Organizações falam sobre as jornadas formativas de que têm participado e sobre a utilização desses conhecimentos no seu cotidiano
Por Wagner Prado
“Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção.”
A frase acima é do filósofo, professor e pedagogo brasileiro Paulo Freire (1921-1997). Ela está muito relacionada com a transformação pela qual estão passando 35 organizações quilombolas, apoiadas pelo edital Quilombolas em Defesa: Vidas, Direitos e Justiça, do Fundo Baobá para Equidade Racial. O edital foi lançado em setembro de 2021 e em dezembro as organizações foram selecionadas para serem apoiadas com R$ 30 mil cada uma delas.
A dotação está sendo utilizada para promover a sustentabilidade econômica e geração de renda; a soberania e a segurança alimentar, além de proteger e defender direitos quilombolas. A instituição parceira do Baobá é a Conaq (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas) e o edital integra as ações da Aliança entre Fundos por Justiça Racial, Social e Ambiental, que reúne o Fundo Baobá, o Fundo Brasil de Direitos Humanos e o Fundo Casa Socioambiental. Os três fundos são membros da Rede de Filantropia para a Justiça Social e as ações da Aliança entre Fundos têm financiamento da IAF (Inter-American Foundation) e da própria Rede.
Para saber como as organizações estão aproveitando as jornadas formativas previstas pelo edital, conversamos com quatro delas: Associação da Comunidade Negra Rural Quilombola Deziderio Felipe de Oliveira, da cidade de Dourados (Mato Grosso do Sul, que apresentou um projeto para o Eixo 2; Fundação dos Moradores e Remanescentes dos Quilombolas da Tranqueira, da cidade de Valença (Piauí), cujo projeto apresentado foi ´para o Eixo 1; Associação Quilombola do Sítio Queimada Grande, de Bom Conselho (Pernambuco), projeto é do Eixo 3 e, por final, a Associação Comunitária Unidos(as) do Cumum, da cidade de Guimarães (Maranhão), que apresentou projeto para o Eixo 1.
As quatro organizações quilombolas, de diferentes estados brasileiros, falam aqui sobre como tem sido a experiência advinda das jornadas formativas, em formato virtual, que têm sido promovidas pelo Fundo Baobá. As jornadas formativas, que são parte do investimento indireto ofertado pelo edital, visam, entre outras coisas, o fortalecimento institucional de cada uma das organizações.
O compartilhamento de experiências com outros donatários é fundamental para ganhar conhecimento e identificar caminhos de soluções de problemas.
Esse compartilhamento, que contribui para a formação do estofo teórico que vai dar diretriz à administração do projeto ou negócio, está dentro dos investimentos indiretos previstos nos editais. Investimentos indiretos são as doações não-financeiras, os recursos colocados em formação, encontros, eventos, palestras, entre outros. O Fundo Baobá vem, desde 2019, trabalhando com investimentos indiretos, o que tem garantido o incremento de potencialidades nas organizações selecionadas para os seus editais e também para as lideranças das mesmas. Em 2021, o Baobá colocou mais de R$ 1,3 milhão em investimentos indiretos.
No edital Quilombolas em Defesa ate o presente momento, as organizações apoiadas participaram de atividades sobre elaboração de projetos, planos de ação, orçamento, prestação de contas, ambiente virtual e uso de recursos tecnologicos.
JORNADA FORMATIVA
Associação da Comunidade Negra Rural Quilombola Deziderio Felipe de Oliveira
“Foi imprescindível, pois nos trouxe um norte, desde como desenhar o projeto, fazer o orçamento, o plano de ação e a prestação de contas.”
(Ramão Oliveira)
Fundação dos Moradores e Remanescentes dos Quilombolas da Tranqueira
“As jornadas formativas têm sido muito importantes porque nos capacita para trabalharmos com o nosso projeto e os projetos futuros.”
(José Soares Bizerra)
Associação Quilombola do Sítio Queimada Grande
“As jornadas formativas têm sido de grande valor, pois estamos adquirindo conhecimentos e entendendo como devemos proceder durante o projeto.”
(Taciana Bento)
Associação Comunitária Unidos(as) do Cumum
“Essas jornadas formativas têm sido muito importantes. Inclusive eu participei de várias e elas têm nos ajudado a esclarecer alguns pontos na questão administrativa, que a gente às vezes não sabia. Desconhecia. Tem sido uma aprendizagem muito bom.”
(Cacá de Guimarães)
MUDANÇA DE PARADIGMA
Associação da Comunidade Negra Rural Quilombola Deziderio Felipe de Oliveira
“A comunidade era carregada pela boa vontade de terceiros para fazer a parte teórica dos projetos. Por meio das jornadas, a própria comunidade está tentando fazer sozinha cada etapa do projeto.”
(Ramão Oliveira)
Fundação dos Moradores e Remanescentes dos Quilombolas da Tranqueira
“Agora temos uma melhor capacidade de manejar os nossos projetos.”
(José Soares Bizerra)
Associação Quilombola do Sítio Queimada Grande
“Hoje podemos dizer que estamos conscientes de nossos direitos no acesso a políticas públicas quilombolas.”
(Taciana Bento)
Associação Comunitária Unidos(as) do Cumum
“Apesar de a gente estar no início do projeto, nessa questão administrativa a palestra que tivemos online com o pessoal do Fundo Baobá e também com a técnica Val foi fundamental. Tem ajudado até na administração da Associação.”
(Cacá de Guimarães)
CONHECIMENTO TRANSFORMADOR
Associação da Comunidade Negra Rural Quilombola Deziderio Felipe de Oliveira
“Todo conhecimento tem sido fundamental para nós, tendo em vista que até alguns meios de correspondências virtuais eram desconhecidos para nós. Outro conhecimento que consideramos de suma importância é a prestação de contas.”
(Ramão Oliveira)
Fundação dos Moradores e Remanescentes dos Quilombolas da Tranqueira
“A oficina para nos capacitar na prestação de contas.”
(José Soares Bizerra)
Associação Quilombola do Sítio Queimada Grande
“Todas as formações foram muito importantes, mas destaco as iniciais de conhecimento do projeto e das informações sobre as políticas públicas quilombolas.”
(Taciana Bento)
Associação Comunitária Unidos(as) do Cumum
“A gente já aprendeu muita coisa com esse projeto, apesar de ele estar no início. Nós fazíamos as coisas de acordo com o nosso conhecimento. Nós não tínhamos conhecimento técnico. Agora já temos um pouco: tomada de preços, conhecimento de preços, essas questões burocráticas, onde a gente tem muita dificuldade. Mas já avançamos um pouco.”
(Cacá de Guimarães)
SABERES UTILIZADOS
Associação da Comunidade Negra Rural Quilombola Deziderio Felipe de Oliveira
“No presente momento, utilizamos os conhecimentos das comunicações digitais, como A intranet para envio de documentos; as palestras sobre orçamento e plano de ação. Tivemos também o curso de Qualidade Sanitária de Alimentos, mInistrado pela Universidade Federal da Grande Dourados/UFGD.”
(Ramão Oliveira)
Fundação dos Moradores e Remanescentes dos Quilombolas da Tranqueira
“O manejo da agricultura na comunidade.”
(José Soares Bizerra)
Associação Quilombola do Sítio Queimada Grande
“Considero que a formação sobre prestação de contas está nos ajudando nesta parte burocrática. Aprendemos como devemos deixar essa prestação mais organizada e fazê-la da forma mais correta.”
(Taciana Bento)
Associação Comunitária Unidos(as) do Cumum
“A questão da tomada de preços. Fazer essa pesquisa de preços, sempre optando por preços que tenham a ver com a realidade da comunidade, tem sido um grande ensinamento.” .
(Cacá de Guimarães)
EXPECTATIVAS FUTURAS
Associação da Comunidade Negra Rural Quilombola Deziderio Felipe de Oliveira
“Esperamos executar o projeto de acordo com o planejado utilizando todos os conhecimentos adquiridos por meio das jornadas formativas realizadas pelo o Fundo Baobá. E obter os resultados esperados pela comunidade.”
(Ramão Oliveira)
Fundação dos Moradores e Remanescentes dos Quilombolas da Tranqueira
“Mais conhecimentos na área agricola trazida pelos técnicos do projeto.”
(José Soares Bizerra)
Associação Quilombola do Sítio Queimada Grande
“Precisamos entender melhor como colocar preço nos nossos produtos e no nosso trabalho. Seria muito importante conhecimento em relação a como comercializar.”
(Taciana Bento)
Associação Comunitária Unidos(as) do Cumum
“Com certeza tem vários conhecimentos no percurso da execução do projeto que a gente ainda vai aprender. Mas eu posso dizer que onde estamos com ansiedade é no acompanhamento técnico agrícola, que vai nos orientar melhor a como criar galinha, como plantar melhor. Então, a gente está ansioso por isso.”
(Cacá de Guimarães)
Tudo o que foi exposto nesse texto está diretamente ligado com o ato de educar. E sobre educação, Paulo Freire disse:
“A educação faz sentido porque as mulheres e homens aprendem que através da aprendizagem podem fazerem-se e refazerem-se, porque mulheres e homens são capazes de assumir a responsabilidade sobre si mesmos como seres capazes de conhecer.”