Por Mariane Euzebio
O projeto, contemplado pelo edital Negras Potências, realizado pelo Fundo Baobá para Equidade Racial, em fevereiro de 2018, teve como objetivo apoiar soluções de impacto que contribuíssem para o empoderamento de meninas e mulheres negras e que ajudassem na visibilidade de agentes da sociedade civil que trabalham para redução das desigualdades raciais e sociais.
O tema é abordado no projeto Corpos Invisíveis, de Quézia Lopes, um documentário construído a partir da experiência de onze mulheres que, imersas nas suas subjetividades, dividem conosco um pouco da sua humanidade, intimidade, afeto, empoderamento e ancestralidade. Além dos diversos tipos de violência de gênero ao qual foram expostas no decorrer das suas vidas. A ideia inicial parte das experiências individuais de Quézia juntamente com o incômodo da prevalência de mulheres negras nos piores índices de violência e violação de direitos. O documentário também responde à falta de representatividade de mulheres negras na mídia e no audiovisual brasileiro.
Créditos: Naira Soares / Pam Nogueira
Promover a equidade racial é combater arduamente um dos maiores problemas do país, o racismo estrutural, que diariamente mata nesse silêncio retratado por Quézia, em Corpos Invisíveis. Incidir o olhar para essas maiorias minorizadas é uma das metodologias para desorganizar as estruturas discriminatórias desse país e se comprometer com a resolução desse problema social complexo, onde a raça define quem vive e quem morre.
Quézia, que não tinha incentivo e nem perspectiva de políticas públicas que viabilizem projetos voltados para o audiovisual negro brasileiro, ao ser contemplada com o Edital Negras potências, pôde construir parte da sua subjetividade no decorrer desse processo. Segundo Quézia, a chamada do Edital Negras Potências, em 2018, foi um grande achado, pois proporcionou viabilidade naquele momento e tornou o longa-metragem possível. Além disso, ela relata a inconstância na continuidade de editais, o que é um quadro diário na política brasileira diante desse cenário desigual de editais de cultura de modo geral e os de cinema em especial, tanto em âmbito federal quanto estadual e municipal, o que torna a captação de recursos cada vez mais árdua e complexa.
“A gente fica sempre sem saber com qual edital contar para financiar um projeto, quando aplicar etc., se terá nova edição ou não, porque a falta de continuidade, de regularidade é generalizada, principalmente nos editais de políticas afirmativas”, relata Quézia.
Atualmente, a diretora e roteirista está num processo de apresentar o documentário a distribuidoras, salas de exibição e equipamentos culturais e já foi possível agendar sessões em alguns estados do Brasil, especialmente no Rio de Janeiro, de onde é ou mora a maioria da equipe envolvida no filme. A previsão é que a estreia aconteça no segundo semestre deste ano, de 2023.
Para Hebe Silva, coordenadora de Administração e Finanças do Fundo Baobá para Equidade Racial, foi uma experiência de muitos desafios, pois foi possível entender as especificidades da produção de um filme. “Ao analisar a execução financeira de um projeto, nosso empenho é que nossos donatários se visualizem como gestores financeiros do recurso, que é de fato o que são. Gerir o recurso, prezar pela transparência e atingir a execução das atividades propostas”, afirma Hebe.
O projeto, num sentido amplo, deixa sua contribuição às gerações atuais e futuras ao visibilizar histórias, trajetórias e vivências de mulheres negras tão potentes.
Construir referenciais e boas representações das nossas e dos nossos na frente e por trás das telas é fundamental para o processo de cura e emancipação da população negra, que como bell hooks fala, é coletivo, não pode se dar apenas individualmente. “A população negra não é invisível; existe um esforço do sistema para inviabilizá-la. Cabe a nós, e a outros atores políticos responsáveis com a construção de uma sociedade justa, ampliar essas oportunidades”, relata Fernanda Lopes, diretora do Programa do Fundo Baobá.