Quem gosta de literatura e escuta o nome Cora Coralina, logo o associa ao pseudônimo de Anna Lins dos Guimarães Peixoto Bretas, uma importante poetisa e contista brasileira, que teve o primeiro livro publicado em 1965, aos 76 anos, embora escrevesse há várias décadas. Aos 50, já viúva, Anna decidiu assumir o pseudônimo e dedicou-se mais intensamente a registrar suas experiências pessoais e o amor pela cidade natal, Goiás.
Ela ainda era viva, em 1991, quando um casal em São Paulo batizou a filha com o seu nome artístico. Cora Coralina de Paula Souza, hoje com 29 anos, chegou a ter vergonha do nome, porque, segundo ela, causava estranhamento entre as outras crianças. Só na juventude, descobriu os textos da escritora goiana.
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“Acredito que um poema dela vem muito de encontro aos meus anseios, o ‘Ofertas de Aninha (aos moços)’, que diz um pouco: ‘Eu sou aquela mulher a quem o tempo muito ensinou. Ensinou a amar a vida. Não desistir da luta. Recomeçar na derrota. Renunciar a palavras e pensamentos negativos. Acreditar nos valores humanos. Ser otimista’(…) ”.
Formada em Comunicação Social, com especialização em Gestão Cultural, a Cora Coralina paulistana tem muita sensibilidade e sede de transformação. Integra o coletivo N’Kinpa – Núcleo de Culturas Negras e Periféricas -, que reúne em sua maioria mulheres negras para a promoção da cultura e educação em territórios periféricos.
“A motivação para me inscrever no Edital Primeira Infância veio do despreparo e descaso do poder público em dar suporte a população, principalmente nas áreas da Saúde e Educação, frente a pandemia. As violências e vulnerabilidades que acometeram os negros e as crianças foram escancaradas. Diante disso, a necessidade de buscarmos fundos e verbas foi imprescindível, pois não podíamos apenas assistir a fome, a morte e falta de cuidados”, desabafa.
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Cora Coralina e integrantes do coletivo atuaram na comunidade Quilombo da Parada, que fica no distrito da Brasilândia em São Paulo, região que chegou a liderar o ranking de mortes pela Covid-19 na capital, ano passado.
“Impactamos trinta famílias com crianças na primeira infância. Desenvolvemos o Kit Capanga contendo um livro de pano, saquinhos de N’ganga (ervas) e um catálogo com explicações sobre as ervas e sugestões ilustradas de cuidados com os bebês e crianças. Os livrinhos de pano trazem os símbolos Adinkras – Sankofa, Aya e Duafe. Também criamos o CD Histórias do Lado de lá Calunga, com contos e canções, acompanhado de um QR Code no encarte. Este Kit foi entregue junto de cestas básicas que continham alimentos e itens para higiene”, descreve.
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Como Cora Coralina, lá em São Paulo, o professor e agente comunitário Domingos Lemos Silva, 40, não suportou assistir de braços cruzados o sofrimento do seu povo.
“Moro no quilombo de São Joaquim do Sertão, em Vitoria da Conquista, na Bahia, e sou natural desse município. Enxerguei no edital a oportunidade de captar recursos para melhor servir a minha comunidade nesse momento difícil”, conta.
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A ajuda chegou com a distribuição de cestas de alimentos, kits de produtos de higiene e muita orientação. Domingos convidou um representante de cada família para participar de uma palestra no pátio da igreja do quilombo – ali evocaram diálogos sobre os sintomas e cuidados necessários para manter distante o novo coronavírus.
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“Na ocasião, também expliquei o que era o Fundo Baobá e o projeto que estávamos participando. Em outro momento promovi a pesagem das crianças em uma unidade de saúde, onde foi possível ainda checar as cadernetas de vacinação, além de vacinar as crianças que tinham vacinas pendentes. Consegui que o projeto atingisse 57 adultos e 35 crianças. Os participantes comentaram que gostaram do projeto e que ele deveria ser permanente; já eu aprendi a lição de que fazer o bem é gratificante”.
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Em Ananindeua, no Pará, a assistente social Amanda Cristina Queiroz de Moraes, 34, teve a mesma impressão ao encerrar o projeto desenvolvido para o edital. O público-alvo foram crianças e adolescentes paraenses que sofrem com a violência familiar e a gravidez na adolescência.
“Sou voluntária em uma comunidade denominada Curuçambá, em Ananindeua, onde vivencio essa realidade diariamente. Eu sigo o Fundo Baobá no Instagram e fiquei sabendo do edital por lá. Decidi participar, porque queria levar informação de forma lúdica e com uma linguagem acessível para essas meninas.”
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Com a parceria de outra assistente social, a Regeane Holanda do Carmo, 29, Amanda Cristina ofereceu também muito carinho e atenção, por meio de rodas de conversa e visitas individualizadas nas casas das adolescentes.
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“Não foi fácil falar sobre sexualidade, uso de contraceptivos e relacionamento amoroso, por exemplo. Primeiro porque havia a necessidade de um responsável por perto, o que as deixava constrangidas, e por que muitas vezes esses temas não eram bem-vindos pelos pais. Mas nós conseguimos levar informações do ECA (Estatuto da Criança do Adolescente) por meio de cartilhas. Informações que elas terão para sempre.”
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Amanda e Regeane são voluntárias do Centro Social Estrela Dalva umas das muitas associações que buscam apoiar os moradores de ocupações de Curuçambá e populações ribeirinhas próximas. Por meio desse trabalho chegaram até 20 garotas e 10 adultos, certas de ter feito alguma diferença na vida de todos:
“Fazer o bem, é amar o próximo”, resume Amanda Cristina.