A saúde é um subtema dentro do eixo viver com dignidade, trabalhado pelo Fundo Baobá. Portanto, é uma das áreas onde o impacto das desigualdades e das injustiças sociais ficam mais evidentes. Desde a sua criação, o Fundo Baobá tem lançado editais que trabalham a promoção da saúde para população preta e parda. No ano de 2014 foi lançada a “1ª Chamada para projetos de Organizações Afro-Brasileiras da Sociedade Civil” – um fundo de apoio a pequenos projetos com o objetivo de apoiar por 12 meses, 22 organizações pequenas e médias da sociedade civil.

Entre os trabalhos selecionados estavam “Bancada de Arrambã no Gumé do Querebentã – Saúde no Terreiro”, da Federação de Cultura Negra do Vale do Itapecuru Mirim, no Maranhão, que além de possibilitar, direta e indiretamente, a melhoria do nível de conhecimento de 560 mulheres jovens e trabalhadores(as) rurais, transmitia informações e habilidades dos antepassados na área de saúde e educação alimentar e nutricional, patrimônio dos “gumés” de cultos afro-maranhenses.

Outro projeto contemplado foi “Saúde da População Negra em foco” da ACMUN – Associação Cultural de Mulheres Negras de Porto Alegre (RS), que tinha como premissa ampliar a informação aos usuários do SUS sobre a existência de uma Política Nacional de Saúde Integral da População Negra.

Em junho de 2018, foi lançado o edital “Negras Potências”, uma parceria do Fundo Baobá e Benfeitoria, com apoio de Coca-Cola Brasil e Movimento Coletivo, reunindo projetos de impacto que contribuem para o empoderamento de meninas e mulheres negras. Entre os 16 projetos selecionados estava “Doula a Quem Quiser”, da Associação de Doulas do Rio de Janeiro (RJ), que promove o acesso à informação de qualidade sobre gestação, parto e puerpério, salientando a questão da violência obstétrica vivenciada por mulheres.

“Parte da preocupação da ADOULASRJ era como mulheres periféricas, negras em especial, vivenciavam o ciclo gravídico-puerperal, o que chamamos de gestação-parto-puerpério”, diz Morgana Eneile, que está à frente da associação. Com o lançamento do edital, a associação enviou o seu projeto para análise: “A proposta era realizar encontros de educação perinatal dentro do sistema de atenção já existente, como medida de prevenção à violência obstétrica e consequentemente à mortalidade materna. Além disso, fazer a interlocução entre a promoção destes conteúdos, direitos e formas de acesso, articulando formas de denúncia ao seu descumprimento”, ressalta Morgana.

Associação de Doulas do Rio de Janeiro

Com o projeto selecionado pelo Fundo Baobá, deu início às atividades do “Doula a Quem Quiser”: “O trabalho que realizamos ocorreu nas Clínicas da Família na Zona Oeste do Rio de Janeiro, especificamente em Realengo, com a atuação em atividades coletivas de gestantes em atenção pré-natal. Ao mesmo tempo, foi articulada uma cooperação com a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, através da Coordenação de Direitos da Mulher,  para elaboração e publicação de uma cartilha de Direitos e um mecanismo de acompanhamento de denúncias”, relembra Morgana.

Segundo ela, ter o projeto selecionado pelo Fundo Baobá foi fundamental para a promoção da saúde e da humanização do parto: “Os trabalhos realizados através do edital colaboram com a constituição de novas modelagens para a atuação das Doulas dentro da atenção primária à Saúde. Muito do que se referencia sobre doulas tem um olhar sobre o trabalho de parto em si, com o suporte realizado neste momento”, disse. 

O projeto abriu outras portas para a instituição de mais construções para mulheres que não tinham a oportunidade de acessar outras modelagens de atenção perinatal, baseadas em atividades coletivas. Para isso, também foi constituída uma modelagem específica pensada para a abordagem permeada pelo lúdico e constituída para mulheres que não necessariamente buscam informações sobre parto natural/humanizado, geralmente acessível às classes privilegiadas. Esse processo formativo, em que as discussões sobre racismo estrutural e institucional foram centrais, potencializaram a atenção da instituição como vocalizadora deste enfrentamento. Estamos sistematizando a experiência para poder dividir com outras organizações”, finaliza.

No mesmo ano, em parceria com a Fundação OAK, foi lançado o edital “A Cidade Que Queremos”, voltado para região Nordeste.  Além da saúde, trabalhou os eixos temáticos de educação, meio ambiente, segurança, trabalho, transporte, habitação, serviços, lazer e cultura. Entre os 10 projetos selecionados estava o Grupo Mulher Maravilha de Pernambuco, uma organização não governamental, com certificado de entidade beneficente de assistência social, filiada à Associação Brasileira de ONGs (ABONG), ao Movimento Nacional dos Direitos Humanos (MNDH), ao Fórum de Mulheres de Pernambuco (FMPE), ao Fórum de Economia Solidária e a Articulação Aids. 

“O Grupo Mulher Maravilha iniciou, em meados dos anos 1980, suas ações de saúde popular junto às mulheres que aprenderam a fazer auto-exame com espéculo de acrílico e espelho, e a se curar com ervas medicinais.”, relembra Maria de Lourdes Araújo Luna, assistente social e Suplente da Coordenação do grupo que, posteriormente, foi convidado para participar de grande campanha de prevenção ao HIV no bairro de Nova Descoberta e Morro da Conceição. No ano de 2001 teve seu primeiro projeto aprovado como o nome Mulheres na Prevenção da Aids, no Recife, e depois Mulheres se Fortalecem na Prevenção da Aids.

Selecionado pelo Fundo Baobá, o GMM começou a executar as suas ações: “O maior trabalho com o  apoio do Fundo Baobá foi a possibilidade da abertura de espaço de diálogo na comunidade sobre o direito a ter saúde, a um meio ambiente equilibrado nas periferias e a reflexão sobre a importância do reconhecimento de ser mulher negra, num contexto político de grande expectativa e ameaça de perda de direitos”, frisa Maria de Lourdes, que entre as inúmeras ações realizadas, elenca os principais destaques: “Realizamos rodas de conversa com várias temáticas, como saúde da mulher negra na perspectiva dos direitos humanos; criação de comissão de acompanhamento de demandas/denúncias da comunidade sobre o descaso do governo com a saúde pública; realização de oficinas de formação de políticas públicas e conjuntura política com foco na Reforma da Previdência”. As oficinas ainda incluíram temas como alimentação saudável, estética afro, jardinagem e ações de prevenção e de enfrentamento à violência doméstica e sexual contra mulheres através de práticas integrativas de auto-cuidado com massagem, yoga, biodança e mapeamento afetivo.

Grupo Mulher Maravilha

Para Maria de Lourdes, o maior legado que o GMM teve após a participação no programa “A Cidade Que Queremos” foi a construção do Núcleo Dandara situado em Nova Descoberta: “O Núcleo Dandara dá maior visibilidade à luta pela saúde da população negra e formação cidadã do Grupo Mulher Maravilha na comunidade, fortalecendo articulação com serviços do Distrito Sanitário, do CRAS, Conselhos de Saúde, da Mulher e Fóruns de Mulheres Negras”, finaliza.      

Em 2019, foi o lançamento do “Programa Marielle Franco de Aceleração do Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras”, em parceria com a Ford Foundation, Open Society Foundations, Instituto Ibirapitanga e a W.K. Kellogg Foundation, e que  teve entre as propostas selecionadas o projeto “Racismo e a interface com a violência doméstica na Saúde”, da participante Magna Barboza Damasceno (SP). 

No mesmo ano, uma parceria entre o Fundo Baobá, W.K. Kellogg Foundation e Fundação Lemann, que trabalha com educação e formação de lideranças, criou um fundo patrimonial de R$ 7,5 milhões, voltado para o apoio a estudantes negros brasileiros através de bolsas de pós graduação nas universidades de Harvard, Columbia, Stanford e MIT. E entre as áreas de pós graduação ofertadas está a saúde.

Segundo Magna, o projeto “Racismo e as interfaces com a violência doméstica na Saúde” ampliou a capacidade de liderança de forma mais assertiva e assegurou discussões sobre o racismo institucional no campo do trabalho por meio de aperfeiçoamento de técnicas de gestão. “Inicialmente, nosso trabalho era organizar a base de dados sobre violência interpessoal/doméstica, dentro do território trabalhado por meio de uma plataforma com três elementos: um banco de dados em tempo real, boletins informativos sobre o agravo e uma leitura que pressupõe o tratamento de dados para a atuação local e a gestão da clínica”, explica ela.

Magna diz que é de conhecimento que a população negra é um público com alta vulnerabilidade e que, em muitas circunstâncias, tem suas necessidades negligenciadas, impactando diretamente em sua saúde. “São as mulheres negras que mais sofrem violência doméstica e também são elas as que mais utilizam os serviços de saúde do SUS”, afirma. 

Reunião do projeto “Racismo e as interfaces com a violência doméstica na Saúde”. Embaixo: Magna Barboza Damasceno (Coordenadora da Rede de Atenção às Pessoas em Situação de Violência Doméstica e Sexual), à esquerda Giovana Neves Damasceno (Gestora de projetos responsável pelo aplicativo), à direita Raquel Regina Rodrigues Monteiro (Articuladora de rede)

Além da plataforma prevista, o financiamento do projeto propõe um momento de imersão dos trabalhadores de saúde sobre as questões que abarcam raça/cor/etnia e a saúde da população negra. Traz elementos para pensar novas abordagens sociais/clínicas do ponto de vista institucional e como essas intersecções interferem nas condições de saúde da população negra. “Isso permite uma reflexão por parte dos trabalhadores na mudança da perspectiva do trabalho de maneira mais crítica, o que pode impactar de forma mais eficaz e positiva no atendimento em saúde”, finaliza.

Manter o foco em saúde é uma necessidade, sobretudo neste momento de pandemia. Com foco nessa questão, o Fundo Baobá tem promovido editais de doações emergenciais para projetos de prevenção à contaminação pelo coronavírus e ações pontuais para combater o avanço da pandemia.

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