“Brasil volta a ser território no qual todas as expressões democráticas terão fala”

Giovanni Harvey, diretor Executivo do Fundo Baobá para Equidade Racial, acaba de retornar da edição 2023 do Fórum Social Mundial, realizada entre 23 e 27 de janeiro na cidade de Porto Alegre (RS). Harvey participou de várias edições do FSM, no Brasil e no exterior. Neste ano, o tema principal do FSM foi o envelhecimento da população mundial.  

Estimativas da Organização das Nações Unidas (ONU) dão conta de que em 2047 (menos de 25 anos), o mundo terá 2 bilhões de pessoas com 60 anos ou mais. Esse número, ainda com base em estimativas da ONU, vai saltar para 3,1 bilhões de idosos em 2100, o que vai significar 30% da população em todo mundo. A reviravolta da pirâmide etária criou o que o mercado publicitário classificou como “Gray Power” (Poder Grisalho, em português). São as pessoas com 50 anos ou mais, hoje representando quase ¼ da população do planeta.

Lançando um olhar mais específico sobre o Brasil, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2021, pessoas com 60 anos ou mais representavam 14,7% da população. Isso era o equivalente a 31,23 milhões de pessoas.  Desse total, 48% são pessoas idosas negras. 

O principal fator para o envelhecimento da população é a queda na taxa de natalidade. Porém, por mais paradoxal que possa parecer, o decréscimo na taxa de natalidade está ligado a um fator positivo: o aumento da longevidade das pessoas. Dentro de 77 anos, portanto em 2100, a expectativa de vida no mundo vai subir para 82 anos. No Brasil, essa mesma expectativa será de 88 anos. Portanto, alcançar objetivos será algo mais tangível. Mas essa longevidade também poderá marcar um compromisso mais extenso de contribuição das pessoas no que se refere aos avanços sociais.

Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) do IBGE, a população idosa no Brasil no segundo semestre de 2022 era de 31,7 milhões de pessoas. Entre essas 31,7 milhões, 48% são pessoas idosas negras. Devido às discrepâncias sociais que ocorrem e marcam a existência negra, nem todas as pessoas pretas têm experienciado o direito de envelhecer. A culpa por isso está no racismo estrutural, tão arraigado na sociedade brasileira. Além disso, fatores discriminatórios como dificuldade de acesso a serviços de saúde pública, o machismo, atendimento discriminatório nos locais que prestam atendimento em saúde e a falta de políticas públicas protetivas para a população negra contribuem para mortes precoces e para o não envelhecimento negro. 

O  diretor, um homem de 59 anos, falou um pouco sobre  as  perspectivas de fortalecimento e incidência dos movimentos sociais tendo em vista o cenário político e social que se desenha no Brasil para os próximos anos. 

O que o Fórum Social Mundial significa para você?

Giovanni Harvey – O Fórum Social Mundial é uma das principais plataformas de articulação, mobilização e troca de experiências por parte dos movimentos sociais, tanto sob o ponto de vista nacional quanto sob o ponto de vista internacional. A realização do FSM em 2023 foi produto do esforço de várias pessoas e instituições que tiveram o entendimento de que era preciso dar uma inequívoca sinalização para os movimentos sociais que o ambiente, de fato, mudou e o Brasil voltou a ser um território no qual todas as expressões sociais democráticas terão espaço para fala e serão ouvidas. O diálogo e a troca de experiências entre as gerações será imprescindível para alcançar as mudanças que queremos. 

O Fundo Baobá participou de alguma atividade específica?

Giovanni Harvey – Sim. Fomos convidados para participar da mesa “Lutas Antirracistas, Populares e Periféricas”, que aconteceu em 26 de janeiro. A mesa reuniu várias expressões do movimento negro e do movimento indígena. Ativistas de várias gerações, gêneros e origens territoriais. O Fundo Baobá mantém estreitos laços com os movimentos sociais desde que o “grupo impulsor”, responsável pela sua fundação, articulou-se há 15 anos. A instituição participa de várias redes e dialoga com todos os setores do movimento social negro e tem buscado garantir, por meio de seus editais,  que os recursos alcancem as comunidades e as periferias. 

Qual é o papel do Fundo Baobá neste contexto?

Giovanni Harvey – O papel institucional do Fundo Baobá é financiar iniciativas lideradas por pessoas, movimentos sociais, coletivos e instituições negras que fazem a luta cotidiana de enfrentamento ao racismo e promoção da equidade racial. A retomada das políticas públicas de Promoção da Igualdade Racial, das Políticas para as Mulheres e todas as demais políticas públicas de promoção e garantia dos Direitos Humanos nos impõe uma reflexão sobre a natureza das demandas que iremos priorizar, dentro do entendimento de que o Fundo Baobá não deve concorrer com as políticas públicas existentes e sim contribuir para o fortalecimento das demandas sociais que ainda não foram contempladas, inclusive aquelas que são apresentadas há anos, por pessoas que iniciaram seu ativismo na década de 1970, 1960, e que hoje são idosas. O reconhecimento destas demandas amplia e qualifica o enfrentamento e define estratégias de superação do racismo, nas mais variadas dimensões da vida social.

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