branca. Um fosso ainda muito grande em relação à educação. É necessário construir estratégias para a sua diminuição ou eliminação. Para que tenhamos a população negra em iguais possibilidades de acesso à educação em nosso país, isso pode ser construído e fortalecido com ações do Fundo Baobá”, afirma Socorro Guterres. 

Elias Sampaio enfatiza o papel da Economia. “A centralidade do Baobá é a Economia. Você não pode promover ação sem ter financiamento dessa ação. A grande inovação do Baobá é isso. O Baobá tem que ter mecanismos sólidos e sustentáveis de financiamento. Sem financiamento não há nenhum tipo de política pública”, afirma.

Elias Sampaio, economista

Com relação à contribuição do Fundo Baobá para a implementação da equidade racial no Brasil e o combate ao racismo, as visões dos conselheiros, por serem pessoas de muito conteúdo, como classificou Elias Sampaio, podem ser diferentes, fato que contribui ainda mais para o debate e tomada de um caminho comum.  “Acho sim que o Baobá já alcançou o propósito para o qual foi criado. Porque a promoção da equidade racial no Brasil não é só do Baobá. O Fundo Baobá  foi criado para contribuir nesse processo de construção de promoção da equidade. E tenho certeza que nesses 10 anos já cumpriu com isso. É claro que pode mais. Intensificando, continuando a implementar projetos, editais, ações que promovam e fortaleçam o exercício da cidadania de tantos sujeitos homens e mulheres, negros e negras. Podemos fortalecer o exercício de disputa de espaços de poder. Quando falo em disputa, falo no sentido do exercício sadio. Falo da possibilidade real de negros e negras estarem em espaços de poder”, diz Socorro Guterres. 

Elias Sampaio considera que a luta histórica ainda tem muito para ser equilibrada, quando questionado se o Fundo Baobá já teria alcançado o propósito de sua criação. “Não. E não poderia. Como vamos conseguir equidade racial em 10 anos se temos mais de 500 de iniquidade?  Nem que fosse com 25 bilhões de dólares, em 10 anos não conseguiriamos alterar as desigualdades históricas contra os negros no Brasil. E isso não é nenhum demérito para o Baobá. Nós não conseguimos chegar a nossa meta, pois ela é a meta de 210 milhões de brasileiros. Essa luta não é apenas dos negros, é de todos os brasileiros”, conclui.

Organizações selecionadas para a terceira fase do Edital Vidas Negras: Dignidade e Justiça

O Fundo Baobá para Equidade Racial, com o apoio do Google.Org, braço filantrópico do Google, lançou, no dia 5 de maio, o edital “Vidas Negras: Dignidade e Justiça”. O intuito do edital é apoiar entidades negras que atuam no enfrentamento do racismo e incorreções que ocorrem dentro do sistema de Justiça Criminal no Brasil.

O edital “Vidas Negras: Dignidade e Justiça” irá selecionar 10 entidades negras brasileiras. Cada organização selecionada, além de receber R$ 100 mil para a realização de ações programáticas, também irá participar de jornadas formativas para o fortalecimento institucional.

As organizações interessadas apresentaram suas propostas para um dos temas a seguir:

a) Enfrentamento à violência racial sistêmica
b) Proteção comunitária e promoção da equidade racial
c) Enfrentamento ao encarceramento em massa entre adultos e jovens negros e redução da idade penal para adolescentes
d) Reparação para vítimas e sobreviventes de injustiças criminais com viés racial.

No dia 18 de junho, foram selecionadas 84 propostas que passaram para a segunda etapa do processo seletivo. Nesta etapa houve análise e avaliação das iniciativas por meio de especialistas, baseado nos critérios de relevância; coerência; consistência e sustentabilidade, entre outros critérios.   

A pontuação máxima a ser atingida nesta etapa era 50 pontos, não passando para a próxima fase, propostas com 25 pontos ou menos. Nesta etapa contamos com o apoio de especialistas que, com base nas necessidades descritas para o campo, além da análise técnica das propostas, buscaram   garantir, nas recomendações para o comitê selecionador, indicação de propostas de todos os eixos e regiões do país.

No prazo de um mês, foram selecionadas para a terceira etapa, 24 propostas das cinco regiões do país.

As organizações selecionadas para a terceira etapa do processo seletivo do edital Vidas Negras: Dignidade e Justiça, irão participar de um painel de entrevistas, realizado por um comitê composto por especialistas e membros da governança do Fundo Baobá para Equidade Racial. Cada organização selecionada deverá preparar uma apresentação, com até 10 minutos de duração, sobre a iniciativa defendida. Poderão participar até dois membros da organização. As entrevistas ocorrerão de forma virtual, com duração de 50 minutos, incluído o tempo da apresentação.

A partir dessa entrevista, o comitê selecionador irá escolher as 10 iniciativas que deverão enviar a documentação para análise e possível aprovação. O resultado da terceira etapa do processo seletivo será divulgado no dia 9 de setembro, após as 19h, através das redes sociais do Fundo Baobá para Equidade Racial.

Agora acesse o link que leva à lista das organizações negras selecionadas para a terceira etapa do edital Vidas Negras: Dignidade e Justiça.

Evento virtual marca o encerramento das formações do Programa de Recuperação Econômica de Pequenos Negocios de Empreendedores(as) Negros(as)

No dia 23 de junho, o Fundo Baobá para Equidade Racial, ao lado do FA.VELA, organizou o evento virtual de encerramento das atividades formativas do Edital de Recuperação Econômica de Pequenos Negocios de Empreendedores (as) Negros (as).

Com o apoio do Instituto Coca-Cola Brasil, Coca-Cola Fundation, Banco BV e Instituto Votorantim, o Programa de Recuperação Econômica apoiou empreendimentos comandados por pessoas negras, localizados em comunidades periféricas, territórios rurais e urbanos, alguns em contexto de vulnerabilidade socioeconômica.

O evento contou com a participação dos 137 empreendedores, que compõem as 46 iniciativas apoiadas pelo edital, além dos membros da diretoria do Fundo Baobá e da equipe de planejamento, articulação e execução das formações coordenadas pelo FA.VELA.

Quem conduziu a primeira parte do evento de encerramento foi a auxiliar de projetos do FA.VELA, Lavínni Moraes, que apresentou dados referentes à jornada formativa com atividades síncronas e assincronas. Do dia 29 de março até o dia 22 de junho foram realizadas 30 aulas ao vivo, além de 17 aulas gravadas, em diversos formatos, como vídeo aulas e podcasts. 

Lavínni Moraes, auxiliar de projetos do FA.VELA

Ao longo do processo de formação, foi implementado um sistema de monitoramento, que culminou como uma boa fotografia dos esforços e dos resultados alcançados por empreendedores(as) que, em trio,  compunham as  iniciativas apoiadas. Por meio de  um questionário aplicado no início e no final da capacitação foi perceptível a evolução dos empreendedores em muitos aspectos. No que diz respeito ao “Planejamento e Gestão de Negócios”, no primeiro mapeamento, 14% das iniciativas em funcionamento não tinham estruturação de metas e princípios. No segundo mapeamento, esse número foi zerado, mostrando que 100% das iniciativas em funcionamento contava agora com estruturação de metas e princípios.

Outro item que chamou atenção foi o das “Parcerias”. No primeiro questionário, apenas 49% das iniciativas contavam com parceiros de negócios. No final do curso, este número chegava a 87%. 

No campo de “Comunicação e Marketing”, no primeiro mapeamento 62% das iniciativas investiam em comunicação e marketing. Porém, no segundo questionário, o número de iniciativas que passaram a investir nessa área subiu para 91%.

Foram apresentados também indicadores de desenvolvimento dos negócios individuais. No primeiro mapeamento, apenas 42% dos empreendimentos possuíam CNPJ, no segundo mapeamento este número subiu para 64%. 

Sobre “Planejamento e Gestão de Negócios” em nível individual, no primeiro relatório, 57% funcionavam com estruturação de metas e princípios, porém no segundo relatório, o percentual subiu para 86%.

No campo de “Comunicação e Marketing”, cerca de 66% dos empreendimentos individuais investiram neste diferencial, entretanto, no segundo mapeamento, este número subiu para 77%.

Sobre “Parcerias”, se em um primeiro momento 68% dos empreendimentos contavam parceiros de negócios, no segundo mapeamento 83% dos empreendimentos funcionavam com parcerias.

Após apresentação dos indicadores de desempenho, foi realizada uma retrospectiva do conteúdo das aulas e uma apresentação dos professores e mentores que contribuíram com essa formação, Inclusive, as mentorias individuais foram bastante elogiadas. Uma pesquisa de satisfação mostrou que a cada 10 participantes, 9,84 ficaram satisfeitos com os atendimentos individuais personalizados.

Emoção tomou conta

A empreendedora Danieli Carvalho Silva, do Emprega – Oficina de Costura, juntamente com Ana Cristina Carvalho Silva e Ana Claudia Salgado, todas de São Paulo,  foi a primeira a abrir a sessão de emocionados agradecimentos. Ela fez questão de lembrar que ser empreendedor é uma coisa que já está no sangue de cada um de nós: “A gente já é empreendedor. Temos isso na nossa cultura”, relembrou a empreendedora,  que começou o seu primeiro negócio ainda na infância: “Eu tentei vender doce na porta da casa da minha avó, esse foi o meu primeiro treinamento, de conseguir vender, de saber o que é se relacionar com as pessoas e o que é trabalhar. Desde então, eu venho tentando conquistar o meu espaço”. 

Danieli inscreveu o seu empreendimento ao lado da mãe e da tia. Agradeceu pela oportunidade de participar do Programa de Recuperação Econômica do Fundo Baobá, principalmente por se sentir mais fortalecida: “O programa me mostrou que se eu não estiver fortalecida e se eu não tiver o meu próprio negócio, como que eu vou conseguir gerar renda para outras pessoas? Então, dentro do nosso projeto, que é empreender e ensinar as pessoas por meio da costura, outras pessoas negras podem ter o seu próprio negócio. A gente conseguiu desenvolver uma marca e com as aulas e as conversas que a gente teve, conseguimos nos organizar melhor”, afirmou.

Danieli Carvalho Silva, do Emprega – Oficina de Costura

Pauliana Rita do Nascimento, da Turismo Rural, Tradições Quilombola, do estado da Paraíba,  estava exultante com uma decisão tomada por sua irmã e parceira de negócio Severina Maria do Nascimento. A terceira componente é a também irmã, Edinalva Rita do Nascimento.  “Estou muito grata pela grande surpresa que tive ao longo desse processo. Nossa iniciativa é formada por três irmãs. A Severina falou que vai voltar a estudar. Ela percebeu que, independente da idade, é possível sim”, disse. 

Dayana Barros Oliveira, do Pescadoras Artesanais Beneficiárias e Integradas, do Rio de Janeiro, tem como parceiras Luciana Oliveira Machado e Erlineia Barros de Sousa Viana. Dayana comemorou a evolução da comunicação do negócio das pescadoras. “Aprendi muito e quero levar isso para o resto da vida. Antes, ninguém sabia do nosso negócio. Nunca tínhamos colocado em nada. Agora, estamos no Facebook, no Instagram e muita gente já está nos procurando”, afirmou em declaração que foi sustentada por sua parceira de negócio Luciana:  “Agradeço ao FA.VELA e ao Baobá por terem mudado nossas vidas”. 

Falando pelo FA.VELA, João Souza, seu co-fundador e diretor de novos negócios e parcerias, elogiou a perseverança das e dos envolvidos. “Muitas falas bem potentes aqui. Isso é muito rico, porque deu certo. Ter esses feedbacks de vocês fazem a gente ver que está no caminho certo.”

Finalizando o evento, a diretora executiva do Fundo Baobá, Selma Moreira, falou do caráter de mudança social que o edital de Recuperação Econômica tem. “Sofremos todas as consequências que o racismo impõe em nossa sociedade. Acreditamos no trabalho de todos vocês. Não temos dúvida de que investir nos empreendedores negros é o que vai mexer nessa estrutura social”, concluiu.

Empreendedorismo negro: Chefs investem nas comidas africanas e têm sucesso

“No tabuleiro da baiana tem: Vatapá, Caruru, Munguzá…”  O verso do compositor Ari Barroso (1903-1964), feito em 1936 e imortalizado na voz de Dorival Caymmi, mostra como a culinária africana está incorporada à cultura do Brasil. Afinal, os povos negros, sequestrados de África e trazidos à força para cá, conferem ao país outros universos de conhecimentos, cores e sabores, desde 1530.

As comidas são algumas  das mais ricas fontes culturais de um povo. Porém, ao contrário do que ocorre com a culinária dos povos europeus que colonizaram o Brasil – e que figuram nos cardápios dos mais caros restaurantes das capitais brasileiras -, as diferentes culinárias  encontradas nos 54 países que compõem a África sofrem rejeição, apesar de terem  muitos de seus elementos em alguns dos mais cultuados pratos da cozinha brasileira. Acarajé, xinxim, vatapá, caruru, amalá, abará, cuscuz, mungunzá, angu e feijoada:  essas iguarias e inúmeras outras estão inseridas dentro do que se chama hoje de comida brasileira. A origem de muitas delas, porém, está nos porões dos navios negreiros que aportaram na costa de Pernambuco, da Bahia e do Rio de Janeiro ainda antes de 1550. 

A diversa culinária africana permanecia invisível, até que uma polêmica televisiva chamou a atenção para sua existência. Houve uma zombaria a uma comida, o Ugali, feita por um camaronês, o chef Sam. Os envolvidos na prova do Ugali mencionaram que poderiam morrer depois de comer. A manifestação viralizou na internet, gerando protestos. 

A dedicação em produzir a culinária dos países africanos  tem sido o meio de vida de muita gente envolvida com gastronomia.  Uma empreendedora que apostou nisso é Rosilene Rodrigues dos Santos, 60 anos, mais conhecida no Recife (Pernambuco) como Rose Tabuleiro. “Tabuleiro é um instrumento onde se expõem as mercadorias ou quitutes para venda. Era muito usado pelas mulheres negras alforriadas ou escravizadas, para vender nas ruas os quitutes produzidos por elas mesmas”, explicou Rose Tabuleiro, revelando de onde vem o apelido. O tabuleiro se transformou no Tabuleiro Culinária Afro Brasileira, empreendimento de Rose que já está no segmento de restaurantes há 20 anos. 

Segundo dados de 2020 do Global Entrepreneurship Monitor (GEM),  há cerca de 24 milhões de mulheres empreendedoras no Brasil.  A Taxa Total de Empreendedores (TTE) entre pretos é maior do que a de brancos, de acordo com a pesquisa do Instituto Brasileiro da Qualidade e Produtividade (IBQP), Sebrae e GEM 2019: 16,5%. Empreendedores brancos são 15,2%, respectivamente. Um dos eixos programáticos do Fundo Baobá para Equidade Racial é o do Desenvolvimento Econômico. Para nós, promover o desenvolvimento econômico da população negra significa apoiar iniciativas de formação de cidadãos e cidadãs para o ingresso no mercado de trabalho formal ou para o seu aprimoramento, nos mais diferentes setores; que estimulem o empreendedorismo como  engrenagem para o emprego e geração de renda; defendam a diversidade e a equidade como um valores  na indústria, comércio, serviços e demais áreas; ou mesmo o apoio a iniciativas que protejam os direitos das trabalhadoras e trabalhadores domésticos ou ampliem o acesso da população negra ao crédito. 

Rosilene Rodrigues dos Santos – Rose Tabuleiro – Tabuleiro Culinária Afro Brasileira

A jornada de Rose Tabuleiro não foi fácil. Um dos motivos, o estigma que existe em relação à culinária africana. “Existe um preconceito histórico com relação a tudo que é considerado africano no Brasil. Em relação à culinária, isso é percebido quando não se ressalta nas preparações da comida brasileira a contribuição do povo africano nos pratos desta culinária. Muitas vezes se referem a esses pratos como preparações regionais, mas não ressaltam a identidade do povo de origem”, afirma Rose.

Rose vê como fruto do racismo estrutural a pouca difusão da culinária dos países africanos. “No Brasil,  o racismo é estrutural. Ou seja, está na base de todas as nossas relações. Nessas relações, tudo que se refere ao povo preto, consequentemente com raiz africana, é taxado como não tendo valor. Portanto, não deve ser difundido”, afirma. 

Outros dois nomes que trabalham com comidas africanas são Leila Ione Oliveira, 47 anos, e André Luis Maciel Lobão, 44. O interesse deles veio por meio da religiosidade. Ambos são iniciados no Candomblé. Leila há 10 anos. É Yabassé, cargo dado às mulheres para serem guardiãs dos segredos da comida sagrada e ritual dos Orixás. André Lobão é iniciado há 15 anos. É Egbomi (alguém que está na direção de ser Ialorixá ou Babalorixá). Ambos integram a comunidade do Ilê Axé Alagbedê Olodumare. 

A evolução de Leila e André na culinária africana deu origem ao Cozinha Ancestral, restaurante localizado em São Luís (Maranhão) e referência no local. Ambos reconhecem que há pouca difusão do seu tipo de trabalho no Brasil, mesmo o país contando com um contingente de 56% de gente negra. “Vivemos no Brasil um complexo cultural colonialista e racista que é estrutural. Ele nos impediu e nos distanciou da soberania alimentar africana, assim como de seus mitos e tabus. Além disso, a disseminação racista sobre a relação sacrificial do alimento, tradicionalmente presente na cultura africana, contribuiu para a construção de um imaginário preconceituoso, macabro e perverso sobre a origem, o manuseio e o propósito do alimento na culinária do povo africano e dos praticantes de seus ritos ancestrais na diáspora”, diz André Lobão.

Leila Ione Oliveira e André Luis Maciel Lobão, Cozinha Ancestral

Leila Oliveira, uma mulher afro-ameríndia, nascida em Belém, no Pará, cresceu dentro do mercado Ver-o-Peso, centro comercial e gastronômico da cidade. Aprendeu a base da culinária em meio a ervas, raízes, frutos e pescados ofertados pela floresta e pelos rios. Para ela, há pouco conhecimento sobre a cultura alimentar no Brasil. “O povo brasileiro, apesar de desfrutar de uma diversidade cultural na sua alimentação, pouco conhece a origem dos ingredientes, receitas, mitologias e tabus que envolvem o imaginário da herança dos povos africanos e indígenas. Fomos educados com um referencial civilizatório europeu e uma economia pautada no capital norte-americano. Esquecemos, porque nos foi negada, a história e a cultura do povo africano. A culinária de um povo é uma de suas principais manifestações culturais. Fala de como os ancestrais nos ensinaram a comer para ter longevidade e sermos felizes”, afirma. 

 “Costumo dizer que trabalho com culinária afro-brasileira e saliento que a contribuição do povo preto da África com o povo preto do Brasil foi e tem sido de extrema importância na formulação desta cozinha tão marcante e rica em qualquer um dos seus territórios. Qualquer preparação advinda destes povos nos representa e reafirma o quanto eles contribuíram para que este país seja engrandecido e enegrecido nesta área”, diz Rosilene, a Rose Tabuleiro. 

André Lobão e Leila Oliveira fizeram um convite a quem for a São Luís: passar no Cozinha Ancestral e comer o Banquete do Caçador. Rose Tabuleiro mandou uma receita para ser experimentada pelos leitores e leitoras:  

Rose Tabuleiro

“Quero, nesta receita, ressaltar a parceria entre o povo indigena e o povo preto, que fez com que esta iguaria se tornasse patrimônio do povo brasileiro, a  Tapioca, uma raiz cultivada e transformada pelos povos indígenas e transformada em culinária saborosa e nutritiva pelas mãos negras.”

Tapioca Ensopada no leite de coco

Ingredientes:

500 gr de goma para tapioca (não é sagu)

500 ml de leite líquido (de caixinha)

300 gramas de coco ralado fresco

100 gramas de açúcar

sal a gosto

10 gramas de canela em pó

Modo de Preparo:

1- peneire a goma para tapioca e faça as tapiocas(de forma tradicional) e reserve,

2- coloque no liquidificador o coco ralado fresco com o leite líquido e coe. Adoce com o açúcar e parte da canela em pó,

3- em um refratário coloque as tapiocas em camadas alternadas com os leites reservados antes

4- polvilhe com o restante do coco ralado fresco e o restante da canela

5- leve à geladeira por pelo menos 2 horas antes de servir


Observações da chef:

1.  Se for servir como sobremesa sirva gelado
2. Se for servir no café da manhã ou jantar, sirva em temperatura ambiente

10 anos do Baobá: base sólida de trabalho, forte estruturação e internacionalização

A cultura de doação no Brasil vem passando por transformações. Como agente desse ecossistema, a atuação do Fundo Baobá para Equidade Racial tem sido marcante. O segmento em que o Baobá atua, o da captação e destinação de recursos visando o combate ao racismo e promoção da equidade no Brasil, vem sendo mais notado por financiadores que enxergam a defesa dos direitos e oportunidades justas para a  população negra como algo sem retrocesso, que vai contribuir para uma melhor sociedade. 

O Baobá completa dez anos de fundação neste ano de 2021. Seu trabalho vem sendo significativo na captação e destinação de recursos para que entidades negras alcancem excelência em suas propostas de transformação da realidade social do Brasil. Esse trabalho, porém, é mais que secular, como explica a socióloga e vice-presidente do Conselho Deliberativo do Fundo Baobá, Amalia Fischer: “Acho que o Baobá tem mais de dez anos. Ele tem 310 anos. Por que falo isso? Porque o Baobá tem a linhagem de toda ancestralidade que criou formas de solidariedade e formas de construir filantropia pela justiça social. A filantropia pela justiça social no Brasil começa com as irmandades negras”,  afirma. “O Baobá tem o conhecimento e a experiência de todas essas pessoas negras que o formam e o fortalecem”, completa. 

Amalia Fischer, socióloga e vice-presidente do Conselho Deliberativo do Fundo Baobá para Equidade Racial

O administrador Fábio Santiago, membro do Conselho Fiscal do Fundo Baobá, vê com otimismo o desenvolvimento de captação de recursos para filantropia no país. “Quando comparamos o ecossistema de doação e a prática de filantropia no Brasil e no exterior, podemos notar a enorme diferença na quantidade de fundos patrimoniais criados e também sobre as diferenças de valores que os compõem. Claro que a situação econômica do país é determinante para esses aspectos, mas o Brasil ainda tem muito espaço para melhorar sua visão e suas práticas no que tange à promoção da filantropia”, diz. 

Para Santiago, o nível organizacional desenvolvido pelo Fundo Baobá nesses dez anos de atuação propiciou confiabilidade dentro do segmento da filantropia. “Trabalhar com objetivos bem definidos, ter discurso coerente, prática estruturada e um processo de prestação de contas bem elaborado e transparente anima as empresas”, explica. Porém, alerta Fábio Santiago, há outras formas de os financiadores contribuírem. “É importante deixar nítido que nem só de dinheiro depende o fortalecimento de certas causas. Acesso ao trabalho, a serviços e produtos essenciais, além do reforço de mensagens afirmativas são algumas contribuições possíveis por empresas de diferentes portes e que podem resultar em mudanças muito significativas no contexto brasileiro.”

Fábio Santiago, administrador e membro do Conselho Fiscal do Fundo Baobá

O desenvolvimento da cultura de doações no Brasil pode fazer uma entidade com o nível organizacional do Baobá crescer ainda mais em importância para a sociedade. “O Baobá vai ser uma das grandes instituições do país. Porque tem capacidade de gerar recursos grandes e altos. Conhece muito bem as organizações e os territórios onde elas estão. Sabe das necessidades dessas organizações e sabe como fortalecê-las. Além disso, sabe construir colaborativamente com outros fundos e outras fundações”, afirma Amalia Fischer. 

O mês de agosto vai marcar a realização do Black Philanthropy Month (BPM). O evento aconteceu pela primeira vez em 2011 e tem como objetivo investir na liderança filantrópica negra para o fortalecimento da doação também negra visando beneficiar organizações, comunidades e vidas dos afrodescendentes brasileiros. Pela primeira vez o BPM acontecerá no Brasil e o Fundo Baobá terá papel de destaque. “Será uma oportunidade de colocar luz sobre um tema, de atrair novos olhares, de promover trocas entre os participantes e conhecer experiências de determinadas regiões que podem ser aplicadas em outras. A participação do Baobá no BPM reforça seu papel de organização formadora de opinião, de incentivo à causa e engajamento de diferentes públicos, além de projetar a instituição internacionalmente. Ter papel de destaque no evento promete ser um grande gol para o Baobá”, destaca Fábio Santiago. 

O caminho da internacionalização do Fundo é analisado também pela vice-presidente do Conselho Deliberativo, Amalia Fischer. “A participação do Baobá no Black Philantrophy Month (BPM) vai ser super importante. Vai ser uma troca em que o Baobá vai aprender e também compartilhar conhecimentos e experiências. Vai também estimular que essas doações sejam dirigidas  para a questão do combate ao racismo no Brasil”, declara.   

Arte negra engajada: existir e resistir

Uma pesquisa realizada em junho de 2020, pelo jornal britânico The Sunday Time, perguntava quais eram as cinco profissões consideradas essenciais e quais as profissões consideradas não essenciais, no contexto da pandemia. Do lado essencial, profissionais da área da saúde lideravam a lista ao lado de faxineiras, coletores de lixo e entregadores delivery. Do lado não essencial, artistas aparecem liderando a lista, com 71% dos votos. Mesmo que a escolha tenha sido feita pela população britânica, este pensamento atravessa fronteiras e oceanos e é reproduzido aqui em nosso país. A professora de dança em Goiânia, Juliana Jardel, já foi questionada acerca da sua profissão: “Já perguntaram se eu só dou aulas de dança ou se eu trabalho também”, mostrando que há uma desvalorização imensa da classe artística. Juliana se utiliza de meios pedagógicos para mostrar a importância da arte, principalmente no contexto pandêmico: “Eu sempre digo  para quem diz que a arte não é importante e que nunca precisou de um artista, para desligar os rádios e as TVs, além de não abrir nenhum livro. Dessa forma eles compreendem a importância de qualquer manifestação artística”.

Por compreender a importância das artes para desconstruir representações sociais negativas da população negra, o  Fundo Baobá para Equidade Racial prioriza apoio a iniciativas negras alinhadas aos eixos programáticos da organização, entre eles o comunicação e memória, que consiste em apoiar projetos e iniciativas de valorização e difusão de bens culturais materiais e simbólicos (produção artística – música, dança, canto, literatura, etc.; práticas culturais tradicionais e inovadoras), além da mídia negra. Promovendo a cultura negra e resgatando a nossa memória em todo o território nacional.

Cientes que somos da importância da arte para reflexão, alívio das dores e preocupações ou mesmo para o nosso entretenimento, deixamos as seguintes perguntas no ar: a (o) artista deve se engajar e se posicionar diante de determinadas situações de crise? As diversas manifestações artísticas negras que, historicamente foram perseguidas, por si só não são um ato de resistência? 

O Fundo Baobá entrevistou três artistas negros, de diferentes linguagens, para responder a estes questionamentos e nos  contar suas histórias e  trajetórias.

Juliana Jardel: A dança como instrumento de resistência e cuidado do nosso povo

Com quatro anos de idade, Juliana Jardel acompanhava a sua mãe, que era costureira em domicílio, até a casa de outras mulheres, para pegar roupas e realizar reparos. Em um desses passeios, a pequena Juliana se encantou com uma foto de formatura que estava pendurada na parede de uma casa, ao lado de um altar com imagens de santos: “Essa pessoa deve ser muito importante, porque a foto dela está do lado de um santo”, pensou a criança, que mesmo muito pequena lembrou que só havia visto fotos parecidas com aquela na casa de outras pessoas brancas. Ao chegar em casa, perguntou ao pai, que era fotógrafo, se pessoas negras poderiam ter aquela foto também e por que ela nunca tinha visto uma parecida na casa de pessoas negras. Naquele momento, Juliana Jardel decidiu que teria uma foto como aquela. Hoje, aos 43 anos de idade, Juliana não só tem uma foto da sua formatura em Dança, como também do mestrado em Performances Culturais e, logo mais, terá registros de sua tese de doutorado em Antropologia Social.

O amor de Juliana Jardel pela arte começou no seio familiar: “A minha família sempre foi muito dançante. O meu tio Virgílio – hoje falecido – fazia parte de uma escola de samba, aqui de Goiânia, chamada Brasil Mulato, e as minhas tias faziam uma ala só da família nessa escola”, recorda Juliana, que estreou como membro da Brasil Mulato com apenas três anos de idade. “A escola de samba ficava em um bairro negro, era o principal ponto de encontro da população negra de Goiânia”.

Aos oito anos, quando Juliana Jardel foi fazer aulas de jazz, ela pôde sentir a importância da representatividade negra: “A Tia Constança, a minha professora de jazz, era negra. Aquilo foi muito importante pra mim, porque eu fui criança nos anos 1980, e naquela década  tinha muitos filmes musicais e tinham muitos corpos negros dançando. Então, na minha cabeça, eu tinha que ir para os Estados Unidos para dançar. Mas quando eu vi a Tia Constança, eu entendi que era possível fazer algo aqui”. Ainda na infância, ao lado de seu irmão Jarbas, outro grande apaixonado por dança, e dos seus primos, fizeram parte da companhia do Juquinha: “Era um show que tinha em Goiânia com apresentações artísticas e imitações”, relembra Juliana que, ao lado do irmão fez imitações do Trem da Alegria e da Banda Reflexu’s, famoso grupo de samba reggae formado nos anos 1980, em Salvador (BA). A Reflexu´s tem um trabalho musical voltado à valorização da história e cultura afro-brasileira: “Até então, a gente não tinha muito entendimento do que era o continente africano. Mas as letras da Banda Reflexu’s nos impactaram porque falavam de uma África completamente diferente do que era aprendido na escola. Foi muito importante pra mim”, revela Juliana.

Com a separação dos pais, Juliana Jardel deu um tempo na dança ( “Dança é algo muito caro, infelizmente”) e aos 16 anos arrumou um emprego. Mas o amor pela arte falou mais alto e  retornou à dança na fase adulta. Integrou a Companhia Nômades até que, finalmente, entrou na faculdade de dança, no mesmo ano em que sofreu um imenso golpe: “Quando entrei na universidade, eu estava com mais de 30 anos, mas entrei com tudo. Falei ‘a minha hora é agora’. Mas logo no primeiro ano, o meu irmão, meu parceiro de dança, faleceu”.

No ano de 2014, Juliana fundou o grupo Corpo Suspeito, uma parceria da Universidade Federal de Goiânia (UFG) com o Sesi, e em paralelo a isso criou um método de dança chamado Movimentos Atlânticos: “é o método de dança que eu uso no Corpo Suspeito e tem ligação com a minha avó que morava na fazenda. Então, alguns pilares dessa dança são coisas cotidianas que a minha avó fazia por lá, o pilar, o peneirar e encher o pote d’água. São esses três elementos que fazem parte fundamental da coreografia, mas entra também a coisa do axé, da dança dos orixás e dos elementos do candomblé”, revela.

Na primeira apresentação do Corpo Suspeito, Juliana Jardel teve uma ideia: convidar dois dançarinos brancos para interpretar a sua coreografia: “Foi proposital, eu queria ver a reação das pessoas ao ver uma mulher negra coreografando pessoas brancas”. O experimento realizado por Juliana funcionou: as pessoas presentes acreditavam que a performance era elaborada pelo dançarino branco, que chegou a demonstrar desconforto com a situação: “Ele chegava até mim e dizia que estava se sentindo mal, pelo fato de as pessoas acharem que o grupo era dele. Mas eu disse para ele não se preocupar, que na hora certa eu iria aparecer. Quando eu apareci, foi engraçado ver a reação chocada das pessoas”.

Juliana Jardel, graduada em dança, mestre em Performances Culturais, doutoranda em Antropologia Social e idealizadora do grupo Corpo Suspeito

O último trabalho realizado pela coreógrafa foi “Do Àiyé ao Òrun: A Escrita da Diáspora”, um filme dança, como ela mesmo gosta de chamar, por causa dos seus 32 minutos de duração, gravado no espaço da UFG – que estava fechado devido à pandemia da Covid-19 e que, segundo a própria coreógrafa, é um trabalho político: “O vídeo retrata o processo da escrita. Mas não só da escrita acadêmica,  uma escrita da vida ou a escrita do corpo. Um movimentar constante e um correr constante”. No vídeo, Juliana Jardel faz sua performance artística rodeada de imagens e desenhos de personalidades negras como Marielle Franco, Mestre Moa (morto a facadas em outubro de 2018, em Salvador, por motivações políticas) e Zumbi dos Palmares, além de fazer uma referência ao baculejo, gíria dada à revista efetuada por policiais a civis em locais públicos: “Não é só o baculejo da polícia que eu retrato, é o baculejo do sistema, que a toda hora vai te parar e vai te advertir, para ver se você realmente está apto a seguir”. Além do posicionamento político, o vídeo também remete à ancestralidade e à gratidão familiar, contando com imagens dos seus familiares ao longo da manifestação artística e com a narração do Babalorixá Paulo de Odé: “Por mais que o meu trabalho seja de cunho político, eu faço de tudo para não construir uma estética negra, simplesmente, pelo viés da dor, mas pela potência que o nosso povo tem. Me incomoda muito essa estética ainda presa a um sistema colonial, sempre da coisa da escravidão. Porque não é só isso, nós somos ricos em criatividade, em virtualidade, em poesia e em sensibilidade. Então, eu procuro sempre trazer essa delicadeza nos meus trabalhos”.

Em 2019, Juliana Jardel foi uma das selecionadas para o Programa de Aceleração e Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco, iniciativa do Fundo Baobá em parceria com Fundação Kellogg, Instituto Ibirapitanga, Fundação Ford e Open Society Foundations. Juliana reconhece que o apoio do Fundo Baobá foi importante para a manutenção do seu mestrado em Performances Culturais, além de exibir orgulhosa, pela chamada de vídeo, as suas maiores aquisições graças ao Programa Marielle Franco: “Não sei se dá pra ver a minha estante aqui, ela está lotada de livros. Eu comprei os livros que eu mais desejei na minha vida e que são importantes para minha área, graças ao apoio do Fundo Baobá”.

No dia 8 de abril, o mundo perdeu o dançarino, coreógrafo Ismael Ivo, mais uma vítima da Covid-19. Juliana Jardel, que tem uma admiração imensurável pelo coreógrafo, chegou a estudar a sua obra em dois momentos da sua vida acadêmica. Na graduação, ela estudou a obra de Ismael Ivo pela ótica da estética do trauma e no mestrado ela mergulhou na pesquisa do dançarino na perspectiva da antropofagia. Juliana lamenta, não apenas a perda de Ismael Ivo, mas a falta de reconhecimento com a sua obra ainda em vida: “Muita gente me disse que conheceu Ismael Ivo através de mim. Eu sempre colocava foto dele nas minhas redes sociais e muitas pessoas vinham me perguntar quem era aquela pessoa. Se você for nas escolas de formação em dança, você jamais vai ver uma foto do Ismael Ivo. Quantos bailarinos negros nós poderíamos ter formado, com uma simples imagem do Ismael Ivo, em uma sala de dança? Mas o racismo no Brasil tem esse poder de eliminação e eu temo que ele e a sua obra caiam no esquecimento”. Diante deste fato, Juliana reforça a importância da arte negra ser engajada: “Eu sempre me posicionei e não é possível fazer arte sem posicionamento, porque a nossa dança, o nosso corpo é um ato político e o nosso papel é cuidar do nosso povo”. Finaliza.

Orun Santana: Colocando a dança de Pernambuco no mapa do mundo

“Artista sem posição só contribui para a permanência absoluta do racismo estrutural e de seus agentes.” A fala forte é do bailarino, capoeirista, professor e pesquisador da dança e cultura afro Orun Santana, 30 anos, do Recife (Pernambuco). Ele vem se tornando uma das referências da dança no país. Em 2019, seu espetáculo Meia Noite, depois de passar por importantes palcos de Pernambuco, São Paulo e Belo Horizonte,  foi parar no outro lado do mundo. Meia Noite foi visto no 22o Festival Lusofonia, em Macau, na costa sul da China, e na 11a Semana Cultural da China dos Países de Língua Portuguesa. 

O espetáculo Meia Noite mostra a relação entre Orun Santana e o mestre Meia Noite, fundador, juntamente com sua esposa,  a também bailarina Vilma Carijós, do Centro de Educação e Cultura Daruê Malungo. Meia Noite e Vilma são os pais de Orun. “Nasci dentro de uma família de artistas. Tive o privilégio de crescer em contato direto com a cultura popular, envolvido com os movimentos socioculturais desenvolvidos e vivenciados junto a meus pais. Não me enxergo vivendo uma vida longe da arte e da dança. A arte sempre fez e continuará fazendo parte de quem sou”, afirma.

Orun Santana, bailarino, capoeirista, professor e pesquisador da dança e cultura afro

Orun Santana não se vê criando espetáculos de dança que não reflitam a realidade do povo preto no Brasil. “Minha prática artística está ancorada nas danças negras, deste corpo que fala e se move dentro de uma construção simbólica e imaginativa dentro de nossa construção de negritude. Em meu segmento,  o corpo negro que consegue e acessa espaços da cena já torna-se político. Justamente pela ausência de nós, negros, ocupando espaços e lugares. Partindo daí,  sigo elaborando discursos e poéticas na dança”, diz. 

Como artista negro engajado, os fatos do cotidiano que acontecem no Brasil influenciam diretamente na criação de Orun. “Faz parte de meu trabalho solo, a lembrança da morte do mestre baiano Moa do Katendê, assim como da negritude morta pela polícia nas periferias. As cenas dialogam demais com os acontecimentos recentes (espancamento e morte de João Alfredo, massacre no morro do Jacarezinho, entre outros). Esses fatos mexeram e mexem muito comigo, primeiro como homem negro; depois  em minhas ações e práticas educativas e artísticas”, afirma. 

O bailarino brasileiro, já reconhecido no exterior, está cuidando de algo importante para quem já domina a prática: a formação acadêmica: .”Minha principal formação foi pelo Daruê Malungo. Pelos mestres Vilma Carijós e Meia Noite. Também estou cursando Licenciatura em Dança pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)”. Suas principais influências, além dos pais, são Germaine Acogny (bailarina e coreógrafa do Senegal), Rui Moreira (bailarino e coreógrafo brasileiro, com atuações no Cisne Negro, Grupo Corpo e São Paulo Cia de Dança), Mercedes Baptista (primeira negra a ser bailarina clássica no Brasil), Mestre Martelo (artista de sabedoria popular que junta histórias, cantigas, cordéis e dança em suas apresentações),  Alvin Ailey (coreógrafo e ativista norte-americano que fundou o Alvin Ailey American Dance Theater), Zebrinha (mestre capoeirista) e demais amigos e parceiros da dança que tanto contribuem dançando junto comigo.

Samuel Santos: Do palco do futebol para o palco do teatro

Futebol e teatro. Em comum entre essas duas formas de arte a palavra atuação. A vida do pernambucano Samuel Santos, 50 anos, caminhava nos anos 1980 para uma carreira no futebol. Mas a dura realidade brasileira deu um chute no sonho. A luta pela sobrevivência gritou mais alto. Era necessário ajudar a família a pôr comida dentro de casa. Um momento de arrebatamento, ocorrido tempos depois, o colocou em contato com outra arte, que definiu uma vida.

Samuel vinha se destacando nas equipes de categoria de base do Santa Cruz Futebol Clube, o Santinha, que revelou nomes como o também pernambucano Rivaldo, campeão do mundo com a Seleção Brasileira em 2002, no Japão. Mas o sonho do jovem centroavante ficou pelo caminho. “Aos dezessete anos sai do Santa e abandonei o sonho de ser jogador. Não por falta de talento, mas por necessidade de sobrevivência. Tinha que trabalhar e ganhar dinheiro para o sustento da família”, diz. 

A arte entrou de forma definitiva na vida de Samuel Santos durante as festas juninas, uma das principais manifestações culturais do país, tão marcante nos estados do nordeste. “Em 1989, num ensaio de quadrilha junina, fui convidado para fazer parte de um grupo de teatro na comunidade do Alto José Bonifácio, bairro do Recife. Entrei em contato com o teatro de forma empírica (por observação e experiência, sem metodologia) e formei o Grupo Teatral Pé no Chão”, afirma Samuel. 

Samuel Santos, ator e fundador do Grupo Teatral Pé no Chão

O autodidatismo fez com que o conhecimento de Samuel Santos pela arte da representação fosse crescendo. “Não tenho curso superior, não sou acadêmico. Sou autodidata. Tenho 32 anos de teatro e já fiz cursos e oficinas com principais nomes do teatro brasileiro e internacional, como Antunes Filho (um dos principais diretores teatrais brasileiros, morto em 2019), Eugenio Barba (italiano, diretor de teatro e cinema, criador do ISTA – International School of Theatre Anthropology), Julia Varley (atriz e dramaturga), Linna de La Roca (atriz), Roberta Carreri (atriz), entre outros”. 

A formação de uma consciência social em suas plateias sempre esteve presente no trabalho de Silva, desde o grupo Pé No Chão. “Como primeiro trabalho,  o Grupo montou a peça Calendário Tradicional, de Zezo de Oliveira. O grupo tinha como objetivo discutir as questões sociais na comunidade e lá desenvolver um rico trabalho de conscientização sobre as problemáticas do bairro”, salienta. 

Da experiência de conscientização da gente do bairro para a abordagem das questões sociorraciais no Brasil não levou muito tempo. Para ele, artistas negros e negras devem estar engajados na luta por equidade. “Se o desejo do artista for pela mudança das estruturas, sim. Mas sabemos que a saúde mental do povo negro vem sendo bombardeada desde a sua captura e sequestro da África, passando pelos navios e chegada no Brasil. Então,  é todo um processo histórico para entender e se entender”, afirma. 

O entendimento desse processo histórico e o entendimento sobre o que se passa é uma longa jornada.” Tudo é um processo de construção e desconstrução para depois a gente ter uma base e uma consciência preta. As nossas referências negras foram e são invisibilizadas no processo de nossa formação. Isso é histórico e cruel. As nossas escolas, universidades e  espetáculos não trazem essas bases negras. Somos colonizados dentro de uma formação de branquitude e eurocentrismo. As novelas, a literatura, o cinema, as expressões artísticas como um tudo. Tudo nos leva apenas a um único olhar: o do colonizador.  Sabe quando a gente é criança e nossos pais dizem que Papai Noel existe? Que ele vai trazer no Natal um presente e para ganhar esse presente temos que nos comportar? Ao descobrir que esse Papai Noel não existe, ficamos com raiva de ter sido enganados por muito tempo. Pronto! É assim!”, afirma. 

O ativismo preto está presente em suas criações ou colaborações em eventos como o Festival Luz Negra: O Negro em Estado de Representação, que evidencia o protagonismo de artistas negros nas artes cênicas; o Pretação, mostra de teatro de mulheres pretas; as Terças Pretas, sequência de lives teatrais e a Escola de Antropologia Teatral, onde alunos, alunas, alunes têm contato com expressões culturais negras de Pernambuco, além de desenvolverem exercícios ancestrais de dança baseados nos movimentos dos orixás. 

Samuel Santos, mesmo fora do futebol, continua marcando seus gols. ”Quando você percebe que o teatro é um instrumento, uma arma poderosa, e que nele, o teatro, e que nela, a arte, podemos construir uma vida melhor para quem faz e para quem assiste, não tem preço”, define. 

Adeus, Januário Garcia

Todos os integrantes e as integrantes dos órgãos de governança do Fundo Baobá para Equidade Racial – Assembleia Geral, Conselho Deliberativo, Conselho Fiscal, Comitê de Investimento e Equipe Executiva – manifestam seu pesar pelo falecimento do fotógrafo Januário Garcia.

Januário Garcia foi o principal artífice e fiel depositário de grande parte da memória do movimento negro no Brasil nos últimos 50 anos. Foi presidente do Instituto de Pesquisas das Culturas Negras (IPCN) e lançou livros acerca da cultura afro-brasileira, como “25 Anos do Movimento Negro no Brasil”, “Diásporas Africanas na América do Sul” e “História dos Quilombos do Estado do Rio de Janeiro”.

“Minha história se mistura com a história”, gostava de dizer Januário Garcia, cuja história também se misturou à história da música brasileira: foi ele que registrou as imagens que ilustram algumas das principais capas dos discos de inúmeros artistas, como Leci Brandão, Roberto Ribeiro, Chico Buarque e a famosa capa de Anunciação de Belchior.

A sua obra (artística, histórica, social e política) inspirou e continuará a inspirar as pessoas que tiveram o privilégio de conhecê-lo. Com certeza, também inspira aqueles que o sucederem.

Expressamos nossas condolências à família de Januário Garcia, assim como aos companheiros e companheiras que com ele estiveram em várias jornadas.

“Na minha geração ninguém vai poder falar que o negro não tem memória, eu vou fazer essa memória”
(Januário Garcia)

Precisamos falar sobre homem negro e o mercado formal de trabalho

No país no qual a população negra é a maioria, representando 56,1%, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), quando o assunto é mercado de trabalho e espaço de tomadas de decisões a situação é bem diferente. 

O estudo Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil, do IBGE, feito em 2018, mostra que as pessoas negras representavam 64,2% da população que não tinha emprego no país. Aos que integraram o mercado de trabalho, boa boa parcela atua na informalidade: 47,3% das pessoas negras têm trabalhos informais, enquanto o percentual de pessoas brancas é de 34,6%.

O mesmo estudo mostrou que pessoas negras no mercado formal de trabalho eram maioria, sendo um total de 57,7 milhões, enquanto o número de brancos era 46,1 milhões, refletindo a composição padrão da população brasileira. Porém, esses números se invertem quando entram na equação dados sobre o ensino superior e cargos de chefia. Dados apresentados pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), em 2017, mostra que a população negra correspondia a 32% das pessoas com ensino superior completo. Mas quando o recorte era a população com 25 anos ou mais, apenas 9,3% dos negros tinham ensino superior completo, enquanto na população branca havia chegado a 22,9%.

Aos negros que conseguiram se formar no ensino superior, enfrentam o desafio de não exercer a sua profissão no mercado formal de trabalho. Um estudo realizado pelo Instituto IDados, com base em dados da Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios (PNAD Contínua) do IBGE, no primeiro trimestre de 2020, mostra que 35% dos negros com ensino superior trabalham em cargos que dispensam diploma, ou seja em cargos de nível médio ou fundamental. O percentual é superior ao de pessoas brancas que têm formação de nível superior em cargos com menor exigência educacional, que somam  28,5%. 

Sobre cargos de chefia, uma pesquisa do Instituto Ethos mostrou que os negros ocupam apenas 4,9% das cadeiras nos Conselhos de Administração das 500 empresas de maior faturamento do Brasil. Entre os quadros executivos, representam 4,7%, enquanto na gerência, apenas 6,3% dos trabalhadores são negros. 

Para falar sobre a presença do negro no mercado formal de trabalho, sobretudo do homem negro, o Fundo Baobá conversou com três profissionais de diferentes áreas, que contaram a sua trajetória profissional e a forma como tem atuado para abrir caminhos para mais pessoas negras no mercado de trabalho.

Para o empresário e contador Carlos Norberto Ribeiro, ser um homem negro foi um desafio em sua carreira profissional: “Aquela velha história: sempre com a qualificação superior comparada à de um colega não negro, no entanto com mesma remuneração e sendo preterido nas promoções e nos postos de liderança”. Hoje, aos 43 anos de idade, Carlos Ribeiro, além de ter MBA em Finanças e Auditoria, é proprietário da Pappo Consultoria, que atua diretamente com consultoria financeira, contabilidade estratégica, planejamento tributário e societário, além de atuar na área de recursos humanos, com recrutamento e seleção, treinamento e desenvolvimento, coaching e consultoria em diversidade: “A Pappo Consultoria surgiu da ideia de que poderíamos prestar um serviço de qualidade para pequenos empreendedores, sobretudo afro empreendedores, com a mesma qualidade e resultados alcançados nas grandes empresas para as quais eu, atuando na área financeira/contábil/tributária, e minha sócia – e esposa – Érika Damasceno, que atua na área de RH, treinamento e desenvolvimento, trabalhamos, trazendo melhorias nos processos, economizando milhões em créditos tributários e tornando as equipes mais produtivas, com sustentabilidade e humanidade”.

Carlos Ribeiro ao lado da esposa e sócia Érika Damasceno, proprietários e diretores da Pappo Consultoria

Com 40 anos de idade e com formação em administração, Gilvan Bueno atua hoje  como especialista em finanças, gerente educacional da Órama e compõe a estrutura de governança do Fundo Baobá, como membro do comitê de investimentos. Sendo um homem negro, ao retratar os desafios encontrados em sua carreira profissional, ele afirma que eles podem ser divididos em três variáveis: renda, tempo e espaço. Segundo o administrador, estudos mostram que quanto menos conhecimento intelectual e educacional você tem, menos renda você terá. E, com isso, você perde a capacidade de competir por melhores oportunidades financeiras e alocação no mercado: “Na minha vida, eu consegui enxergar isso cedo pela criação da minha mãe e avô, assim minha caminhada profissional ficou pautada em competir com pessoas de melhores soft skills (habilidades comportamentais) e renda. O fator raça trouxe um olhar atento dos meus gestores em construir um ambiente em que todos respeitassem meu trabalho”.

Falando no fator tempo, para Gilvan Bueno é importante fazer um recorte temporal. Se estamos falando no século XXI, ele acredita que houve avanços na discussão, mesmo que pequenos. “Podemos trazer conceitos importantes, como ESG (Governança, Social e Ambiental), que mostra a relevância de ter diversidade e maior responsabilidade social. Estes critérios têm sido importantes para negros, mulheres, indígenas e pessoas com diferentes orientações sexuais”, diz o especialista em finanças, que também reconhece que o século XX foi importante para presenciamos os grandes debates sobre racismo nas instituições, a falta de diálogo e a restrição dos direitos e oportunidades em diversos campos produtivos da formação de capital privado e público: “Não quero dizer que hoje é muito melhor, mas as instituições privadas estão preocupadas com isso e querem aumentar seu comprometimento social e ambiental. O desenvolvimento da caminhada profissional está dentro da construção do século XXI, os desafios aconteceram, mas sempre fui respeitado nas instituições que trabalhei pelos meus resultados. A regra sempre esteve bem definida”.

Gilvan Bueno, administrador, especialista em finanças, gerente educacional da Órama e membro do comitê de investimentos do Fundo Baobá

Ao falar de espaço, Gilvan diz que é preciso reconhecer em qual espaço o percurso para a profissionalização é mais árduo: “Em ambientes com alta competitividade, os desafios são maiores e é necessário ter um bom conteúdo educacional e ser automotivado para persistir e vencer. Quando olhamos para espaços com pouco desenvolvimento humano, temos uma grande perda intelectual, social e econômica. E a população negra está em muitos destes locais e acaba sendo atingida e fica distante de aumentar sua renda para acessar outros espaços”, afirma Gilvan, que também acredita que o acesso a educação está atrelado ao crescimento profissional: “Alguns conceitos da educação empreendedora das escolas públicas e de cursos de extensão me ajudaram na caminhada profissional e a minha história é um misto dessas duas situações: quando aumentei meu nível educacional,  consegui novos espaços para me desenvolver, o que acelerou o meu crescimento profissional”, completa.

Sendo o mais jovem entre os três, com apenas 27 anos de idade, o jornalista Ruam Oliveira é fruto desse mercado de trabalho do século XXI, atento às diversidades: “Durante minha trajetória profissional tive o privilégio de estar envolvido com organizações e instituições que trabalham em favor da diversidade”, destaca. Mas reconhece que ser um homem negro também impôs desafios em sua jornada profissional: “Acho que senti isso muito mais na faculdade e na busca por estágios, por exemplo. Isso misturado ao fato de ser alguém da periferia pode ter tido um peso maior. De alguma forma aprofundou a minha percepção a respeito das dificuldades encontradas. Vejo também que o racismo atravessa todas as esferas da nossa vida e, somente há pouco tempo, venho fazendo as conexões necessárias sobre as respostas negativas que já tive”.

Ruam Oliveira, jornalista e idealizador do Banco de Talentos Negros

Além de atuar como repórter na área de educação, hoje Ruam está à frente do projeto Banco de Talentos Negros, criado em 2019, ao lado da jornalista Beatriz Sanz e da publicitária Angel Pinheiro. Trata-se de uma iniciativa que auxilia profissionais da área da comunicação a ingressarem no mercado de trabalho: “O Banco de Talentos Negros surgiu de alguns esforços isolados da Angel e da Beatriz inicialmente. Elas tinham planilhas com alguns contatos para indicação em jornalismo e publicidade. Quando a Beatriz me contou do projeto, decidimos juntos criar um drive, organizar em pastas, separar por estados e áreas e assim começamos. Focamos na comunicação por ser nossa área de atuação. As empresas começaram a nos procurar pedindo indicações e sugerindo vagas. Hoje conseguimos cadastrar mais de 400 profissionais espalhados por todo o Brasil e contamos com uma gama grande de instituições que nos procuram solicitando acesso ao Banco”.

O fato de Carlos, Gilvan e Ruam serem três homens negros com curso superior completo, atuando dentro da área na qual se especializaram e estando presentes em espaços de tomadas de decisões, é algo a ser celebrado, mas revela um imenso caminho a ser percorrido. As dificuldades de acesso ao ensino superior, de certo modo ajuda a entender essa falta de pessoas negras em cargos administrativos. Uma pesquisa do IBGE, realizada no ano de 2018, mostrou que um terço dos brasileiros entre 19 e 24 anos não havia conseguido concluir o ensino médio naquele ano. Entre os que não conluíram esta etapa, 44,2% são homens jovens negros. Para Gilvan Bueno, este alto número de evasão escolar está atrelado à questão profissional: “Os homens acabam desistindo de concluir o ensino médio e não almejam o nível superior porque acreditam que é mais oportuno ganhar recursos no curto prazo ou, em muitos outros casos, precisam sustentar sua família”. 

Ações afirmativas para ingresso do negro no ensino superior, como cotas raciais e programas como o ProUni (Universidade para Todos), geraram aumento de pessoas negras nas universidades. Se em 2015, o IBGE registrou 1,7 milhão de homens negros no ensino superior, em 2020 esse número chegou a 2,7 milhões – um aumento de 59%. Mesmo assim, o número de homens negros no ensino superior ainda é inferior comparado ao número de mulheres negras (4 milhões), homens brancos (5,4 milhões) e mulheres brancas (6,8 milhões).

Sobre a ausência do homem negro na universidade, o que também ocasiona na sua ausência no mercado de trabalho qualificado, Gilvan Bueno acredita que é uma questão bem mais ampla: “Envolve melhor distribuição de renda, melhora do índice de desenvolvimento humano e criação de cursos profissionalizantes de curto prazo para criar um aumento de renda nas famílias e permitir que tanto homens quanto mulheres possam se dedicar de maneira integral aos estudos”.

Para Carlos Ribeiro, o aumento da presença de mulheres negras nas universidades é em razão do empoderamento feminino e o feito deve ser celebrado: “Pelo fato das mulheres negras serem as grandes mantenedores do lar, da família, do sustento, trazendo unidade, mesmo enfrentando o abandono, a violência doméstica, creio que por conta disto tudo, a mulher se potencializou, se empoderou, se esforçou mais, e o resultado é que a mulher negra acaba almejando mais, e isto responde porque a mulher negra ocupa uma posição em muito casos, superior a do homem negro”. Entretanto, ele acredita que isto não venha de alguma forma minar a posição do homem negro: “Obviamente há outros fatores que acabam por contribuir com esta estatística, e um deles, pode se explicar pelo genocídio da população negra, que é maior em homens negros”.

Ruam Oliveira também vê com bons olhos essa alta procura por mulheres negras em posições de poder e com chances de empregabilidade: “É preciso levar em consideração que, se observarmos o espectro de desigualdade social, a mulher negra ficou por anos em um patamar inferior ao homem negro. Além de sofrer as dificuldades e impactos do racismo, ainda carrega nos ombros as dificuldades do machismo e do sistema patriarcal. É uma questão desse campo estrutural que tanto se fala. A escala é: homem branco – mulher branca – homem preto e mulher preta”. A fala de Ruam Oliveira faz relação com um estudo realizado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), no ano de 2017, que mostrou que a média de salário do homem branco é R$ 2.507; a da mulher branca, R$ 1.810; a do homem negro, R$ 1.458; e a da mulher negra, R$ 1.071. “Não se trata de uma contraposição homem negro x mulher negra, mas apenas uma constatação de que, no jogo de poderes, já está na hora de as mulheres ascenderem também”, completa Ruam.

Ainda sobre o assunto, Carlos Ribeiro acredita que mesmo que haja políticas públicas a favor do homem negro, é necessário ter consciência de classe: “Eu acredito que se existir, por parte do homem negro, o sentido de unidade negra e o sentido de valorização da mulher negra, com ele se espelhando nela e a apoiando, isto fará com que este homem negro se empodere mais e, desta forma, eu creio que esta distancia será diminuída. Precisamos deixar de reproduzir o modelo europeu e machista, para reconhecer na mulher negra a grande força e influência que esta exerce, e muitas vezes é negada”.

Olhando para suas áreas de atuação, Ruam Oliveira, disse que a participação de homens negros no jornalismo ainda é pequena, mas tem aumentado: “Tem homens negros, sim, mas em menor escala. A minha área, cobrindo educação, já é bem restrita, com um número muito pequeno de repórteres e instituições se comparados a outras editorias”. Já Gilvan Bueno, que atua no mercado financeiro, chega a citar nomes de grandes referências negras na área, mas reconhece que conhece todos pelo nome, logo, são poucos: “Existem grandes nomes como Marcus Macedo, Ian Lima, Oscar Decotelli, entre outros. Contudo, acredito que precisamos trazer mais participantes para o mercado financeiro”. Carlos Ribeiro também reforça a ausência de homens negros na área de consultoria empresarial: “Há participação sim, mas em número infinitamente menor que homens brancos, e na maioria dos casos, sem ocupar posição de liderança”.

Questionados sobre qual o papel de cada um deles no apoio a outros homens negros no mercado formal de trabalho, Carlos Ribeiro faz questão de apresentar o trabalho realizado pela Pappo Consultoria na promoção da equidade racial no meio profissional: “Nas contratações da Pappo, damos preferência a afro descendentes; consumimos serviços e produtos de homens e mulheres negras, privilegiamos a qualificação profissional dos nossos colaboradores e colaborados; o investimento em formação técnica dentro da área de atuação na empresa”. Gilvan Bueno segue a mesma linha e reforça que as suas contribuições são tanto para homens negros quanto mulheres negras, pois os dois são diretamente atingidos pelos desafios de conquistar espaços que permitam aumento de renda e mobilidade social: “Posso destacar minha participação no programa de igualdade social no mercado financeiro realizado pela Infi-Febraban e Instituto Ser Mais. Conseguimos formar muitos talentos que hoje estão pelo Brasil em instituições financeiras. Temos também o programa de formação da edtech que sou sócio: Financier, que está levando muitos talentos para o mercado de trabalho”. Para Ruam Oliveira, que comanda o Banco de Talentos Negros de forma voluntária, ele acredita que a sua participação nesse espectro vai ainda mais além: “Eu sigo conversando e permanecendo aberto para conversas sobre o assunto. Me colocando à disposição de jovens pretos que buscam por uma oportunidade de emprego. Sigo atento para as muitas possibilidades que dão prioridade para essa tarefa difícil, porém necessária, de equilibrar a balança. O BTN é só uma das coisas que fazemos. Acho que o principal é ter uma postura de abertura para pensar, refletir e reforçar a necessidade de que aconteçam efetivamente processos justos, assertivos e que enxerguem a competência pouco explorada dos profissionais pretos na comunicação brasileira”, finaliza.

Fundo Baobá na imprensa em maio

No dia 5 de maio, o Fundo Baobá para Equidade Racial lançou o edital “Vidas Negras: Dignidade e Justiça”. Com o apoio do Google.org, braço filantrópico do Google, a iniciativa irá apoiar organizações negras que atuam no enfrentamento à violência racial sistêmica e incorreções que ocorrem dentro do sistema de Justiça Criminal no Brasil.

Vidas Negras: Dignidade e Justiça, foi destaque na grande mídia, sendo noticiado nos principais portais de notícias do país, como O Globo, Estadão e Folha de São Paulo, este último, contando com uma entrevista da diretora-executiva do Fundo Baobá, Selma Moreira, falando da trajetória da organização, dos editais realizados, dos parceiros financiadores e da importância do apoio do Google para abrir portas para outros investimentos: “No Brasil, geralmente quem tem fundo é uma família milionária. O nosso desafio é fazer uma construção de patrimônio para o investimento na causa racial, captar recursos para uma pauta que no Brasil as pessoas pouco gostam de falar”.

Outros portais de notícias como Yahoo, Valor Econômico, Época Negócios, Correio Braziliense, Impacta Nordeste e Capital Econômico, também noticiaram o edital Vidas Negras, assim como sites de filantropia, organizações de investimentos e empresas do terceiro setor, como Expert XP, Filantropia, Busca Voluntária, ABPN, Tudo do Bem e Observatório do Terceiro Setor.

Tratando de mídias negras, o edital Vidas Negras: Dignidade e Justiça foi destaque no Movimento Ar, Mundo Negro, Notícia Preta e no Portal Geledés, que além de divulgar a iniciativa, compartilhou na íntegra a entrevista dada pelo presidente do conselho deliberativo do Fundo Baobá, Giovanni Harvey, para o site da organização, no qual ele cita a importância da realização deste edital: “Isso é importante porque é um tema que normalmente precisaria de investimento social privado. O Baobá conseguiu construir uma parceria com a Google.org no sentido de atender a uma demanda super nítida, que trata de um tema tão emergente. Um tema para o qual a filantropia brasileira, o investimento social privado no Brasil,  ainda não dá relevância. Portanto, é importante que o braço filantrópico de uma empresa como a Google se alinhe ao Baobá no sentido de sinalizar para a sociedade a relevância do enfrentamento desse tema para promover equidade racial”.

Além do edital, o Fundo Baobá também gerou alcance na mídia com dois textos de autoria de Fernanda Lopes, diretora de programa da organização. O primeiro, escrito em parceria com Lúcia Xavier, membro do GT Racismo e Saúde da Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva) e coordenadora da Ong Criola, foi publicado no site da revista Carta Capital e compartilhado posteriormente no site da Associação, dado que Fernanda Lopes é membro de um dos grupos temáticos da mesma: GT Racismo e Saúde. O artigo 133 anos após a Abolição, negros ainda lutam por direitos, publicado no dia 13 de maio, conhecido como o Dia da Abolição da Escravatura, traça um paralelo entra a abolição inconclusa, ocorrida em 1888 e os desafios enfrentados pela população negra nos tempos atuais, como a pandemia da covid-19:

“Após 133 anos da tal Abolição, ‘assinada’ no dia 13 de maio, negros, negras e negres permanecem lutando pelo direito à vida, à liberdade, pela chance de respirar. No Brasil, onde mais de 428 mil vidas foram ceifadas por conta da covid-19, são muitas as evidências de que os efeitos da pandemia são desiguais, de acordo com a escolaridade, ocupação, renda, gênero, raça, etnia e território dos sujeitos. Sem ações governamentais eficientes e com a falta de consciência individual e coletiva, as assimetrias sociais e as violações de direitos foram ainda mais agravadas. E, infelizmente, dados mostram que a população negra tem sido mais afetada durante a pandemia.”

O segundo artigo de autoria de Fernanda Lopes foi publicado no site da Rede de Filantropia para Justiça Social. O texto Semeando os valores da filantropia negra: a pandemia e as ações do Fundo Baobá, fala da atuação e das iniciativas da organização no enfrentamento à covid-19, através do edital Doações Emergenciais de Combate ao Coronavírus:

“Uma das nossas preocupações era contribuir, de alguma forma, para “quebrar” a cadeia de transmissão do vírus e assim evitar novas infecções, por isso a tempestividade no lançamento do edital; o compromisso com a desburocratização do processo; a sistematização e análise de informações disponibilizadas pelos donatários nos relatórios e estudo de caso fosse para subsidiar decisões futuras e ajustes na resposta institucional à pandemia ou produzir e compartilhar conhecimentos com membros da Rede de Filantropia para Justiça Social e outros atores.” 

Ao lado de outras organizações incríveis e inspiradoras, o Fundo Baobá é membro da “Rede de Filantropia para a Justiça Social”, um espaço que reúne fundos e fundações comunitárias, organizações doadoras (grantmakers) que apoiam diversas iniciativas nas áreas de justiça social, direitos humanos e cidadania.

Enquanto isso, o artigo de autoria de Alexandre Gonçalves e Paula Fabiani, respectivamente analista de comunicação e CEO do IDIS (Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social) publicado na Folha de São Paulo e replicado no site do instituto, traz uma fala de Selma Moreira. O texto Por que ter diversidade e inclusão no terceiro setor? Fala da obrigatoriedade de abordar a diversidade dentro de organizações, promovendo o acolhimento e valorização de todos os gêneros, orientações sexuais e raças. A diretora-executiva do Fundo Baobá é citada no artigo quando a sua fala reflete o dever das organizações sociais ter um espaço de trabalho diverso e inclusivo para catalisar o ideal de mundo pelo qual elas defendem: “Nós do terceiro setor não podemos deixar a população negra, que sofreu tanto, de fora”.

 

Apoiadas do Fundo Baobá/Negras que Movem

No campo das apoiadas, tivemos o artigo O fundo do poço não é pra mim, nem pra você! de autoria da publicitária e uma das lideranças apoiadas do Programa de Aceleração e Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco, Luciane Reis, publicado no Portal Soteropreta.

A coluna Negras que Movem, do Portal Geledés, publicou, no mês de maio, seis textos de autoria de mulheres também apoiadas pelo Programa Marielle Franco: Black Lives Matter, epistemicídio e o que nós da psicologia temos a ver com isso?, de autoria da mestre em Psicologia Social, coordenadora da Rede de Atenção às Pessoas em Situação de Violência Doméstica e Sexual de Suzano (SP) e ganhadora do Prêmio Viva, promovido na parceria entre o Instituto Avon e a Revista Marie Claire, Magna Barboza Damaceno. Do afeto potente, da luta e da ancestralidade, nasce a Enegrecida, escrito pela pós-graduanda em História e Cultura Afro-brasileira e diretora e idealizadora da Enegrecida, Carolina Brito. A proteção integral de crianças e adolescentes inclui as crianças e adolescentes da favela do Jacarezinho?, de autoria da advogada, pesquisadora e realizadora do projeto “Sonhe Alto Pretinha”, Mayara Silva de Souza. Assistentes sociais e as vítimas de trabalho escravo: algumas das mulheres negras na visão social do trabalho, escrito pela assistente social e especialista em gestão pública, Brígida Rocha dos Santos. Reconexão ancestral, escrito em parceria pela psicóloga doutoranda e mestre em Psicologia, gestora de Políticas Públicas de juventude, Gênero e Raça e integrante da atual gestão do Conselho Regional de Psicologia de Minas Gerais (CRP-MG), Larissa Amorim Borges, com a graduanda em Ciências Aeronáuticas, pilota em formação, comissária de voo gestora da página @voe_como_uma_garota_negra, membro do Comitê de Tripulantes negros do SNA e cofundadora do Quilombo Aéreo, Laiara Amorim Borges, ao lado da bacharel em Direito, coach de desenvolvimento pessoal afrocentrado, defensora popular, coordenadora cultural e de eventos e integrante do coletivo Juventude de Terreiro Cenarab (MG), Lorena Amorim Borges, que por sua vez, escreveu o artigo Inovações sociais na pandemia: as contribuições das organizações negras, ao lado da supracitada Mayara Silva de Souza e  da mestre em desenvolvimento econômico, especialista em planejamento e orçamento e servidora de carreira de planejamento e orçamento federal, Clara Marinho Pereira. 

Edital Vidas Negras

05/05/2021 – Google Blog – Apoio à luta contra o racismo e a desigualdade racial:
https://brasil.googleblog.com/2021/05/apoio-luta-contra-o-racismo-fundo-baoba.html 

05/05/2021 – Folha de São Paulo – Google e Fundo Baobá vão apoiar dez ONGs negras com R$ 1 milhão:
https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2021/05/google-e-fundo-baoba-vao-apoiar-dez-ongs-negras-com-r-1-milhao.shtml 

05/05/2021 – O Globo – Google vai destinar R$ 1 milhão para investir em projetos contra violência racial:
https://oglobo.globo.com/economia/google-vai-destinar-1-milhao-para-investir-em-projetos-contra-violencia-racial-25004705

05/05/2021 – Estadão – Google e Fundo Baobá lançam edital para apoiar com R$ 1 milhão organizações que se dedicam à equidade racial:
https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/google-e-fundo-baoba-lancam-edital-para-apoiar-com-r-1-milhao-organizacoes-que-se-dedicam-a-equidade-racial/ 

05/05/2021 – Yahoo – Google vai destinar R$ 1 milhão para investir em projetos contra violência racial:
https://br.noticias.yahoo.com/google-vai-destinar-r-1-195816952.html 

05/05/2021 – Valor Econômico – Google e Fundo Baobá vão apoiar dez ONGs negras com R$ 1 milhão:
https://valor.globo.com/empresas/noticia/2021/05/05/google-e-fundo-baob-vo-apoiar-dez-ongs-negras-com-r-1-milho.ghtml 

05/05/2021 – Capital Econômico – Google e Fundo Baobá vão apoiar com R$1 milhão ONGs com foco em equidade racial e justiça:
https://revistacapitaleconomico.com.br/google-e-fundo-baoba-vao-apoiar-com-r1-milhao-ongs-com-foco-em-equidade-racial-e-justica/ 

05/05/2021 – Portal Geledés – Google e Fundo Baobá vão apoiar com R$ 1 milhão ONGs com foco em equidade racial e justiça:
https://www.geledes.org.br/google-e-fundo-baoba-vao-apoiar-com-r-1-milhao-ongs-com-foco-em-equidade-racial-e-justica/

05/05/2021 – Mundo Negro – Google e Fundo Baobá vão apoiar ONGs com foco em equidade racial e justiça com R$ 1 milhão:
https://mundonegro.inf.br/google-e-fundo-baoba-vao-apoiar-ongs-com-foco-em-equidade-racial-e-justica-com-r1-milhao/

05/05/2021 – Movimento AR – Google e Fundo Baobá vão apoiar dez ONGs negras com R$ 1 milhão:
http://movimentoar.com.br/google-e-fundo-baoba-vao-apoiar-dez-ongs-negras-com-r-1-milhao/  

05/05/2021 – A Cidade On – Google e Fundo Baobá vão apoiar dez ONGs negras com R$ 1 milhão:
https://www.acidadeon.com/economia/NOT,0,0,1611656,Google-e-Fundo-Baoba-vao-apoiar-dez-ONGs-negras-com-R-1-milhao.aspx 

05/05/2021 – Expert XP – Café com ESG: Conteúdos diários que transformam | 05/05:
https://conteudos.xpi.com.br/esg/cafe-com-esg-conteudos-diarios-que-transformam-05-05/

05/05/2021 – DL News – Google e Fundo Baobá vão apoiar dez ONGs negras com R$ 1 milhão:
https://riopreto.dlnews.com.br/noticias?id=63134/google-e-fundo-baoba-vao-apoiar-dez-ongs-negras-com-r$-1-milhao

05/05/2021 – ND Mais – Google e Fundo Baobá vão doar R$ 1 milhão para entidades negras:
https://ndmais.com.br/saude/bem-estar/google-e-fundo-baoba-vao-doar-r-1-milhao-para-entidades-negras/

05/05/2021 – Época Negócios – Google vai destinar R$ 1 milhão para investir em projetos contra violência racial:
https://epocanegocios.globo.com/Empresa/noticia/2021/05/google-vai-destinar-r-1-milhao-para-investir-em-projetos-contra-violencia-racial.html 

06/05/2021 – Notícia Preta – Google e Fundo Baobá irão apoiar ONGs com projetos de Justiça Racial:
https://noticiapreta.com.br/google-e-fundo-baoba-irao-apoiar-ongs-com-projetos-de-justica-racial/ 

06/05/2021 – Ceará Criolo – Edital destina R$ 1 milhão a ongs de equidade racial:
https://cearacriolo.com.br/edital-destina-r-1-milhao-a-ongs-com-foco-em-equidade-racial/

06/05/2021 – Filantropia – Google e Fundo Baobá lançam edital Vidas Negras para buscar equidade racial:
https://www.filantropia.ong/informacao/google-e-fundo-baoba-lancam-edital-vidas-negras-para-buscar-equidade-racial

06/05/2021 – Busca Voluntária – Google e Fundo Baobá vão doar R$ 1 milhão para entidades negras:
https://noticias.buscavoluntaria.com.br/entidades-negras/   

07/05/2021 – ABPN – O Edital Vidas Negras: Dignidade e Justiça é uma iniciativa do Fundo Baobá com o apoio do Google.org:
https://www.abpn.org.br/post/o-edital-vidas-negras-dignidade-e-justi%C3%A7a-%C3%A9-uma-iniciativa-do-fundo-baob%C3%A1-com-o-apoio-do-google-org 

10/05/2021 – Tudo do Bem – Fundo Baobá abre seleção de 10 organizações negras que serão apoiadas com R$ 100 mil:
https://tudodobem.ig.com.br/fundo-baoba-abre-selecao-de-10-organizacoes-negras-que-serao-apoiadas-com-r-100-mil/

10/05/2021 – Impacta Nordeste – Edital Vidas Negras vai fortalecer estratégias de ativismo, resistência e resiliência:
https://impactanordeste.com.br/edital-vidas-negras-vai-fortalecer-estrategias-de-ativismo-resistencia-e-resiliencia/

11/05/2021 – Google Discovery – Google e Fundo Baobá anunciam apoio de R$ 1 milhão a ONGs com foco em equidade racial e justiça:
https://googlediscovery.com/2021/05/11/google-e-fundo-baoba-anunciam-apoio-de-r-1-milhao-a-ongs-com-foco-em-equidade-racial-e-justica/ 

16/05/2021 – Correio Braziliense – Eu Estudante – Especialistas discutem o que há de escravidão nas relações do trabalho:
https://www.correiobraziliense.com.br/euestudante/trabalho-e-formacao/2021/05/4924882-especialistas-discutem-o-que-ha-de-escravidao-nas-relacoes-do-trabalho.html    

27/05/2021 – Observatório do Terceiro Setor – Edital do Fundo Baobá selecionará ONGs para apoio de R$ 1 milhão:
https://observatorio3setor.org.br/noticias/edital-do-fundo-baoba-selecionara-ongs-para-apoio-de-r-1-milhao/ 

31/05/2021 – Portal Geledés – Presidente do Conselho Deliberativo do Fundo Baobá, Giovanni Harvey analisa a importância do Edital Vidas Negras: Dignidade e Justiça, lançado no início de maio:
https://www.geledes.org.br/presidente-do-conselho-deliberativo-do-fundo-baoba-giovanni-harvey-analisa-a-importancia-do-edital-vidas-negras-dignidade-e-justica-lancado-no-inicio-de-maio/

Fundo Baobá

13/05/2021 – Abrasco – 133 anos após a Abolição, negros ainda lutam por direitos – Artigo de Fernanda Lopes e Lúcia Xavier:
https://www.abrasco.org.br/site/gtracismoesaude/2021/05/13/133-anos-apos-a-abolicao-negros-ainda-lutam-por-direitos/ 

13/05/2021 – Carta Capital – 133 anos após a Abolição, negros ainda lutam por direitos – Artigo de Fernanda Lopes e Lúcia Xavier:
https://www.cartacapital.com.br/opiniao/133-anos-apos-a-abolicao-negros-ainda-lutam-por-direitos/ 

17/05/2021 – Folha de São Paulo – Por que ter diversidade e inclusão no terceiro setor? – Artigo do Alexandre Gonçalves, analista de comunicação do IDIS, com fala da Selma Moreira:
https://www1.folha.uol.com.br/empreendedorsocial/2021/05/por-que-ter-diversidade-e-inclusao-no-terceiro-setor.shtml

19/05/2021 – Rede de Filantropia para a Justiça Social – Semeando os valores da filantropia negra: a pandemia e as ações do Fundo Baobá – Por Fernanda Lopes:
https://www.redefilantropia.org.br/post/semeando-os-valores-da-filantropia-negra 

27/05/2021 – IDIS – Por que ter diversidade e inclusão no terceiro setor? – Artigo do Alexandre Gonçalves, analista de comunicação do IDIS, com fala da Selma Moreira:
https://www.idis.org.br/por-que-ter-diversidade-e-inclusao-no-terceiro-setor/ 

 

Apoiadas do Fundo Baobá

26/05/2021 – Portal Soteropreta – O fundo do poço não é pra mim, nem pra você! – Por Luciane Reis:
https://portalsoteropreta.com.br/o-fundo-do-poco-nao-e-pra-mim-nem-pra-voce-por-luciane-reis-mulher-negra/

 

Negras que movem

01/05/2021 – Black Lives Matter, epistemicídio e o que nós da psicologia temos a ver com isso? – Por Magna Barboza Damaceno:
https://www.geledes.org.br/black-lives-matter-epistemicidio-e-o-que-nos-da-psicologia-temos-a-ver-com-isso/ 

08/05/2021 – Do afeto potente, da luta e da ancestralidade, nasce a Enegrecida – Por Carolina Brito:
https://www.geledes.org.br/do-afeto-potente-da-luta-e-da-ancestralidade-nasce-a-enegrecida/ 

10/05/2021 – A proteção integral de crianças e adolescentes inclui as crianças e adolescentes da favela do Jacarezinho? – Por Mayara Silva:
https://www.geledes.org.br/a-protecao-integral-de-criancas-e-adolescentes-inclui-as-criancas-e-adolescentes-da-favela-do-jacarezinho/ 

15/05/2021 – Assistentes sociais e as vítimas de trabalho escravo: algumas das mulheres negras na visão social do trabalho – Por Brígida Rocha dos Santos:
https://www.geledes.org.br/assistentes-sociais-e-as-vitimas-de-trabalho-escravo-algumas-das-mulheres-negras-na-visao-social-do-trabalho/ 

22/05/2021 – Reconexão ancestral – Por Larissa Amorim Borges, Lorena Amorim Borges e Laiara Amorim Borges:
https://www.geledes.org.br/reconexao-ancestral/ 

31/05/2021 – Inovações sociais na pandemia: as contribuições das organizações negras – Por Clara Marinho, Lorena Borges e Mayara Silva de Souza:
https://www.geledes.org.br/inovacoes-sociais-na-pandemia-as-contribuicoes-das-organizacoes-negras/ 

Fundo Baobá divulga lista de aprovados do edital Chamada Para Artigos

No dia 6 de agosto de 2020, o Fundo Baobá para Equidade Racial, em parceria com a Fundação Ford, lançou o edital Chamada Para Artigos – Filantropia para Promoção da Equidade Racial no Brasil no Contexto Pós-pandemia da Covid-19.

A principal premissa da iniciativa, que integra o projeto Consolidando Capacidades e Ampliando Fronteiras, realizado em parceria com a Fundação Ford, foi selecionar até 20 artigos inéditos, que contribuam para aprimorar a ação de filantropia para equidade racial no Brasil, pós-pandemia da Covid-19. Uma edição eletrônica bilíngue (português-inglês) de um livro com os artigos será publicada em 2021, ano em que o Fundo Baobá completa 10 anos de fundação.

Para figurar como primeiro(a) autor(a) do artigo, era preciso ser especialista, mestre ou doutor(a) com produção acadêmica concernentes às áreas priorizadas pelo Fundo Baobá, como educação, juventude negra, racismo religioso, violência de gênero, além de ciência e tecnologia, desenvolvimento econômico, comunicação, arte e memória, violência racial e violência contra a população LGBTQI+. 

Para a diretora executiva do Fundo Baobá para Equidade Racial, Selma Moreira, esta publicação, elaborada no contexto da pandemia, poderá trazer elementos que subsidiem nossa ação institucional: “Os números da Covid-19 não deixam dúvidas sobre quem são as principais vítimas. Ao mesmo tempo em que a pandemia explicitou as consequências do racismo que permeia as estruturas sociais do Brasil, ela também acentuou as desigualdades que marcam nosso país. Com esta chamada, quisemos entender esse cenário, que acentuou os problemas conhecidos e trouxe ainda mais desafios para a promoção da equidade racial e da justiça social.”.

Ao longo de dois meses, o edital recebeu 75 artigos de todas as cinco regiões do país. A primeira etapa da seleção contou com o apoio de um grupo de 19  doutoras e doutores, de diferentes áreas de conhecimento, que atuaram como pareceristas para realizar análise crítica dos artigos.

Entre os pareceristas estava a doutora em Ciência Social e mestre em Antropologia e escritora, Heloisa Pires: “A minha contribuição se deu como parecerista, com análise e recomendações para os artigos submetidos ao Edital de Chamadas do Fundo Baobá, principalmente, na comunicação intergeracional. É uma oportunidade para perceber interesses indicativos de demandas e as abordagens dos temas”. Segundo Heloisa a iniciativa do Fundo Baobá em publicar os artigos é importante para localizar a origem da desigualdade racial: “Publicizar uma experiência tão propositiva é fundamental. Pelo potencial de mapeamento, em particular o contexto de pandemia, situação política brasileira e, nível de reflexão dos inscritos. O material pode vir a ser inspiração para iniciativas similares que auxiliem a mapear principais questões saídas dos processos e autorias em destaque por região”.

Outro membro da equipe de seleção foi o Pró-Reitor de Políticas Afirmativas e Assuntos Estudantis (PROPAAE) da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), Carlos Alberto Santos de Paulo, que tem uma proximidade com o trabalho realizado pelo Fundo Baobá: “A relação que tenho com a organização, está intrinsecamente associada à defesa dos direitos dos segmentos mais vulneráveis da sociedade brasileira, neste sentido a interseccionalidade entre raça, gênero e desigualdades”. Sobre os artigos analisados, Carlos Alberto teve uma reação bastante satisfatória com os conteúdos abordados pelos participantes do edital: “Os textos que analisei são de vital importância por traduzir a emergência de práticas ancestrais hoje traduzidas em movimentos matrilineares de resistência, acolhimento em redes sociais nos bairros periféricos de maior vulnerabilidade social, tendo nas mulheres negras mais velhas seus elos tradicionais de manutenção da tradição e da cultura”.

“Ter participado deste processo reforça o meu compromisso de contribuir com um país em que a produção acadêmica faça sentido para os verdadeiros beneficiários”, foram as palavras da PhD em Odontologia, coordenadora de projetos, membro do GT Racismo e Saúde da Associação Brasileira de Saúde Coletiva e pesquisadora na UFRJ – Saúde bucal e Doença Falciforme em parceria com o Ministério da Saúde, Márcia Alves. “Minha relação com o trabalho do Fundo Baobá é a disseminação do conhecimento para promover a busca da Equidade e da justiça social. Ao integrar a equipe de pareceristas deste edital, avaliei o compartilhamento de práticas, saberes e vivências e experiências, inclusive no campo científico de temas e abordagens que respondem às demandas das populações”. Acerca dos textos aprovados por ela, Marcia é bem enfática sobre a importância desta produção: “O edital é uma possibilidade de induzir produção científica, cultural, artística e comunitária sobre temáticas relacionadas à população negra e ou as populações vulnerabilizadas, dando protagonismo  destas produções lideradas por autores negras e negros.”

Ao serem questionados se a publicação desses artigos pelo Fundo Baobá poderá contribuir para o segmento aos quais estão dirigidos, Heloisa Pires acredita que a publicação panorâmica permitirá o debate entre artigos e poderá estimular desdobramentos: “Ela contribui para o exercício de afinar argumentos, relacioná-los em ambiente que valoriza a formação com foco nas relações raciais”. Carlos Alberto afirma que a grande contribuição é registrar o resgate da solidariedade em artigos para o grande público: “Creio que o resgate e a análise dessas práticas de solidariedade tradicional verificadas pela rede sempre presente dessas mulheres negras (tias, avós e mães), que serão expressas  na publicação, poderá sinalizar outras formas de organização que se observa de forma empírica, mas quando traduzida em artigos e veiculados para o grande público dará visibilidade a antigas formas de sociabilidade que perduram até o presente momento como forma de resistência ancestral”. Já Márcia Alves acredita que a relevância do tema contribui para longevidade da publicação: “Novas perspectivas de referenciais teórico-práticos pelo reconhecimento da relevância temática quando do resultado da publicação e ao mesmo tempo, do  incentivo financeiro para que novos estudos/experiências sejam realizados ou mesmo continuados”.

Após o trabalho de seleção dos pareceristas, o Fundo Baobá chegou ao número de 19 artigos aprovados. A organização entrou em contato com os autores dos textos, checando se havia interesse em seguir no processo. Todos tiveram um prazo para fazer os ajustes recomendados pelos(as) pareceristas e devolver para uma nova análise. Caso seja necessário a realização de mais ajustes, os autores serão contatados novamente, agora com base nas recomendações da equipe da editora Ogum’s Toque, responsável pela obra.

Todos os autores aprovados, receberam a quantia de R$ 2,500.00, ofertada pelo edital e estão garantidos na publicação que será um livro eletrônico e já está em fase de produção, com o lançamento previsto para outubro, inserido no conjunto de atividades em celebração ao aniversário de 10 anos do Fundo Baobá.

Para a diretora de programa do Fundo Baobá para Equidade Racial, Fernanda Lopes, a realização deste edital foi muito importante, considerando que todos os autores e autoras apresentaram importantes recomendações para os investimentos programáticos a serem realizados pelo Fundo Baobá no pós-pandemia e que, independente da publicação, as contribuições serão levadas em consideração nos processos de tomada de decisão da organização: “A proposta é que, cada vez mais, possamos atuar em parceria com a comunidade acadêmica dado que a filantropia para equidade racial ainda é uma área pouco estudada no Brasil”.

Confira agora a lista dos 19 artigos selecionados para publicação do Fundo Baobá.

‘Já É’ tem jovens LGBTQIA+ com bolsa para curso de pré-vestibular

Jovens homossexuais e transexuais falam da importância do programa para inclusão de gênero e de sexualidade nas universidades

Por Marcos Furtado, do Perifaconnection, em parceria com o Fundo Baobá para Equidade Racial

O que uma mulher trans, um homem trans e um homossexual que moram em São Paulo têm em comum? Eles estão entre os 100 contemplados pela bolsa do programa ‘Já É: Educação e Equidade Racial’ para fazer um cursinho pré-vestibular. Lucca Catherine, Breno Ribeiro e Victor Passos terão apoio educacional, psicossocial e vocacional durante a preparação para a seleção do ingresso ao ensino superior. No entanto, ainda existem muitos jovens LGBTQIA+ que nem ao menos se imaginam estudando. Afinal, qual a importância de iniciativas que incentivam a diversidade e a inclusão de gênero e de sexualidade nas universidades?

Para a vestibulanda, que se identifica como mulher trans, Lucca Catherine, de 22 anos, “estar em uma universidade mostrando que a gente (pessoas trans) não é só estereótipos. Somos inteligência, conhecimento e capazes de mais. E provar esse tipo de força de não ser cis no mundo cis faz a gente adquirir experiências, como quando nos tratam com o nome errado, nos expulsam do banheiro e nos agridem na rua. Então a gente pode levar para a universidade essa interseccionalidade que as pessoas ainda não entendem”, pontua.

Lucca, que mora em Americanópolis, na Zona Sul de São Paulo, deseja cursar ciências sociais para ensinar outras pessoas sobre questões que envolvem a luta contra a LGBTfobia. O desejo da jovem torna-se ainda mais importante quando se olha para as estatísticas.

Lucca Catherine, 22 anos

Dados da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) apontam que, em 2020, o Brasil, infelizmente, foi o país que mais matou pessoas transexuais do mundo. Com 175 mortes, o ano passado foi o 12º consecutivo em que o país apareceu no topo da lista.

Com a bolsa do ‘Já É’, Lucca considera que terá um importante apoio para atingir os seus objetivos. “Quando recebi a notícia que tinha sido aprovada, eu fiquei muito feliz”, lembra. “Quero poder ajudar a expandir o conhecimento das pessoas sobre questões sociais da melhor forma possível.”

Da mesma maneira, Victor Passos, de 23 anos, percebe a importância da inclusão e representatividade de pessoas LGBTQIA+ na produção de conhecimento acadêmico. “Eu sempre achei necessário que esses corpos ocupem esses espaços para que a gente possa humanizar pessoas que a sociedade lida como anormais”, afirma.

Com o sonho de fazer a graduação de artes cênicas, o jovem, que vive em Taboão da Serra, município da região metropolitana de São Paulo, sonha em trabalhar com televisão. “Acho muito importante a gente ter uma série, como ‘Pose’, trazendo pessoas transexuais e travestis como personagens principais.”

Victor Passos, 23 anos

Breno Ribeiro, de 17 anos, passou por algumas dificuldades dentro de casa, no bairro de Jardim Aracati, em São Paulo, para que alguns membros de sua família o tratassem com os pronomes adequados a um homem trans, sua identidade de gênero. A mudança veio com o tempo e os próprios parentes do rapaz perceberam o quanto isso foi positivo.

O bolsista do ‘Já É’ tem a intenção de cursar física e sonha em algum dia trabalhar com astronomia. Ciente da baixa presença e permanência de pessoas LGBTQIA+ nas universidades, Breno, morador do Jardim Aracati, na Zona Sul de São Paulo, acredita que programas como o do Fundo Baobá agregam para os alunos, que têm a oportunidade de se desenvolverem, e para as instituições, que aprendem quais maneiras de incluir e aumentar o bem-estar dessas pessoas.

Breno Ribeiro, 17 anos

Ter contato com diversidade, seja sexual, de raça, de lugares, de culturas e de pessoas com deficiência na universidade é muito importante para conhecer novos olhares sobre a vida”, avalia. “É ruim viver numa bolha que só tem gente igual. As pessoas são diferentes e a gente precisa ter contato com essas diferenças.”

Lucca, Victor e Breno são três dos 100 jovens que representam a diversidade de gênero, sexualidade, raça, local de moradia e de pessoas com deficiência que o Fundo Baobá quer ver se desenvolver no mercado de trabalho. O programa ‘Já É’ é o primeiro passo desse processo que, dentre tantas bandeiras, tem a causa LBGTQIA+ como uma de suas prioridades.

Enfermeiros e médicos inspiram jovem ao cuidarem de sua avó

A avó de Barbara Oliveira sofria de esclerose lateral amiotrófica, uma doença rara e degenerativa

Barbara Oliveira Guimarães, de 23 anos, mora no bairro de Cachoeirinha (Zona Norte de São Paulo) e sempre admirou os profissionais da saúde. Isso porque durante um período de sua vida, Guimarães passou a receber médicos e enfermeiros em sua residência. O motivo era a condição rara e degenerativa de sua avó, portadora de esclerose lateral amiotrófica.

Ao ver o afeto e dedicação dos profissionais, ela decidiu cursar Enfermagem. “Todo aquele cuidado foi essencial na minha vida, fez toda a diferença. Entendi que era isso que eu queria: ajudar as pessoas através da minha profissão”, conta. Guimarães acredita que, mesmo morando em um país tão corrupto e desigual, ainda assim ela vê potencial em si mesma.

Barbara Oliveira Guimarães, 23 anos

A jovem, que atualmente mora com sua mãe, irmã e sobrinha recém-nascida, deseja conquistar seu espaço na sociedade, e estuda em casa para alcançar seu objetivo de se tornar enfermeira. Apesar do seu foco, a estudante enfrenta alguns problemas estruturais, pois a falta de privacidade em uma casa pequena com muitas pessoas e pouco silêncio, dificulta sua rotina de estudos. “Eu também tenho dificuldade em aprender algumas coisas sozinha, então fica bem complicado”, diz.

Foi através do Fundo Baobá que Guimarães se sentiu mais próxima do seu objetivo. Ela conheceu o projeto através do grupo Fórum da Consciência Negra, do qual participa. O link chegou em meio aos posts, e a estudante se interessou. “Confesso que no começo fui pessimista, achei que não passaria, mas fiquei surpreendida com a notícia boa”, diz. “Eu sinceramente não consigo me ver fazendo outra coisa. Já pensei em mudar para outras profissões, mas nada me chama atenção. Acredito que estou no caminho certo”, conclui.

21 de junho: Dia de Luiz Gama e Machado de Assis, escritores, jornalistas, abolicionistas e negros

Hoje, dia 21 de junho, celebramos o aniversário de duas personalidades negras históricas e de imenso simbolismo para a nossa cultura. Celebramos o nascimento do jornalista, escritor e advogado, Luiz Gama e também do escritor, jornalista, contista, cronista, dramaturgo e poeta, Machado de Assis.

Nascido no ano de 1830, em Salvador, Bahia, Luiz Gonzaga Pinto da Gama era filho de Luiza Mahin. Sua mãe merece um capítulo à parte, nascida na Costa da Mina, na África, Luíza Mahin foi escravizada até o ano de 1812, quando comprou a sua alforria, se mudou para Bahia e se tornou quituteira. Luiza participou do maior levante organizado pelos negros escravizados, a Revolta do Malês, no ano de 1835.

Filho de Luiza Mahin com um fidalgo branco de família portuguesa, aos 10 anos Luiz Gama foi vendido pelo próprio pai, sendo escravizado pelo comprador. Em São Paulo, ele foi colocado à venda, mas foi rejeitado por ser baiano, uma condição que conferia  aos homens a fama de insubordinados, justamente por causa da Revolta dos Malês, ocorrida cinco anos antes. Sendo assim, ele foi levado para casa de um comerciante.

Analfabeto, aos 17 anos Luiz Gama aprendeu a ler e conseguiu a própria alforria. Autodidata, começou a estudar leis e passou a defender escravizados em processos judiciais, conseguindo a liberdade de muitos, iniciando assim, a sua luta abolicionista. Estudos indicam  que Luiz Gama libertou mais de 500 escravizados e chegou a receber o carinhoso apelido de “Apóstolo Negro da Abolição”.

Luiz Gama

Luiz Gama também atuou como jornalista.  Ao lado do caricaturista Angelo Agostini, fundou, em 1864, o primeiro jornal ilustrado humorístico da capital paulista, o Diabo Coxo. Dois anos depois, fundou o Cabrião.

Diabético, Luiz Gama faleceu no dia 24 de agosto de 1882, aos 52 anos. Partiu antes da chamada abolição da escravatura, que aconteceria no dia 13 de maio de 1888, mas sua luta abolicionista, mesmo não encontrando espaço nos livros da história do Brasil, é de suma importância para a comunidade negra.

133 anos após sua morte, em 3 de novembro de 2015, a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), concedeu-lhe o título de “advogado”, uma vez que não era formado e atuava como “provisionado abolicionista”.

 

No mesmo dia, nove anos depois, nascia outro negro que mudaria a história do país

No mesmo 21 de junho, mas com nove anos de diferença (1839), nasceu Joaquim Maria Machado de Assis, no morro do Livramento, no Rio de Janeiro. Filho do pintor de paredes Francisco José de Assis – que por sua vez era filho de escravizados alforriados – e da lavadeira, de origem portuguesa, Maria Leopoldina Machado de Assis.

Em 1849, após a morte da sua mãe, Machado e o pai se mudam para a casa de sua madrinha. Em 1854, Francisco José se casa novamente, dessa vez com a doceira Maria Inês da Silva.  Mesmo após a morte do pai em 1864, Machado de Assis continua morando com a madrasta.

Apesar de não ter sido escravizado na infância, como Luiz Gama, para a doutora, jornalista e historiadora e membro da Rede de Historiadorxs Negrxs, Ana Flávia Magalhães Pinto, “Machado de Assis cresceu em um ambiente em que a sua presença podia ser confundida como a de uma criança ou jovem escravizado”, disse a historiadora em uma live organizada pelo Sindicado dos Jornalistas do Distrito Federal, em 2020, que celebrava o aniversário de Machado e Gama. No mesmo evento, Ana Flávia relembra que assim como Luiz Gama, Machado de Assis também encontrou no jornal “um espaço estratégico para desenvolver os seus projetos individuais e coletivos”. Foi em 1855 que Machado de Assis publicou o seu primeiro poema, Ela, após tornar-se colaborador do jornal Marmota Fluminense. Em 1858, após ter aulas de francês e latim com o professor Padre Antônio José da Silveira Sarmento, ele se torna revisor de provas de tipografia e da livraria do Jornalista Paula Brito, onde conhece membros da sociedade Petalógica e vira colaborador dos jornais O Paraíba e Correio Mercantil.

Para Ana Flávia Magalhães Pinto, em mais um momento a história de Luiz Gama e Machado de Assis se assemelham: “Escrevendo e criando jornais, ambos tiveram a oportunidade de estabelecer relações de amizade, não apenas com medalhões, figurões reais ou pretensamente brancos, mas também com outros homens negros, livres e letrados”. 

O primeiro romance publicado por Machado de Assis foi Ressureição, lançado em 1872. Ao longo de sua trajetória, o escritor lançou 10 romances e 10 peças teatrais, 200 contos, 5 coletâneas de poemas e sonetos, além de mais de 600 crônicas. Entre os livros mais emblemáticos está a chamada “trilogia realista”, formada por Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881), Quincas Borba (1891) e Dom Casmurro (1899).

Machado de Assis

Com uma saúde muito frágil, para além da epilepsia e gagueira, desenvolveu cegueira e depressão ao longo da vida. Machado de Assis morreu com uma úlcera cancerosa na boca no dia 2 de setembro de 1908, aos 69 anos de idade.

Luiz Gama e Machado de Assis, dois escritores e jornalistas negros que nasceram no dia 21 de junho, são retratados no livro Escritos de Liberdade: Literatos Negros, Racismo e Cidadania no Brasil Oitocentista de autoria de Ana Flavia Magalhães Pinto, lançado em 2019, fruto da sua tese de doutorado, que estuda a mídia negra no Brasil e apresenta os resultados da pesquisa sobre a rede de homens negros, livres, letrados e atuantes na imprensa nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro na segunda metade do século XIX.

Livro “Escritos de Liberdade: Literatos Negros, Racismo e Cidadania no Brasil Oitocentista” de autoria de Ana Flavia Magalhães Pinto

Além de Luiz Gama e Machado de Assis, o livro aborda as trajetórias de Ferreira de Menezes, José do Patrocínio, Ignácio de Araújo Lima, Arthur Carlos e Theophilo Dias de Castro, todos homens negros livres e letrados e que colaboraram com a luta abolicionista, muito antes do 13 de maio de 1888: “Luiz Gama e Machado de Assis foram pessoas que cada um ao seu modo, se dedicaram à luta contra a escravidão, problematizando aquilo que estava colocado no sentido de uma conivência com a permanência da escravidão, sejam em textos muito marcantes e também em textos que guardam uma certa discrição, muito comum dessa escrita machadiana”, conclui a autora. 

Para a historiadora Ana Flavia Magalhães Pinto: “Luiz Gama e Machado de Assis foram pessoas que cada um ao seu modo, se dedicaram à luta contra a escravidão”

Fontes:

Portal Geledés

Revista Afirmativa

Live do Sindicato dos Jornalista do Distrito Federal

Podcast Sob Torção – Especial Luiz Gama

Fortes Laços em Linhas Rotas – Literatos negros, racismo e cidadania na segunda metade do século XIX – Ana Flavia Magalhães Pinto