Liderança negra e feminina se destaca por atuação frente às necessidades de mulheres negras após tragédia climática no RS

Saiba como uma liderança negra, do Coletivo Atinúké, enfrentando os desafios impostos por tragédias climáticas e promovendo igualdade racial e de gênero no RS.

Nina Fola é militante do movimento negro, socióloga, produtora cultural e doutoranda em sociologia. Atualmente é a liderança negra que coordena o Coletivo Atinúké – Pensamento de mulheres negras, um grupo de formação que apoia, estuda e fomenta a produção de conhecimento das mulheres negras desde 2016. O grupo surgiu a partir da iniciativa de três mulheres negras acadêmicas que identificaram que as necessidades da população negra e feminina do Rio Grande do Sul não eram consideradas.

Nina Fola é militante do movimento negro, socióloga, produtora cultural e doutoranda em sociologia. Atualmente é a liderança negra que coordena o Coletivo Atinúké. Ela é uma mulher negra de cabelo crespo com luzes loiras e na foto está de óculos de sol e camiseta amarela.
Nina Fola, liderança negra que coordena o Coletivo Atinúké

A atuação do Coletivo, um dos selecionados no edital Educação e Identidades Negras, do Baobá – Fundo para Equidade Racial, vem se destacando com maior incidência e suprindo cada vez mais as necessidades emergenciais da população negra e feminina após um dos maiores eventos climáticos extremos no Brasil, ocorrido em maio no RS. Elas vêm enfatizando o desfavorecimento em termos salariais, profissionais e acadêmicos da população negra que representa 21,19% dos habitantes do estado segundo o IBGE.

Anteriormente a uma das maiores catástrofes climáticas da história do estado do RS, o coletivo atuava principalmente na formação de mulheres negras a partir de leituras e discussões de produções escritas e artísticas de autoria  das mesmas. Atinúké, nome que significa, em Iorubá, “aquela que merece carinho desde o ventre”, faz um resgate ancestral da potencial intensidade do que é o amor, o carinho e a força transmitida no ventre de uma mulher negra. São forças oriundas da resistência ancestral que as fazem enfrentar desafios de uma sociedade patriarcal, racista e misógina.

No levantamento realizado pelo Observatório das Metrópoles de Porto Alegre, pode-se visualizar que um contingente expressivo da população pobre e preta foi afetado durante as fortes chuvas do mês de maio em bairros populosos da cidade, como o Sarandi, na região Norte, nas ilhas e na região metropolitana, a exemplo de Canoas, Cachoeirinha, Alvorada, Gravataí, Sapucaia do Sul e São Leopoldo. A água tomou conta também de praticamente toda a cidade de Eldorado do Sul e Guaíba. 

Nina explica que nos bairros mais afetados, onde o estado não opera prontamente nem os torna visíveis, são as comunidades de quilombo e terreiros que atuam para identificar e amenizar os impactos oriundos das chuvas que impossibilitam a população negra de viver com dignidade e respeito. São também os quilombos e os terreiros que estão na linha de frente acolhendo, monitorando e fornecendo alimentos básicos e moradia para parte dessa população, pois alguns têm medo de ir até os abrigos e serem vítimas de violências raciais e de gênero nesses locais.

Ao relembrar diversos desafios desse cotidiano, Nina afirma que as necessidades que vieram após o evento climático extremo são muito particulares e ao mesmo tempo muito similares às da pandemia de Covid-19, em 2020. Ela relata que a experiência que obteve participando do edital Educação e Identidades Negras a fez conduzir com maestria todas as adversidades impostas pelas fortes chuvas. Para ela, foi de extrema importância vislumbrar o Fundo Baobá, não só como financiador do recurso recebido, mas também pela base sólida de aprendizado e conhecimento que adquiriu com as várias palestras, assessorias e assistências necessárias nesse processo.

Coletivo Atinúké

Nina constatou que as dificuldades das mulheres negras e, consequentemente, da população negra no RS, ficaram muito mais evidentes e são desproporcionais em relação ao restante da população. Os desafios encontrados por esse grupo são maiores, especialmente as mulheres negras, que sofrem com a falta de acesso a abrigos seguros, cuidados médicos, medicamentos, alimentos adequados e a reestruturação de suas vidas, empregos e renda futuros, além de acesso às políticas públicas.

Diante desses fatos, ela questiona a dificuldade em acessar e identificar as políticas públicas necessárias para enfrentar esse momento caótico. Para suprir as necessidades básicas, é crucial ter dados sobre essa parte da população. Atualmente, o possível e viável é atuar nas questões mais urgentes, como fornecer alimentação e moradia para garantir a sobrevivência dessas pessoas.

“Se é interesse político atender a esse público, é fundamental que sejam implementadas medidas afirmativas de urgência, que mobilizem a sociedade civil, mas também a imediata criação de políticas públicas voltadas para a promoção da igualdade racial e de gênero, visando a garantia de direitos fundamentais, financiamentos, oportunidades de emprego e renda, assim como justiça social para as mulheres negras no Rio Grande do Sul”, afirma Nina. Para ela, é essencial uma ação emergencial direcionada a estas mulheres que, ela acredita, vai ter um reflexo positivo para as pessoas. Quando atuam direcionadas, as mulheres negras modificam um contexto social e não somente uma mulher ou uma família.


“Se é interesse político atender a esse público, é fundamental que sejam implementadas medidas afirmativas de urgência, que mobilizem a sociedade civil, mas também a imediata criação de políticas públicas voltadas para a promoção da igualdade racial e de gênero, visando a garantia de direitos fundamentais, financiamentos, oportunidades de emprego e renda, assim como justiça social para as mulheres negras no Rio Grande do Sul”, afirma Nina. Para ela, é essencial uma ação emergencial direcionada a estas mulheres que, ela acredita, vai ter um reflexo positivo para as pessoas. Quando atuam direcionadas, as mulheres negras modificam um contexto social e não somente uma mulher ou uma família.

Siga o Coletivo Atinúké para acompanhar o trabalho que elas realizam: https://www.instagram.com/coletivoatinuke/

Créditos: Arquivo Pessoal

Edital Carreiras em Movimento aproxima estudante de engenharia da profissional que a inspira

Descubra como o edital "Carreiras em Movimento" pode transformar sua trajetória profissional através do depoimento inspirador de Lívia Mello.

Conhecimento é poder e isso ninguém te tira, filha!

Com os olhos marejados, Livia contou a história da sua família, em especial de seu pai que, infelizmente, não vai ver essa potência brilhando dentro e fora de terras brasileiras. Sim, ele não está mais conosco, mas, assim como eu, ela recebeu de seus pais a semente da paixão pelo estudo, que desbrava caminhos, abre fronteiras e nos faz ver além do óbvio.

A futura engenheira contribui com suas ações para o desenvolvimento do setor de petróleo e gás, focando na transição energética justa e inclusiva e já coleciona vitórias, que vão desde a sua nomeação como Student Energy 2024 Fellow até sua emocionante ida para os Emirados Árabes como uma das poucas selecionadas a participar do importante fórum juvenil de energia, o Irena Youth Forum.

No nosso bate-papo eu vi uma moça cheia de sonhos e pronta para fazer diferença no mundo para sua geração e para as outras que virão e é disso que o mundo precisa, de diversas Livias, movimentando a roda que vai além do óbvio, que nos coloca como protagonistas de uma história que nem sempre foi de sucesso para nós mulheres e principalmente para nós mulheres negras e engenheiras. Que essa Livia inspire outras e outras e outras! Estamos esperando por vocês nesse mundo desafiador, mas extremamente gratificante! Parabéns, Livia. É uma honra poder fazer parte de um capítulo de sua história. Voe!”

O relato acima foi escrito pela engenheira Denise Santos, de 49 anos, que construiu sua carreira na Shell do Brasil. O texto surgiu após conhecer a estudante de Engenharia Livia Mello, 24 anos, de Fortaleza (CE). O primeiro encontro entre elas ocorreu por conta da inscrição de Livia no edital Carreiras em Movimento, do Baobá – Fundo para Equidade Racial. As duas têm histórias que passam por pontos em comum, como a origem humilde e a determinação para quebrar barreiras e alcançar um sonho aparentemente impossível. 

Livia Mello é estudante na Universidade Federal do Ceará. Está no sétimo semestre de Engenharia, o que equivale ao quarto ano de um curso com cinco anos de duração. Sua intenção é especializar-se no segmento de energias não renováveis, ligadas ao petróleo e ao gás natural. O curso é em período integral, o que representa  mais um obstáculo  em sua vida pessoal. A estudante mora com a mãe, Aurilia, e com a irmã, Lilian. As três têm uma vida difícil e Livia teria que contribuir para suprir os gastos da casa, mas o curso em período integral a impede de trabalhar. 

Aurilia tem formação em Gestão Ambiental, mas está desempregada. Lilian, a irmã, é formada em Ciências Sociais e atua como pesquisadora. “É bem difícil para mim, porque o meu curso é integral, tenho aula de manhã e à tarde e eu acabo não conseguindo pegar um trabalho. É difícil ver as contas chegando e eu não ter como ajudar no momento. Já pensei até em desistir da minha graduação. Estamos nos virando da forma que a gente consegue”, afirma. Livia e Lilian perderam o pai há 12 anos. Gilson era um homem da roça que acreditou no sonho e conseguiu alcançá-lo: “Ele teve que estudar muito, formou-se em Engenharia e chegou a engenheiro projetista na Embraer (Empresa Brasileira de Aeronáutica). Meu pai e minha mãe são as duas figuras que me ensinaram que o caminho que eu teria que trilhar seria dentro da educação”, diz a futura engenheira. 

E é na educação que os caminhos de Livia Mello e Denise Santos se cruzam. Ao ser perguntada sobre a presença de mulheres na área de atuação que pretende seguir, Livia foi enfática: “São poucas mulheres. É difícil entrar e é mais difícil ainda ficar. Costumo fazer uma análise de quantas mulheres têm na sala de aula e quantos negros. Geralmente, sou a única mulher negra”, afirma. Com tão poucas mulheres, ela revelou em quem se inspirava no projeto de construção de sua carreira: “Eu me inspiro na Denise, que trabalha na Shell”. Livia passou a acompanhar Denise nas redes sociais a partir de entrevistas dadas pela engenheira, palestras e artigos escritos. 

Denise Santos é a atual gerente de suprimentos da Shell do Brasil. Ela é de Nova Iguaçu, município da Baixada Fluminense. Filha de uma empregada doméstica (Laura) e de um motorista (Manoel), Denise fez sua formação universitária no Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckov da Fonseca, o CEFET, e acabou beneficiada pelo programa de intercâmbio que a entidade mantinha com universidades ao redor do mundo. 

Por seu bom desempenho, Denise foi aceita para fazer sua especialização em Engenharia de Automação (Robótica) na Universitè de Technologie de Compiègne, na França. O domínio do francês e a vida longe de Nova Iguaçu eram as principais barreiras a serem vencidas. Para se manter, Denise recebeu uma subvenção do CEFET para poder viajar, além de uma quantia na caderneta de poupança, arrecadada entre professores e alunos da instituição. No seu retorno ao Brasil, depois de um semestre de estudos e um estágio de seis meses na fábrica da Renault, iniciou sua carreira em outra montadora francesa, a Peugeot-Citroen, que se instalou no Brasil no início dos anos 1990. 

Assim como Denise Santos, Livia Mello sonhou e realizou o projeto de ir para o exterior. O principal problema era o domínio do inglês. Foi para tentar resolver a  pendência com a língua estrangeira que ela fez sua inscrição no edital Carreiras em Movimento, do Fundo Baobá, no qual 298 pessoas foram classificadas. Como parte do Programa Presente e Futuro em Movimento, o edital foi lançado em setembro de 2023, e objetiva promover a ampliação de oportunidades no mercado de trabalho para pessoas negras em empresas privadas. Um recurso que poderia variar entre R$5 mil e R$10 mil foi designado para cada um dos selecionados, que poderão usar esse valor para desenvolver suas carreiras com cursos, compra de equipamentos, intercâmbios e outros itens que possam contribuir para o desenvolvimento pessoal e profissional.  

O foco de Livia Mello foi a participação no Irena Youth Forum: The New Generation of Decision Makers (Irena Fórum  da Juventude: A Nova Geração de Tomadores de Decisão), que aconteceu no mês de abril em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes, e discutiu a questão das energias renováveis com jovens representantes de várias partes do mundo. “Eu me inscrevi! Passei na primeira fase, que foi a análise curricular.  Achei que ia ser só isso, mas não foi. Teria a entrevista por vídeo. Foi terrível, porque foi em inglês. Deram 60 segundos para eu me apresentar e falar do projeto. Fiquei super nervosa”, disse.

Em 12 de março, alguns dias após os testes, Livia ficou sabendo de sua aprovação para estar em Abu Dhabi representando o Brasil. Mas o não domínio do inglês ainda era o seu principal obstáculo. A solução veio com o recurso doado pelo Fundo Baobá. Ela investiu parte do que recebeu em algumas aulas extras de inglês. “Fiquei seis dias em Abu Dhabi. No início, as pessoas perguntavam coisas em inglês e eu respondia em português. Depois, fui me adaptando. Foram 6 dias ótimos. Tive contato com gente de várias partes do mundo, como Jordânia e Índia. Ver as expectativas de cada um com relação aos processos energéticos em seus países foi transformador”, afirmou. 

Além de seguir nas aulas de inglês, Livia pretende fazer outros dois cursos para melhorar suas chances no mercado de trabalho: Excel e Power BI. Ela está se qualificando e sabe que este é o caminho para melhores oportunidades.

Quer saber mais sobre o edital que vai apoiar as carreiras de Livia e tantas outras pessoas? Conheça o Carreiras em Movimento.

Créditos: Arquivo Pessoal

Dança, Corpo e Ancestralidade conectados em prol da cura de um povo

Apostar na dança como ferramenta de ascensão das diversas potências negras é o que a Leandra Silva e a Juliana Jardel, ambas bailarinas e professoras, acreditam. Para elas, a dança é um dos instrumentos mais ricos para a cura e a conexão do corpo negro. Além disso, o movimento corporal, entendido como universal, está presente na história de cada povo, reescrevendo tradições, contando histórias e saberes. E constitui, assim, um denominador comum, que é a conexão que os entrelaça através de oralidade, mitos, danças, cantos, gestos e ritmos, o que resulta na cura de um povo tão sofrido.

A dança ancestral é também um dos temas contemplados na 1ª turma do Programa de Aceleração do Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco. A potência negra na arte brasileira, principalmente na dança, é um grande fator de resistência e contribui com a construção histórica e cultural desse país. As relações que envolvem o negro na sociedade estão inteiramente ligadas ao enfrentamento do racismo, discriminações, intolerâncias, homofobias e diversas outras formas de discriminação que perpassam significativamente pelo o que é ser um artista negro. Por isso, se torna urgente revelar e inserir novos corpos negros e suas diversas ações de militância e ativismo nas artes, culturas, educação, politica etc.

Foi com os projetos Movimentos Atlânticos e Verve-Déjà Vu Afrofuturista 1º Ato – Ancestralidade High Tech, respectivamente propostos pela bailarina, professora de dança e doutoranda em Antropologia Social na Universidade Federal de Goiás (UFG), Juliana Jardel, e pela também bailarina, professora e jornalista Leandra Silva, que ambas conseguiram receber investimento e desenvolver processos criativos que possibilitaram crescimento pessoal e profissional.

Leandra Silva explica que fazer parte do Programa foi uma das melhores coisas que poderia ter acontecido, pois foi a primeira vez que ela vivenciou esse nível de investimento profissional. Ela acredita que a iniciativa do Baobá, em querer formar lideranças negras, vai na contramão do que o Brasil está acostumado. “Essa bolsa me deu um chão e essa é uma das coisas mais revolucionárias que eu vejo na proposta do Baobá, que é o investimento financeiro direto e real em mulheres negras; aí eu tive a dimensão do quanto eu posso chegar simplesmente tendo um investimento mínimo”, relata a coreógrafa. 

A paulistana dança e atua como professora há 20 anos e reconhece ali um lugar de cura, no qual a partir das tecnologias ancestrais consegue fundamentar processos criativos que fortalecem ainda mais a sua autoestima e as dos seus, o que nos leva a cada vez mais a refletir sobre o papel do corpo negro na dança contemporânea.

“O desenvolvimento do projeto se deu com muitas transformações, e altos e baixos. Tive assessoria de um coach do Baobá, oficinas, reflexões e muitas trocas com outras mulheres negras agraciadas pelo Fundo. Foi bastante inspirador estar com essas mulheres de tanta criatividade e coragem. Mulheres gigantes de distintas trajetórias”, recorda Leandra. A dançarina conquistou, além de formação e conhecimento, a aprovação em outros editais. O dinheiro captado não foi para o próprio benefício, todavia trouxe paz, alegria e trabalho para todos da sua comunidade de dança. 

Nestes cinco anos, o programa se destacou como uma das mais importantes iniciativas lideradas pelo Baobá – Fundo para Equidade Racial, que atua há mais de 12 anos em prol da ascensão e do acesso da população negra a capacitações. Essa ação, desenhada e implementada por muitos parceiros e colaboradores, deixou como legado experiências inesquecíveis e duradouras não só para as mulheres negras donatárias, mas também para as que desenvolveram o projeto desde sua concepção.

Para as participantes da primeira edição do Programa de Aceleração do Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco, o Fundo Baobá possibilitou uma estrutura pessoal que permitiu a dedicação delas em outros projetos que somaram na melhoria da Cia de Dança. A realização do festival ‘Déjà vú Afrofuturista Ancestralidade HighTech’ é fruto e legado desse investimento.  

Para mais detalhes e resultados do Programa de Aceleração de Lideranças Femininas: Marielle Franco, acesse este link.

Conheça a sergipana Glória Stefany, futura comissária de voo, uma das selecionadas no edital Carreiras em Movimento

Na noite de 4 de agosto de 1996, em Atlanta, capital do estado da Georgia, nos Estados Unidos, acontecia a cerimônia de encerramento dos Jogos Olímpicos. A mais de 7.000km de distância, em Aracaju, capital do estado do Sergipe, no nordeste brasileiro, Maria Patricia Santos, grávida, assistia ao lado da mãe, Maria Helena, o momento em que a cantora cubana naturalizada norte-americana Gloria Estefan cantava a música Reach (Alcançar), que era tema dos Jogos. A performance encantou Maria Helena que disse: “Se nascer uma menina, vai se chamar Gloria Estefan. Não deu outra. Mas, por obra do cartório, o Estefan se transformou em Stefany. 

Glória Stefany, a menina que nasceu em 1996, hoje é uma mulher de 27 anos que carrega um sonho: tornar-se comissária de bordo. Para isso, ela vem enfrentando uma difícil batalha. Glória ficou desempregada durante a pandemia da Covid-19. A função de merendeira que exercia em uma escola foi descontinuada quando as aulas foram interrompidas. Casada com Leonardo, um atendente de farmácia que dá todo apoio e incentivo ao desejo profissional da mulher, ela não mede esforços e, entre outros trabalhos, tem feito faxinas. 

A sergipana é uma das 298 pessoas classificadas pelo edital Carreiras em Movimento, lançado pelo Baobá – Fundo para Equidade Racial em setembro de 2023. Como parte do Programa Presente e Futuro em Movimento, o edital objetiva promover a ampliação de oportunidades no mercado de trabalho para pessoas negras em empresas privadas. Um recurso de R$ 5 mil a R$ 10 mil foi designado para cada um dos selecionados, que poderão usar esse valor para desenvolver suas carreiras com cursos, compra de equipamentos, intercâmbios e outros itens que possam contribuir para o desenvolvimento pessoal e profissional. 

Acostumada a uma vida de luta, Glória cresceu em uma família de 10 irmãos,  filhos de uma mãe solo. Aos 14 anos já trabalhava em uma feira livre e também estudava. Quando a família começou a enfrentar problemas financeiros, sua vida passou por uma mudança radical. “Precisei sair da escola. Parei de estudar e comecei a trabalhar como babá. Tive um convite para trabalhar em Navegantes, Santa Catarina, tomando conta de um bebê. Saí de Sergipe e fui para lá. Minha primeira viagem de avião”, diz.

A viagem foi o ponto de inflexão na vida dela. A movimentação nos aeroportos, o glamour das aeromoças e pilotos, a magia das aeronaves plantaram um desejo na cabeça da então jovem de 17 anos: ser uma comissária. “Aquela foi a experiência que mudou totalmente meu ponto de vista. Uma menina simples, para quem andar de ônibus não era uma coisa acessível, estava andando de avião. Fiquei admirada com tudo aquilo e me apaixonei pela aviação”, afirma.

A paixão virou quase uma obsessão. Ela passou a pesquisar tudo sobre aviação, principalmente os temas relativos à formação de uma comissária. Também sabia que para tentar alcançar seu objetivo teria que ter uma boa formação. Portanto, concluir o Ensino Fundamental e o Ensino Médio era obrigação. Para recuperar o tempo que ficou sem estudos, cursou o Ensino para Jovens e Adultos, o EJA, modalidade educacional voltada àqueles que não tiveram oportunidade de fazer o Ensino Fundamental e o Ensino Médio na idade prevista. Depois de concluir, Glória Stefany foi além: conseguiu a aprovação para o curso de Letras na Universidade Federal de Sergipe, onde está no sétimo período, restando dois para a conclusão do curso. 

Os desafios nos estudos têm se mostrado superáveis. As considerações preconceituosas feitas pelas pessoas são tentativas frustradas de impor obstáculos. E as principais têm a ver com o cabelo de Stefany. “Mas eu nunca vi aeromoça de cabelo cacheado; “Será que você vai se adaptar ao uniforme?”; “Nordestina pode ser aeromoça?”; “Você já está com 27 anos. Aeromoça tem que ser jovem!”. Porém, como canta Gloria Estefan em Reach: “Alguns sonhos vivem para sempre no tempo (Some dreams live on time forever).” E o sonho da Glória brasileira está bem vivo.  

Ela fala da importância do edital Carreiras em Movimento na busca pelo seu objetivo. “O edital me dá a possibilidade de eu não ficar só no sonho. Eu passei a ter a prática da coisa. Passei a ter um espaço maior para aprender. Aqui em Sergipe não tem escola para essa formação, o curso é semipresencial e os testes são feitos em São Paulo. Fiz meus testes em São Paulo, fiquei três dias por lá. O edital me proporciona poder pagar o curso com o recurso que recebi”, afirma. 

Em tempo: A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), órgão que regula e fiscaliza as atividades da aviação civil no Brasil, publicou em seu site oficial que após os testes feitos em São Paulo, Glória está apta a voar, restando apenas conseguir certificações complementares. Glória Stefany acaba de decolar em direção ao seu sonho!

Alunos adolescentes do Instituto Oportunidade Brasil (IOB) lançam no Espírito Santo livro com relatos de suas experiências com o racismo

Um jovem negro de nome Justyce sofre uma abordagem policial no momento em que ajudava sua ex-namorada, que estava embriagada, a voltar para casa. Os policiais suspeitam que o rapaz iria cometer algum ato criminoso contra a moça. Justyce é tratado com crueldade pelos policiais. Nenhum de seus direitos como cidadão é respeitado. A sua palavra é negada. O fato o revolta. Para se livrar do trauma, ele decide escrever cartas para Martin Luther King Jr, o grande ícone da luta pelos direitos civis dos negros nos Estados Unidos. O principal questionamento de Justyce ao pastor King era sobre o que ele, King, faria se sofresse aquele tipo de violência racial. 

O enredo acima, similar ao que acontece com jovens pretos no Brasil,  é a base do livro Cartas para Martin (veja aqui a resenha), da escritora norte-americana Nic Stone, 38 anos, publicado em 2017. Ele foi utilizado pelos alunos do Instituto Oportunidade Brasil (IOB), de Vitória, no Espírito Santo, na oficina Clube da Leitura. A proposta dada a eles, todos oriundos da periferia de Vitória, foi que se colocassem no lugar de Justyce, fizessem uma análise da realidade que vivem, principalmente a da questão racial, e colocassem no papel as suas impressões. Dos participantes da oficina, dez tiveram os trabalhos escolhidos. Seus textos acabaram se transformando no livro Relatos de Reexistência, lançado na noite de 13 de maio de 2024. 

Relatos de Reexistência é resultado da proposta apresentada pelo Instituto Oportunidade Brasil para o edital Educação em Tecnologia, do Baobá – Fundo para Equidade Racial. O edital, lançado em maio de 2023, foi a primeira parceria entre o Fundo e o MOVER – Movimento pela Equidade Racial. Ele apoiou organizações e empresas negras que têm como objetivo contribuir, por intermédio de processos de formação educacional, com o aumento da capacidade de pessoas negras se inserirem no mercado de trabalho na área tecnológica ou dentro de suas aptidões. 

O trabalho de construção do livro a partir dos depoimentos escritos em cartas pelos alunos foi coordenado por Juliana Ferrari, doutora em Educação. Seu objetivo era estimular o gosto pela leitura, aprimorar a escrita e desenvolver o pensamento crítico, fundamental para fazer a análise sobre a sociedade em que vivemos. 

Para a fundadora e presidente do IOB, Veronica Lopes, mestre em Administração pela Fucape, a importância do livro está na sua representatividade como peça de resistência. “Estamos em um local (o Espírito Santo) em que não há muito espaço para esse tipo de literatura. É uma vitória ter um livro escrito por jovens negros falando justamente sobre a resistência”, afirma. 

Veronica Jesus. presidente e fundadora do IOB (Instituto Oportunidade Brasil)

Veronica Jesus. presidente e fundadora do IOB (Instituto Oportunidade Brasil)

Relatos de Reexistência teve tiragem inicial de 100 exemplares. A aquisição pode ser feita pelo instagram do Instituto Oportunidade Brasil ao preço de R$ 45,00. 

Baobá investe em Educação para melhores oportunidades às pessoas negras

Em uma manhã do final de fevereiro de 2023, uma moça de então 27 anos, mãe solo, faz uma revelação agradecida: “Sou preocupada com o meu futuro e com o da minha filha. Sei que o futuro dela será outro quando eu concluir um curso superior. Quero mostrar que é possível. Preciso estudar e trabalhar por mim e pela minha filha”, disse Thauany Aniceto de Souza, estudante de Enfermagem das Faculdades Metropolitanas Unidas, as FMU, em São Paulo. Na mesma manhã, Karina Leal de Souza comemorava a sua entrada no curso de Arquitetura na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU), da Universidade de São Paulo (USP). Uma grande força veio da mentoria que Karina recebeu: “Minha mentora buscou um curso superior dez anos após ter concluído o Ensino Médio. Senti que tinha muito o que aprender com ela”, disse.  

As trajetórias de vida de Thauany Aniceto e Karina Leal são semelhantes. Ambas alcançaram o objetivo de entrar em uma instituição de ensino superior. Além de sua dedicação, contaram com o apoio do Programa Já É. Entre 2021 e 2022, o Baobá – Fundo para Equidade Racial, com apoio da MetLife Foundation,  implementou o Já É, um programa com o objetivo de ampliar oportunidades para jovens negros e negras de até 26 anos, moradores de São Paulo ou da Região Metropolitana. O programa financiou cursos preparatórios para o vestibular, além de vale alimentação, vale transporte, e um notebook com acesso à internet visando aulas online, dadas as necessidades impostas pela pandemia da Covid-19. A turma de 2021/2022 teve 85 estudantes inscritos. Ao final do período, 32 deles foram aprovados nos vestibulares, sendo que 12 em instituições públicas (USP, UNIFESP, UNESP e UFRJ) e 20 em privadas.  

Os depoimentos de Thauany e Karina foram colhidos durante um encontro que juntou estudantes beneficiados pelo Já É e colaboradores da MetLife que fizeram trabalho de mentoria para eles. O Já É contou também com uma mentoria em formato de encontros virtuais. Cada sessão tinha duração de 1 hora e poderia ser quinzenal ou mensal, dependendo do acordo estabelecido entre mentores e mentorados. As conversas foram pautadas por temas como: ingresso no mercado de trabalho, habilidades socioemocionais e comportamentais, carreira e projeto de vida. 

Dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) confirmam por que o apoio do Já É para o acesso da juventude negra ao ensino superior é necessário. Com relação ao ensino superior, as pessoas brancas com graduação completa equivalem a 6,5% da população brasileira entre 18 e 24 anos. Entre os pretos e pardos, apenas 2,9% da população entre 18 e 24 anos tem graduação completa. Já se o recorte for feito com base no Ensino Médio, são 9 milhões de brasileiros que não o completaram. Desses, 71,6% são pretos e pardos. Entre brancos, a porcentagem cai para 27,4%. A pesquisa também revelou que entre os 48,5 milhões de pessoas com idade entre 15 e 29 anos, 19,8% nem trabalham nem estudam. Pretos e pardos equivalem a 22,4% enquanto brancos são 15,8%. As discrepâncias são grandes e de alguma forma têm que ser eliminadas. 

O Dia Internacional da Educação, 28 de abril, foi criado no ano 2000 durante o Fórum Mundial da Educação, no Senegal, em uma reunião de 180 países que discutiram sobre quais metas alcançar para seus povos em termos educacionais. A Educação tem como objetivo o crescimento das pessoas e a possibilidade de melhorar as suas vidas e a dos seus, porque além de trabalhar o desenvolvimento de suas competências, potencialidades e habilidades, contribui para ascensão de uma parte da população ainda invisibilizada. Ela é um direito de todos, independentemente de raça, cor, origem, gênero ou religião e acontece por meio da conexão ensino-aprendizagem e não necessariamente em espaços formais, como escolas.

Embora a Educação seja um direito de todos e um dever do Estado, na prática brasileira não é bem assim que isso acontece. E, por isso, ter acesso a ela é uma forma de ampliar o ideal democrático. A nação que investe na educação de seu povo está contribuindo para que ocorra crescimento econômico, redução da pobreza, maior oferta de trabalho e maior entendimento sobre o que são os direitos individuais. Ela permite que os indivíduos ampliem sua capacidade para modificar a realidade de suas comunidades.

Organizações do Terceiro Setor, como o Baobá, têm atuado e feito trabalho fundamental para que a desigualdade no que se refere ao acesso à Educação seja banida de nosso cotidiano. O Baobá priorizou a Educação como um de seus pilares para, e principalmente, promover o enfrentamento ao racismo institucional nos ambientes escolares; contribuir para a ampliação das capacidades socioemocionais de jovens e adolescentes; incrementar a entrada e contribuir para a permanência de negros e negras no ensino superior, além de incentivar a formação de novas lideranças negras nas ciências, na tecnologia e na inovação. Nos últimos quatro anos, além do Programa Já É, o Fundo lançou também o Educação em Tecnologia, o  Educação e Identidades Negras e o BlackStem.  Ao todo, foram investidos mais de R$ 2 milhões como dotação a esses programas.

O Impacto de um edital no crescimento da capacidade de intervenção do Coletivo Filhas do Vento

Para Mariana Paz e Emanuele Nascimento, do Coletivo Filhas do Vento (PE), uma das quinze organizações selecionadas no apoio coletivo, a iniciativa do Baobá foi de extrema importância para o desenvolvimento político e para a capacidade de intervenção das lideranças dentro das suas comunidades. Segundo elas, através das jornadas formativas realizadas foi possível repensar as estratégias de atuação e aproximação com as mulheres negras da comunidade, além de desenvolver novos contatos e novas parcerias que surgiram como consequência da participação no programa.

“O projeto foi, na perspectiva profissional, minha principal descoberta. Revelou que eu sou boa em gestão financeira e que a gente tem potencial de fazer aquilo que tem vontade na área dos projetos”, diz Emanuele Nascimento.

Com o recurso destinado pelo  programa, o Coletivo Filhas do Vento realizou, para o dia Dia da Mulher Negra Latino Americana e Caribenha, o lançamento de uma série de vídeos com temas relevantes, como: “Aláfia: Revoluções Feministas Negras”, sobre as lutas das mulheres negras; “Jovens Insurgências”, sobre juventude negra; e “Enraizando Saberes Ancestrais”, sobre educação antirracista. Além de apresentar a trajetória dos até então quase cinco anos de atuação do coletivo no vídeo “Ventania”, o coletivo também abordou a experiência na execução do projeto do Programa de Aceleração em meio ao contexto da pandemia de covid-19, no vídeo “Travessias”

Há cinco anos, o Baobá – Fundo para Equidade Racial criou o Programa de Aceleração do Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco. Lançado em setembro de 2019, com o apoio da Kellogg Foundation, Ford Foundation, Instituto Ibirapitanga e Open Society, o programa contou com dois editais. O primeiro foi voltado para o apoio de grupos, coletivos e organizações de mulheres negras. O segundo para apoio individual a lideranças negras. Ambos tinham como principal objetivo ampliar habilidades de mulheres que já desempenhavam papel de liderança em suas comunidades em instituições públicas, organizações da sociedade civil ou no mundo corporativo.

Nestes anos, o programa se destacou como uma das mais importantes iniciativas lideradas pelo Baobá – Fundo para Equidade Racial, que atua há mais de 12 anos em prol da ascensão e do acesso da população negra a capacitações. 

Essa ação, desenhada e implementada por muitos parceiros e colaboradores, deixou como legado experiências inesquecíveis e duradouras não só para as mulheres negras donatárias, mas também para as que desenvolveram o projeto desde sua concepção.

Nos dois editais, no coletivo e no apoio individual, foram investidos 4 milhões de reais diretamente e 400 mil indiretamente que foram direcionados a assessorias, jornadas formativas e treinamentos realizados por especialistas e por membros da equipe do Baobá. Ao todo, foram selecionadas 15 instituições no apoio coletivo e 63 mulheres no apoio individual, sendo realizadas 42 horas de formação política, 15 horas no enfrentamento dos efeitos psicossociais do racismo, 300 sessões de coach individual, 45 sessões de coach institucional, 200 beneficiárias diretas, 520 beneficiários indiretos e mais de 1.000 atividades realizadas para compartilhamento de conhecimento.

Comemorar esse feito depois destes anos é, sem dúvida, ter a certeza de que com os resultados alcançados foi possível estabelecer um compromisso com diversas trajetórias de mulheres que hoje ocupam posições de poder e influência, através de investimentos em seus planos de desenvolvimento individual e no fortalecimento coletivo das organizações que são lideradas por elas.

Para o Baobá – Fundo para Equidade Racial a eficiência do programa e sua influência nos territórios de atuação deixa um legado importante no que se propôs, contribuindo assim para o desenvolvimento social e para o bem viver de uma parte da população ainda invisibilizada. Para mais detalhes e resultados do Programa de Aceleração de Lideranças Femininas: Marielle Franco, acesse este link.

Baobá – Fundo para Equidade Racial e B3 Social lançam edital de bolsas no exterior para estudantes negros brasileiros

Conseguir uma bolsa de ensino superior pode ser desafiador, especialmente para estudantes negros. Para o Baobá – Fundo para Equidade Racial e B3 Social, isso não deve ser um obstáculo para que jovens negros realizem o sonho de estudar nas melhores universidades ao redor do mundo. Por isso, estas duas instituições estão unindo forças para apoiar financeiramente jovens negros aprovados em cursos de graduação STEM (ciências, tecnologia, engenharia e matemática), que correspondem a ciências exatas, em universidades estrangeiras.

As inscrições para o edital Black STEM já estão abertas e podem ser feitas pelo link https://baoba.org.br/blackstem/ até 15 de abril de 2024.  São cinco bolsas de estudo de até R$ 35 mil por um período de 12 meses a partir de 2024, com a possibilidade de renovação anual até a conclusão de seus cursos. O objetivo é apoiar a permanência do aluno no exterior com despesas operacionais, como aluguel, transporte, alimentação e material acadêmico.

O edital conta também com o apoio da BRASA (Brazilian Student Association), uma instituição sem fins lucrativos que visa empoderar e conectar a próxima geração de líderes brasileiros por um país melhor. A BRASA é liderada por estudantes que estudam no exterior e oferece bolsas de estudo para jovens que desejam estudar fora do Brasil, já tendo mais de 45 bolsistas em sua história. 

Segundo dados da pesquisa Selo Belta 2023, da Associação Brasileira de Agências de Intercâmbio, o mercado brasileiro de educação internacional registrou um crescimento de 18% em 2022 em comparação a 2019, consolidando em 455.480 estudantes.

Para Tainá Medeiros, coordenadora de projetos do Fundo Baobá, “o programa busca ser reconhecido como uma oportunidade que inspire cada vez mais jovens, em especial aqueles oriundos da rede pública de ensino, que nunca consideraram estudar nas áreas de STEM, especialmente no exterior, ou que achavam isso impossível.” Ela afirma que “o Fundo Baobá não visa apenas apoiá-los individualmente, mas também deseja incentivar mudanças profundas que possam criar oportunidades mais justas para futuras gerações de jovens negros que desejem ingressar nessas áreas.”

A contribuição da população negra para o avanço das ciências e da tecnologia é inegável. No entanto, ainda existem barreiras que podem dificultar o acesso a oportunidades no exterior. O objetivo deste edital é justamente reduzir essas barreiras e promover a inclusão de talentos negros em áreas STEM, onde estão subrepresentados. Dados do Censo da Educação Superior, do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, o Inep, evidenciam a importância de iniciativas que visam a entrada e permanência de pessoas negras nesses espaços. 

Além de buscar aumentar a diversidade étnica nesses espaços, o edital Black STEM quer também enriquecê-los com a perspectiva e o pensamento crítico dos estudantes negros brasileiros.

Confira o site do edital e faça a sua inscrição: https://baoba.org.br/blackstem/

Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial

Sharpeville, bairro de Vereeniging, África do Sul, 21 de março de 1966. Vinte mil pessoas negras realizavam um protesto pacífico contra a Lei do Passe, uma determinação do governo sul-africano da época, que obrigava negros a portarem cartões de identificação constando os locais para onde eles poderiam ir. A África do Sul vivia sob o regime do apartheid, que determinava a separação do povo negro. A polícia local, armada, interveio de forma violenta. 69 pessoas foram mortas. 186 ficaram feridas. O fato ficou conhecido como o Massacre de Sharpeville. A ONU – Organização das Nações Unidas instituiu em 21 de março de 1979 o Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial como homenagem aos mortos e feridos.

O parágrafo I da Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, define o seguinte: “toda distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que tenha por objeto ou resultado anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício em um mesmo plano (em igualdade de condição) de direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro campo da vida pública é discriminação racial”. 

Segundo o censo de desigualdades sociais de 2022,  levantado pelo IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, em 2021, a linha de pobreza monetária de pessoas pobres no país era de 18,6% entre os brancos e praticamente o dobro entre os pretos (34,5%) e entre os pardos (38,4%), enquanto a taxa de informalidade da população ocupada era 40,1%, sendo 32,7% para os brancos, 43,4% para os pretos e 47,0% para os pardos, e o rendimento médio dos trabalhadores brancos (R$ 3.099) superava muito o de pretos (R$1.764) e pardos (R$1.814).

Diante dos dados apresentados acima, é inevitável não apontar a necessidade de reparação histórica e ações que promovam a pessoas negras a possibilidade de viver um dia 21 de março que faça jus à Luta pela Eliminação da Discriminação Racial, e que ações promovidas e ofertadas, como as do Baobá – Fundo para Equidade Racial, sejam cada vez mais frequentes e visibilizadas diante da necessidade de evidenciar as vulnerabilidades que envbolvem a vida de pessoas negras (pretas e pardas).

Em 2021, Baobá – Fundo para Equidade Racial  lançou o Programa Já É: Educação e Equidade Racial, com o objetivo de ampliar as oportunidades de jovens negros de acessar o ensino superior, priorizando as universidades públicas. O Programa foi dirigido a jovens de até 26 anos, residentes na cidade de São Paulo e região metropolitana, tendo 75 estudantes presentes até dezembro de 2021. 43% deles foram aprovados em vestibulares.

O Baobá – Fundo para Equidade Racial é uma organização que vem abrindo caminhos para apoiar pessoas negras em diferentes exercícios sociais há 13 anos. Durante esse período, muitos editais foram colocados minuciosamente em prática no intuito de possibilitar que pessoas negras ocupem seus locais de direito na sociedade, que por intervenção do racismo as exclui de espaços de autonomia e liderança.

Edital Carreiras em Movimento: Baobá promove primeiro encontro para orientar os 337 selecionados

Representantes de 20 estados mais o Distrito Federal receberam orientações sobre edital que promove conhecimento em busca da empregabilidade

A participação em um edital do Baobá – Fundo para equidade Racial é o início de uma jornada de transformação e conhecimento. Para as 337 pessoas selecionadas pelo edital Carreiras em Movimento, a nova jornada foi iniciada em fevereiro com a realização da 1ª Reunião de Orientações Gerais do edital. Resultado de  uma parceria entre o Fundo Baobá e o Mover – Movimento pela Equidade Racial, o edital faz parte do Programa Presente e Futuro em Movimento, que tem como objetivo o desenvolvimento de pessoas negras em competências técnicas, habilidades socioemocionais e comportamentais, além de elevar o potencial de empregabilidade das mesmas nos setores privado, público e no terceiro setor. 

O edital Carreiras em Movimento foi lançado pelo Baobá – Fundo para Equidade Racial em setembro de 2023. Sua dotação é de R$ 5 a R$ 10 mil que deverão ser usados pelos beneficiados de forma estratégica para ampliar seus potenciais de empregabilidade por intermédio de, por exemplo, cursos de formação, aquisição de equipamentos, intercâmbios e formas de aprendizado ou investimento  que possam catapultar suas carreiras. 

As 337 pessoas selecionadas representam 20 estados brasileiros mais o Distrito Federal. O encontro aconteceu de forma virtual em dois períodos, e a mediação ficou a cargo da coordenadora de Projetos do Baobá, Tainá Medeiros. Ela iniciou o encontro colocando os propósitos. “Teremos algumas reuniões, alguns encontros reservados para que a gente tire dúvidas, converse e dê detalhes sobre as atividades que estão previstas. Quero dizer que é uma alegria ter esse momento com vocês e aproveito para dar as boas-vindas”, disse. 

As perguntas eram encaminhadas pelos beneficiados para um chat para respostas posteriores. Algumas das dúvidas giraram em torno dos seguintes temas: entrega de documentação, emissão do contrato; abertura de conta bancária; data de depósito para as parcelas de R$ 5 mil e de R$ 10 mil; obrigatoriedade de participação nas jornadas formativas e prestação de contas. 

Tainá Medeiros encerrou o encontro falando sobre prioridades do Baobá.: “O intuito do Baobá ao construir um edital é conseguir organizar possibilidades que possam contribuir para o enfrentamento dos impactos do racismo e para a ampliação de oportunidades justas para a população negra”. E concluiu: “Nós vamos estar juntos, sempre dialogando, apoiando vocês para informar o que vai ser feito e como terá que ser feito”. 

As dúvidas dos selecionados poderão ser sanadas a partir desses contatos:  

email: programa_presente_futuro_em_movimento@baoba.org.br

 whatsapp: (11) 9 6062-0978 

Iniciativas do Baobá têm como foco principal a Justiça Social

O Dia Mundial da Justiça Social, comemorado no último dia 20 de fevereiro, foi estabelecido pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) em novembro de 2007, com o objetivo de desenvolver um diálogo entre os países para garantia de justiça, dignidade e direitos humanos de modo equânime para todas as pessoas. A data também está atrelada a vários aspectos urgentes da sociedade, como igualdade de oportunidades, acesso à educação e à saúde, inclusão e respeito à diversidade, justiça criminal e econômica, direitos humanos, entre outros.

Para o Baobá, justiça Social é uma importante bússola. Ao longo de seus 12 anos de atuação, a organização vem desenvolvendo estratégias assertivas para perpetuar esse pacto coletivo em promoção de uma reparação social. Essa atuação consiste em transferir recursos, através de editais, para que agentes de transformação social selecionados possam promover transformações e mudanças reais. É através desses agentes que o Baobá amplia seu escopo de atuação, alcançando lugares, territórios e organizações onde a filantropia tradicional ainda não opera.

Na prática, o modus operandi do Baobá é o de uma agenda filantrópica baseada nos valores da ética, efetividade na gestão, transparência e justiça social, que é fortalecida através de doadores no Brasil e no exterior, os quais acreditam que é urgente discutir a justiça social como uma agenda prioritária na busca constante por políticas públicas internacionais e nacionais. 

Até 2022, foram mais de 870 iniciativas apoiadas, que tiveram impacto direto nas vidas de mais de 1 milhão de pessoas e reforçam o compromisso do Baobá – Fundo para Equidade Racial com as organizações e lideranças negras que protagonizam essa importante transição e realizam grandes ações de enfrentamento ao racismo estrutural. Um exemplo é o Edital Vidas Negras: Dignidade e Justiça, que faz parte do programa Equidade Racial e Justiça, aberto em 2023. Por meio dele, o Baobá apoiou 10 projetos em todo território nacional. Eles tiveram a oportunidade de fortalecer estratégias de ativismo, resistência e resiliência frente às injustiças raciais recorrentes. 

Segundo a diretora de Programa, Fernanda Lopes, para se pensar a Equidade Racial e Justiça, é necessário reconhecer que a justiça é um conjunto de mecanismos que busca harmonizar pretensões e interesses conflitantes de uma sociedade. E ao exercer tais direitos através do edital, foi possível alinhar a justiça com o cenário de dignidade plena para a população negra, contando com o apoio dessas 10 instituições selecionadas que são comprometidas com o bem viver de uma parcela da sociedade que ainda é invisibilizada.

Ao realizar esse movimento o Baobá – Fundo para Equidade Racial garante o acesso aos direitos, previstos em lei, na tentativa de corrigir qualquer desigualdade e ilegalidade não combatida pelo Estado. Essa forma de agir faz do Baobá um dos protagonistas na perpetuação da filantropia participativa e um forte aliado para que as organizações e instituições comunitárias consigam mapear determinados problemas e difundir possíveis soluções, diminuindo o cenário atual de desigualdade social e provendo a justiça social entre todos.

Ato de doar humaniza as pessoas e mobiliza a sociedade por mudanças

As psicólogas canadenses Elizabeth Warren Dunn e Lara Beth Aknin, junto com o também psicólogo norte-americano Michael Irwin Norton, realizaram uma pesquisa que determinou que o sentimento de felicidade de algumas pessoas era maior quando elas destinavam parte do dinheiro que ganhavam na promoção do bem estar para terceiros. Ou seja: promover o bem para outras pessoas é tão ou mais compensador que fazer algo em causa própria. 

Quando se estimula o bem de alguma forma, regiões do cérebro que geram a sensação de prazer são ativadas, o que produz o sentimento de felicidade. A importância dessa pesquisa para quem atua no terceiro setor está diretamente ligada à ação de doar. O terceiro setor vive do que é ofertado por pessoas físicas e por pessoas jurídicas (empresas de grande, médio e pequeno porte).   

Os agentes que atuam no terceiro setor no Brasil têm uma preocupação em comum: como motivar muito mais gente a fazer doações que propiciem bem estar para um sem número de outras pessoas em situação de necessidade? Como chegar a esses potenciais doadores? Como falar com eles e elas? Como incentivar?

A recente pesquisa realizada pelo IDIS (Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social), em 2022, determinou que entre os brasileiros com idade superior a 18 anos, 84% fizeram algum tipo de doação: dinheiro, tempo dedicado (trabalho voluntário) ou mesmo bens. As pessoas dentro dessas características tinham rendimento que ultrapassava um salário mínimo, atualmente em R$ 1.412,00 (vigente desde 1.º de janeiro de 2024).  

Ao serem perguntados sobre se as organizações do terceiro setor dependiam da colaboração das pessoas para funcionar, 58% responderam que sim. Ainda se aprofundando no mesmo tema, 44% reconheceram a importância do trabalho do terceiro setor na busca de solução para problemas sociais e ambientais no Brasil. Outro dado interessante é que o ato de doação direta para ONGs ou projetos socioambientais foi feito por 36% dos entrevistados na pesquisa do IDIS.   

O Baobá – Fundo para Equidade Racial, que se direciona, de forma exclusiva, à promoção da equidade racial para a população negra no Brasil, vem realizando seu trabalho de captação de recursos há 12 anos. Tem firmado importantes parcerias com empresas, fundações e institutos, parceiros que têm dado importante apoio  financeiro. O Baobá já investiu mais de R$ 20 milhões em 19 editais, 861 iniciativas e ações ao longo dessa jornada. Já são mais de 800 mil pessoas impactadas, com investimentos nas cinco regiões do país. 

O Fundo Baobá já conta com doações mensais de pessoas aliadas à nossa missão. Esse número, entretanto, precisa crescer. É necessário alcançar muito mais gente que acredite que o enfrentamento ao racismo é primordial para que o Brasil seja um país justo, de oportunidades igualitárias e que promova o acesso ao ensino, à saúde e ao trabalho. Portanto, divulgar e promover a filantropia para a equidade racial é fundamental.  

Confiança, conexão, empatia, desejo de igualdade e justiça são sentimentos que motivam alguém a se engajar em algo. Não há transformação social sem mobilização. 

Mercado de trabalho brasileiro ainda reproduz o racismo da nossa sociedade

Basta olhar as publicações e editorias especializadas em economia e negócios da imprensa brasileira para constatar que os dirigentes empresariais ainda são maciçamente brancos. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) comprovam essa impressão. Embora correspondam a 56,1% da população em idade de trabalhar, os negros ocupam apenas 33,7% dos cargos de direção e gerência. De forma geral, a remuneração mensal de um profissional negro é 39,2% menor que a de uma pessoa não negra. Fora do mercado de trabalho, a situação é oposta: 65,1% das pessoas desocupadas são negras.

Esses números, referentes ao segundo trimestre de 2023, não trazem qualquer novidade em relação a levantamentos anteriores. O paradigma colonial, segundo o qual quem manda tem uma cor e quem obedece, outra, permanece presente no século 21, gerando uma incompatibilidade com a garantia de empregabilidade formal e autonomia financeira para a população negra.

A contradição acontece em várias camadas e talvez a constitucional seja a mais óbvia. Ao condenar o racismo, a Constituição Federal implicitamente sugere que ele precisa ser combatido – e uma das formas mais eficientes é justamente a presença de pessoas negras no mercado de trabalho. Esse, aliás, tem sido um dos pilares da atuação do Fundo Baobá desde sua criação, em 2011. A mais recente iniciativa nesse sentido foi o edital Carreiras em Movimento que visa apoiar pessoas negras que atuam no setor privado, auxiliando  no desenvolvimento e aperfeiçoamento de suas formações e nas mais diversas habilidades socioambientais existentes. No decorrer de 2024 será possível conhecer os selecionados e saber mais sobre suas experiências acompanhando as nossas redes sociais.

Nesse movimento, as empresas têm um papel estratégico, que começa pela seleção e contratação, mas que vai além. Vale ressaltar que quando uma empresa contrata ou promove um profissional, ela faz uma seleção dos melhores. Portanto os negros que fazem parte do mercado de trabalho superaram os inúmeros funis que deixaram milhares de outros jovens para trás. Esses funis começam no acesso à educação, que nem sempre está disponível e na própria qualidade do ensino, além de itens básicos como alimentação, material didático, computador e internet. O apoio do setor privado à educação com equidade pode contribuir muito para acelerar esse processo. Equidade racial no ambiente de trabalho formal começa antes, com o apoio para que a população negra consiga alcançar as vagas oferecidas, e deve ir além, criando condições internas de acolhimento aos profissionais negros. 

O mercado de trabalho passa por inúmeras mudanças e o que foi chamado de proletariado no século 19 agora constitui o precariado, no qual a remuneração permanece espremida, exigindo extensas horas de prestação de serviços. Um estudo feito pelo Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap) a pedido da Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia (Amobitec) constatou que mais de 60% dos profissionais que prestam serviço aos principais aplicativos de entregas e transporte no Brasil se autodeclaram negros e mais da metade não tem outra fonte de renda além do serviço que prestam a essas empresas. Esse novo modelo de relação de trabalho, fortemente dominado pelo avanço da tecnologia e que se sustenta com muita similaridade ao período escravocrata, está em total contradição com a promoção da dignidade humana preconizada pela Constituição. 

Seja no mercado formal ou pelo empreendedorismo, pessoas negras ainda enfrentam barreiras que reforçam séculos de exclusão, opressão e desigualdade. O enfrentamento deste desafio é responsabilidade de qualquer organização que esteja comprometida com a promoção de um mundo melhor, onde os negros possam protagonizar determinados espaços, contribuindo assim com toda a sua riqueza de conhecimento e suas experiências de vida. Não há como construir reparação e reputação das grandes empresas brasileiras sem um envolvimento ativo no combate às causas do racismo.

O conceito e a prática do desenvolvimento de pessoas negras promovidos pelo Fundo Baobá nos editais que fomentam essa forma de inserção econômica prevê o apoio para a formação de um mundo melhor, além de garantir a promoção da diversidade racial nas empresas.

Retrospectiva 2023

O ano de 2023 foi marcante na história do Baobá – Fundo para Equidade Racial. Ao longo dos últimos 12 meses, lançamos editais, firmamos parcerias e aderimos a compromissos cruciais para a equidade racial.

Logo nos primeiros meses de 2023, o Baobá divulgou o resultado do Edital Educação e Tecnologia, que teve como objetivo apoiar organizações e empresas negras que atuassem no desenvolvimento ou ampliação das capacidades técnicas das pessoas negras na área de tecnologia. Com parceria do MOVER – Movimento pela Equidade Racial, foram investidos e destinados R$ 4.000.000,00 (quatro milhões de reais) para 16 iniciativas negras de educação em tecnologia. Ainda nos primeiros meses, lançamos uma aliança entre o Fundo Brasil de Direitos Humanos e o Fundo Casa Socioambiental, em que foi possível reunir narrativas sobre os primeiros projetos apoiados pelo grupo em 19 estados brasileiros. O objetivo principal foi apresentar resultados da estratégia inédita no campo da filantropia para justiça social. Os resultados podem ser conferidos no site (aliancaentrefundos.org.br). 

Em março, um dos pontos altos do ano: o primeiro encontro de estudantes e mentores do Edital Já É, que visa favorecer a entrada e permanência de adolescentes e jovens no ensino superior. Os estudantes visitaram a sede do MetLife Foundation, apoiadora do edital,e puderam se conhecer pessoalmente, visto que todos os encontros da mentoria realizada pela MetLife ocorreram virtualmente. Conversas sobre ingresso no mercado de trabalho, habilidades socioemocionais e comportamento foram valorosas para os estudantes.

Outro encontro que vale mencionar foi a primeira reunião presencial com os participantes do Edital Educação e Identidades Negras – Políticas de Equidade Racial. O encontro ocorreu em Recife e foi uma excelente oportunidade de conhecer os projetos de perto e apreciar as brilhantes iniciativas de enfrentamento ao racismo e valorização da identidade e cultura negra no campo da educação.

Nos meses de abril, maio e junho o Baobá participou do 12º Congresso GIFE – “Desafiando estruturas de desigualdades”, do Fórum Interconselhos para construção do Plano Plurianual Participativo (PPA) e do evento que reuniu B3 Social e  Pacto de Promoção da Equidade Racial para discutirmos sobre Investimento Social Privado. Ambos foram uma ótima oportunidade para reconhecer as raízes da desigualdade e intervir em favor de oportunidades justas, para que o desenvolvimento seja pleno em sua forma individual, social, econômica, cultural, ambiental e política, como ressalta a diretora de Programas do Baobá, Fernanda Lopes.

Outro ponto alto desse ano foi o fortalecimento de uma instituição centenária que nos ensina, através do seu legado, como fazer filantropia negra no Brasil: a Sociedade Protetora dos Desvalidos (SPD), importante instituição que esteve à frente das principais conquistas da população negra brasileira, recebeu uma doação de R$ 500 mil do Baobá – Fundo para Equidade Racial. “Esta é a primeira vez que o Baobá decide, politicamente, sem edital, fazer uma doação e faz isso com dinheiro próprio. Dinheiro gerado pelas operações do Baobá, que nos propiciam fazer uma doação expressiva”, relata Giovanni Harvey, diretor executivo do Fundo. 

Em 2023 o Baobá aderiu ao Compromisso Internacional da Filantropia sobre as Mudanças Climáticas (International Philanthropy Commitment on Climate Change), movimento global liderado pela WINGS, formado por organizações filantrópicas dedicadas a discutir soluções para os desafios climáticos que a humanidade enfrenta, mas que atinge de maneira desproporcional as populações mais vulneráveis. Desta forma, o Baobá honra seu objetivo por uma vida com dignidade e por um desenvolvimento econômico justo para a comunidade negra. 

Juntamente com a Rede Comuá, o Baobá participou também do movimento dedicado a refletir sobre os contextos e práticas das filantropias comunitárias e de justiça socioambiental, o Mês da Filantropia Que Transforma, na qual foi realizada a live “Transformando com Propósito: Medindo o Impacto na Filantropia Negra”, com o  objetivo de contextualizar as diferentes práticas da filantropia, discutir como a medição de impacto fortalece iniciativas sociais, além de compartilhar as experiências vividas e alcançadas pelo Baobá.

O último trimestre do ano coincidiu com a finalização do projeto Saúde Mental Quilombola; Direitos, Resistência e Resiliência com a exibição de um minidocumentário em Oeiras do Pará, com a participação da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ), Coordenação Estadual das Associações de Comunidades Remanescentes de Quilombo (Malungu/Estado do Pará) e a Associação das Comunidades Remanescente de Quilombo de Igarapé Preto à Baixinha (ARQIB). O audiovisual idealizado pelo Baobá e executado pela Negritar Produções traz reflexões dos quilombolas no que diz respeito a um resgate de autoconhecimento, empoderamento e identidade racial.

A finalização do Edital Vidas Negras: Dignidade e Justiça,  em outubro de 2023, também proporcionou ao Fundo Baobá  a premiação com o Selo Direitos Humanos e Diversidade,  da Prefeitura de São Paulo. O selo é um reconhecimento anual a iniciativas de empresas privadas, órgãos públicos, organizações da sociedade civil e coletivos de todos os portes que promovam e defendam os direitos humanos e a diversidade na cidade de São Paulo. Para Tainá Medeiros, coordenadora de Programas, a premiação não só demonstra a necessidade de promover ações semelhantes no campo da filantropia, mas também evidencia a carência e necessidade de ampliação de políticas públicas que garantam a interrupção dessas violações de direitos. Além da premiação, o Baobá finda o ciclo do Edital Vidas Negras: Dignidade e Justiça com um minidocumentário com depoimentos de representantes de algumas das organizações beneficiadas. 

O ano também foi marcado pelo fortalecimento da parceria entre o Baobá e o Mover, que juntos lançaram o Edital Carreiras em Movimento. Ele visa ampliar o acesso de pessoas negras ao mercado de trabalho, através de atividades voltadas para o desenvolvimento ou ampliação de habilidades socioemocionais e comportamentais. Os selecionados foram prioritariamente pessoas negras, com 18 anos ou mais, ensino superior concluído até 2019, e que atuassem ou desejassem atuar nos setores privado, público ou terceiro setor. Além de estarem no início de suas carreiras profissionais ou buscando mobilidade na carreira, incluindo transição ou ascensão. 

Olhar o passado para direcionar o nosso futuro é uma das ferramentas mais utilizadas pelo Baobá no decorrer desses 12 anos de existência. E é assim que chegaremos em 2024, dispostos a observar os aprendizados e experiências do que foi esse 2023.

Temas ligados às mudanças sociais colocaram o Baobá na mídia em 2023

Esta não é uma retrospectiva sobre o que foi o ano para o Baobá – Fundo para Equidade Racial em termos de aparição na mídia, pois haveria muito mais para ser mostrado ao revisitar nosso 2023. Aqui estão onze matérias que mostram a versatilidade do Baobá dentro dos temas que geraram a sua existência: o enfrentamento ao racismo e a busca pela equidade. 

Para alcançar isso, os caminhos percorrem temas que crescem em importância dentro da sociedade, uma vez que se percebe cada dia mais a relevância de valores comprometidos com o enfrentamento ao racismo, a promoção da equidade racial e da justiça social.

O Baobá acredita que seja possível provocar um avanço que contribua para a mudança real, através de temas como Filantropia Negra; Filantropia para Justiça Social; Preservação da Cultura Negra; Incentivo ao Empreendedorismo Negro; Incentivo ao Emprego; Incentivo à Presença de Negros em cursos superiores; Incentivo ao Estudo e Combate às Desigualdades. E foram essas temáticas abordadas em alguns dos principais veículos de comunicação do país.  

Embarque na leitura, e contemple novas perspectivas para se engajar na luta por um Brasil e por um Mundo de direito à igualdade.  

  • O Estado de S.Paulo – O que é  Filantropia Negra? Conheça o Fundo de R$ 118 milhões

https://www.estadao.com.br/brasil/o-que-e-filantropia-negra-conheca-o-fundo-de-r-118-milhoes/

  • Nexo Jornal – Como a filantropia pode ser ferramenta de mudança 

https://www.nexojornal.com.br/expresso/2023/11/13/Como-a-filantropia-pode-ser-ferramenta-de-mudan%C3%A7a-social?posicao-home-esquerda=2

  • Notícia Preta – Baobá doa R$ 500 mil à Sociedade Protetora dos Desvalidos 
  • Times Brasília – Reabertura de inscrições edital Carreiras em Movimento 

https://timesbrasilia.com.br/concurso-e-emprego/parceria-entre-o-baoba-fundo-para-equidade-racial-e-o-mover-movimento-pela-equidade-racial-visa-fortalecer-potencialidades-e-com-isso-alavancar-oportunidades-de-trabalho/

  • Observatório do Terceiro Setor – Edital destina verba para apoiar carreira de pessoas negras
  • G1 – Vagas do Edmilson – Edital Carreiras e Movimento

https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/blog/edimilson-avila/post/2023/08/14/classificados-do-edimilson-veja-as-vagas-de-emprego-da-semana-de-14-a-18-de-agosto.ghtml

  • O Tempo (Belo Horizonte – Edital Carreiras em  Movimento

https://www.otempo.com.br/cidades/projeto-quer-facilitar-acesso-de-pessoas-negras-a-empregos-veja-como-participar-1.3214016

  • Neo Mondo –  Baobá, mais de uma década de trabalho em prol da equidade racial
  • Folha de S.Paulo – Fundo Baobá e B3 firmam parceria para financiar bolsas a estudantes negros

https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2023/05/b3-e-fundo-baoba-firmam-parceria-para-financiar-bolsas-para-estudantes-negros.shtml

  • Valor Econômico – Baobá e B3 firmam parceria para dar bolsas de estudos a estudantes negros

https://valor.globo.com/empresas/esg/noticia/2023/05/25/fundo-baoba-e-b3-firmam-parceria-para-dar-bolsa-de-estudos-a-estudantes-negros.ghtml

  • UOL – Gife discute importância do investimento social no combate às desigualdades

https://www1.folha.uol.com.br/folha-social-mais/2023/04/congresso-gife-discute-importancia-do-investimento-social-no-combate-as-desigualdades.shtml

Vidas Negras recebe selo da Prefeitura de São Paulo

O Baobá – Fundo para Equidade Racial é uma das organizações que recebeu o Selo de Direitos Humanos e Diversidade da Prefeitura de São Paulo. O Selo é um reconhecimento anual a iniciativas de empresas privadas, órgãos públicos, organizações da sociedade civil e coletivos de todos os portes que promovam e defendam os direitos humanos e a diversidade na cidade de São Paulo. A Cerimônia de Premiação do Selo acontece nesta terça-feira (05/12) no Sesc Pinheiros.

Essa premiação se dá por meio do Edital Vidas Negras: Dignidade e Justiça, iniciado em  maio de 2021 pelo Baobá com apoio do Google.org. Um dos principais objetivos do edital era o apoio a instituições negras que enfrentam o racismo, a violência racial e as incorreções que ocorrem dentro do sistema de Justiça Criminal no Brasil. Foram beneficiadas diretamente doze organizações negras, das quais 75% tinham a maior parte da coordenação composta por mulheres cis ou trans, sete delas com mais de 10 anos de atuação. 

Tainá Medeiros, coordenadora de programas do Fundo Baobá, reconhece que receber o Selo de Direitos Humanos e Diversidade da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo é um reconhecimento significativo do trabalho realizado pelo Fundo Baobá e a valorização de uma iniciativa extremamente importante como o Edital Vidas Negras: Dignidade e Justiça. Ao trazer à tona um debate necessário sobre violações de direitos e injustiças raciais sofridas pela população negra brasileira, o edital se apresentou como uma oportunidade de fortalecer organizações que estão desenvolvendo estratégias essenciais de resistência e de enfrentamento ao racismo neste contexto. 

A premiação não só demonstra a necessidade de promover ações semelhantes no campo da filantropia, mas também evidencia a carência e necessidade de ampliação de políticas públicas que garantam a interrupção dessas violações de direitos e proporcionem meios de reparação à população que foi vítima delas. Neste sentido, o prêmio reconhece a importância da continuidade da luta por justiça e equidade racial”, afirma Tainá.

Evaluation of the initiative on entrepreneurship and the food sector points to the strengthening of businesses and communities

Midiã Noelle

The initiative invested in resources, and capacitation of 14 companies in Recife and its Metropolitan Region, selected through a Request for Proposals.

By the end of 2021, in a challenging economic outlook worsen by the Covid-19 pandemic, three private social investors – Baobá Fund for Racial Equity, General Mills, and Verizon – launched the Request for Proposals Black Business Food. Part of a broader Program for Economic Recovery and Black Entrepreneurs, the initiative aimed at directing resources and specific support for those facing social and economic challenges, and presented itself as an important alternative to strengthen and increase resilience in 14 companies of Black entrepreneurs in Recife and its Metropolitan Region.

Why invest in the food sector in Pernambuco?

Because it is vital in difficult moments, the food sector was selected as the focus of the request for proposals, amidst the resilience of nano-, micro-, and small businesses led by the Black population of Pernambuco, one of the most diverse and culturally rich states in Brazil. In order to adapt to new circumstances, local entrepreneurs took advantage of a growing demand for delivery services of essential goods in the food sector. 

It is notable the impact of the food sector outlook in all states of the country, especially in Pernambuco. It has 18,960 companies in the food sector, corresponding to 3.5% of all companies in Pernambuco, slightly above the national average (3%). Most of these businesses (90.35%) are Individual Micro-Companies (MEIs, in the Portuguese acronym) and Micro-Companies (ME, in the Portuguese acronym, 6.63% of businesses), percentages similar to national averages (respectively, 86.33% and 10.18%). The growth is also visible in Sebrae’s studies that point to the opening of 3,032 new MEIs in the food sector of Pernambuco between March and Abril of 2020, following a national trend.

Strategically, the request for proposals selected the Metropolitan Region of Recife, involving 14 towns, including the capital, that concentrate 56% of businesses formalized up to May 2020. Six of these towns concentrate 90% of food businesses (48% in Recife itself). Notably, 37% of all food businesses in the region are in the category of street vendors, which goes to show the diversity of entrepreneurs in such dynamic sector.

As part of the evaluation process of its investment, focusing on learning and improvement of the support offered, Fundo Baobá relied on an external consultant, Janela 8. The evaluation methodology included document analyses, online research, interviews, and focal groups, allowing for a holistic analysis of the results, which are systematized in the Executive Summary

The support injected considerable resources in capacitation and strengthening of the 14 companies supported in Recife and its Metropolitan Region. It also offered a set of benefits to selected people. Besides the seed-capital of R$ 30,000, the funding included the assistance of Fa.vela (a hub of education and entrepreneurship innovative, digital, and inclusive learning), which provided a series of activities: diagnostics, and customized improvement plans; constant technical assistance; online education and mentorship; and organizing live meetings for networking, and sharing of experiences.

Profiles of people and companies supported

The diversity of the food sector was present in the profiles of supported businesses, comprising from catering to food delivery services, food trucks, and restaurants. The supported group had a majority of women, but also different gender identities: 11 cis women, one transvestite, one cis man and one transgender man, with ages going from 18 to 64. Regarding education, most entrepreneurs had graduated in college (65%). 

It should be noted that 86% of supported projects (12 of them) are in urban areas, mainly in peripheral regions (71% or ten companies). At the start of the project, most entrepreneurs had a monthly family income up to R$ 3,135.

Isamara Costa, one of the entrepreneurs supported, owns Acarajé da Tia Joana, a kiosk selling and delivering acarajés, beverages, and desserts. The inspiration for the company came from her mother, Lucivânia. “A Black woman, recently separated, with two children to raise, she started selling food at the Praça da Várzea, and stayed there for five years”, Isamara recalls. “Then, she was invited to sell her food at the Madalena, where we remain to this day. I started in 2018, and here I am.” Isamara responded to the request for proposals in order to make true a dream: to have her mother’s face as the symbol of Acarajé da Tia Joana. 

Impact on lives and communities

The focus on the food sector in a specific territory allowed for targeted investments, and for more exchange between entrepreneurs facing similar challenges. Most of supported businesses (71%) have their company as the main source for family income, while for 29% the business is a supplemental income. Thus, results go beyond the impact on the entrepreneurs’ life, and reach their families.

As for the strengthening of businesses, the main changes are connected to general management improvement, including financial organization and productivity increase. Companies have recorded an increase in revenue and in number of clients. These changes were noted throughout the duration of the project, and are still valid today, more than a year after the end of the initiative.

One of the women entrepreneurs described how the initiative improved the situation of her business, and contributed to also improve her quality of life: “In my personal life, I managed to have a wage, and to take a week of vacation after years working non-stop. Now, we’re planning to open a physical location in order to expand the business and reach more clients. We never lose the focus on being a business led by Blacks, and serving with excellence the peripheries of the North Zone of Recife”.

Racial awareness, and the strengthening of Black identities

The support also stood out for its inclusive and sensitive approach. An important differential is that the initiative was developed by Black people, and focused on the Black population. As a result, it is clear that it had a crucial role not only for businesses, but also in building a stronger community for debates about race, and confronting racism: 64% of entrepreneurs report an increase in self-esteem, and 82% acknowledge a broaden racial awareness.

In general, the Black Business Food support was a successful initiative, by the design of the support offered, and by its execution. It stands out for focusing on Black entrepreneurs in the food sector, and for offering a broad support, including financial resources, education, and exchanges among peers.

It worked as leverage, i.e., changes that would take much longer to happen were potentialized by the intervention. Such transformation might eventually happen, but in a much slower pace, and with partial results for most businesses.

Lessons learned with the Black Business Food, and its impact resonate not only in business itself, but also in communities, in the self-esteem and empowerment of the Black population in Pernambuco, and by extension in the whole country.

Avaliação do edital de empreendedorismo e alimentação aponta para o fortalecimento dos negócios e das comunidades

Midiã Noelle

Iniciativa investiu em recursos e no fortalecimento de capacidades de quatorze negócios em Recife e Região Metropolitana

Em um cenário de desafios econômicos agravados pela pandemia da Covid-19, três investidores sociais privados – Baobá – Fundo para Equidade Racial, General Mills e Verizon – lançaram no final de 2021 o Edital Negros Negócios Alimentação. Parte do Programa de Recuperação Econômica e Empreendedores(as) Negros(as), a iniciativa buscou direcionar recursos e suporte específico para aqueles que enfrentam desafios sociais e econômicos e se apresentou como uma importante alternativa para fortalecer e elevar a resiliência de 14 negócios empresas de empreendedores e empreendedoras negros(as) de Recife e Região Metropolitana. 

Por que investir no ramo alimentício em Pernambuco?

Por ser um dos mais vitais em momentos adversos, o setor alimentício foi selecionado como foco do edital, em meio à resiliência de nano, micro e pequenos negócios liderados pela população negra de Pernambuco, um dos estados mais diversos e culturalmente ricos do Brasil. O aumento da demanda por serviços de entrega e a oferta de bens essenciais tornaram o ramo uma opção de destaque para empreendedores e empreendedoras que procuram se adaptar às novas circunstâncias.

O cenário do setor alimentício no país tem um impacto notável em todos os estados do país e em Pernambuco esse impacto é evidente. Com um total de 18.960 empresas na área de alimentação, o setor representa 3,5% do total de empresas do estado, ligeiramente acima da média nacional de 3%. A maioria desses empreendimentos (90,35%) é de Microempreendedores Individuais (MEIs) e de Microempresas (ME, 6,63%), porcentagens semelhantes às nacionais (86,33% de MEIs e 10,18% de MEs). Esse crescimento é destaque também em estudos do Sebrae, que apontam a abertura de 3.032 novos MEIs em Pernambuco entre março e abril de 2020, em várias áreas do segmento alimentício, seguindo uma tendência nacional.

Estrategicamente, o edital selecionou a Região Metropolitana de Recife, que abrange 14 cidades, incluindo a capital, devido à concentração significativa de empresas – 56% dos negócios formalizados até maio de 2020. Dentre essas cidades, apenas seis concentram 90% dos empreendimentos de alimentação, com Recife concentrando 48% dessas empresas. Notavelmente, 37% dos negócios da região se enquadram na categoria de serviços ambulantes de alimentação, demonstrando a diversidade de empreendimentos nesse setor dinâmico.

Como parte do processo de avaliação de seus investimentos, tendo como foco a aprendizagem e a melhoria dos apoios oferecidos, o Fundo Baobá contou com o suporte de uma consultoria externa, a Janela 8. A metodologia de avaliação incluiu análise de documentos, pesquisa online, entrevistas e grupos focais, permitindo uma análise holística dos resultados, que estão sistematizados neste Resumo Executivo

O edital representou um investimento significativo na capacitação e fortalecimento das 14 empresas apoiadas em Recife e sua região metropolitana, bem como apresentou um conjunto de benefícios para as pessoas selecionadas. Além do capital-semente de até R$ 30 mil, o apoio incluiu assessoria do Fa.vela (um núcleo de educação e aprendizagem empreendedora, inovadora, digital e inclusiva), que fez o diagnóstico e elaborou planos de melhorias personalizados, ofereceu assessoria técnica constante, formações e mentorias online, e organizou encontros presenciais para networking e compartilhamento de experiências.

Os perfis de pessoas e empresas apoiadas


A diversidade do setor alimentício se refletiu nos perfis dos negócios apoiados, abrangendo desde bufês para festas até serviços de comida por encomenda ou entrega, food trucks e restaurantes. O grupo apoiado foi composto majoritariamente por mulheres, mas também contemplou diferentes identidades de gênero: 11 mulheres cis, uma travesti, um homem cis e um homem trans, com idades entre 18 e 64 anos. Em relação à formação educacional, a maior parte (65%) dos empreendedores concluiu o ensino superior.

Observa-se, também, que 86% dos projetos apoiados (12 deles) estão em área urbana, majoritariamente em regiões periféricas (71% ou dez empresas). No início da execução dos projetos, a maioria dos(as) empreendedores(as) tinha uma renda familiar mensal de até R$ 3.135. 

Isamara Costa é uma das pessoas apoiadas pelo edital. Responsável pelo Acarajé da Tia Joana, ao lado da mãe, Lucivânia, especializou-se em venda de acarajés, bebidas e sobremesas. Sua empresa opera num quiosque e via entregas em domicílio. Ela diz que a inspiração veio da matriarca. “Mulher negra, recém-separada de um baiano e com dois filhos para criar”, relata. “Começou vendendo na Praça da Várzea e ficou lá cerca de cinco anos. Depois foi convidada para vender na Madalena, onde vendemos até hoje. Em 2018 eu entrei e lá estou.” Isamara explica que concorreu ao edital para realizar o sonho de estruturar o Acarajé da Tia Joana com o rosto da mãe como marca de apresentação.

Impactos nas vidas e nas comunidades

O enfoque no setor alimentício em um território específico permitiu investimentos direcionados e mais trocas entre empreendedores que passam por desafios similares. A maioria (71%) dos que foram apoiados tem seu negócio como a principal fonte de renda familiar, enquanto para 29% é apenas uma fonte de renda complementar. Nesse sentido, os resultados vão para além do impacto na vida dos empreendedores e alcançam suas famílias. 

No âmbito do fortalecimento dos negócios, as principais mudanças referem-se a melhorias generalizadas na gestão, incluindo organização financeira e aumento de produtividade. Além disso, as empresas registraram aumento no faturamento e no número de clientes. Essas mudanças foram percebidas não apenas ao longo e após o término dos investimentos realizados, mas mantêm-se até hoje, mais de um ano depois da iniciativa. 

Uma das empreendedoras avaliou como o edital melhorou a situação de seu negócio e contribuiu para melhorar sua qualidade de vida: “Na minha vida pessoal consegui ter um salário, consegui tirar uma semana de férias depois de anos sem parar e agora estamos no planejamento para abrir o nosso ponto físico em 2024 e, assim, expandir e atingir mais clientes. Sem perder o foco no fato de ser um negócio liderado por negros e com toda raiz periférica, atendendo as periferias da Zona Norte do Recife com a maior excelência”.

Consciência racial e fortalecimento das identidades negras 

O edital também se destacou pela abordagem inclusiva e sensível. O fato de ser uma iniciativa desenvolvida por pessoas negras, com foco na população negra, é um diferencial importante. Com 64% dos empreendedores/as relatando um aumento na autoestima e 82% indicando uma ampliação de sua consciência racial, ficou evidente que o edital desempenhou um papel crucial não apenas nos negócios, mas também na construção de uma comunidade mais fortalecida para os debates sobre raça e enfrentamento ao racismo.

De maneira geral, o Edital Negros Negócios Alimentação foi uma iniciativa de sucesso tanto pelo desenho do apoio oferecido quanto por sua execução. Destaca-se por focar em empreendedores/as negros/as do setor de alimentação e por oferecer um suporte abrangente, incluindo recursos financeiros, formação e trocas entre pares. 

Funcionou como alavanca, ou seja, mudanças que levariam muito mais tempo para acontecer foram potencializadas pela intervenção. São transformações que até poderiam ter acontecido, mas a passos muito mais lentos e com resultados parciais para a maioria dos negócios.

As lições aprendidas com o Edital Negros Negócios Alimentação e os impactos dessas ações repercutem não apenas nos negócios, mas também nas comunidades, na autoestima e no empoderamento da população negra em Pernambuco e, por extensão, em todo o país.

Documentário relata o encerramento do edital Vidas Negras: Dignidade e Justiça

Lançado em  maio de 2021 pelo Baobá – Fundo para Equidade Racial, com apoio do Google.org, o Edital Vidas Negras: Dignidade e Justiça chega ao final do seu ciclo com a expectativa plenamente atingida no que diz respeito ao apoio a  instituições negras que enfrentam o racismo, a violência racial e as incorreções que ocorrem dentro do sistema de Justiça Criminal no Brasil. A importância do edital originou um minidocumentário com depoimentos de representantes de algumas das organizações beneficiadas. A realização é da Terra Preta Produções.

O Edital Vidas Negras: Dignidade e Justiça beneficiou diretamente doze organizações negras, das quais 75% tinham a maior parte da coordenação composta por mulheres cis ou trans. Sete delas com mais de 10 anos de atuação. Sendo impactadas indiretamente 7210 pessoas privadas de liberdade, 67% mulheres cis e trans; 23% travestis e 15% homens cis e trans. Além das pessoas privadas de liberdade, 5.113 familiares também foram indiretamente impactados por ações realizadas com apoio do edital. No sistema socioeducativo, 3594 adolescentes e jovens em cumprimento de medidas foram beneficiados e 2.838 familiares. E com relação às vítimas em decorrência de violência policial, um total de 2.606 pessoas vitimadas, com viés racial beneficiadas indiretamente e 1.579 familiares de vítimas fatais ou sobreviventes de violência policial com viés racial.

“Há um entendimento de que o Estado brasileiro precisa ser responsabilizado por todas as injustiças cometidas contra o povo negro. Mas, para que isso se torne uma medida real e que seja realmente efetiva para todos, precisamos nos debruçar sobre esse tema com dados e produção de conhecimento. Só assim será possível reparar todos os danos sofridos nos territórios”, afirma a socióloga, diretora e co-fundadora da Iniciativa Negra por uma Nova Política sobre Drogas, Nathalia Oliveira, uma das beneficiárias do Edital Vidas Negras: Dignidade e Justiça. 

Além de Nathalia Oliveira, aparecem com importantes depoimentos no documentário, o historiador, Dudu Ribeiro, também fundador e diretor executivo da Iniciativa Negra;  Maria das Graças Nacort, da Amafavv (Associação de Mães e Familiares de Vítimas de Violência do estado do Espírito Santo); a assistente social, Lúcia Xavier, do Criola  e a advogada Carol Bispo, do Elas Existem – Mulheres Encarceradas . .  

, O que os dados mostram é que pessoas negras continuam sendo o principal grupo vitimado pela violência,  independentemente da ocorrência registrada, e chegam a 83,1% das vítimas de intervenções policiais. Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2023, com dados de 2022, em relação ao perfil étnico-racial das vítimas, 76,5% dos mortos eram negros. Em relação ao Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), segundo Larissa Camerino, Mestre em Políticas Públicas em Saúde da Fiocruz Brasília, existe uma falta de atenção em saúde e os cuidados a adolescentes privados de liberdade. 

“A política socioeducativa ainda é permeada por estigmas, por desconhecimento de processos e por compreensões retrógradas, alicerçadas em uma concepção menorista e meramente punitiva, de que o(a) jovem autor(a)  de ato infracional se torna como que menos “digno/a” de direitos. Em um sistema em que as nossas internações têm cor, raça e gênero definidos muito antes do cometimento dos delitos, abordar sobre direitos desses jovens é, antes de mais nada, afirmá-los enquanto sujeitos de direitos e trazer à discussão as diversas omissões vivenciadas em paralelo”,  afirma Larissa em entrevista à Fiocruz Brasília, em julho de 2023.

Ainda que com a tarefa concluída, Giovanni Harvey, diretor executivo do Fundo Baobá, entende que é papel e responsabilidade do Estado Brasileiro garantir políticas públicas que retardem o nível de desigualdade racial e de gênero, refletido na Justiça criminal brasileira.

Para Nathalia Oliveira, co-fundadora e dretora executiva responsável pelo Projeto Iniciativa Negra por Direitos, Reparação e Justiça, apoiado pelo Baobá, a verdadeira reparação histórica para a população negra passa por construção de memória, justiça e verdade, criando uma comissão de verdade que investigue dados e a averiguação e responsabilização sobre casos específicos, como a participação de agentes do Estado em crimes contra a humanidade, e o paradeiro de pessoas desaparecidas em meio a esses conflitos. Além de anistia a pessoas envolvidas em conflitos, mudanças legislativas e institucionais para o fim de contendas,  e outras ações urgentes para reparar anos de injustiças criminais ao povo negro.

Pessoas negras são detentoras das suas próprias histórias, ainda que por muitos anos não tenham tido protagonismo dela. A história do povo preto não se resume somente ao período escravocrata, mas é mantida em condições desiguais até os dias atuais por interesses políticos e sociais. Tal imigração forçada de africanos, durante o tráfico transatlântico de pessoas escravizadas,  deixou para trás centenas de histórias, mas que ainda temos em nós a memória e a resistência do lugar de onde viemos. Tal memória perpassa pela luta em garantir dignidade e justiça para os nossos atuais, que é o que consumou o edital, através de um modelo de filantropia participativa utilizado pelo Baobá, que vem permitindo que as organizações tenham autonomia e identifiquem soluções para se reinventar perante desafios tortuosos que as desigualdades sociais os impõem.

Fundo Baobá consegue alcançar as cinco regiões do Brasil

Após doze anos de atuação, Baobá segue sendo pioneiro em promover a transformação social pelos quatro cantos do País

Uma grande missão foi posta para o movimento negro brasileiro com esta frase: “Baobá, a árvore símbolo da sustentabilidade da causa da equidade racial. Cultive e regue essa ideia”. Ela foi dita por Magno Cruz, uma das grandes referências de liderança negra no Nordeste brasileiro, lá em 2009, aos futuros membros do que viria a se tornar o primeiro e maior fundo patrimonial no Brasil dedicado exclusivamente à promoção da equidade racial para a população negra.

Ao longo dos anos, o Brasil testemunhou projetos políticos que mantiveram pessoas negras em situações precárias e marginalizadas, perpetuando assim uma estrutura de opressão e exclusão social. Isso contribuiu para uma população muito invisibilizada, no que tange à construção e à prática de políticas públicas existentes para a redução de desigualdades sociais e opressões vividas até hoje pela população negra. 

“Dar a conhecer sobre a nossa forma de atuação, seleção e realização das doações é garantir que nosso trabalho chegue em territórios onde o poder público ou mesmo o investimento social privado não chega. É isso é um dos nossos grandes desafios”, afirma Fernanda Lopes, Diretora de Programa do Fundo Baobá.

É preciso olhar para o passado para seguir em frente, assim nos ensina a filosofia Africana Sankofa. E é exatamente o que faz o Baobá – Fundo para Equidade Racial no decorrer desses 12 anos de existência, atuando prioritariamente em territórios desassistidos, com o objetivo principal de fomentar a justiça social apoiando iniciativas negras de Norte ao Sul do Brasil. Ao exercitar esse olhar, atualmente mais de 800 iniciativas apoiadas já foram beneficiadas pelo Fundo patrimonial. E nesses anos de atuação do Fundo Baobá, a estratégia principal para contribuir com o avanço socioeconômico da população negra do País, se destaca por um amplo processo de escuta ativa envolvendo, prioritariamente,  lideranças e organizações, com atuação prioritária nos eixos Viver com Dignidade, Educação, Desenvolvimento Econômico e Comunicação e Memória. O que resulta em mais de 16 milhões de reais investidos em projetos de transformação social por todo o País, sendo mais de setecentos mil na região Norte, sete milhões na região Nordeste, seiscentos mil na região Centro-Oeste, seis milhões na região Sudeste e setecentos mil na região Sul.

“É com muita alegria que conseguimos finalizar o Projeto Olori: mulheres negras e periféricas construindo lideranças, com a ajuda do Baobá que além de trazer muita alegria nos desafiou a trabalhar coletivamente. Nós somos 3 organizações de mulheres negras de periferia de Recife, que hoje afirma que o que fica de legado é a aproximação de mulheres da comunidade que não nos conheciam e agora desejam participar de uma das 3 organizações”, afirma Rosa Marques, realizadora de um dos projetos apoiados na 1ª turma do Programa de Aceleração do Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco.

Identificar, reconhecer e reproduzir o modus operandi de filantropia negra, através do histórico de atuação das irmandades também é uma das ferramentas essenciais para entender a história da população negra e como elas operavam desde dos primórdios para garantir desde cartas de alforria até velórios dignos para os negros. A estratégia de grupos engajados na luta contra o racismo estrutural, potencializa as tecnologias sociais concebidas e implementadas nas comunidades, fortalecendo assim o ecossistema empreendedor, em especial investindo em nano e micro negócios. Isso resulta em mobilizar ativos produtivos locais, apoiando estudantes, profissionais e pesquisadores que atuam em diversas áreas do conhecimento na ampliação de suas habilidades técnicas e socioemocionais.

“Quando falamos de filantropia pode parecer que falamos apenas de dinheiro, mas filantropia também pode ser usar nossa liderança e influência para trazer outras pessoas que talvez não se sentissem poderosas o suficiente para falar sobre a cura racial e sobre progresso racial. A influência da filantropia pode mudar mentalidades sociais e perspectivas tanto quanto programas financiados”, afirma Hélio Santos, professor, consultor e ativista da causa racial no Brasil.

A governança do Baobá tem reiterado a necessidade e urgência de continuar atuando com uniformidade em todas as cinco regiões do Brasil, tanto na mobilização e articulação de investidores sociais privados quanto no desempenho e promoção de equidade racial em todas as regiões do país.