O Fundo Baobá para Equidade Racial em parceria com a Conaq (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas) lançam o edital Quilombolas em Defesa: Vidas, Direitos e Justiça. O objetivo do edital é apoiar iniciativas de organizações quilombolas para promover a sustentabilidade econômica nas comunidades, a geração de renda, promover a soberania e a segurança alimentar, além de defender os direitos quilombolas nas comunidades.
Fundo Baobá, Fundo Brasil de Direitos Humanos e Fundo Casa Socioambiental que, juntos, constituem a Aliança entre Fundos, atuam em prol da justiça racial, justiça social e justiça ambiental. As ações da Aliança são financiadas pela Fundação Interamericana (IAF). Os três, com editais independentes, pretendem contribuir na redução dos impactos que as crises sanitária e econômica vêm ocasionando nos povos indígenas, comunidades quilombolas e outros povos tradicionais mais vulnerabilizados pela pandemia da COVID-19.
De acordo com a Conaq e o IBGE, o Brasil conta com cerca de 6 mil comunidades quilombolas. Dessas, apenas 2.819 já foram certificadas, estando 1.727 localizadas no Nordeste, 450 no Sudeste, 300 no Norte, 191 no Sul e 151 no Centro-Oeste.. Mais de 70% das comunidades quilombolas certificadas, que têm direito à terra coletiva, estão em quatro estados: Maranhão, Minas Gerais, Bahia e Pará. Segundo a Fundação Cultural Palmares, responsável pela emissão das certidões para as comunidades quilombolas e inclusão das mesmas em um cadastro geral, 3.475 comunidades quilombolas foram reconhecidas, porém ainda aguardam certificação (2196 no Nordeste, 547 no Sudeste, 369 no Norte, 193 no Sul e 169 no Centro-Oeste). Os quilombolas têm, em sua maioria, a agricultura e a pecuária como principais atividades econômicas. A preservação de sua cultura vem da oralidade ancestral e da resistência que têm exercido ao longo de suas existências.
“Para nós do Fundo Baobá este edital é um marco. Estamos celebrando 10 anos e será a primeira vez que teremos um edital exclusivo para quilombolas. O edital foi todo desenhado em parceria com a Conaq e se apresenta como uma grande oportunidade para fortalecer as estratégias de ativismo, resistência e resiliência das comunidades quilombolas no contexto da pandemia da covid-19. Sabemos que as organizações de base comunitária nem sempre conseguem acessar recursos, em especial organizações comunitárias lideradas e constituídas por povos tradicionais, por isso o edital também é uma oportunidade para contribuir no aprimoramento da filantropia para justiça social”, afirmou a diretora de Programa do Fundo Baobá, Fernanda Lopes.
Entidades e valor do apoio
Apenas organizações lideradas e constituídas por quilombolas poderão se inscrever. Essa é a principal premissa do edital. Os recursos financeiros e o apoio técnico irão para a base comunitária. Serão apoiadas até 35 (trinta e cinco) iniciativas. Para cada uma caberá um montante de R$ 30.000 (trinta mil reais), perfazendo R$ 1.050.000 (Um milhão e cinquenta mil reais). As organizações selecionadas também irão receber investimentos indiretos por meio de assessoria e apoio técnico visando seu fortalecimento institucional. O edital completo poderá ser lido neste link.
Inscrições
As inscrições para o edital Quilombolas em Defesa: Vidas, Direitos e Justiçacomeçam no dia 23 de setembro e vão até as 23h59 do dia 25 de outubro (horário de Brasília). As demais fases do processo seletivo estão descritas no edital.
Para se inscrever basta acessar o site oficial do edital.
Eixos Temáticos
Cada organização deve apresentar apenas uma proposta que verse sobre um dos eixos temáticos propostos:
Recuperação e sustentabilidade econômica nas comunidades quilombolas;
Promoção da soberania e segurança alimentar nas comunidades quilombolas;
Resiliência comunitária e defesa dos direitos quilombolas.
Desde 1996 o Brasil celebra o Dia de Adolescentes (21). Setembro também é o mês em que se celebra o Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio (10). Em alusão a esta data, desde 2014 acontece a campanha nacional Setembro Amarelo, por iniciativa da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) e do Conselho Federal de Medicina (CFM) e sendo aderida em 2015 pelo Centro de Valorização da Vida (CVV).
Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), no Brasil, todos os anos, cerca de 12 mil pessoas tiram a própria vida. Isso representa quase 6% da população. A OMS também informa que o suicídio é a terceira causa de morte de jovens brasileiros entre 15 e 29 anos.
Dados do Ministério da Saúde, revelam que, em 2019, a taxa de jovens negros entre 10 e 29 anos de idade que cometeram suicídio foi 45% maior que a observada entre jovens brancos na mesma faixa etária. A pergunta que fica é: Qual são os possíveis motivos que levam o adolescente/jovem negro brasileiro a experimentar este risco acrescido de suicídio?
Para a psicóloga, mestre em Saúde Comunitária, doutora em Saúde Pública, docente na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia e idealizadora da página Saúde Mental da População Negra, Jeanne Saskya Campos Tavares, é preciso voltar no tempo e analisar que o suicídio funciona como estratégia política da população negra no Brasil desde a colonização: “No passado, por diferentes meios, pessoas negras davam fim a sua própria vida e de seus filhos para que não mais fossem submetidos aos horrores da escravização”.
Nos tempos atuais, Jeanne afirma que o racismo continua diretamente ligado à ideação e comportamento suicida, uma vez que este não é um problema individual, mas um processo coletivo: “Ele se relaciona com a necessidade do jovem negro de cessar um intenso sofrimento através da morte e à percepção de que não há esperança de que, em algum momento, terá uma vida que valha a pena viver. Neste sentido, o racismo está diretamente relacionado às questões sociais, de baixa auto-estima e de violência no ambiente escolar desde a infância”.
Jeanne faz questão de salientar que o racismo é um importante fator que vulnerabiliza os adolescentes e jovens negros brasileiros e pode ser entendido como um fator predisponente para o suicídio: “Pois ele impede o acesso aos direitos de cidadania, expõe as pessoas negras a múltiplas violências cotidianas que envolvem desde situações continuadas de humilhação pública, até a possibilidade de sua própria morte e encarceramento ou encarceramento de conhecidos e familiares. Essas experiências comprometem significativamente a saúde mental da maioria das pessoas negras, pois relacionam-se com a baixa qualidade de vida e impossibilidade de receber apoio social em diferentes contextos”.
Em 2020 e 2021, tivemos que lidar (e estamos lidando) com um fato que afetou diretamente a vida e a saúde mental das pessoas do mundo inteiro: a pandemia da Covid-19. Durante este período, Jeanne Tavares realizou uma série de lives intituladas Saúde mental da população negra em tempos de pandemia, que dialogavam diretamente com os mais afetados nesta crise sanitária. Jeanne diz que o novo coronavírus impactou diretamente na saúde mental dos adolescentes e jovens negros: “A saúde mental foi afetada porque foram expostos à maior insegurança do que já viviam. Não era apenas o risco de contaminação pelo vírus, pois muitos continuaram desenvolvendo atividades laborais, geralmente informais, junto com suas famílias, mas tiveram que lidar com a morte e adoecimento dos seus familiares e conhecidos que, em sua maioria, não puderam estar em trabalho remoto”. Jeanne frisa que, em um ano de pandemia, os jovens experienciaram todas as dificuldades relacionadas à perda de emprego entre os seus e ao empobrecimento coletivo, além da paralisação de suas atividades escolares com comprometimento do apoio que a comunidade escolar pode oferecer, “ainda que tendo muitas limitações, é um contexto reconhecido como protetor e de acesso à alimentação e contatos sociais diários”.
Diante de todo esse cenário, fica evidente que o cuidado com a saúde mental de adolescentes e jovens negros é essencial. Políticas, programas, iniciativas para enfrentar o racismo no ambiente escolar, dialogar sobre orientação sexual, identidade de gênero, entre outras intersecções que contribuem para a vulnerabilidade e podem levar ao suicídio de jovens negres. Trabalho de base realizado em um ambiente escolar, educação básica de qualidade, manutenção de jovens negres na escola, todos estes pontos estão em jogo quando falamos sobre saúde integral e saúde mental, em especial. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2018 um terço dos brasileiros entre 19 e 24 anos não havia conseguido concluir o ensino médio. Entre os que não conluíram esta etapa, 44,2% eram homens jovens negros. Um dos motivos da evasão escolar entre negros do sexo masculino, com menos de 18 anos, é o ingresso no mercado de trabalho. O relatório Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil, divulgado em 2019 pelo IBGE, mostra que as pessoas negras representam 75% entre os mais pobres. A educação de má qualidade, o ambiente que segrega e a carência econômica contribuem para a busca por emprego em detrimento à formação escolar.
Sobre esta conexão entre situação socioeconomica e educacional, Jeanne acredita que as políticas de redistribuição de renda e as políticas afirmativas, não apenas as cotas como também as que garantam a permanência de crianças, adolescentes e jovens do ensino fundamental ao superior, podem ser interpretadas também como políticas promotoras de saúde mental: “É importante salientar que a saúde mental da população negra está diretamente associada à nossa qualidade de vida, por isso todas as políticas que nos permitam viver numa sociedade equânime, com acesso à alimentação, água, justiça, paz, trabalho, moradia, liberdade de trânsito nas cidades, saúde, educação, descanso, dentre tantos outros direitos humanos, são também produtoras de saúde mental e nos protegem em relação ao suicídio”. Finaliza.
Já É: Promovendo educação, equidade racial e qualidade de vida
Compreendendo as conexões entre educação de adolescentes e jovens, qualidade de vida, saúde mental e justiça racial, o Fundo Baobá lançou em 2020 o Programa Já É: Educação e Equidade Racial. Em parceria com a Citi Foundation, Demarest Advogados e Amadi Technology, o Programa Já É foi criado pelo Baobá com a premissa de impulsionar o ingresso de jovens negros e periféricos nas universidades, através do custeamento dos gastos em um curso pré-vestibular e também transporte e alimentação.
Jakeline Souza Lima, 22 anos, é uma das jovens apoiadas pelo Já É e uma das defensoras da promoção de uma educação de qualidade para o fim do racismo estrutural: “A educação é a ferramenta mais potente para transformar as estruturas, para sanar os problemas que estão enraizados há tanto tempo na nossa sociedade”. Apesar desta certeza, Jakeline também acredita que a educação precisa ser crítica e empoderadora, principalmente no que diz respeito a história negra: “É preciso que nossa história seja passada como realmente foi: cheia de lutas, com muita potência, inventividade, riqueza e orgulho, e não como tem sido desde sempre, quase nos ensinando a termos vergonha e aceitar tudo que nos dizem”.
Foi a falta dessa educação crítica e empoderadora, que fez Jakeline sofrer racismo dos 7 aos 14 anos no ambiente escolar: “Os alunos zoavam tudo em mim: o meu cabelo, a cor da minha pele, o meu nariz e o meu peso. Essas ofensas afetaram demais minha autoestima, passei a me sentir feia, achar que eu nunca seria amada; passei a não ter mais vontade de sair e ter medo de ser vista demais, queria ficar escondida e chamar o mínimo de atenção possível”.
Mesmo com a saúde mental abalada pelos ataques racistas na adolescência, durante o ensino médio, Jakeline Lima teve contato com o movimento dos estudantes secundaristas, com o teatro e também com o grêmio estudantil. Montou uma chapa com alguns amigos e realizou um trabalho de conscientização, enfrentamento ao racismo, e outras formas de discriminação: “Realizamos a Semana da Alteridade, levando os alunos mais novos para a biblioteca para contarmos as nossas experiências e explicar o porquê não era bom ofender o amigo, além de várias outras questões”,
Hoje no Programa Já É, Jakeline quer cursar artes cênicas e credita ao teatro um divisor em sua vida: “No teatro eu lidei, e sigo lidando, com as questões mais pessoais, passei a trabalhar minha relação com a imagem e transformar minhas dores em criações, juntar minhas dores com as de muitas pessoas e lutar, criar um coro, forte e potente”.
Assim, Jakeline Lima faz questão de reforçar a importância da educação como sendo caminho de potencialização e transformação: “Através da educação a gente se enxerga na história e tem orgulho dela, tanto da que escreveram antes de nós, mas também da que estamos escrevendo”, afirma a estudante, também frisando que o Fundo Baobá, através do Programa Já É, tem permitido que outros adolescentes e jovens escrevam a sua própria história: “O Programa Já É, é um desses caminhos que usa a educação para nos devolver, para nos dar perspectiva, para nos fazer acreditar que somos capazes e também para nos mostrar que, quase cem jovens estão juntos e, se apenas um passar na universidade, todos passam, porque representamos a nós mesmos, mas também toda nossa família que muitas vezes não tiveram a mesma oportunidade que nós”.
No dia 9 de setembro, o Fundo Baobá para Equidade Racial divulgou a lista das organizações selecionadas no edital Vidas Negras: Dignidade e Justiça, iniciativa lançada no dia 5 de maio, com apoio do Google.Org, braço filantrópico do Google, e que tem a premissa de apoiar entidades negras que atuam no enfrentamento do racismo e incorreções que ocorrem dentro do sistema de Justiça Criminal no Brasil.
Ao todo foram selecionadas 12 iniciativas, divididas pelos seguintes eixos:
I – Enfrentamento à violência racial sistêmica II – Proteção comunitária e promoção da equidade racial III – Enfrentamento ao encarceramento em massa entre adultos e jovens negros e redução da idade penal para adolescentes IV – Reparação para vítimas e sobreviventes de injustiças criminais com viés racial
Entre as organizações selecionadas temos organizações de mulheres negras e que atuam no enfrentamento à violência racial contra as mulheres, aquelas que atuam no enfrentamento ao racismo religioso, outras que dão visibilidade à situação de encarceramento de mulheres negras, organizações quilombolas que atuam na defesa dos direitos quilombolas, sobretudo o direito à terra. Organizações antiproibicionistas, outras que atuam na defesa do direito à moradia para famílias sem teto de baixa; aquelas que congregam familiares e vítimas de violência do Estado e outras que prestam assistência biopsicossocial e jurídica a familiares de pessoas privadas de liberdade.
As organizações selecionadas estão localizadas nas regiões Sudeste, Norte e Nordeste do país, oriundas dos estados de Espírito Santo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo, Amapá, Pernambuco e Ceará.
O edital contou com três etapas de seleção sendo que, na última fase, as organizações participaram de um painel de entrevistas conduzido por especialistas e membros da governança do Fundo Baobá. As entrevistas foram realizadas considerando o eixo temático escolhido pela organização no momento da inscrição e cada eixo contava com 2 ou 3 entrevistadores(as).
Para a graduanda em direito, monitora das disciplinas de Sociologia Geral e Assessoria Jurídica Popular na FND/UFRJ, também monitora no curso de extensão Promotoras Legais Populares e liderança comunitária na Baixada Fluminense, Thuane Nascimento, ter atuado no comitê de seleção entrevistando as e os representantes de organizações que inscreveram seus projetos no eixo III Proteção Comunitária e Promoção da Equidade Racial, dialoga perfeitamente com a sua área de atuação, desde quando ela entrou na universidade: “Essa lógica da proteção comunitária junto com a promoção da equidade racial tem tudo a ver com o trabalho que eu desenvolvo. Nós sabemos que quando um território está seguro, a pessoa que mora lá se sente segura naquele território. Entendemos que é a comunidade que consegue dar uma segurança e um aporte para a pessoa que está morando ali”.
Segundo Thuane, essa proteção que a comunidade oferece aos seus moradores, de maioria negra e pobre, faz parte do senso coletivo que está enraizado desde a construção desse local: “As favelas, os assentamentos e as ocupações são construídos numa lógica de coletividade. Isso é muito importante, porque na coletividade as pessoas aprendem a respeitar um ao outro e aprendem a proteger um ao outro”.
Thuane atuou em um projeto chamado Circuito Favela por Direito, onde ela pôde vivenciar de perto o senso de coletividade existente nas comunidades do Rio de Janeiro: “Em muitas comunidades existe um grupo de WhatsApp para poder falar onde estava acontecendo um tiroteio, para avisar qual lugar que estava perigoso, além dos grupos de WhatsApp entre as mães. Proteção comunitária tem tudo a ver com o território”, afirma.
Quem também atuou no comitê de seleção do edital Vidas Negras, em diálogo com organizações que apresentaram suas propostas no eixo IV: Reparação para vítimas e sobreviventes de injustiças criminais com viés racial, foi a doutora e mestra em Direito Constitucional e Teoria do Estado; Professora do Departamento de Direito da PUC-Rio; Coordenadora Geral do NIREMA – Núcleo Interdisciplinar de Reflexão e Memória Afrodescendente – e professora visitante Jr. no African Gender Institute, University of Cape Town, Thula Pires, que também vê ligação entre a sua área de atuação e o eixo em que realizou entrevistas: “O eixo de Reparação é aquele que mais evidencia a necessidade do Estado se responsabilizar pelas violências que (re)produz e, nesse sentido, dialoga muito intrinsecamente com o campo do Direito Constitucional e da Teoria do Estado”.
No eixo IV foram selecionadas três organizações, todas da região Sudeste. Thula analisou e traçou o perfil característico de cada uma: “As organizações selecionadas no eixo IV nos oferecem a possibilidade de incidir em diferentes dimensões na reparação às vítimas de injustiças raciais. Do direito à moradia, em toda sua complexidade, aos desafios da política de drogas e da política prisional, passando pelo racismo religioso, temos distintas e estratégicas áreas de enfrentamento às violências promovidas, sobretudo, pelo Estado brasileiro”.
Ao relembrar a sua atuação no eixo II, Thuane fala dos diferentes perfis das quatro organizações selecionadas que, segundo a própria, deixou a escolha dos projetos ainda mais interessante. Entretanto, ela fez questão de destacar um dos projetos selecionados: “Uma organização da Região Norte que está situada em uma comunidade quilombola e eles queriam expandir o trabalho para dezenas de comunidades, em um lugar que o principal meio de transporte é o fluvial. Eu fico imaginando a dificuldade: já trabalhavam com algumas comunidades e querem expandir ainda mais o trabalho. Isso é de uma importância imensa”. No caso, Thuane se refere à organização selecionada Associação de Jovens Moradores e Produtores Rurais de Santa Luzia do Maranum I (Ajomprom), localizada em Macapá, no Amapá.
Ao lembrar dessa organização, Thuane Nascimento fala sobre as potencialidades dos projetos e das organizações selecionadas; as expectativas em relação às mudanças que poderão ser geradas na sociedade, além da importância da realização do edital Vidas Negras: “Se as organizações conseguem fazer um trabalho tão bom e chegar até aqui, mesmo sem tanto apoio financeiro e sem um apoio de rede, imagina onde que elas vão conseguir chegar com esse apoio do Fundo Baobá? Eu acredito que teremos muitas mudanças, talvez não seja uma mudança como a gente pensa, que vai abranger a todos, porque nem é essa a proposta, mas vai mudar a comunidade local, vai avançar no sentido dela se sentir protegida, se sentir conscientizada e conseguir avançar nas pautas e demandas que elas precisam para poder se manter e produzir em seu território”.
Para Thula Pires, os projetos selecionados têm a potencialidade de produzir impactos importantes na sociedade brasileira: “Não apenas na redefinição e monitoramento de políticas já existentes, como também na possibilidade de ampliarmos as ações de organizações negras em comunidades e grupos historicamente negligenciados pelas políticas públicas. Em tempos de acirramento da violência e da produção da morte em escala, medidas de enfrentamento às injustiças raciais são não apenas bem-vindas, mas efetivamente necessárias”. Ela também faz questão de ressaltar a importância da realização do edital Vidas Negras: Dignidade e Justiça: “através deste edital, o Fundo Baobá cumpre um papel fundamental na viabilização de ações promovidas por pessoas negras no enfrentamento concreto às injustiças raciais. O apoio financeiro para o desenvolvimento das ações, ao ser acompanhado pelo suporte técnico para o fortalecimento institucional, é capaz de preparar as organizações para intervenções futuras e para ampliar o acesso a outros editais e programas. Nesse sentido, atua tanto no fortalecimento das comunidades, vítimas e sobreviventes das injustiças raciais, como na ampliação da capacidade de incidência das organizações negras de promoção da justiça racial”, finaliza.
Rosana Fernandes e Helio Santos lançam um olhar sobre a sociedade brasileira diante do segmento da filantropia para justiça social
Por Wagner Prado
Dois profundos analistas da sociedade brasileira. Ambos com trabalhos que envolvem a observação das movimentações sociais e a influência dos diferentes fatores econômicos no dia a dia das pessoas. O passado de ambos está ligado à formação do Fundo Baobá para Equidade Racial. A historiadora Rosana Fernandes e o administrador e professor Helio Santos falam sobre doações, consciência social, futuro e a atuação do Baobá dentro desses contextos.
Rosana Fernandes é formada em História pela Universidade Católica de Salvador e faz parte da CESE (Coordenadoria Ecumênica de Serviço), onde atua no Setor de Projetos e Formação. A CESE foi criada há 48 anos e sua atuação está voltada para a defesa e garantia de direitos das pessoas no Brasil. Essa defesa de direitos é motivada por questões de injustiças e desigualdades tão presentes no cotidiano dos brasileiros. A CESE foi criada pela união de várias igrejas cristãs.
Helio Santos é doutor em Administração e mestre em Finanças. O doutorado foi obtido na Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP). Atuou como professor na Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas) e Universidade São Marcos. Atualmente é professor convidado na Universidade do Estado da Bahia (Uneb).
O ano de 2022 será de transformações políticas no Brasil. A eleição poderá mudar o ocupante do cargo de presidente da República, além de 27 governadores de Estado. Com certeza, novas diretrizes serão adotadas, e elas sempre impactam todos, principalmente os cidadãos e cidadãs comuns. O país encontra-se entre as 19 maiores economias do planeta, mas isso não é visto como positivo em relação à política por equidade racial e o incentivo a doações. “Por mais de uma década o Brasil esteve entre as dez maiores economias do mundo. Então, até um dia desses estávamos junto com China, Japão, Alemanha, Estados Unidos e Canadá. Ao mesmo tempo, estivemos também no banco dos mais desiguais. Se quando estávamos entre os dez mais ricos, sempre houve uma escassez de recursos, o que dará uma vantagem para nós não é essa colocação do Brasil em 19º lugar, esqueça dela, e sim a mudança da sociedade”, disse Helio Santos.
Rosana Fernandes é ainda mais reticente ao analisar a tão propalada posição brasileira no ranking da economia mundial. “ Eu questiono muito os índices de crescimento econômico, quando analiso o desemprego e o subemprego. A Pandemia trouxe um número muito grande de pessoas em situação de rua. Está havendo uma migração para cidades menores para se ter uma garantia de vida. Mas não há políticas públicas para a garantia de um lugar de qualidade de vida e de melhoria de vida para essa população. E a fome aumentou. E quem está passando fome? A gente sabe que a fome tem cor”, falou a historiadora.
Mudanças de consciência e engajamento das pessoas em causas que favoreçam populações em situação de vulnerabilidade não acontecem de uma hora para a outra. Mas uma cultura que leve a isso deve ser apoiada, mesmo que a mudança venha de forma lenta. “Se a pessoa acredita e pensa numa sociedade justa, colocar recursos financeiros no Baobá, que luta pelo enfrentamento ao racismo, significa você querer um outro Brasil, uma sociedade melhor. O apoio ao Baobá é fundamental para equilibrar a balança um pouco mais a favor da maioria nesse país. E a maioria é negra. Quem quer fazer a diferença deve colocar recursos no Baobá”, disse Rosana Fernandes.
Iniciativas como as que o Fundo Baobá empreende no ecossistema filantrópico com seus editais voltados para o apoio a comunidades quilombolas, para o acesso de jovens negres à universidade e incentivo ao empreendedorismo estão modificando o pensar sobre engajamento social. “A filantropia racial hoje é o tema da sociedade brasileira. O Fundo Baobá tem muito a ver com isso, porque ele é o primeiro fundo criado com essa vertente e organização. A missão dele é exatamente transferir e fomentar recursos para as organizações negras. O Fundo Baobá tem uma responsabilidade direta nessa mudança. Isso é resultado do esforço da sociedade civil, da qual o Baobá faz parte. E hoje se entende o investimento social como uma mola para o desenvolvimento com sustentabilidade. Então, a vantagem de se doar para o Fundo Baobá é você investir no segmento da equidade racial”, define Helio Santos.
A fidelização, palavra muito usada no segmento corporativo, é o grande desafio para o Fundo Baobá e para o segmento da filantropia para equidade racial, no entender de Rosana Fernandes: “Precisamos ter um discurso direto e respostas objetivas. Mas este é o grande desafio. Como atrair voluntários doadores? Acho que a capacidade de dialogar com a sociedade é que talvez nos dê a independência e a autonomia necessárias. Se a gente trouxer a sociedade para o enfrentamento ao racismo, a gente pode estar trazendo a fidelização para uma estrutura”, afirmou.
O Baobá trabalha com a empatia. Analisa os movimentos da sociedade brasileira e faz a escuta sobre as necessidades das populações menos favorecidas. Neste período de Pandemia da Covid-19, essas carências ficaram muito evidenciadas. Hélio Santos analisa: “Solidariedade e generosidade. São elas que permitem sentir a qualidade de uma sociedade. Às vezes, a solidariedade e a generosidade estão acima da própria ética. É arriscado dizer isso, mas muitas vezes tenta-se estruturar ética onde não há nem solidariedade nem generosidade. Essas duas características são eminentemente humanas. Elas são o resultado da empatia e da capacidade que se tem de estar no lugar do outro. Eu hoje meço a qualidade de uma sociedade não só pela renda per capta, não só por parâmetros econométricos. Eu meço pela capacidade que ela tem de produzir empatia. Pela capacidade de estar no lugar do outro. O homem pode, a partir do seu corpo masculino, entender o que significa para uma mulher o estupro. Uma pessoa branca pode muito bem entender o que é a pessoa ser discriminada pelo exclusivo motivo de ser negra, da mesma forma que uma pessoa que tem posses pode muito bem se posicionar e se colocar na situação desses 19 milhões de brasileiros que acordam pela manhã sabendo que não terão ao longo do dia como se alimentar. Então eu acho que radicalizar na empatia é fundamental, é uma forma de demonstrar a qualidade de uma sociedade. Mas que qualidade? A qualidade moral”, declarou.
O lançamento da Aliança Entre Fundos, iniciativa composta pelo Fundo Baobá para Equidade Racial, Fundo Brasil de Direitos Humanos e Fundo Casa Socioambiental, que tem como meta promover o maior aporte de recursos diretos para os povos indígenas, comunidades quilombolas e outros povos tradicionais mais vulnerabilizados pela pandemia da COVID-19, foi destaque na imprensa no mês de agosto.
O Pacto de Promoção da Equidade Racial, lançado em julho, é outra iniciativa que conta com a participação do Fundo Baobá, com contribuições importantes de membros do Conselho Deliberativo e Assembleia Geral, além da diretora executiva. Assim como no mês anterior, o Pacto segue reverberando na mídia, sendo tema da coluna da sócia-fundadora da Wright Capital Wealth Management, Fernanda Camargo, no eInvestidor, dentro portal do Estadão e também destaque no site do Grupo de Institutos Fundações e Empresas GIFE.
Falando no GIFE, o evento online Black Philanthropy Month (Mês da Filantropia Negra) organizado pelo Grupo e que contou com a participação da diretora-executiva do Fundo Baobá, Selma Moreira, como principal expositora, foi destaque no portal do Observatório do Terceiro Setor. O portal publicou uma matéria completa, no dia 5 de agosto, registrando os principais acontecimentos do evento.
Duas matérias produzidas pelo Fundo Baobá e publicadas originalmente no site oficial da organização foram compartilhadas em outros portais. O texto “A contribuição negra para a comunicação no Brasil”, que traz uma entrevista com o jornalista, mestre em Comunicação Social, doutor em Educação e membro do Conselho Deliberativo do Fundo Baobá, Edson Cardoso, foi compartilhado no portal Nação Z. Enquanto a matéria “Por que celebramos hoje o Dia Internacional das Pessoas Afrodescendentes?”, referente a data celebrada no dia 31 de agosto, contando com a entrevista do doutorando em Saúde Coletiva (PPGSCM/IFF/Fiocruz), mestre em Políticas Públicas em Direitos Humanos (UFRJ), psicólogo, pesquisador da Fiocruz e coordenador do Plano Fiocruz de Enfrentamento à Covid-19 nas Favelas do Rio de Janeiro, Richarlls Martins, foi publicada também no portal Neo Mundo.
Apoiadas do Fundo Baobá
Sobre organizações, grupos, coletivos e lideranças apoiadas pelo Fundo Baobá, no dia 8 de agosto, tivemos uma entrevista com Dandara Rudsan Sousa de Oliveira, formada em Direito e com especialização em Diálogos e Mediação de Conflitos, atuante na Rede de Mulheres Negras Amazônicas e no Núcleo de Mobilização de Recursos dos Movimentos Negros e LGBTQI+ unificados em Altamira, no Pará. Dandara, que é uma das apoiadas no edital 1 do Programa de Aceleração e Desenvolvimento de Lideranças Femininas: Marielle Franco, conversou com a revista Trincheira Democrática, falando sobre os direitos das pessoas LGBQIA+.
Outra apoiada do Programa de Aceleração, a advogada, responsável pelo projeto Justiça Juvenil do programa Prioridade Absoluta do Instituto Alana e criadora da página “Sonhe alto, Pretinha”, Mayara Silva de Souza, escreveu o artigo “Esporte na infância é direito, liberdade e diversão”, dentro da coluna no portal UOL Ecoa, falando da importância da prática esportiva na infância, citando a adolescente Rayssa Leal, que aos 13 anos de idade foi medalha de prata no skate nas olimpíadas de Tóquio.
O projeto Rodas de Conversa, que abordou questões sobre racismo e povos indígenas do Acre, aconteceu nos dias 17, 19, 24 e 26 de agosto e contou com a participação da pedagoga, mestra em Educação pela UFAC e fundadora da Rede Mulher Ações Neabi-UFAC, Sulamita Rosa, que esteve no último dia de evento virtual palestrando sobre o tema “A importância das ações afirmativas na superação de racismo estrutural”. Sulamita também é uma das apoiadas no Programa de Aceleração de Lideranças Femininas Negras. O evento foi divulgado no portal da Defensoria Pública do Estado do Acre.
Outras apoiadas deste Programa ganharam destaques na imprensa. O Grupo de Mulheres Lésbicas e Bissexuais Maria Quitéria, de João Pessoa (PB), apoiado no edital coletivos, foi matéria no portal Brasil de Fato, sobre a divulgação do I Encontro Municipal de Mulheres Lésbicas e Bissexuais, realizado entre os dias 27 a 29 de agosto, no Centro de Atividades e Lazer Padre Juarez Benício (Cejube), em João Pessoa.
E, por fim, o portal Meio e Mensagem fez a reportagem “Com coletivo 100% preto, Janga chega ao mercado”, abordando a produtora de áudio que quer impulsionar a equidade racial nas trilhas de publicidade e entretenimento. Fundada pelos sócios Tatiana Nascimento e Antonio Pinto, a Janga conta com a produtora musical, ativista afro-indígena, LGBTQIA+ e nossa apoiada, Dessa Ferreira.
Apoiados no edital “A Cidade que Queremos”, o Grupo Nóis de Teatro, que atua no Grande Bom Jardim, periferia de Fortaleza, celebra seus 19 anos de atividades ininterruptas em 2021. Para comemorar realizou no mês de agosto uma programação especial com apresentação, seminário, sarau e a defesa da tese de doutorado do coordenador geral do grupo, Altemar Di Monteiro. A agenda de atividades do grupo foi divulgada no portal Papo Cult.
Coletiva Negras que Movem – Portal Geledés
A já tradicional coluna “Coletiva Negras que Movem”, no portal do Instituto da Mulher Negra Geledés, com as apoiadas do Programa de Aceleração e Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco, trouxe no dia 7 de agosto o texto “O que aprendemos com as pretinhas da ginástica artística nessas olimpíadas”, de autoria da pós-graduanda em História e Cultura Afro-brasileira, MBA em produção de conteúdo para mídias digitais, Bacharel em Arte e Mídia, Artvista, produtora cultural e empreendedora, Carolina Brito.
No dia 23, foi a vez do artigo “Não seja tão dura com você! Um texto de amor em tempos tão difíceis”, de autoria da escritora, jornalista e autora do livro-reportagem “Negra Sou: a ascensão da mulher negra no mercado de trabalho”, finalista do Prêmio Jabuti 2020, Jaqueline Fraga.