Clube de Mães com 30 anos de existência investe em educação e formação no povoado de São Pedro, zona rural do município de Anajatuba, no Maranhão

A Associação do Clube das Mães do povoado São Pedro realizou durante o Programa de Aceleração do Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco oficinas e cursos que beneficiaram a comunidade

Por Jamile Araújo*

 

Há três décadas as necessidades de transformação na comunidade organizam e movimentam as mulheres no povoado São Pedro, localizado em Anajatuba, no interior do Maranhão. A Associação do Clube das Mães São Pedro atua desde 1991, com atividades voltadas para crianças e adolescentes, mas também com formação para as mulheres. Após 30 anos de luta, as lideranças do Clube perceberam a necessidade de dinamizar e modernizar a entidade, única associação de mulheres do município até hoje. 

O apoio do Fundo Baobá veio no momento ideal para “levantar a moral” da Associação e possibilitar o planejamento de um futuro com sede própria e novos projetos – é o que afirmam as suas componentes. A entidade é uma das contempladas na 1ª turma do Programa de Aceleração do Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco, uma ação do Fundo Baobá para Equidade Racial em parceria com a Fundação Kellogg, o Instituto Ibirapitanga, a Fundação Ford e a Open Society Foundations

A história da Associação Clube das Mães do Povoado São Pedro se mistura com boa parte da história de vida de Maria Eunice de Jesus Santos, 69 anos, professora aposentada e membro do Clube desde a criação. Ela conta que é filha do povoado de São Pedro e que, quando era adolescente, saiu para estudar na Universidade Federal do Maranhão (UFMA). “Uma coisa interessante é que nessa época, de 1976 a 1980, eu fui a primeira pessoa negra de Anajatuba a cursar uma universidade pública. Abri caminho para muitos outros, e hoje tem várias pessoas que já fizeram curso superior também, inclusive Filomena [jovem do povoado presente durante a entrevista]”.

Dona Eunice acredita na educação como um caminho possível de empoderamento. “Sem educação a gente não é nada. Sem educação nunca vamos ser mulheres empoderadas”, afirma. E foi a partir da educação que Dona Eunice, professora do ensino médio e técnica em assuntos culturais, teve contato com a possibilidade do trabalho social para transformar vidas. “Nunca esqueci minhas raízes de São Pedro. Nessa trajetória, em 1991 eu fui procurada por algumas mulheres para falar que ‘não tinha nada na comunidade’. Então eu disse ‘nós vamos criar um grupo de mulheres’, e criamos a Associação. E daí a gente vem trabalhando. Tudo o que a gente conseguiu para o povoado foi por articulação, para angariar as coisas. E isso a gente fez de água à luz”, explica. 

Joana Moura Machado Santana, 67 anos, também é co-fundadora e faz parte da diretoria do Clube de Mães. Ela explica que o trabalho é realizado conjuntamente, e que o desejo de trazer o novo e apoiar a comunidade é o que as move. “Estamos aqui desde que começou, todo o tempo junto, fazendo nosso trabalho juntas, participando. Estou aqui na luta junto com minhas amigas, querendo trazer alguma coisa e apoiando nossa comunidade”, diz Dona Joana. 

Fortalecimento e dinamização da Associação

As mulheres da Associação relatam que antes do apoio do Fundo Baobá alguns projetos do Clube de Mães com crianças e adolescentes foram apoiados por outras organizações, mas que nos últimos períodos perceberam que uma dinamização era necessária. 

De acordo com Dona Eunice, os projetos implementaram ações com arte, cultura, teatro, entre outras áreas. “Plantas medicinais também… a gente visitou até o horto medicinal da UFMA. Visitamos alguns espaços da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA). Já tivemos outras experiências com alfabetização de jovens e adultos, mini-usina de beneficiamento de arroz, entre outros”, pontua. 

“A gente estava bem baixinho, quase não andando mais”, lembra Dona Eunice. Ela acredita que o projeto veio para levantar a moral do Clube de Mães. “Por isso que a gente colocou ‘dinamização do Clube das Mães’, para poder levantar”, argumenta. 

Entre 2020 e 2021, período de execução do projeto, a Associação realizou oficinas e cursos, além de iniciar uma presença virtual, com a criação das redes sociais da instituição, que estão para ser lançadas. “Nesse período de pandemia a gente fez doação de cestas básicas para as pessoas mais necessitadas da comunidade. Doou também kits de higiene pessoal para crianças, com creme dental, escova de dente, sabonete, e todo mundo saiu satisfeito”, relata Dona Eunice.

“O Fundo Baobá deu grande apoio para a gente nesse momento. A gente teve oficinas de associativismo, gestão social e governança; internet e redes sociais; captação de recursos e elaboração de projetos sociais”, conta a liderança. “Para a gente é uma satisfação porque os jovens se interessaram por esses assuntos, e assim não deixam morrer essas atividades na comunidade”, explica  ao comentar que nas oficinas de internet e redes sociais houve uma grande presença de jovens.

 

Teoria e prática: oficinas enriquecem o olhar da comunidade e envolve jovens na continuidade das ações

A professora Maria Albertina Lima Machado, 41 anos, moradora do povoado São Pedro e sócia do Clube de Mães, participou de seu primeiro projeto na Associação. “Eu tive a oportunidade de participar da oficina de associativismo e gestão social”. Ela conta que foi uma experiência muito enriquecedora e que, apesar de já ter uma noção de como fazer os documentos de uma associação, não sabia como fazer de uma associação de uma comunidade.

A professora acredita que as oficinas impactaram e trouxeram um conhecimento gigantesco para a comunidade, que já lida com negócios, mas não tinha tanta noção do planejamento e requisitos para o gerenciamento. “Vou levar para minha vida, porque a gente que pensa em gerir e gerenciar nossos negócios em uma comunidade precisa disso também. Aqui tem algumas pessoas que produzem, trabalham com hortas, e que aprenderam muito nesse curso com a questão dos gastos”, reitera.

Filomena Lica dos Santos, 28 anos, pedagoga e moradora da comunidade de São Pedro, participou das oficinas de captação de recursos; e internet e redes sociais. “Teve uma mudança radical aqui na nossa comunidade. Porque tem muitas pessoas que através dessas oficinas estão dando continuidade. Aquilo que aprenderam na teoria estão colocando na prática. Então foi muito enriquecedor para mim e para os demais jovens”, afirma.

Nicole Cintia Machado Santos, 13 anos, sempre participa das atividades da Associação com sua mãe, Maria Albertina. A adolescente participou das oficinas de internet e redes sociais e acredita que foi muito enriquecedor poder ter uma noção melhor sobre os computadores. “Eu achei bem interessante o que a gente trabalhou nela. Foi bom para a gente ter uma experiência, já tinha começado com um curso básico e esse foi mais avançado”, descreve.

Maria Albertina destaca ainda, que mesmo não participando das oficinas de internet e redes sociais, a realização delas impactou até mesmo em sua casa. “Minha filha participou e veio me ajudar também. Porque como estamos trabalhando de forma remota e eu não fiz curso de informática, então o conhecimento que ela adquiriu na oficina veio me ajudar. Alguma coisa que eu me atrapalhava, falava ‘Nicole vem aqui’. Então diretamente me ajudou”, pontua.

Dina Carla Barbosa Almeida, 46 anos, consultora do projeto do Clube das Mães, conta que se sentiu muito feliz em fazer este trabalho. “Aprendi temas novos e uma linguagem nova. O gerente de projetos tem que estar sempre aberto a receber, a ouvir, a aprender ali todos os dias. Então foi muito importante para mim ter conhecido o Baobá,  ter conhecido as pessoas e esta luta. Me sinto feliz por mais uma história que trilhamos”, afirma.

 

Desafios em tempos de pandemia

A pandemia de Covid-19 foi um desafio que exigiu que as mulheres se reinventassem durante toda a execução do projeto. Maria Albertina conta que tiveram que fazer muitas adaptações. “Inclusive na oficina de Associativismo. Tivemos que reduzir o número de participantes. A gente ainda estava com muito pavor. Precisamos fazer ao ar livre, com muito cuidado. Em todas as oficinas tivemos que fazer adaptações”. Mesmo assim, todas as ações planejadas foram concluídas, com os cuidados exigidos diante do contexto de crise sanitária.

Dina Carla relata que, mesmo antes do início da pandemia, o Fundo Baobá já estava inovando com a introdução de reuniões virtuais, por isso foi necessário planejar um bom ponto de internet. “Lá no início não tínhamos uma internet tão boa. Havia um ponto de internet na Escola Família Agrícola, que na época em nossa primeira reunião virtual não estava funcionando bem. Hoje as pessoas já têm internet lá”, destaca. 

 

Construção de uma Sede e novos projetos

Pra gente, participar do projeto do Fundo Baobá foi excelente, a gente fica muito agradecida”, diz Dona Eunice. As mulheres do Clube de Mães têm agora o desafio, junto com a União de Moradores de São Pedro, de encontrar apoio para viabilização do Centro de Desenvolvimento Social do povoado. Elas citam a necessidade de engenheiros, arquitetos, doação de materiais, tudo que contribua para a materialização do sonho desse espaço físico que será mais um avanço para a comunidade.

A dificuldade de espaço físico sempre foi algo presente. Inicialmente a Associação funcionava em uma casa de palha. Depois no salão da antiga mini usina de beneficiamento de arroz, que não era um espaço apenas da entidade. Atualmente está sendo viabilizado um terreno para a construção do que estão chamando de Centro de Desenvolvimento Social. 

“O terreno é bem no meio do povoado, para fazer a sede da Associação do Clube das Mães e a sede da união de moradores do povoado de São Pedro. A união de moradores trabalha mais com os homens, com a produção agrícola e fabricação de farinha. E o Clube das Mães com o desenvolvimento integral de crianças e adolescentes, e também a formação com as mulheres”, relata Dona Eunice.

Elas projetam que o novo espaço tenha uma sala de informática, já que as duas organizações têm computadores; sala de secretaria de cada organização; sala de exposição permanente como um museu rural, banheiros e cozinha com acessibilidade; sala de reuniões e sala para cursos e oficinas. “Não sei se o terreno vai caber tudo isso, mas eu acredito que vai suportar”, brinca Dona Eunice. “Então agora é outra batalha”, reforça.

Segundo ela, entre as próximas ações, haverá um concurso com premiação de poesia ilustrada, com o objetivo de estimular a questão da educação ambiental. “Para ver se a gente vai conscientizando crianças e adolescentes… Apesar da véspera dos 70 anos, a gente sempre está aprendendo também, com outras pessoas de outras idades, e sempre querendo que a vida seja melhor”, finaliza.

 

*Esta entrevista foi realizada pelo Fundo Baobá, em parceria com a Revista Afirmativa – Coletivo de Mídia Negra.

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