Lorenna Vilas Boas tem um sonho. A jovem baiana de 19 anos, estudante de engenharia elétrica da Universidade Federal da Bahia (UFBA), sonha que mais meninas tenham acesso à ciência e a tecnologia e usem essas duas ferramentas como forma de empoderamento.
Estudando na UFBA, Lorenna quer desenvolver um aplicativo de tecnologia assistiva para ajudar pessoas cegas.
Ela faz parte dos 12,8% de jovens negros que tiveram acesso ao ensino superior e essa estatística é um lembrete diário para a jovem:
“Me sinto mal vendo a realidade que preciso enfrentar. Quando descobri que posso contribuir levando esse problema à tona, participando de programas como o G(irls)20, entendi que é uma oportunidade de dizer para o mundo a situação que a gente vive no Brasil. O País é de maioria negra, mas onde estão as mulheres negras? O meu projeto atual é desenvolver tecnologias voltadas para pessoas – o que a gente chama de engenharia pessoal”. https://goo.gl/zTW1jE
O sonho da Lorenna é possível porque com projetos como a PretaLab, por exemplo, a possibilidade de mais meninas negras perceberem que o que elas já fazem no seu dia-a-dia é tecnologia, é inovação e é possível e portanto muito importante, pela possibilidade de ver outras meninas e mulheres negras como espelhos positivos.
A PretaLab é uma iniciativa do Olabi – Um espaço/laboratório dedicado a apropriação de novas tecnologias – que acredita no protagonismo das meninas e mulheres negras e indígenas nos campos da inovação e tecnologia como forma de reduzir as desigualdades sociais do país. O objetivo da iniciativa é fazer um levantamento para coletar as histórias e desafios que essas mulheres enfrentam, tornando visíveis as suas trajetórias e estimulando que outras mulheres considerem esse universo como uma possibilidade.
E porque a PretaLab considera que falar sobre mulheres negras e indígenas na tecnologia é importante? Porque esses são os dados levantados por elas após pesquisa inicial:
– 19 mulheres foram citadas na história da ciência no Brasil pelo CNPq, nenhuma é negra.
– 4% é a quantidade de mulheres negras entre as fundadoras de startups de tecnologia comandadas por mulheres nos Estados Unidos.
– 10 é o número de mulheres negras que às Escola Politécnica da USP formou em 120 anos, segundo levantamento do Poligen de 2013.
De acordo com Silvana Bahia, Diretora de Projetos do Olabi, “ A PretaLab nasce com o intuito de estimular outras meninas a desenvolver tecnologias. A gente entende que é preciso criar os nossos espaços mas também estar nos espaços que já existem, se não cadê a diversidade?”.
“O que a gente quer mesmo no fundo é democratizar esse acessos”, afirma Silvana Bahia que juntou um time incrível para gravar uma série de 10 vídeos, sobre as mulheres negras que são destaques nos campos de tecnologia e inovação e que servem de exemplo positivo para tantas outras mulheress seguirem caminhos similares.
Os primeiros vídeos da série, já lançados, contam com a participação de Monique Evelle – Fundadora do Desabafo Social, Ana Carolina da Hora – Estudante de Ciência da Computação e estagiária do Olabi, Viviane Gomes – Jornalista e Ciberativista da ONG Criola, Gabi Oliveira – Comunicóloga e Youtuber e Maria Eloisa – Pesquisadora do Laboratório de Design Next PUC-Rio e tecnologista em produção de vestuário.
Os vídeos podem ser vistos aqui: https://goo.gl/y8FbHh
Katemari Rosa é professora de física na Universidade federal de Campina Grande (UFCG), mestra em Ensino, Filosofia e História das Ciências e Doutora em Science Education e está à frente do projeto “Contando nossa história: Negras e negros nas ciências, tecnologias e engenharias no Brasil”, que pretende resgatar a história de cientistas negros brasileiros.
Segundo Katemari, “a participação das mulheres nas ciências das tecnologias é extremamente baixa e quando falamos de mulheres negras simplesmente não existem dados”.
Para mudar esse cenário de falta e invisibilidade existe o MINAS PROGRAMAM, um projeto que desconstrói a noção de que homens são mais aptos a programar, que entende que a quantidade de mulheres nas ciências, tecnologias e engenharias afeta diretamente a maneira com que as mulheres e as suas ideias são representadas. Enquanto o número de mulheres que sabem programar continuar tão pequeno, será muito difícil garantir pautas mais inclusivas na produção.
Para se ter uma ideia do cenário de tecnologias, os dados levantados inicialmente pelo projeto são:
– Dos 1.683 engenheiros da computação formados em 2010, apenas 161, ou seja 9,5% eram mulheres, segundo o INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais).
– Dos 7.339 formados em ciências da computação no mesmo ano, 1.091 (14,8%) eram programadoras.
– Em 2015, um total de 330 ingressantes dos cursos de Computação da USP, apenas 38 (11,5%) eram mulheres.
– Dos 300 mil profissionais registrados pelo CREA-SP (Conselho Federal de Engenharia e Agronomia de SP), apenas 49 mil (16,3%) são mulheres.
– A participação das mulheres na ciência da computação caiu quase 37% em meados dos anos 80, para 17% atualmente. (http://minasprogramam.com/ )
Esses dados não levam em conta o recorte racial, o que só comprova a fala da Doutora Katemari quanto a inexistência de dados quando falamos de mulheres negras.
Outra iniciativa que chega para mudar esses números é O OxenTi Menina, um grupo formado por meninas entusiastas e apaixonadas pela fomentação da tecnologia que foi criado com o propósito de reunir meninas do ensino fundamental e médio para participar do Technovation (programa que oferece a meninas em todo o mundo a oportunidade de aprender as habilidades necessárias para se tornarem empresárias de tecnologias e líderes. Meninas com idade entre 10 e 18 anos, que identificando um problema local, criam uma solução através de um aplicativo móvel, para resolvê-lo).
Depois da participação no Technovation, o grupo se manteve e tomou para si o nome OxenTi Menina, que tem como objetivo inicial a promoção da ideia na inserção da tecnologia e empreendedorismo para adolescentes, levando a filosofia de criar novas tecnologias para resolver o problema do contexto social de cada uma, promovendo assim a motivação para adentrar o mundo da tecnologia como desenvolvedoras e não somente como usuárias.
O grupo possui metodologia de trabalho e ensino próprias, realiza oficinas em escolas públicas e particulares inicialmente na lógica de programação e possui como meta final o empoderamento da mulher nas exatas e na tecnologia. (http://oxentimenina.com.br/ )
Seja ainda no ensino fundamental ou após adentrar ao ensino superior, aumentar o leque de alternativas e ampliar o acesso das mulheres, especialmente das mulheres negras, às ciências e tecnologias é possível com projetos como a PretaLab ou o OxenTi Menina, assim o sonho de Lorenna Vilas Boas, poderá ser o sonho de mais e mais meninas.
“Sozinhas vamos mais rápido, juntas vamos mais longe!”