A força coletiva que mobiliza a Marcha das Mulheres Negras desde 2015

A mobilização para a Marcha das Mulheres Negras de 2025 é construída por mulheres que estiveram presentes desde sua primeira edição, realizada em novembro de 2015, em Brasília. Articuladoras, militantes e lideranças de diferentes gerações e territórios do Brasil marcham na luta por reparação diante das injustiças históricas, contra o racismo e pelo Bem Viver.

Entre elas está Piedade Marques, filósofa, articuladora da Rede de Mulheres Negras de Pernambuco e atual coordenadora do projeto social Eu voto em negras.

“Foi uma militância e uma formação baseada em debate, leitura, informação. Tive a sorte e a oportunidade de fazer parte do Afoxé Alafin Oyó — grupo cultural e religioso de Pernambuco —, que foi meu espaço de ‘aquilombamento’. Era o nosso gueto, onde eu podia ser uma menina preta livre, sem precisar alisar o cabelo. Isso nos dava uma sensação de liberdade”, afirma.

Na fotografia, vemos Piedade Marques, filósofa, articuladora da Rede de Mulheres Negras de Pernambuco e atual coordenadora do projeto social Eu voto em negras. uma mulher negra em pé, sorridente, com os cabelos trançados e presos com um detalhe vermelho. Ela veste uma regata estampada com a imagem de uma figura feminina negra em trajes tradicionais e com uma espada em punho, além de um short branco com bordados. Ao fundo, há um mural artístico em tons de preto e branco, com traços que remetem a elementos culturais e figuras humanas. A expressão da mulher transmite confiança e serenidade, em um ambiente que valoriza a identidade afro-brasileira.
Piedade Marques, filósofa, articuladora da Rede de Mulheres Negras de Pernambuco e atual coordenadora do projeto social Eu voto em negras.

A faísca da Marcha das Mulheres Negras nasceu em 2013, durante a III Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial, com a formação do Comitê Impulsor Nacional da Marcha das Mulheres Negras Contra o Racismo, a Violência e pelo Bem Viver. 

O comitê foi composto por organizações como a Articulação Nacional de Mulheres Negras Brasileiras (AMNB), a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Quilombolas (Conaq), a Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (Fenatrad) e o Movimento Negro Unificado (MNU).

A Marcha como processo político e social de longo prazo

A construção da Marcha demanda meses — e, muitas vezes, anos — de preparação: encontros regionais, reuniões, estudos, debates e mobilizações nas comunidades. Trata-se de uma expressão coletiva do protagonismo das mulheres negras na luta contra o racismo, o sexismo e outras formas de opressão. Mais do que um ato político, a Marcha afirma um novo projeto de sociedade pautado no Bem Viver.

Valdecir Nascimento, atualmente com 65 anos, também foi uma das protagonistas na concepção e organização da Marcha de 2015. Fundadora do Odara – Instituto da Mulher Negra, sua trajetória se entrelaça com a luta cotidiana das mulheres negras e com a busca coletiva por estratégias de resistência e sobrevivência. 

Na década de 1980, Valdecir encontrou o movimento negro e, paralelamente, começou a questionar narrativas enquanto atuava como catequista (pessoa que leva a fé cristã a crianças, jovens e adultos) — entre elas, a releitura do poema O Deus Negro, de Neimar de Barros.

Desde cedo, passou a refletir e sonhar com um novo caminho para o Bem Viver das mulheres negras e de suas famílias. Filha de um ogã de terreiro (pessoa responsável por tocar e cantar), Valdecir carrega saberes ancestrais ligados à cura física e espiritual proporcionada pelas religiões de matriz africana.

“Em 2012, em Brasília, quando Nilma Bentes propôs um encontro de mulheres negras para discutir articulações que nos fortalecessem, senti que era uma proposta potente, que precisava ser acolhida por todas. Era a chance de nos afirmarmos como sujeitas políticas diante da sociedade brasileira — e assim foi feito, com a realização da Marcha em 2015”, relembra Valdecir.

Para ela, o maior legado daquela Marcha está na metodologia adotada e na capacidade de romper com a subalternidade histórica imposta às mulheres negras. É nelas, acredita, que reside a força transformadora capaz de mudar o país.

Tanto Piedade quanto Valdecir desejam que a Marcha de 2025 seja marcada pela esperança. Elas acreditam na força coletiva e afetiva das mulheres negras para construir um novo mundo — um mundo onde possam ser livres e moldar a realidade de acordo com seus próprios valores, e não segundo as imposições políticas e ideológicas dos opressores.

Para mais informações sobre a Marcha, acesse: https://marchadasmulheresnegras.com.br 

Rumo à Marcha das Mulheres Negras 2025: mobilização por Reparação e Bem Viver

Rumo à Marcha das Mulheres Negras 2025: mobilização por Reparação e Bem Viver

No próximo dia 25 de novembro, milhares de mulheres negras vão se reunir para marcharem por Reparação Histórica e Bem Viver, em Brasília – DF. Marcham por uma exigência de políticas e medidas concretas que enfrentem as desigualdades raciais e sociais, que assegurem oportunidades reais para a população negra, que garantam o direito de sonhar e realizar, de envelhecer com dignidade, de acessar uma educação de qualidade, de se alimentar bem, e de ter acesso à saúde integral.

E pelo Bem Viver que representa uma proposta de organização política e social que rompe com o modelo individualista, explorador e desenvolvimentista centrado no capital, ou seja que proponha uma organização coletiva para a ascensão das mulheres negras na sociedade em todas as regiões do Brasil.

Mulheres negras sorrindo em círculo, vistas de baixo para cima, reunidas em Recife para o planejamento do Março de Lutas em preparação para a Marcha das Mulheres Negras 2025.
Mulheres negras reunidas para o planejamento do Março de Lutas em Recife (PE)

Com o objetivo principal de denunciar as diversas formas de opressão que atingem de maneira potencializada as mulheres negras, o movimento coletivo do Março de Lutas foi criado em 2019 pelo Odara – Instituto da Mulher Negra e é construído pela Articulação de Organizações Negras Brasileiras (AMNB) e a Rede de Mulheres negras do Nordeste.

A 7ª edição reforça uma agenda coletiva dos movimentos de mulheres negras, promovendo reflexões sobre o combate ao racismo e ao patriarcado, além de propor um novo olhar sobre o 8 de março, data que marca o Dia Internacional da Mulher.

Grupo de mulheres negras sorrindo e vestindo roupas coloridas e estampadas com a campanha "Prevenção é Afeto", durante mobilização do 8M em Goiás, fortalecendo a construção da Marcha das Mulheres Negras 2025
8 de Março em Goiás

Durante o mês de março foram realizadas 167 atividades, de 83 organizações, grupos e coletivos, em 19 estados, nas 5 regiões do Brasil. Foram rodas de conversa, oficinas, festivais, seminários e outras ações que são o fio condutor desta mobilização. Todas essas atividades têm por meta  alcançar o número histórico de 1 milhão de mulheres negras nas ruas da capital federal. Costurando experiências, saberes e resistências por todo o país, este ano, o chamado ganha ainda mais potência, direcionando os passos rumo à marcha.

Mulheres dos centros e dos quilombos; das universidades e das escolas primárias; atletas; artistas; profissionais da educação e da comunicação; engenheiras; cientistas; motoristas de aplicativos; agricultoras; donas de casa; empreendedoras; trabalhadoras do campo e da cidade; cristãs e candomblecistas; religiosas ou não; entre outras. 

Mulheres negras reunidas em círculo sob árvores, em uma roda de conversa no Quilombo do Cedro, em Mineiros (GO), como parte das articulações para a Marcha das Mulheres Negras 2025.
Reunião de mulheres negras no Quilombo do Cedro, em Mineiros (GO)

Para Maria Conceição Costa, a Ceça, uma das integrantes da Coordenação Nacional do Comitê impulsor da Marcha das Mulheres Negras, a marcha cumpriu o seu papel em 2015 como um impulsionador para a organização dessas mulheres. Após a marcha houve um fortalecimento significativo das mulheres do Nordeste, ainda que tenham relatos de ocorrências de opressão durante a marcha.

Mulheres negras seguram faixa da Marcha das Mulheres Negras 2025 durante o carnaval de São Luís (MA), reafirmando a luta por reparação histórica e bem viver em meio à celebração popular.
 Mulheres negras presentes no carnaval de São Luís (MA)

“É importante fortalecer não só as capitais para 2025, mas um número maior de cidades e os interiores Brasil afora, pois a realidade das mulheres negras ainda é muito crítica. São elas as que mais morrem pela ausência de saúde, são as que mais choram pelos seus filhos assassinados pela violência do estado, são as mais perseguidas por conta da sua fé, das suas guias, e as que mais sofrem violência obstétrica”, afirma Ceça.

Para mais informações sobre a Marcha das Mulheres Negras 2025, acesse o Instagram da Marcha das Mulheres Negras.