O medo como ruptura dos processos democráticos

Quem não sentiu mal nos últimos meses por causa da intensa e tensa polarização política? Discussão entre familiares, brigas com amigos, ofensas e até ameaças. Rompimentos.

Relações que geralmente se davam no campo do privado (família e relações afetivos-sexuais) foram ampliadas para o campo do coletivo através de sentimentos como: medo, angústia, lamento, frustração, luto e muita tristeza.

Segundo pesquisa realizada pelo Datafolha em 2 de outubro o clima pouco amistoso e a situação política do país provocam raiva e tristeza em mais de 65% dos eleitores brasileiros.

Nesse período eleitoral, duas figuras políticas centralizam toda a tensão e cerca de 147 milhões de adultos votantes concentram suas energias focando nesses dois polos, já que todas as relações sociais são relações políticas, são nesses campos que os personagens políticos se fundem e as opiniões distintas acabam gerando mais atritos.

A psicanalista Maria Homem é taxativa: “O aumento do ódio e da violência tem relação direta com a diminuição do debate e o motivo é a exaustão, não de uma pessoa mas do sistema inteiro”.

“Estamos vivendo uma patologia da mente, realmente a gente não consegue elaborar, muito menos comunicar, então a gente tem uma descarga, uma onda catártica, que atropela tudo e que é um berro. A gente tem certeza de quem são os culpados e temos igualmente a certeza de quem são os benfeitores”, afirma a psicanalista que vai mais a fundo e compara o cenário atual com o aprendizado de um bebê: quando não consegue falar, precisa berrar, chorar e gritar para ser ouvido.

Ângela Soligo, presidente da Abep (Associação Brasileira de Ensino de Psicologia) lista alguns efeitos colaterais psicológicos dessas eleições: “Primeiro é o aumento e a exacerbação das atitudes extremadas, ou totalmente contra ou a favor, sem ponderar, refletir, sobre o significado dessas atitudes e das ideias que elas carregam. A consequência é o fanatismo, e o fanatismo em geral é obscurantista, ele impede que as pessoas reflitam sobre sentimentos, ideias e ações. Num momento de polarização, o pensamento fica comprometido. O que vem à frente são fortes emoções, as crenças acima de tudo e o desprezo pelo pensar. É a impossibilidade do diálogo, o que fica marcado é o sentimento de ódio. Ele se tornou a marca de muitos discursos. Odiar nessas circunstâncias é abrir mão da racionalidade. Outro sentimento que vai marcar é o da impotência e desesperança. Há pessoas que olham para o que está acontecendo e sentem que não podem fazer nada. Como se tudo fosse mais forte que elas, daí o sentimento que vem junto é a desesperança. Não posso fazer nada, quero ir embora”.

Para a psicanalista Amanda Mont’Alvão o ódio está sendo exercido sem mediação e sem os freios trazidos pelo processo de civilização e esse sentimento faz com que a aceitação das diferenças no convívio estejam impraticáveis e que as pessoas envoltas nessa onda de sentimentos negativos se sintam intimidadas.

Para não ser inundado por essa onda é preciso investir em práticas de saúde mental, estabelecer redes solidariedade e de apoio mútuo, buscar caminhos e modos de vida que permitam sonhar, planejar e criar, indo além de meramente sobreviver.  

Essa eleição está tendo o ódio e o medo como modus operandi, mas o pós eleições pode ser definido pelo amor, pela conversa, pelo respeito e pelo olho no olho.

Fontes:
Huffpost Brasil
Data Folha
Nexo Jornal

O Fazer Político em 2018

Discutir política em 2018 não está se mostrando nada fácil. Nem tão pouco tranquilo.
A polarização está cada vez mais acirrada e os ânimos estão exaltados.
Seja na roda de amigos, no grupo de mensagens instantâneas da família, em redes sociais, discutir política tem sido tomar partido, se posicionar e muitas vezes nas medidas mais radicais, cortar relações com quem pensa diferente.
Estão todos sensíveis e reativos a qualquer posição contrária.

O que fazer para não cair no discurso vazio e sem sentido de alguns candidatos, se instrumentalizar sobre propostas irreais e conhecer algumas outras formas do fazer político?
Que tal colocar em discussão a pouca ou quase nula presença de mulheres em posições de poder, em especial as mulheres negras?

E quebrar alguns mitos, como o de pessoas negras não votam em candidatos negros?

Listamos logo abaixo, algumas iniciativas que podem te ajudar a perceber as várias esferas do fazer político e a se instrumentalizar para reconhecer candidatos ou propostas com falsas soluções para problemas reais.

  Rede Umunna (que significa clã ou irmandade em igbo, língua falada em parte da Nigéria), foi criada a partir da iniciativa de cinco mulheres negras que acreditam que as mudanças sociais transformadoras se darão através da qualificação e da discussão sobre o debate político. A rede existe para engajar mulheres negras no debate eleitoral e que conecta essas mulheres na discussão da política institucional e nos espaços de poder.

A iniciativa foi criada por Ana Carolina Lourenço – Cientista Social, Gabriele Roza – Jornalista, Juliana Marques – Estatística, Lorena Pereira – Analista de Sistemas e Diana Mendes – Relações Internacionais e Políticas Públicas, que se juntaram durante a imersão do programa Mina de Dados, idealizado pela Transparência Brasil, em parceria com data_labe e a Preta Lab . As idealizadoras da Rede Umunna crêem na criação de espaços seguros para o fortalecimento de mulheres negras na política brasileira. Um dos dados levantados pela Rede é que as mulheres negras são o maior grupo demográfico do país, somando 27% da população brasileira e no entanto são menos de 2% no congresso nacional.

Diante dessa dado, a Rede Umunna lançou a campanha #MulheresNegrasDecidem, cujo objetivo é continuar o longo legado de movimentos de mulheres negras que lutam pelo avanço dos direitos através do fortalecimento de processos eleitorais.

“Mulheres Negras Decidem é uma declaração de crença no poder das gerações atuais em cumprir a promessa democrática”.

Através de mapeamento e análise de dados produzidos por órgãos oficiais de pesquisa, a Rede Umunna derrubou diversos mitos amplamente difundidos, especialmente em época de eleições.

“Negros não votam em negros”.
A justiça eleitoral não faz recorte racial do eleitorado, o que impossibilita uma análise que conecte diretamente eleitores negros e candidatos negros. O perfil demográfico da zona que a candidatura foi mais votada não é uma leitura suficiente para esta afirmação.
A análise completa desse mito você pode ler aqui: 

“Existem poucas mulheres negras eleitas porque elas não se candidatam”.
O universo de mulheres negras candidatas é próximo ao número total de mulheres brancas candidatas. Contudo nas eleições de 2014, mulheres negras foram 12,6% das candidaturas a deputado federal, mas apenas 1,9% das eleitas.
A análise completa desse mito você pode ler aqui:

 Observatório Brasil 50 – 50, uma iniciativa de organizações de mídias, pesquisa e da sociedade civil (Gênero e número, Instituto Patrícia Galvão, Instituto Alziras com apoio da ONU Mulheres e da pesquisadora e professora da UnB Flávia Biroli) foi lançado na metade do mês de setembro  apresentando análises, dados e reportagens em prol da paridade de gênero no debate eleitoral e político do país para o fortalecimento dos processos democráticos.

Os conteúdos publicados pelo Observatório têm como objetivo fornecer informações de qualidade para fundamentar o debate de gênero e política e publicizar que a parcela da população que busca por igualdade não está sozinha.

Duas das pesquisas que estão sendo produzidas são: um perfil das prefeitas no Brasil de 2017 a 2020 a ser lançado em breve e um mapeamento de todas as mulheres na disputa eleitoral em 2018, que você pode acessar aqui.

E um dos mais importantes levantamentos  – já que nas eleições de 2018 serão 6 candidatos a votar (deputado federal, deputado estadual, primeira vaga de senador, segunda vaga de senador, governador e presidente da República) – dentro da publicação Gênero e Número é a campanha #MeRepresenta, onde você escolhe os temas mais importantes para você (Gênero, raça, lgbts, povos tradicionais e meio ambiente, trabalho/saúde e educação, segurança e direitos humanos, corrupção, drogas, migrantes), seleciona o Estado e o site lista todas as candidatas e os candidatos, bem como  seus respectivos partidos, para você escolher qual mais trata dos temas que são caros a você.

–  Rede de Justiça Criminal é formada por oito organizações não governamentais (Centro de Estudos de segurança e Cidadania; Conectas direitos humanos; Instituto de Defensores de Direitos Humanos; Instituto de Defesa do Direito de Defesa; Instituto Sou da Paz; Instituto Terra, Trabalho e Cidadania; Justiça Global; Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares) que promovem ações de advocacy, buscando a disseminação de informação, a promoção de debate público, a elaboração e o encaminhamento de propostas, junto aos atores do sistema de justiça criminal e a sociedade civil, nos eixos de dados e transparência, direitos e garantias e violência institucional.

A iniciativa colocou no ar a campanha #EleiçõesSemTruque, com o objetivo de ajudar as eleitoras e os eleitores a identificar propostas  que possíveis candidatos(as) tentam projetar para solucionar problemas antigos com resoluções ilusórias, no campo da segurança e da justiça.

Alguns candidatos(as) para atrair atenção de futuros eleitores se utilizam de chamadas ficcionais tais quais: ”Vamos mudar o código penal para acabar com a impunidade” ou “Vou construir mais presídios”, como respostas à população toda vez que algum caso de violência ganha destaque midiático. O que a Rede de Justiça Criminal se propõe a fazer é qualificar o debate sobre segurança e justiça munindo as eleitoras e os eleitores de questionamentos e informações para que estes, analisem quais candidatas e candidatos estão propondo políticas públicas sérias, baseadas em dados e pesquisas e não proferindo um discurso apenas como caça a votos.

Essas foram três das iniciativas que mapeamos que podem te ajudar a ter mais clareza e te auxiliar na tomada de decisão sobre quem são as pessoas que você depositará sua confiança através do seu voto nas eleições de 2018.

Fontes: Imagem – Wendy Andrade
Rede Justiça Criminal 
Eleições sem truque
Mulheres Negras Decidem
Gênero e Número

1 ano do Governo Interino. Como as mudanças impactam na vida das mulheres negras?

Foto: Lula Marques/ Agência PT

 

Ao longo de toda a história do Brasil, o país foi impactado por inúmeras crises que não possuíam como prioridade o aspecto social, mas sim, o mercadológico. Nos anos 90, houve uma profunda crise econômica, onde viveu-se com o capital estagnado e o temor do fantasma da hiperinflação era constante. Os países latino-americanos estavam em frente a um enorme endividamento e o Brasil chegou a ponto de ter 70% de dívida estatal, e a partir desse momento, o gasto público se torna desequilibrado.

Para escapar desse cenário, resgatou-se a reforma que havia se iniciado nos anos 70, que previa a reestruturação da administração pública a fim de estabilizar o crescimento da economia, defendendo o ponto de que o problema seria do Estado e que por isso seria preciso reduzir o gasto do Estado com as políticas públicas, o que não se difere de hoje.

O Estado passou a se somente regulador, reduzindo os gastos na área social e transferindo os gastos para o setor privado e para a sociedade civil.
Foi no governo do Presidente Collor que as privatizações tomaram forma, onde se entregou uma parcela significativa do patrimônio público ao capital estrangeiro, principalmente a grupos norte-americanos. É a partir da reforma do Estado que o mercado ficou entendido como primeiro setor, o Estado seria o segundo setor e a junção do Estado com a sociedade civil seria o terceiro setor, além de ONGs executando políticas públicas através de trabalho voluntário e ações sociais.

Os Direitos Sociais (garantidos pela Constituição Federal de 88) são uma conquista que se obteve ao longo do desenvolvimento social, com o objetivo de garantir condições mínimas aos indivíduos, eles tiveram seu ápice no século XX, e trata-se de uma regulação que permite resolver os conflitos sociais com o objetivo de corrigir desigualdades entre as classes sociais.

A Constituição Federal de 1988 assegura ao indivíduo o básico necessário para a sua existência digna, onde a maior parte dos Direitos Sociais depende da atuação do Estado. Na Constituição os Direitos Sociais são garantidos no CAPÍTULO II, dos artigos 6º ao 11º.

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.  (Brasil, 1988).


A constituição Federal de 1988 introduz no seu artigo 194, o parágrafo único que diz:

Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a seguridade com base nos objetivos de: universalidade de cobertura e do atendimento; uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais; seletividade e distribuição das prestações dos benefícios e serviços; irredutibilidade do valor dos benefícios; equidade das formas de participação no custeio; diversidade da base de financiamento; caráter democrático e descentralização da gestão administrativa com participação da comunidade, em especial, de trabalhadores, empresários e aposentados. (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988 apud CABRAL, 1995, pag. 124).


Também foram introduzidas modificações nos planos de benefícios, incorporando novos direitos e recompondo valores. Dentre as alterações, destaca-se: licença maternidade de 120 dias, extensiva aos rurais e domésticos; direito à pensão para maridos e companheiros; redução do limite de idade – 60 anos para homens e 55 para mulheres; aposentadoria proporcional para as mulheres aos 25 anos de serviço; direito de contribuição independente do exercício de atividade; recomposição das aposentadorias e pensões pelo número de salários mínimos da época da concessão; integralidade do 13º salário, e correção das últimas 36 contribuições para efeito de cálculo do salário de benefício.

A tríade da Seguridade Social no Brasil é composta por: Saúde, Assistência e Previdência. Sendo a  Previdência Social uma seguradora social do Governo Federal, em regime contributivo, portanto, para ter direitos aos benefícios, o trabalhador precisa estar inscrito e manter o pagamento das contribuições em dia.


Proposições do Governo Temer e rebatimentos nos direitos sociais

No final do ano passado com 53 votos a favor e 16 contra, o Senado aprovou em segundo turno, o texto base da Proposta de Emenda à Constituição do Teto de Gastos (PEC 55, PEC 241 ou PEC do Fim do Mundo), que congela todos os gastos públicos para os próximos 20 anos. A medida já vinha tramitando desde o início do governo do presidente Michel Temer (PMDB).

O caráter elitista do congelamento de gastos ocorre pelo esvaziamento da concretização de direitos sociais previstos na Constituição Federal e segundo o Defensor Público Federal, Fernando Antonio Holanda Pereira Junior, “os direitos sociais, a exemplo da saúde, educação, moradia, previdência social, entre outros expressos ou não no texto constitucional, por constituírem ações positivas do Estado, carecem para a sua concretização, de dispêndio de recursos financeiros. Acontece que as principais medidas de austeridade divulgadas pelo Governo, encabeçadas pela PEC 55, são direcionadas à redução do papel assistencial do Estado, imprescindível à manutenção da teia de segurança da população mais carente, dependente do bom e regular financiamento das políticas sociais não usufruídas na mesma escala pelos entusiastas do ajuste fiscal”.

As consequências para os trabalhadores serão sentidas também no desmonte da Justiça do Trabalho promovida pela PEC, a Juíza do Trabalho, Valdete Souto Severo afirma que ao contrário do que nos dizem, o objetivo da PEC 55 não é conter gastos e com isso enfrentar a crise. Trata-se de um movimento de desmonte do Estado Social. O que a aprovação da PEC 55 propiciará concretamente, será o fechamento da Justiça do Trabalho, dos hospitais públicos, das escolas e faculdades.

Segundo matéria escrita por Gil Alessi e publicada pelo Jornal El País:

“A proposta também inclui um mecanismo que pode levar ao congelamento do valor do salário mínimo, que seria reajustado apenas segundo a inflação. O texto prevê que, se o Estado não cumprir o teto de gastos da PEC, fica vetado a dar aumento acima da inflação com impacto nas despesas obrigatórias. Como o salário mínimo está vinculado atualmente a benefícios da Previdência, o aumento real ficaria proibido. O Governo tem dito que na prática nada deve mudar até 2019, data formal em que fica valendo a regra atual para o cálculo deste valor, soma a inflação à variação (percentual de crescimento real) do PIB de dois anos antes. A regra em vigor possibilitou aumento real (acima da inflação), um fator que ajudou a reduzir o nível de desigualdade dos últimos anos”.

A PEC 55 colocará limite em gastos que historicamente crescem todos os anos em um ritmo acima da inflação, como educação e saúde. Além disso, gastos com programas sociais também podem ser afetados pelo congelamento. A medida prejudicará o alcance e a qualidade dos serviços públicos oferecidos e aumentará a problemática no cumprimento dos mecanismos já em vigor, como os investimentos do Plano Nacional de Educação. Aprovado em 2014, o PNE tem metas de universalização da educação e cria um plano de carreira para professores da rede pública, uma das categorias mais mal pagas do País. A medida também sucateará o Sistema Único de Saúde (SUS), utilizado principalmente pela população de baixa renda que não dispõe de plano de saúde.

Subfinanciado desde a sua criação, o SUS já tinha a sua sustentabilidade ameaçada pelas transformações que o País passa: um acelerado envelhecimento da população, acompanhado do aumento da prevalência de doenças crônicas, a demandar tratamentos prolongados e dispendiosos. De acordo com o médico José Gomes Temporão, ex-ministro da Saúde do governo Lula, a PEC 241 apenas agrava o problema, com a perspectiva de perda real de recursos.

Temporão afirma que “a decisão do Congresso é uma condenação de morte para milhares de brasileiros que terão a saúde impactada por essa medida irresponsável”, para o ex-ministro, o País renuncia ao seu futuro ao sacrificar a saúde e a educação no ajuste fiscal: “Estamos falando de fechamento de leitos hospitalares, de encerramento de serviços de saúde, de demissões de profissionais, de redução de acesso, de aumento da demora no atendimento. Se existe um problema macroeconômico a ser enfrentado, do ponto de vista dos gastos públicos, há outros caminhos. Mas este governo não parece disposto a enfrentar a questão da reforma tributária. Temos uma estrutura tributária regressiva no Brasil, que penaliza os trabalhadores assalariados e a classe média, enquanto os ricos permanecem com seus privilégios intocados”.

De acordo com o australiano Philip Alston, relator especial da Organização das Nações Unidas para a Pobreza Extrema e os Direitos Humanos, a aprovação da PEC 55 é um erro histórico e que provocará um retrocesso social: “Eu acredito que quando mudanças dramáticas são propostas, é essencial que haja um debate público, com a as informações detalhadas a respeito das consequências dessas medidas. Eu não acho apropriado acelerar essa discussão no Congresso e acho particularmente inapropriado que um governo que não foi eleito proponha medidas tão radicais e imutáveis nas políticas econômicas e sociais”.

Outra medida que provoca um duro golpe nos direitos sociais conquistados é a PEC 287 ou PEC da Reforma da Previdência, que prevê, entre outras propostas, o estabelecimento de idade mínima de 65 anos para os contribuintes homens e 62 anos para contribuintes mulheres, reivindicarem aposentadorias. As novas regras irão atingir os trabalhadores dos setores público e privado e de acordo com o governo, a única categoria que não será afetada pelas novas normas previdenciárias é a dos militares. Pelas regras propostas pela gestão Temer, o trabalhador que desejar se aposentar recebendo a aposentadoria integral deverá contribuir por 49 anos.

 

Imagem: Jornal da Paraíba
Imagem: Jornal da Paraíba

 

O estudo do Ipea “Retrato das Desigualdades de Gênero e Raça” divulgado no início de março, tendo como base os indicadores extraídos da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), do IBGE, relativos ao período de 1995 a 2015, comprovam que a desigualdade de gênero é histórica e pode se agravar, tendo em vista o cenário de redução de direitos e de políticas públicas no atual governo Além das mulheres trabalharem mais em atividades precarizadas e acumular com funções domésticas, outros dados que chamam atenção são: a proporção de mulheres que chefiam os domicílios aumentou de 24,8% para 43% nos últimos 20 anos; e mulheres negras possuem o menor rendimento em relação a homens brancos e negros e mulheres brancas, variando entre
R$ 1.027,5 a R$ 2.509,7.

De acordo com Jucimeri Isolda Silveira, coordenadora do núcleo de Direitos Humanos e professora do Curso de Serviço Social e do Mestrado em Direitos Humanos e Políticas Públicas da PUCPR, “ as políticas pontuais e meritocráticas fracassaram no Brasil desde a década de 1930. Do mesmo modo, as ilusões neoliberais que apostam na capacidade do mercado de reduzir desigualdade se mostram ineficazes. Não há outra forma de reduzir vulnerabilidades e violações de direitos que não sejam por políticas públicas universais, integradas, redistributivas, afirmativas e de qualidade, associadas às políticas econômicas que gerem emprego e renda, e que promovam desenvolvimento territorial. A redução de direitos e de políticas públicas tem sido a medida adotada pelo governo Temer como justificativa para o ajuste fiscal. A lógica é simples e trágica: menos direitos e políticas sociais, mais pobreza e desigualdade. O cenário será de aumento da pobreza que afeta especialmente as mulheres negras, a infância e a juventude, com aprofundamento da desigualdade social, racial e de gênero no Brasil”.

As desigualdades aumentam e aprofundam os riscos de violência. 59,4% dos registros de violência doméstica na Central de Atendimento à Violência – Ligue 180 são de mulheres negras (2013). 62,8% das vítimas de morte materna são negras, uma situação que poderia ser perfeitamente evitada com acesso à informação e atenção no pré-natal e parto. (SIM/Ministério da Saúde, 2012). As maioria das mulheres que afirmam ter passado por algum tipo de violência obstétrica também são mulheres negras, compondo 65, 9% dos dados (2014). Ainda, as mulheres negras têm duas vezes mais chances de serem assassinadas do que as mulheres brancas (Ministério da Justiça/2015), entre 2002 e 2013 houve um aumento de 54,2% dos homicídios de mulheres negras (ONU Mulheres e SPM/2015) e entre 2000 e 2014 houve crescimento de 567% da população carcerária feminina, sendo 68% de mulheres negras e em situação de prisão por crimes que poderiam, sem dúvidas, ter utilizadas alternativas penais que não o cárcere (Ministério da Justiça/2015).

E no dia 28 de abril o País parou, quando o povo decidiu que mostraria sua insatisfação a esse pacote de retrocessos com a Greve Geral nas ruas. Com transportes públicos parados, estradas e avenidas bloqueadas, 26 estados mais o Distrito Federal, cruzaram os braços numa união para muitos inédita do sindicalismo brasileiro e dos movimentos sociais, junto aos setores significativos da igreja católica e outros segmentos. Essa união produziu um movimento que não se tem notícia desde 1917, quando ocorreu a primeira Greve Geral no Brasil.

O presidente interino possui a rejeição de 92% dos brasileiros e isso foi comprovado nas ruas com a Greve Geral, através de marchas, piquetes, bloqueios de rodovias e atos culturais em todo o País.

A PEC 241 e a PEC 287 rasgam a Constituição Federal de 1988 e consolidam a perda de direitos duramente conquistados pelos trabalhadores durante décadas, quando colocam em curso pacotes de medidas irresponsáveis que visam para manutenção de privilégios dos mais abastados e promoção do status quo, a retirada de benefícios que foram conquistados a duras penas pela classe que é colocada à margem e que sustenta esse país nas costas. As PECs citadas acima ou o Pacote da Maldade é um período marcado pelo retrocesso, pelo conservadorismo e pela ganância desmedida daqueles que com o poder nas mãos, usam dele para enriquecer a custa da educação, saúde e por fim, da vida do povo que foi posto na base da pirâmide econômica e social do país.


Referências Bibliográficas:

BOSCHETTI, I; SALVADOR, E. da S. Orçamento da seguridade social e política econômica: perversa alquimia. Serviço Social e Sociedade, São Paulo, v.87, p.25-57, 2003

CABRAL,M.S.R.  As políticas brasileiras de seguridade social. Previdência Social. 1995

http://justificando.cartacapital.com.br/2016/12/14/10-materiais-do-justificando-para-entender-o-que-significa-aprovacao-da-pec-241/

http://brasil.elpais.com/brasil/2016/10/10/politica/1476125574_221053.html

http://www.cartacapital.com.br/politica/toda-uma-geracao-esta-condenada-diz-relator-da-onu-sobre-a-pec-55

http://www.cartacapital.com.br/politica/201cpec-241-e-condenacao-de-morte-para-milhares-de-brasileiros201d

http://g1.globo.com/economia/noticia/veja-as-mudancas-que-o-governo-propoe-com-a-reforma-da-previdencia.ghtml  

https://www.nexojornal.com.br/ensaio/2017/O-destino-das-mulheres-pobres-e-negras-no-Brasil-de-Temer

http://www.redebrasilatual.com.br/trabalho/2017/04/greve-geral-de-28-de-abril-ja-esta-na-historia-mas-promete-desdobramentos